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7

Terceiro ano de residência (R3) (2 anos atrás)

[Fernanda]

-Acho que eu não estou muito bem, não. -digo sem sentindo meu estomago se revirar dentro de mim.

-O que você tem? -perguntou Cristina.

-Como se tivesse sido atingida na região do abdômen e agora quisesse vomitar o mundo. -reclamei ao fazer uma careta.

-Iiiiii, não vai me dizer que tá grávida? Quem é o pai, Maurício? -disse Rafael.

Joguei uma prancheta em sua direção e ele se desviou a tempo fazendo com que o objeto colidisse na parede.

-Cala boca, estúpido. -ralhei.

-Parece que alguém acordou de mau humor hoje. -Lucas comentou ao entrar na sala dos residentes e ouvir minha última frase.

-Não é nada disso, ela só deve estar de tpm ou sei lá o que. Deve ser só coisa de mulher no ciclo menstrual. -respondeu Jonathan.

-Bom dia. -disse Mariana ao se sentar em uma cadeira ao meu lado.

-Mau dia, você quer dizer. -resmunguei ao deitar minha cabeça no tampo de vidro da mesa.

-O que ela tem? -foi a vez de Mariana perguntar.

-Acho que ela está grávida, tem sintomas de gravidez. -Isabel deitada do sofá.

-O QUE? -ela cuspiu o que estava bebendo.

-Calem a boca, seu idiotas. -bati na mesa e me levantei irritada.

Ouvi a risada suas risadas se intensificarem. Vesti meu jaleco, joguei estetoscópio no pescoço e fui em direção a porta, chegando lá parei e virei em direção a Mariana.

-E não, eu não estou grávida, nem de Maurício e muito menos de outra pessoa. Não acredite em nada que esse imbecis disserem.

Bati a porta ao sair.

-Doutora Fernanda, você está comigo hoje. Tenho uma laparotomia exploratória as duas, não se atrase. -disse doutor Cristiano.

-Sim, senhor. -respondi.

-... aquele homem é um gato. Ai se eu pudesse, pegava ele de jeito. -uma voz irritante disse muito próxima a mim.

-O que pensa que está fazendo, interna? Não devia estar repassando os pós operatórios dos paciente da doutora Luíza?

-Sim, mas é que eu... -a interna que eu acho que se chamava Daniela, Dafne ou Eduarda, não sei ao certo começou a se explicar.

-Eu não quero saber, vai já fazer o que te mandei. -ordenei e a garota sumiu da minha vista no mesmo segundo.

-Esse internos... -disse comigo mesma.

-São fracassados, não é mesmo? O seus alguns ainda se salvam por tem uma garotas bonitinhas.

Não precisei nem me virar para saber de que boca veio tal comentário.

-Eu não diria fracassados e sim idiotas. Assim como você foi um dia. Não... deixa eu consertar essa frase: você ainda é um idiota, Rafael.

-Nossa quanta agressividade, e ainda uma da tarde. Imagina... -ele começou a divagar e eu me lembrei que iria me atrasar se ficasse perdendo meu tempo de conversa fiada com o Rafa.

-Droga, eu vou acabar me atrasando. -respirei fundo tentando fazer meu estomago inquieto se acalmar.

Eu não poderia passar mal em pleno centro cirúrgico.

-Você vai fazer o que agora? -ele perguntou.

-Laparotomia com Cristiano. -respondi sentindo um pouco de dor.

-Vê se não vomitar na sala do cara, hein? Se não ele não te deixa pisar no mesmo chão que ele nem na próxima vida. -debochou.

-Obrigada pelo conselho, Rafa. -ironizei.

Deixei Rafael para trás e entrei no elevador acionando o primeiro andar.

-... vai para casa, Sofia. Aqui não é lugar de você dar seus chiliques.

Me virei para ver quem falava isso e dei de cara com Vicente e Sofia, minha primeira e totalmente bêbeda paciente do primeiro ano.

Ela as vezes aparecia no hospital vez e outra, e quando me encontrava agia como se fossemos velhas conhecidas. Eu não entendia esse jeito diferente da garota e entendi menos ainda, ao saber que ela era irmã do sargento, porque sejamos justo, eles são totalmente opostos quando o assunto se trata de personalidade.

Ao me ver, a garota abriu seu caríssimo e belo sorriso, exibindo sua perfeita arcada dentária branquinha.

-Fernanda! -ela disse animada fazendo com que o irmão voltasse a atenção para a pessoa com quem ela falava.

-Olá, Sofia. -respondo educada.

-Ainda bem que alguém aqui não é tão chato quanto certas pessoas. -ele comentou mandando uma indireta para o irmão.

O elevador abre no meu andar e eu saio deixando aqueles dois trocando farpas.

