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Capítulo 2 - A proposta!

¤ Por Lili James | Brooklyn, Nova Iorque ¤

    A vida seguia tranquila, calma como a superfície do mar, e mais previsível que o clima.

Nessa tarde de um domingo ensolarado, achei de passear pelo Broklyn Bridge, fazia muito tempo que não espairecia, que não pensava em outra coisa que não fosse trabalho. Uma vida morna é confortável, adaptável e segura, eu não tinha do que reclamar, levando em conta como era minha vida há três anos atrás.

Quando você se prende à uma perspectiva, você se limita a perceber o que se passa ao seu redor. Pessoas vem e vão, um mundo diferente passa por você, e você não percebe. Meu trabalho envolvia comunicação, de qualquer forma, me sentia conectada às pessoas, fazia parte do cotidiano delas. Já conheci muitas pessoas trabalhando ali, sempre fui gentil com cada uma delas.

   Viver a vida era a melhor arte, nada se comparava as sensações, dirigir um olhar ou uma palavra às pessoas. Entretando, a breve conversa que tive com aquele estranho na outra noite, plantou em mim a semente da discórdia, quando perguntou-me sobre os planos para meu futuro. Eu estava decepcionada comigo mesma, pois parecia que eu tinha desisto de uma vida melhor para mim.

    Era extraordinário que depois de tudo que passei, não pudesse esperar coisas boas da vida, não que meu futuro estivesse condenado porque meu passado não foi bom. Esses momentos de reflexão eram necessários para não enlouquecer, mas ainda assim eu fugia de me trabalhar para ser alguém melhor. Não falo de caráter, mas sim de estudos, oportunidades de me preparar para viver a vida de uma forma melhor.

   A tarde estava caindo quando decidi voltar, a praça estava com mais movimentação, estava cheia de crianças brincando. Uma criança corria solta pelo o parque, enquanto poderia estar imaginando saltar da mais alta nuvem, e escorregar num lindo e enorme arco-íris no céu. Eu gostava de observar esse tipo de coisa, era agradável, relaxante.

Estava distraída observando os sorrisos e a correria no pátio, quando meu corpo trombou com o de outra pessoa. Meu coração saltou do peito quando me virei para me desculpar, aqueles mesmos intensos olhos azuis como cristais prenderam minha atenção de imediato.

— Você de novo! — ele apertou os lábios num meio sorriso, e eu me senti envergonhada. — Desculpe, outra vez... — ajeito minha postura.

— Lili, não é? — assenti sem jeito. Ele lembrava do meu nome. — Costuma vir aqui? — ele me olhou de cima abaixo. Eu estava com um casaco jeans ridículo e velho, enquanto ele vestia um sobretudo que devia ser muito caro.

— Não sempre, mas sim... — ele ficou me encarando, e depois me mostrou um banco vazio.

— Quer sentar um pouco? — eu concordei, me sentando ao seu lado. — Aproveitando o dia de folga?

— A semana mal começou! E você? — tomei coragem para olhar para ele, e ele parecia confortável.

— Gosto de observar o mundo.

— Também — dei de ombros. — Mas o senhor deve ser mais ocupado do que eu!

— Senhor? Pareço ser tão velho assim? — eu não consegui segurar a gargalhada, porque ele pareceu realmente preocupado.

— Eu te chamaria pelo seu nome, se eu soubesse. — Ele assentiu, tirando sua mão do bolso e estendendo para me cumprimentar.

— Henry Montanari. – Eu apertei sua mão vergonhosamente fraco.

— Hum, estive pensando na nossa breve conversa, senhor Montanari. – Sorri, mas falando de um jeito enigmático.

— Mesmo? No que esteve pensando? — ele realmente pareceu interessado.

— Nada demais... — de repente me senti arrependida de ter tocado no assunto. Até parece que eu iria desabafar minha vida com esse cara.

— Você por acaso se tocou que é nova e inteligente, e que tem tempo para mudar de ideia? — lhe encarei tímida, contendo um sorriso travesso nos lábios.

— Vou adicionar esses detalhes...

