Aniversário
Livia
“Feliz aniversário!!” Acordo com as vozes gritando e pequenas crianças pulando em cima de mim.
Não consigo esconder o sorriso diante da felicidade deles, Lia está com as mãos cruzadas enquanto a Madre nos observa com um sorriso estampado nos lábios.
Distribuo beijos nas cabeças deles, sentindo um peso a menos pela compreensão de que terão mais tempo pra encontrar uma família disposta a adotar e cuidar bem com muito amor.
“Vamos, vamos crianças precisamos nos arrumar para a missa.” Madre Magnólia bate com as mãos fazendo os pequenos resmungarem.
Rapidamente eles vão atender o pedido e saem de dentro do meu quarto junto com Lia para tomarem seus banhos.
Ela se aproxima e posso ver a maneira condescendente na qual parece buscar as palavras para falar comigo, quando se senta na ponta da cama puxa minhas mãos beijando com calma.
Sinto os olhos queimando diante das lágrimas, busco manter a calma para guardar o segredo, mas de algum modo tenho a sensação de que ela sabe ou imagina o que se passa.
“Não sei quando você cresceu tanto filha.” Ela suspira passando as mãos pelos meus fios. “Era tão miúda, sempre se mantendo forte nos momentos mais difíceis.”
Elevando a mão e a apoiando contra minha bochecha, suspiro.
“Sabe que a tenho como uma mãe.” Murmuro baixinho.
“Também sei que você é capaz de aprontar bastante - Arregalo os olhos e vejo seus lábios apertados.- Ainda não engoli esse seu namoro escondido Livia.”
Abro a boca para responder, mas sou parada pela mão que ergue, balançando a cabeça em negativa.
“Não vou questionar mais, tem idade para começar a aprender com as decepções da vida.”
Vejo o momento em que enfia a mao dentro do bolso quando abre é com um terço de pedras preciosas fico sem reação.
“Quando você chegou aqui, esse Rosário veio junto o mantive guardado por ser tão valioso e por saber que você poderia tentar se desfazer em um momento de dificuldade, quero pedir a você para se manter firme diante de todas as provações filha e leve esse terço com você.”
Começo a chorar sem saber o que dizer caindo em seus braços, a minha vida inteira fui criada aqui dentro e agora irei enfrentar qualquer coisa para mantê-los aqui é o mínimo que posso fazer.
“Tá bom de tanto choro, vamos o seu futuro noivo daqui a pouco chega.” Ela fala nos afastando.
Limpa as minhas bochechas como uma mãe enquanto as próprias estão cheias de lágrimas. Ela se ergue ajeitando o hábito na cabeça.
Demoro um pouco jogando o corpo na cama e olhando para o teto, meus pensamentos são traiçoeiros e acabo sendo levada para a voz rouca e os olhos tão lindos.
Balanço a cabeça, preciso me manter sã Bruno Lafaiete é um homem que sabe iludir qualquer pessoa com tanta beleza e carisma, mas não posso cair nas suas garras a minha família depende disso.
Quando o relógio bate às oito horas em ponto, estamos quase entrando dentro da igreja para o início da missa ao escutar o som do motor potente parando na rua estreita em frente à entrada ao lado do orfanato.
“Você ainda não contou nada.” Lia murmura em meu ouvido.
“Porque vocês duas ainda não entraram?” A voz da Madre nos chama.
Mas logo ela fica tão paralisada quanto nós duas, observando o carro do qual Bruno desce, vestindo uma camisa social branca e a calça jeans escura. Ao contrário do terno que usava ontem, essa roupa o deixa mais próximo de reles mortais como nós. Percebemos os seguranças trajando roupas formais, se posicionando em locais estratégicos, jamais imaginei ver esse homem de perto muito menos que poderia vir a uma missa no domingo pela manhã justo no meu aniversário.
“Bom dia Madre.” Ele fala fisgando a mão dela e depositando um beijo em cima. “Bom dia?”
“Lia” minha amiga fica parecendo um tomate ao responder e aceitar o mesmo gesto dele.
“Bom dia, minha principessa” Seus olhar encontra o meu.
Posso jurar que meu coração molenga errou uma batida ao escutar o apelido sendo falado em italiano e trazendo a mente de um filme que tanto amo e choro todas as vezes que vejo. É impossível controlar o sorriso que se abre para ele.
“Bom dia Bruno, vem vamos entrar.” Recupero a minha voz.
Entramos na igreja atraindo a atenção dos moradores do bairro que costumam participar da missa, o padre nos olha intrigado.
Passamos todo o momento de mãos unidas nos separando apenas para realizar a comunhão, ao contrário do que imaginei ele não fica incomodado nem dorme ou reclama.
