๑ 04 | Vim lhe cobrar um favozinho.
"Repare, a vida sempre cobra pelos seus atos, e não é à prestação, é a vista. A Vida cobra e a gente tem que crescer."
— Autor desconhecido
๑
Durante o curto caminho até a sala de controle me recordo que o General me deve um favor e chegou a hora de cobrar. Seguro o telefone e levo ao ouvido.
— Major Villin. — Me apresento.
— Sua mãe disse que vai me matar se não tiver notícias suas Monspie. — aflito me questiona — Está tudo bem mesmo com você? É que o soldado Dante estava bem nervoso na ligação e deu a intender estar escondendo algo importante.
— Você está saindo com minha mãe? É sério isso General?! — o questiono ponderando minha raiva — Responde! — Esbravejo.
— Somos adultos Monspie. — declara como se isso fosse amenizar minha raiva — Me diga quais são os seus planos e desde já meus sentimentos, sei que os soldados Jard e Raink eram seus amigos.
— Estou bem. Volto pela manhã e obrigado. — respiro exageradamente — Tenho que cobrar um favorzinho, que um certo alguém está me devendo. — Resolvo mudar o foco da conversa.
— Assim que chegar conversaremos melhor. Faça uma boa viagem. — Muda de assunto.
— General, quero levar comigo uma criança daqui de Nad-e Ali. — Informo sem rodeios.
— Que porra é essa Monspie! Está maluco? — suponho que consegui deixa-lo nervoso, fala baixo e exasperado — O que aconteceu, quem é essa criança?
Conto tudo para ele que me nega o pedido, mas prometeu que irá tentar levá-la como emigrante para os Estados Unidos e lá poderei adquirir a paternidade da menina.
— Você não pode se envolver com isso, caso contrário vão alegar ser nepotismo, mas vou mantê-la aí na base. Encontre alguém de confiança que possa cuidar e protegê-la até que venha para ficar conosco. — é sério que ele já pensa ser meu pai?! — Te darei os nomes de cada soldado de confiança que irá para Bagram e você realizará o resto, através deles mande tudo que ela precisar.
— Ok, outra coisa. Tenho uma pessoa aqui na base que cuidará bem dela. Entretanto, quando for para junto da gente ele deverá ser levado também, já que negou meu pedido ao menos esse você pode né General? — Deixo claro minhas intenções com o doutor.
— Quem é? Não é assim que funciona Major Villin. — Rebate rude acreditando que me amedronta.
— Dr. Enzo. Quero fazer dele um homem rico por tê-la salvado. Você pode realizar isso por nós? Ele é muito importante para mim.
— Quantos anos para ele voltar? — pergunta — Isso posso fazer.
— Dois anos e ficarei muito feliz de ajudá-lo.
— Ok, é americano? — merda, não havia pensado nisso — Se for faço umas ligações e no mesmo voo que ela vier poderá vir junto.
— Não, é europeu, mas deixa isso comigo. — Me despeço e desligo.
Tenho pessoas muito fluentes no exército europeu e um pedido da Izabell ou do Benjamin poderia me ajudar com o Enzo. Estou pensativo quando passo e dou uma olhada a minha volta percebendo todos me vigiando boquiabertos, parece até que nunca presenciaram um Sargento gritar com um General.
— Sabem o que significa privacidade? — pergunto — Vão trabalhar!
Uns correm e outros se viram para suas mesas. Agora é só informar ao Enzo e deixar tudo pronto. Volto a passos rápidos e escuto uns risinhos vindo do cubículo que serviu de sala cirúrgica para minha Luz. — Como ainda não sei seu nome a chamarei assim.
Adentro no local e os dois estão juntos demais para meu gosto, nada contra, mas tem uma cri*nça ali e isso é inadmissível.
— Atrapalho? — Dante fica de pé nervoso — Vocês podem ficar à vontade a hora que quiserem, porém, longe da minha Luz. Ela é uma cri*nça. — os repreendo — Porra!
— Desculpa Major. — Dante se retrata — Isso não irá se repetir, prometo.
Essa é nova, não sabia que Dante gostava de homem. Enfim, se o próprio não quis dividir com sua equipe creio que isso não é da minha conta. Respiro fundo e me junto ao Enzo que permaneceu sentando.
— Enzo de agora em diante se assim você aceitar, manteremos contatos diariamente. — Dante me dá um olhar de reprovação — Calma porra! — tento explicar o mal-entendido — Estou voltando para casa, contudo infelizmente ela não poderá ir comigo ainda e você se mostrou uma pessoa confiável.
— Do que precisa? — não sei porque, mas vejo lealdade nessa pessoa — Diga Sargento e farei o que for para ajudar essa menina.
— Que você cuide da minha Luz. Todo mês enviarei coisas para vocês dois, a partir de hoje será bancado por mim, não tenha vergonha de me pedir nada. Sou um cara muito rico. — Ele me olha com as sobrancelhas levantadas.
— Não quero seu dinheiro Sargento, farei de coração, pois, sei que ela é importante para você. — acabo sorrindo com sua resposta — Não tenho celular o meu quebrou faz meses, mas pode falar comigo pelo telefone da base.