— A vida nos entrega oportunidades a todo momento, basta sabermos notar e aproveitá-las.

— Obrigada pelo o conselho — lhe sorri, ainda envergonhada.

— Você mora longe daqui? — me voltei para as crianças.

— À duas quadras a sua esquerda — ele ficou quieto por um tempo, e um vento frio arrepiara meu corpo.

— O que acha de jantarmos? — olho para ele, surpresa. Ele ergue a sobrancelha esperando por uma resposta.

— Tudo bem... — Tudo bem mesmo? Ele era um estranho, sua maluca!

— Eu conheço um lugar aqui perto — ele se levanta e oferece seu braço para apoio.

A atitude formal me deixou boquiaberta, eu acabei rindo sem querer, e ele me lançou um olhar sério demais. Rapidamente aceito me apoiar em seu braço, e assim começamos uma caminhada tranquila, e sem pressa. Me mantive atenta a todo momento.

— Você nasceu aqui?

— Eu sou do Bronx, me mudei para cá há três anos. – Respondi.

— Hum. — Ele estava concentrado nos carros que passavam.

— E você? — perguntei, ainda me sentindo acanhada.

— Londres, mas moro atualmente em Manhattan.

— Sabia que tinha algo a mais no seu sotaque! — ele aparenta ter achado graça, e mal percebi quando estávamos entrando em um restaurante.

Eu conhecia, mas nunca tinha entrado aqui, era um pouco caro, mas ele que me convidou. Será que ele aceitaria dividir? Ele escolheu uma mesa distante, onde havia pouquíssimo movimento. Ele arrastou uma cadeira para mim, me deixando desconsertada novamente com tanta formalidade. Ele era um cavalheiro.

— É a minha convidada, fique à vontade para escolher o que quiser — ele sorriu minimamente.

— Não, nós vamos dividir!

— Eu não perguntei, eu afirmei a informação — fico boquiaberta com sua ousadia, ele dá de ombros como se não se importasse. Eu respiro fundo, resolvendo deixar a situação como está. — Então, a única coisa que faz da vida é trabalhar?

— Isso é um insulto? — ele me encarou preocupado. — Eu também divido um apartamento com uma amiga. Dividir espaço com a Samy é o mesmo que dividir com uma criança!        

— E você é a adulta responsável da história? — ele ergue uma sobrancelha, como se não acreditasse nisso, me fazendo gargalhar. Ele pareceu se divertir com minha reação. Ele chama o garçom e então fazemos o pedido rapidamente, eu escolhi um prato simples e água para acompanhar. — Conheceu ela aqui?

— Não, na verdade eu vim pra cá com ela.       

— Imaginei que tinha vindo com sua família — ele se aproximou, como se estivesse interessado nesse assunto.

— Não tenho mais contato com a minha família desde então... — limpo a garganta.       

— Toquei num assunto delicado? Sinto muito.      

— Não, não... — ele fixa o olhar como se quisesse arrancar mais algo de mim. — Você tem muitos compromissos pelo o Broklyn? — mudo de assunto.

— Na verdade, não. — Ele se estica na cadeira. 

— Então, o que faz por aqui? — ele respira fundo. — Ah, desculpa, não é da minha conta!  

— Não tem problema. Na verdade, eu voltei na lanchonete, mas não te encontrei lá — fico boquiaberta com a informação. —, estava indo pegar a ponte para voltar pra casa, quando te vi no parque.

— Entendi... — fiquei lhe observando, e ele fez uma expressão engraçada.

— Isso é estranho?

— É sim — e finalmente lhe arranco um sorriso aberto.

— Eu gostei da última conversa que tivemos.

— Conseguiu resolver seus problemas? — o garçom trás os nossos pedidos.

— Na verdade, eu pensei em uma solução temporária. — Ele responde, assim que ficamos sozinhos novamente.

— Que bom! — começo a comer.

              

— Você não quer saber?

              

— Não é da minha conta. — Dou de ombros.

              

— Mas eu quero dividir com você. — Será que ele me considera uma nova amiga? Lhe dou um sorriso como resposta, e então ele continua. — Você gostaria de entrar num relacionamento sério publicamente comigo? — estreito os olhos para ele. Eu não aguento, e dou uma risada. Ele puxa os cantos da boca, como se quisesse acompanhar a graça do que disse.