Quando a celebração termina, caminhamos juntos para dentro do orfanato, as crianças passam correndo e quase vou ao chão sendo segurada pela mão firme se espalmando nas minhas costas. Ficamos cara a cara, sou envolvida pelo olhar atraente, as marcas do tempo que o deixa charmoso, afasto o rosto quando tenta tocar a minha bochecha e o desgracado ri.
“Precisa prestar mais atenção por onde anda”
Bufo afastando as mãos dele e jogando para longe essa sensação.
“Se quiser já pode ir.” Digo cruzando os braços.
“Claro que não, vamos comemorar nosso noivado e o seu aniversário.”
“Não e todo dia que se completa dezessete anos e ainda fica noiva.” A voz da Madre me assusta.
Seu sorriso enorme e nos braços um bolo de aniversário confeitado, as crianças aparecem junto com Lia cantando os parabéns.
É impossível não ficar emocionada com essa demonstração de afeto por parte deles. Assopro as velas desejando que esse ano se passe rápido e possa ter a certeza do orfanato preservado.
A mão grande envolve minha cintura, estremeço com a sensação diferente.
“A Livia tá namorando, a Livia tá namorando.” Juan começa a puxar o coro de vozes irritantes com a declaração.
Sinto a risada reverberando pelo peito dele, em um movimento recebo o beijo na bochecha e sou virada de frente para o homem enorme. Nossas diferenças de altura gritantes, até que Bruno se abaixa ficando em cima de um só joelho. Minha mente paralisa mesmo com as vozes ao redor.
“Jamais imaginei encontrar alguém que não me desejasse pelo status, pelo dinheiro ou o nome da minha família, então como uma luz no meio da escuridão você apareceu, sinto-me culpado por roubar a sua juventude mas te prometo recompensar com sorrisos e momentos de alegria. - Ele faz uma pausa, suas palavras por um momento penetram dentro do meu coração, tão acostumada a não ter ninguém e agora caio nessa ilusão. - Livia, aceita ser a minha noiva e um dia futura esposa?”
Perco o fôlego com as batidas rápidas dentro do peito, ele puxa uma caixinha de veludo do bolso e quando abre a aliança de ouro branco com uma única pedra azulada no meio fazendo as meninas soltarem um coro de suspiros.
E apenas uma mentira, pelo menos é o que digo ou penso e sinto.
“Claro que aceito.” Respondo colocando um sorriso falso no rosto aceitando a aliança no dedo.
Bruno se levanta do chão e beija a minha testa com carinho, nos próximos cinco minutos preciso mostrar a todos o anel.
Porém, quando Giulio aparece na entrada do pátio sei que o momento chegou, puxo Bruno pela mão com a desculpa de que ele precisa ir embora.
“O que aconteceu?” Bruno questiona.
“Quero assinar isso e ficar livre dessa encenação.” Declaro.
Giulio abre um sorriso zombeteiro mas de dentro do terno retira alguns papéis junto com uma caneta, vejo por cima o meu nome completo, sendo que jamais o mencionei, ao lado do nome dele e a menção ao orfanato.
Assino no final da folha e devolvo a ele.
“Não quer ler?” Questiona.
“Você vai vender os meus órgãos?” Rebato
“Poderia”
Seu olhar frio chega a ser assustador, sinto medo e uma sensação horrorosa, acabo colocando a mão no jeans e segurando o Rosário.
“Onde você conseguiu isso?” Giulio questiona puxando a minha mão analisando as contas do terço.
Puxo o punho de volta.
“Deixaram aqui no orfanato comigo, algum problema?”
“É só que para alguém que não tem onde cair morta, como ganhou uma joia dessas? Foi aplicando golpes ou oferecendo a…”
Antes que ele possa completar vejo o punho de Bruno encontrando com a cara do outro, ergo as mãos tapando a boca e olhando para trás conferindo que ninguém está vendo.
Ele puxa o outro pela camisa e o joga contra o carro estacionado.
“Vou repetir mais uma vez Giulio, Livia é minha noiva, destrate ela outra vez e um soco não será nada perto da minha raiva.” Sinto autoridade na sua voz.
"Perdão, Livia." Não consigo ver o rosto dele encoberto pelas costas de Bruno.
“Tudo bem - Murmuro vejo os ombros dele relaxando e soltando o outro homem.
Ao se afastar vejo a mão machucada dele e o sangue escorrendo pelo supercílio do Giulio, o olhar odioso me faz dar um passo para perto do Bruno, ele se vira e sai.
Pego a mão do meu falso noivo olhando o machucado pequeno.
“Você se feriu.”
“Isso não é nada”
“Posso fazer um curativo.”
“Não precisa Livia, vá aproveitar o seu dia, amanhã venho para levá-la ao colégio.”
Aceno concordando e desapegando do que aconteceu, observo enquanto entra no carro e os seguranças tomam os outros dois automóveis o seguindo.