Capítulo 1
Beatriz
Me pergunto quando foi que deu tudo errado.. Ou melhor, onde é que eu errei?
Foi por ter acreditado que finalmente era amada e desejada?
Não.. No fundo não era isso.
Aquilo não era amor.
Amor machuca, não te destrói.
Queria voltar a ser criança.. Joelhos raladas doíam menos que corações partidos.
Mas a quem eu quero enganar?
Nunca fui uma criança normal, com uma infância normal..
Esta foi apenas mais uma queda para a coleção.
A diferença é que esta foi A Queda!
Daquela em que não consigo levantar.
Não consigo me deitar e não lembrar dos seus beijos, dos seus abraços e do seu cheiro.
Da mesma forma que não consigo me deitar sem desatar em lágrimas.
Eu o amei tanto.. Achava que esse amor era correspondido, mas aquilo não é amor.
Hoje eu não sou nada.
Nada.
Apenas estilhaços do que um dia foi alguém.. Alguém que desde pequena era quebrada.
Faz algum tempo desde que minha irmã morreu.. E desde o dia que perdi meu bebê.
As vezes eu acho que estou enlouquecendo.
Sinto como se estivesse ouvindo sua voz meiga logo seguida por choro de bebê.
Tenho sonhos constantes com ela e o bebê que nunca tive. E Rafael.
Estou adoecendo, eu sei disso.
Mas não sinto vontade alguma de tomar precauções.
Seria melhor se eu desaparecesse de vez, não?
Me encontraria com minha irmã e deixaria de ser um encosto.
Sinto que estou arrastando todo mundo para a minha solidão e vida mísera.
Meu celular apita e vejo uma mensagem de Millena aparecer no ecrã.
Ela está preocupada..
É a única coisa que faço agora.. Preocupar as pessoas e fazer com que deixem de viver suas vidas por minha causa.
Eu me odeio por isso!
Sou apenas mais uma para a minha própria lista de pessoas que me odeiam.
Não preciso dizer que é quase todo mundo, não?
Todo o coração sabe amar grande. O problema é que, nos corações machucados, o amor esvazia em meio aos buracos, e o amor passa a se tornar pequeno e duvidoso.
É difícil encher algo que insiste em ficar furado, que insiste em derramar.
Todo o coração sabe amar grande, mas amar pequeno não é questão de escolha, e sim de involuntariedade.
/
Desde que cheguei nos EUA minha vida mudou drasticamente.
Foi da água para o vinho.
Me encontrei com Millena - minha médica - no dia em que embarquei nessa viagem, ela insistiu que eu ficasse em sua casa pois estaria sozinha mas eu recusei..
Precisava de um tempo sozinha, para ser eu mesma, sabe?
Então eu me instalei em um hotel, onde fiquei por uns 4 dias enquanto procurava uma casa..
Logo comprei um apartamento. Com o dinheiro que ganhei do Ogro consegui comprar um apartamento aconchegante, não é pequeno mas também não é grande.
Possui dois quartos com banheiros e um banheiro geral. Uma cozinha espaçosa e uma sala grandinha.
Aqui os apartamentos não são caros e pra minha sorte todos eles vem mobilados.
Não fico tão longe da casa de Millena, talvez uns 20 minutos dirigindo.
Faz duas semanas que estou em minha própria casa.. E isso me alegra, apesar de desmoronar todas noites.
Mas enfim.. Um dia de cada vez.
Rafael realmente me pagava um absurdo de dinheiro. Fiz tudo que tinha que fazer e ainda assim me sobrou uma boa quantia de dinheiro.
Dinheiro que penso em investir, pois num futuro próximo pretendo lhe devolver cada tostão.
Que não sobre nem um centavo.
Mas como se estou em um país totalmente desconhecido? Não sei como começar e nem por que caminho seguir.
Em função dessa desgraça eu fiz a única coisa que me passou pela cabeça.
A ajuda chegou uma semana depois, Máx Castilho me ajudou a erguer uma pequena empresa.
Como dizem, pequenas empresas, grandes negócios.
Numa primeira fase o tive como sócio, depois ele quis dar o pé e deixar que eu tivesse controle de tudo, mas eu não aceitei.
Realmente lhe devo muito, não sei o que faria sem sua ajuda.
Faz um mês que ele está aqui nos Estados Unidos me ajudando com tudo isso.
Nesse Um mês Bella se mudou para cá.. Ao que parece seu relacionamento com Lucas andava de mal a pior. Até que então ela lhe flagrou com um montão de piranhas e aí foi a gota d'água.
Minha irmã não tinha para onde ir, mas como sempre, minhas portas estarão sempre abertas para ela, pois não sei o que seria de mim sem ela.
Tratamos de tudo e dois dias depois ela estava aqui.
É nostálgico, nós duas sofrendo por muita coisa sozinhas, sorrimos durante o dia mas choramos durante a noite.
Então é assim, Eu e Bella contra o mundo.
Ela e Millena também nutriram uma amizade que me alegrou, agora somos um trio aqui em Miami.
O estranho é ela e Máx terem se odiado.
Sinceramente eu não entendi nada. Não podem estar no mesmo local juntos que já transformam tudo em bate boca.
Aos poucos minha empresa vai subindo.. Ainda é pequena e não me rende muito, mas é grão a grão que a galinha enche o papo.
Yassmyn veio me visitar por uns dias. Estava morrendo de saudades dela também.
Bem, ela já sabe de tudo, tudo mesmo que aconteceu comigo, desde a minha infância até o dia que eu decidi sair do Brasil.
Fiquei sabendo através dela que Rafael anda um trapo.
Mas quer saber, eu pouco me importo.. Ou não! E me odeio por isso, não devia me importar mas aqui estou eu, pensando em como ele deve estar.
Meu coração deve ser masoquista, não vejo outra justificação possível para isto.
Porquê me importo?
Suspiro derrotada.
Vou vivendo um dia de cada vez.
Por mais que eu chore toda noite, sempre manterei um sorriso nos lábios.
Sabe, me sinto diferente.
Tenho tanta merda pairando em minhas costas mas não tenho vontade de me perder com drogas e álcool como antes.
Com apenas 21 anos me encontrei sendo obrigada a agir como alguém de 30.
Mas agradeço internamente por isso!
Não sou mais aquela menina ingénua que acreditava que um dia, depois de toda merda, as coisas ficariam bem.
Aquela Beatriz morreu, hoje nasceu outra.