   

— Eu estou surpresa, porque eu pensei que você não tivesse senso de humor! – ele limpou a garganta antes de me responder.

          

— Não foi uma brincadeira — ele veste uma feição preocupada. Um longo minuto se passou, e ele ainda continuava com uma expressão séria, esperando uma resposta de mim. Então minha ficha caiu. Ele realmente estava falando sério.

— Isso é patético...!

— Mas...

— Eu nem conheço você, você ficou maluco? — em que tipo de mundo esse cara vive? E é por isso que é perigoso aceitar convite de estranhos.

— Deixa eu explicar? — ele pediu, parecendo achar graça do meu estado de alerta. — Seria uma fachada.

— Fachada?

— Sim.

— Em que mundo você vive? — ele ri.

— As pessoas fazem isso as vezes, é normal — isso não é normal pra mim. — Eu gostei de você.

— Ah, tá, pelo os dois minutos que conversamos? — perguntei com deboche evidente.

— Você parece ser uma boa pessoa, não vejo maldade em você. — Ele suspirou, coçando a nunca.

— Eu acho melhor eu ir embora... — olhei ao redor, a saída não estava tão longe.

— Não precisa ter medo, é só uma conversa amigável — ele deu de ombros, e eu estreitei os olhos para ele.

— Você é um esquisito, que está falando coisas mais esquisitas ainda pra mim.

— Não precisa me ofender — ele ri. — Falo sério, as pessoas fazem isso o tempo todo.

              

— Eu acho que você está desesperado, e não pensou direito. Isso pode acabar em sérios problemas com seus pais, ao invés de te ajudar, não importa quem escolha para essa besteira — cruzo os braços, e ele estreita os olhos para mim.

              

— Vai ser por pouco tempo, já tenho tudo planejado — eu segurei uma risada.

              

— Ninguém que se preze aceitaria esse absurdo! — Ele acha graça.

              

— É por um bem maior, Lili — ele sorre. — É só juntar meus interesses com os de outra pessoa, e então o acordo estará feito. Lembra que você concordou comigo na outra noite? Tudo o que basta é respeito e comunicação, mesmo que não haja amor.

              

— Olha, não precisamos passar por isso — Ele não teria problema algum para arranjar uma namorada de verdade. Ele ficou apenas me observando, parecia que queria falar algo.

              

— Gosto da sua sinceridade. — Reviro os olhos. Não será com elogios que ele me fará mudar de ideia. — Já conheceu alguém antes e teve a sensação que a conhecesse há muito mais tempo? — Hershel veio a minha mente no mesmo segundo.

              

— Meu chefe, o considero como um pai... — Ele assentiu.

              

— Sinto isso com você — eu franzi o cenho.

              

— Como assim? — ele sorriu outra vez.

              

— Não sei. Eu olho pra você, e me sinto confortável para conversar.

              

— Legal, mas isso não justifica sua ideia absurda. Pode me convidar pra ser sua amiga, isso eu não negaria — lhe dou um sorriso.

— Amigos ajudam um ao outro, e você está me negando ajuda.

              

— Na verdade, eu estou sendo uma boa amiga te avisando que isso vai dar em merda...

              

— Eu não tenho muitas alternativas.

              

— Então espero que sua lista de pretendentes seja maior, porque minha resposta é não — termino de comer, e me ocupo bebendo o suco, e lhe lançando um olhar de deboche. Eu ainda acreditava que era uma piada, só podia ser. Onde que esse cara lindo, elegante e boa pinta, inventaria uma ideia como essa?

              

— Só pensei em uma pessoa para essa lista — ele suspirou.

              

— Por que não liga pra uma ex-namorada? — pisquei pra ele.

              

— Eu não tenho ex-namorada — suspiro frustrada, até nisso não conseguia acreditar. — Lili, seria por pouco tempo, nós... — ele se curva na mesa.

— Não, Henry, já chega, isso é ridículo! — estava ficando nervosa.