Pego meu aparelho do bolso e lhe entrego. Ele me olha espantado com minha atitude.
— Agora tem! O que você precisar é só me ligar! — afirmo — Conversei com meu General e infelizmente ele não poderá te tirar daqui com a Luz, entretanto, minha família tem contato com o exército do nosso continente e são pessoas de patentes importantes bastando apenas um telefonema e você estará livre dessa situação.
— Não precisa se preocupar comigo eu até gosto de estar aqui trabalhando e serei uma verdadeira mãe para nossa filha. — sorrindo faz eu e Dante o acompanhar na gargalhada alegre — Pode deixar que cuidarei muito bem dela e vou protegê-la com a minha vida.
— Fico muito feliz de saber disso. — Declaro.
(...)
Após todos os esclarecimentos tomo um banho e me deito em uma cama ao lado da dela, seguro em sua pequena mão e faço uma oração.
— Deus, sou eu aqui de novo enchendo seu saco. E-er desculpa por usar essa metáfora ofensiva, é que preciso que cuide bem do Enzo e da minha Luz para que muito em breve eles possam ir morar comigo. Se esse for o caso não me importo já que ele se tornou uma pessoa muito importante para mim, então, os proteja amém! — Finalizo e fecho meus olhos.
Não consegui pregar os olhos a noite inteira. No meio da madrugada Enzo veio aplicar os medicamentos em sua veia, verificar sua incisão e constatou estar tudo bem. Ao amanhecer um helicóptero chega à base para nos levar para o hangar e de lá partiremos para casa, não estava feliz com isso. Meus amigos morreram e minha Luz não iria comigo. Durante o banho fiz algo que não fazia há anos, chorei por não poder voltar com meus amigos vivos e ainda mais por não ter minha Luz junto de mim nesse avião. Finalizo meu banho e vou para perto dela esperar o Enzo voltar da despedida do Dante, assim que chega beijo a cabeça da minha futura filha e vou para junto dele.
— Enzo cuide dela como se fosse sua filha e terá minha eterna gratidão, por favor, me liga a qualquer hora assim que eu chegar em casa comprarei um telefone e entrarei em contato com você. — Despeço-me com um abraço amigo e saio na frente para dar-lhe um pouco de privacidade para se despedir do Dante.
Não demora muito para estarmos sobrevoando Bagram em direção ao hangar, nós dois e os corpos de Jard e Raink. Sinto meu peito apertado e tento controlar minha impaciência. — Ela tinha que vir comigo.
— Sargento, ficará tudo bem, não se preocupe que o Enzo falou a noite inteira que era sua mãe, então, pode ficar tranquilo que ele cuidará da pequena. — Seu relato me tira dos meus devaneios.
Dante não sabia, mas as suas palavras me tiraram de um buraco negro chamado ansiedade.
— Jura que você é gay e não me contou? — o questiono — Porra! Quantos anos juntos, Dante? Que caralho é esse de não confiar em mim?
— Desculpa. Ninguém sabe Sargento, não queria piadinhas sobre minha opção sexual e sinto muito por não ter contado antes é que ninguém sabia. — sinto verdades em suas palavras — Sempre fui interessado em conversar com o Enzo, mas nunca tomei um tiro se quer nesses anos que ele esteve aqui.
Fico triste por não confiar em mim, sou um cara legal, nunca o julgaria. Olho para os caixões dos meus amigos e uma tristeza cai sobre mim.
— Me desculpa de verdade, Sargento. — o encaro — Espero que me entenda e isso não afete nossa amizade.
— Monspie, me chame por meu primeiro nome. Dante, nunca te julgaria. Conhecemo-nos há anos e já salvei sua vida quantas vezes? Porra! Sou seu amigo caralho você pode contar tudo para mim. — deixo claro que fiquei decepcionado — Tenho um emprego garantido por minha patente e sei que o salário de um soldado aposentado é uma miséria, mas se quiser posso te arrumar um emprego com meu amigo na Suíça que por ter minha confiança Dários confiará em você, se quiser converso com ele.
— Muito obrigado, porque pretendo manter contato com Enzo sei que ele não é americano e ficará mais fácil para ficar perto dele. — Olho bem para a cara dele.
— Cuidado! Se ele chorar por sua causa vou te matar. Já que queria tanto levar um tiro te dou dois. — deixo bem claro já que me conhece muito bem — Enzo é uma boa pessoa e hoje sua importância na minha vida é igual aos meus amigos que você irá conhecer, então, muito cuidado.
— Eu sei. — com medo concorda — Cuidarei dele. — Afirma e ficamos quietos.
O resto da viagem foi em silêncio, assim que chegamos no hangar não demoramos muito a pegar o avião de carga e logo estávamos bem longe de Nad-e Ali. Meu coração se apertou de tal maneira que me senti sufocado e fui invadido por uma crise de pânico. Doparam-me e quando acordei já estava no hospital de base da marinha americana.
— Luz, farei de tudo para te trazer para cá e se não der certo me mudo em definitivo para a Síria. Isso é uma promessa!