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02

Cresci forjada no sofrimento. Há sete anos minha mãe foi arrancada de mim e isso acabou transformando meu coração em uma pedra de gelo.

Meu pai deixou de ser o homem amável, para curar seu luto com álcool e mulheres e o único acalento que sobrou para mim foi meu irmãozinho.

Para ele sim, eu era capaz de dar todo meu amor.

Depois do luto consegui me recuperar e dou o maior amor ao meu irmão, pois ele precisa.

Agora com meus dezessete anos, consegui um trabalho de meio período no centro da cidade costurando roupas e limpando a loja e até atendendo os clientes quando a loja ficava movimentada.

É uma loja simples, mas muita gente a frequenta. Nossa cidade é bem pequena então as pessoas que habitam aqui enchem a loja, pois nossa cidade é afastada das demais, por isso há muito movimento por aqui, ainda bem.

Fico o dia todo na loja e volto pra casa por volta das seis para começar a janta mais cedo. Meu pai só fica em bares bebendo enquanto eu tento manter nossa casa. E mal dá para pagar a conta de água e luz, graças aos céus ganhamos cesta básica da dona da loja que trabalho, se não fosse por ela passaríamos fome. Ela viu nossa situação e quis ajudar, só por ela ter oferecido o trabalho a mim nos ajudou bastante, mas com a cesta básica ela nos salvou.

Meu irmão trabalha nas fazendas vizinhas, cuidando do gado, e afins.

Eu sentia que eu podia fazer mais pelo meu irmão, afinal não era justo, uma criança de doze anos trabalhar para ajudar a sustentar nossa família.

Meu pai, que deveria ser nosso refúgio, era apenas um pobre coitado, que afogava todas as suas mágoas em doses da cachaça mais barata que podia encontrar. Mas mesmo assim o dinheiro usado para comprar essas porcarias daria para pagar algumas contas. Esse dinheiro que ele gasta com bebidas é uns trocados que sobrou do trabalho que meu pai fazia. Ele nunca para em trabalho, ele presta serviços por uns meses e é demitido porque chega no trabalho bêbado e desorientado, portanto não posso confiar no meu pai nessa questão, por isso me virei e consegui o trabalho. Graças a Deus.

Todo o fardo de alimentá-lo acabava ficando em minhas costas, uma garota de dezessete anos.

Nossa fazenda nos rendia muito, tínhamos porcos, vacas, galinhas, cavalos e até ovelhas, era um bom investimento, mas tudo se perdeu quando minha mãe morreu e meu pai vendeu todos os animais da Fazenda. Foi muito chocante pois havia me afeiçoado aos animais. Mas ele fez isso e gastou todo o nosso dinheiro com bebidas e prostitutas. Eu e meu irmão nos sentimos só, mas sempre que posso, falo para ele que é uma fase que tudo voltará ao normal. E sempre digo que o amo, aliás sou a irmã mais velha e devo protegê-lo.

Mas não vai melhorar. Estou mentindo pra ele.

Chegando em casa, meu irmão ainda não chegou, deve estar finalizando o serviço. Eu entro em casa e começo a fazer uma sopa de carnes e legumes.

Ganhamos carne na última cesta e alguns legumes, isso é muito bom por que só estávamos comendo arroz, feijão e tomate. Era o que tínhamos. Ainda bem que agora temos um tipo de carne e legumes, graças a Letícia a dona da loja que trabalho.

Começo a sopa e deixo no fogo baixo e vou tomar um banho.

Lavo minhas madeixas escuras, ensaboo todo meu corpo e logo enxaguo e me seco.

Coloco um vestido simples de mangas curtas. Escovo os cabelos e passo um creme que ganhei ano passado da dona da loja, é o que tenho de "perfume".

Passo um pouco pelo corpo. Venho economizando, não sei quando poderei comprar um.

Volto ao fogão e está quase pronto. Assim que termino escuto vozes do lado de fora.

" Você não pode subir hoje, minha filha deve estar em casa fazendo a janta. Volte amanhã de tarde que ela não estará em casa, até amanhã gata."

Escuto sons de lábios se beijando e me viro fazendo uma careta.

Vou até nosso minúsculo sofá e me sento. Olho para a parede e João já devia ter chegado.

— Onde está seu irmão?

É assim que meu pai me deseja boa noite.

— Já devia ter chegado, vou lá na fazenda ver se ele está lá.

Ele me olha sério e diz.

— Não vou deixar minha filha sair a noite. Está louca? Fica aí que já volto.

Meu pai sai todo apressado até a fazenda vizinha. Ele está bêbado mas pelo menos não está agindo tão sem noção. Bom, Até agora.

Fico do lado de fora esperando os dois, olho a lua se formando no céu. É tão linda.

Queria tanto você aqui, mamãe.

Digo baixinho olhando para o céu e uma lágrima escorre dos meus olhos.

De repente vejo a figura de alguém, é um homem estranho que parou ao meu lado, analisando—me dos pés à cabeça e uma vontade imensa de sair dali surgiu em meu peito.

Mas eu tinha que esperar meu pai retornar com meu irmão. Eu não podia ir para casa sem me certificar que ele estava bem.

O homem que está ali me encarando desce de seu cavalo, é um cavalo muito lindo. Observo melhor o senhor a minha frente, ele é até bonito, os seus olhos verdes são muito belos e até me deixa fascinada por alguns minutos. Nunca cheguei perto de um homem, e ele aparenta ser bem mais velho que eu, isso é errado, não posso encarar ele assim, devo me recompor. Após eu o analisar ele me encara e diz:

— Boa noite. É filha do senhor Rodolfo?

Respondo sem demonstrar medo ao desconhecido.

— Sou sim. E o senhor é?

Ele sorri, se aproximando e diz:

— Sou Jones Krim. Prazer, senhorita?

Respondo esticando minha mão a ele, educadamente como qualquer jovem.

— Lúcia.

Ele beija minha mão e diz após se afastar.

— Não é perigoso uma criança está aqui fora sozinha?

Eu o respondi a altura, corajosamente, pois não sou criança. Sou quase uma adulta.

— Não estou sozinha, Deus está comigo.

Digo o espantando e ele diz:

— Claro, mil perdões. Claro que ele está aqui. Enfim… seu pai, quando chega?

Eu olho para o senhor estranho ao meu lado e digo:

— Foi só buscar meu irmão, ele já vem. Pode esperar aqui de fora, se quiser.

— Claro.

Ele sorri e fica olhando o horizonte como eu.

Sei que é estranho falar com estranhos, mas pelo menos ele não foi inapropriado.

Graças a Deus, pois se fosse não saberia como agir.

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