— Não é nada demais...

— Você está louco, você nem me conhece! Como você pode confiar essas coisas para uma estranha?

              

— Me deixa explicar — eu estava quase pulando da cadeira, mas me segurei para ouví-lo. Estava me tremendo toda. — Eu disse antes, e pode soar estranho, mas eu me sinto à vontade com você, e não tenho nenhuma explicação que descreva melhor isso. Tudo acabaria discretamente e ninguém suspeitaria de nada, cada um seguiria seu caminho, e não se preocupe, eu te recompenso da forma que achar que mereça, é só me dizer seu preço, e faremos um acordo.

— Pode parar! — levantei num sobressalto. Encarei a saída do restaurante, pronta para fugir daquela situação, mas ele se pôs na minha frente.

— Se acalme, não me entenda errado! A última coisa que quero é te ofender...

— Eu já disse que não. — Enfiei minhas mãos no bolso do casaco, enquanto ele parecia preocupado com os olhares alheios.

— Por favor, pelo menos pense. Não te pediria para fazer nada que fosse desconfortável pra você. Seria apenas jantares e talvez alguns eventos, no máximo lhe pediria apenas três meses.

— Apenas três meses mentindo? Três meses não são três dias!

— Eu sei, Lili.

— Não, Henry, sinto muito.

— Qual é o seu medo? — se aproxima. Ironicamente nós já estávamos interpretando um clima de briga como um casal.

— Eu tenho meus princípios. — Falei de forma óbvia. — Não vou me meter nas confusões de alguém que não conheço, tudo pode acabar muito mal, principalmente para mim. Gostaria muito de poder te ajudar, mas isso extrapola qualquer limite. Como eu disse antes, é patético. Não pode brincar com os outros com uma ideia idiota de filme de comédia romântica, e simplesmente perguntar meu preço!

— Eu sei que é honesta, eu vejo isso em você. E me desculpe pela forma que falei. Eu só quis oferecer algo em troca. — suspirei cansada do assunto, acenando negativo, olhando para meus pés. — Olha, eu te levo pra casa, você descansa, dorme, e amanhã você me dá uma resposta definitiva.

— Senhor — o garçom lhe entrega a conta, e ele paga rapidamente. Ele faz sinal para sairmos juntos do restaurante, e eu ando longe dele.

— Isso é ridículo. — Eu segui o caminho de casa, e ele veio atrás.

— Eu não disse que era uma ideia brilhante.

— Prefiro que você entre no seu carro e vá embora, finja que nunca me conheceu, eu não vou contar pra ninguém mesmo. — Pensei na alternativa.

— Eu agradeço, mas estou realmente interessado em você... — Que merda ele estava dizendo?!

 

— Por que não arranja uma namorada de verdade? É tão mais simples e menos complicado! — paro e cruzo os braços, brava e nervosa.

 

— Eu não gosto de ninguém assim. Acha que não pensei nisso? — me enfureço e volto a andar. — Lili...

 

— Esse tipo de coisa só dá certo em filmes, e, na verdade, nem isso, no fim todos descobrem a mentira!

 

— Eu prometo que será por pouco tempo. Três meses no máximo. É o tempo de eu convencer o meu pai de me entregar a presidência da empresa. – Meu prédio já estava perto, para meu alívio.

 

— Então tudo isso é por uma empresa? Você é mesmo um filhinho de papai... — ele me agarra pelo o braço, e me puxa. O ato me fez ficar alerta, me afastando no mesmo instante de seu corpo. — Você não pode ter tudo o que quer! E não pode me assustar assim...

 

— Eu só estou te pedindo pra ser minha namorada, e não para assumir meus problemas!

 

— Esse é o seu ponto de vista... — ele dá um passo, ficando mais perto do meu rosto, me intimidando.

 

— Só diz que vai pensar, Lili.

 

— Não, Henry, talvez você não tenha noção disso nesse seu mundinho particular, mas "não" é "não", e você está me assediando. — Ele parece tomar um susto com minhas palavras, e se afasta no mesmo segundo, guardando as mãos nos bolsos.

— Me desculpe, não quis que parecesse isso... — ele se atrapalha com as palavras. — Me desculpe, de verdade, não quis assediar você!

— Me diz uma coisa, quem você acha que se ferraria mais nessa ideia idiota?

 

— O único risco que você corre, é de se apaixonar por mim. — Eu não acredito que ouvi isso. Revirei os olhos instaneamente, enquanto ele riu. — Prometo pela minha vida que vou proteger você de tudo, de qualquer complicação.

 

— Boa noite, Henry, obrigada pelo jantar — eu ainda tinha educação. Subo para o hall do prédio.

 

— Obrigado por aceitar jantar comigo! — Escutei atrás de mim

 

— Só aceitei porque estava com fome. — Gritei de volta, abrindo a porta de entrada.

 

— Pense com carinho no meu pedido de namoro... — e fechei a porta. Que garoto ousado! Ele deve achar que tem o mundo aos seus pés!

  

   Ele está muito enganado se pensa que fará minha cabeça, como se eu fosse influenciável e burra. Não estou nem aí se isso é comum no mundo dele, no meu mundo isso se chama 'desespero'. Era uma completa roubada. E eu sou mais esperta do que pareço!

   A manhã seguinte passou voando, meus olhos estavam grudados na porta, imaginando ele passar por ali a qualquer momento, e vir com a mesma conversa da outra vez, mas o pensamento de que nunca mais veria ele era predominante. Eu ainda insistia em acreditar que tudo não passava de uma loucura momentânea dele.

Era torturante essa situação. Eu sentia que ele estava sendo sincero, não via maldade nas suas palavras, por mais que ele seja apenas um estranho para mim, e esse era o ponto. Não poderia confiar minha integridade a qualquer um que aparecesse e me pedisse ajuda, não esse 'tipo' de ajuda. Porém, o que que ele tinha que me deixava tão confusa? Ele me faz duvidar de mim mesma.

   E foi nesse clima que se seguiu o dia, a luz do pôr do sol iluminava maravilhosamente o estabelecimento, quando parei um pouco para checar o celular. Samy havia me notificado de que chegaria tarde, pois iria jantar com o namorado. Tinha outra mensagem que era uma cobrança da dona do apartamento, lembrando que amanhã seria o dia de pagar o aluguel. Hershel neste segundo sai da cozinha, e me encara suspirando.

— Cansado? — ele sorre.

— Se importaria de fechar hoje?

— Claro que não me importo, mas por quê?

— Eu preciso ir resolver um assunto... — ele não parecia querer entrar em detalhes.

— Pode ir, não se preocupe! — ele assentiu, puxando seu casaco.

— Tome cuidado, Lili — nos abraçamos rapidamente, e então ele saiu.

Observei o lugar vazio de clientes, e pensei em comer uns bolinhos com café, quando a porta novamente se abriu.

— Esqueceu de algo? — me virei despreocupada, e me surpreendi ao dar de cara com ele, Henry. — Ah, é você. — Fui para atrás do balcão.

— É assim que você cumprimenta seu namorado? — ah... Eu não ouvi isso!

— De qual realidade alternativa você veio? Pensei que nunca mais te veria de novo — servi meu café, pescando um bolinho da vitrine.

— Imagino que desejava mesmo isso. – Ele ri. — Isso é sua janta, ou apenas um lanche? — ele se senta a minha frente, num banco.

— Você quer? — ele sorriu.

— Eu gostaria — lhe sirvo o mesmo, enquanto isso ele retira seu sobretudo, se acomodando melhor na cadeira. Brindamos nosso café, e comemos em silêncio, para minha surpresa. Pensei que não entraria mais ninguém pela porta, então achei de fechar cedo, e fui logo limpando as mesas.

— Você faz tudo isso antes de fechar? — ele finalmente disse alguma coisa. Eu virei para trás, largando a vassoura.

— Geralmente, o Hershel me ajuda, mas ele precisou sair.

— Hum. 

   Termino com as mesas e o chão rapidamente, e dou graças silenciosamente por mais um dia de trabalho, assim que a noite chega. Corro para o banheiro, depois de notificá-lo que iria trocar de roupa, tento ser breve. Eu voltei para perto dele murcha, querendo lhe fazer mil perguntas, e ele notou minha inquietação. Já que ele estava aqui, eu queria saber mais sobre ele.

— Por que está com essa cara? — ele acena para um lugar ao seu lado.

— Por que não me explica sobre querer tanto a presidência dessa empresa que mencionou ontem, ao ponto de fazer essa bizarrice? — ele sorre.

Talvez ele pense que eu estaria cogitando a possibilidade de aceitar, e eu estaria mentindo para mim mesma se negasse isso. É claro que passou pela minha cabeça, mas a última coisa que sou é impulsiva.

— Meu pai sempre mencionou que seu sonho era passar a empresa da família adiante para as próximas gerações, tendo em vista que tudo começou pelo o meu bisavô, é quase que uma tradição. — Eu me sento ao seu lado, mostrando meu interesse na história, mas eu não conseguia esconder meu nervosismo. — Eu sou o mais velho dos meus irmãos, então sempre me senti mais pressionado que eles para assumir este cargo. Então fui para Harvard, dei o meu melhor, tenho tentado seguir os passos do meu pai, para deixá-lo seguro da escolha de me passar a presidência. Meus irmãos são de acordo. Minha mãe se preocupa com a ideia por que ela acha que deixarei minha vida pessoal de lado, então ela penaliza meu pai quando ele tenta me moldar para o cargo. E então, tudo se complica.

— Então, na verdade, é sua mãe que se preocupa com sua vida amorosa? — ele dá de ombros.

— Resumindo, os dois. Porém, é meu pai que exige que eu tenha uma esposa e filhos, porque esse seria o melhor cenário para ele me escolher como seu sucessor, e para o comando não sair da nossa família. Meus tios e primos queriam muito estarem no meu lugar. Um dos meus irmãos, que também disputaria a presidência, já tem sua família formada, e isso deixa ele mais capacitado. Por ele ter um filho e uma esposa que meus pais aprovam inquestionavelmente a empresa continuaria na nossa família, ao invés de possivelmente perdermos para outro membro. E acredite quando digo que os meus tios e primos nos rodeiam como se fossem urubus. — Ele explica.

— Então, você viverá para procriar e fazer dinheiro. Que vida bacana! — eu levanto para buscar minha bolsa e casaco, enquanto ele ri.

— Falando assim, parece mesmo, mas é uma tradição familiar que eu desejo cumprir, e meu irmão não, mas ele não teria escolha se meu pai decidisse por ele. Então nós dois ficaríamos infelizes. — Ele cruza os braços, e me encara. Eu já entendo seu olhar. — Eu pensei numa solução saudável e segura.

— Ah, que bom! — sorrio aliviada, e me aproximo para acariciar seu braço, e ele estreita os olhos.

— Eu não disse que mudei de ideia, eu quis dizer que pensei numa forma segura de finalizarmos nosso acordo.

— Que acordo, Henry? Eu não aceitei nada! — ele ri novamente.

— Vamos assinar um contrato, nele prometemos um ao outro manter segredo sobre o assunto, e eu deixo claro suas condições. — Suspiro fundo, tentando acalmar meus nervos. — Eu disse que protegeria você de qualquer imprevisto, e eu também deixarei isso claro no acordo. Eu juro pela minha vida que você não sairá prejudicada!

— Henry... — ele sorre.

— Eu sei que ainda somos dois estranhos, e eu não sou idiota, eu sei que o que estou pedindo é muito, acredito que você já tem coisas demais para se preocupar no seu dia à dia. Por isso sugeri te ajudar com algo!

— Não quero nada de você.

— Você que sabe, não vou te forçar a nada. — Eu simplesmente não conseguia respirar direito. Parecia que eu estava prestes a tomar a decisão que mudaria minha vida. — Se você me disser outro não, encerramos esse assunto aqui, e eu vou entender. Não quero ser mais insistente e incomodar mais do que já estou fazendo.

— Você é maluco, não me interessa que isso seja comum pra você. Por que não procura alguém que pense da mesma forma que você? Você também mencionou isso no outro dia, sobre encontrar alguém que esteja de acordo com as mesmas coisas que você!

— Você é especial — ele pisca.

— Para! — vou em direção da porta.

— Aceite, por favor. Veja de outra forma, seremos bons amigos naturalmente, não haverá nada demais, apenas uma boa relação entre nós dois. É a isso que me refiro ser algo comum.

— Isso é estranho. — Digo, ainda de costas.

— Eu sei — lanço um olhar duvidoso para ele por cima do ombro, ele vem até mim com a testa franzida.

— Humf — faço, lhe encarando feio.

— Seja uma garota normal, e aceite meu pedido de namoro — ele usa um olhar intrigante, tentando me intimidar. Eu gargalho alto, lhe deixando com uma ruga entre as sobrancelhas.

— Você é inacreditável!

— Você que é!

— Você é maluco!

— E você é má, está me fazendo implorar para namorar comigo — ele ri, me fazendo rir também.

— Eu não sou boba...

— Sei que não é, você é inteligente, só não é tão esperta. — Ele cruza os braços, eu lhe imito.

— Você não vai me ganhar me ofedendo!

— Então, o que posso fazer para lhe ganhar? — ele dá um passo, me olhando sugestivo. Eu dou um passo para trás, me sentindo rendida o suficiente pela situação. Eu sou mais idiota que ele.

— Não, tudo bem, já chega, eu te digo um "sim".

— Não sei descrever o quanto estou grato... — ele sorre abertamente. Ele realmente parecia feliz com a ideia. Ele é insano.

— Se... — ele assente, escutando atentamente. — Se você não fizer nenhuma besteira, não me colocar em perigo, não me envolver em uma roubada, por mais que isso já seja uma...

— Eu prometo. — Ele acena positivo, sério.

— Você não vai me constrager na frente de ninguém, e vai respeitar meus limites!

— Sim, estamos de acordo!

— E eu só posso ter perdido o juízo, mas admito que será uma aventura, parece coisa de adolescente... É tão idiota — ele sorre.

— Somos oficialmente comprometidos, então não ande por aí com outro cara, não quero esse tipo de fama — e eu gargalho alto.

— Você é muito bobo! — ele recolhe seu casaco e me acompanha para fora do estabelecimento.

— Minha primeira missão como namorado, será levá-la em casa! — e eu me vi rindo abobalhada novamente, enquanto girava a chave trancando a porta. Eu fiquei maluca? Eu me viro para ele, e noto o carro parado. Ele acena para que eu me aproxime, enquanto abria a porta do carona. E o arrependimento chegou cedo.

— Eu moro aqui pertinho, você sabe... — ele veste uma feição séria, ainda acenando para que sentasse no banco. — Tudo bem, mas não vem com essa de mandar em mim, o namoro é de mentira! — ele fecha a porta, e rapidamente dá a volta no carro e entra.

— Peço desculpas pela educação que meus pais me deram, de nunca deixar uma garota voltar para casa sozinha. — Ele facilmente manobra o carro e dirige sem pressa.

— Eu ainda quero te convencer a não fazer isso — ele ri.

— Amanhã trarei a papelada para assinarmos juntos, tudo bem? Poderíamos passar um tempo juntos para nos conhecermos melhor.

— Eu te insulto, mas eu me sinto pior.

— Apenas curta o momento, Lili, você vai se divertir comigo — Eu aceno, sentindo-me tímida. O que merda eu estava fazendo? — Está entregue. — Ele estaciona. E eu brevemente agradeço a Deus por não ter sido raptada. — Você é minha primeira namorada, que interessante. Será que eu escolhi bem? — Ele me olhou curioso.

— Você deve estar com falta do que fazer. — Ele sorre.

— Obrigado pela oportunidade, espero que dê tudo certo, preciso da confiança dos meus pais.

— Obrigada pela pressão psicológica — ele revira os olhos. — Bom, vou indo, boa noite, e obrigada por me trazer. — Abro a porta do carro.

— Não vai me dar nenhum beijinho? — e então sumo do banco, ouvindo sua risada atrás de mim.

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