-Boa tarde, Cecília. -cumprimento a instrumentista que separava alguns materiais para o procedimento.

-Boa tarde, doutora. -responde ainda concentrada em suas tarefas.

***

Já estávamos há uns vinte minutos de procedimento quando eu pensei que iria dar um treco, bem ali no meio do centro cirúrgico com um paciente aberto em minha frente.

-Se não estiver se sentindo bem, pode sair, é um procedimento simples, eu dou conta sozinho. -disse olhando preocupado para mim.

-Droga.... -saí correndo da sala e vomitei na primeiro recipiente que encontrei pela frente, no caso era uma lixeira.

Fiquei por alguns minutos ali debruçada em meio o corredor vomitando todo o conteúdo estomacal que existia dentro de mim.

-Você não está nada bem. Vem, vou fazer alguns exames para sabermos o que você tem. -Mariana ajudou-me a lentar do chão.

Depois que os resultados do exames saíram, foi constatado o problema: Apendicite. O que era uma droga, pois precisaria de cirurgia, pequena mas necessária.

Agora eu estava deitada em um leito de hospital vestindo uma batinha ridícula de paciente, sendo preparada para a cirurgia por minha interna imprestável.

-Espero que você fique bem. -Daniela, Dafne ou alguma coisa parecida, disse.

-Isso é um procedimento simples, não é nada demais, garota. -respondi irritada pois estava perdendo um dia ou dois de trabalho por causa dessa cirurgia.

-Ora, ora. Vejamos se não é a "senhorita eu estou bem". -comento doutor Cristiano entrando no quarto hospitalar.

-Eu mesma. -respondi com desagrado.

-Você é muito louca, sabia? Podia ter contaminado o paciente se tivesse vomitado dentro do centro cirúrgico. -ele repreendeu-me

-Eu sei. Sinto muito, isso não mais se repetir. -prometi.

-Assim espero. -ele piscou descontraindo do puxão de orelha.

-Doutora Cristina, você vem comigo para a cirurgia de apendicectomia. -Cristiano ordenou.

-Vou me preparar, senhor. -ela respondeu e saiu do local.

Fui levada de maca até o centro cirúrgico, era a segunda vez no dia que eu pisava no mesmo local , só que diferença é que agora, eu era a paciente.

-Respire fundo e com calma. Agora vamos anestesiar você. -ele disse e minha visão foi desfocando aos poucos.

A última coisa que me lembro de ter visto foi duas Cristinas meio borradas me observando através daqueles pequenos olhos de chihuahua.

***

Não sei quanto tempo depois, acordei sentindo o mundo girar a minha volta. Meus olhos piscaram várias vezes com a claridade tentando discernir aonde eu estava. Acho era o quarto do hospital, não tenho certeza ao certo, pois minha mente estava nublada como se uma névoa me impedisse de continuar no chão e meu corpo flutuasse.

Provavelmente era o efeito da anestesia ainda circulando em meu corpo.

-Ooooooo moçaaaaa, moça bunitaaa, veeem cá! -chamei com a voz meio grogue.

-Ai.meu.deus! Olha só o seu estado! -acho que era Isabel o nome da garota.

-Isabeeeeeeel, você viu esse vestido que eu tô usando? É tãaaaao brega! -reclamei gargalhando feito uma boba.

A garota riu do que eu havia acabado dizer.

-Cadê a shuauxaua? -perguntei curiosa.

-Cadê quem? -ela estava com a mão na boca segurando riso.

- A shuahuua. Chi-hu-a-u-a. -soletrei para que ela entendesse.

-Você quer dizer: chiuhuahua, né? -ela perguntou.

-iiiisso. -confirmei sorrindo.

-Vou chama-la, espere um pouquinho. -disse rindo e saiu me deixando sozinha.

-Eiiiii, você! -chamei uma garota que passava pelo corredor.

Ela se virou olhando para mim.

-Fernanda? O que está fazendo nessa cama? -perguntou entrando no quarto.

-Você se parece com aquela.... aquela mulher do filme. Como é mesmo o nome dela? Hum.... Mel... não, Meg... já sei! -gritei rindo. -Megan alguma coisa.... só que mais nova e bebum, é claro. -revirei os olhos.

Ela riu do comentário.

-Você sabe que eu parei de beber há mais de dois anos. -retrucou.

-Sei... -desdenhei não prestando mais atenção nela e sim olhando o movimento do lado de fora no corredor.

-Precisa de alguma coisa? -ela perguntou.

-O que? -me virei fitando-a.

-Perguntei se precisa de algo? Quer que suborne alguém para trazer uma comida de verdade para você?

-Psiuuuuuuu! -chamei o homem do lado de fora que estava de costas para mim lendo algo que estava no balcão a sua frente.

Ele se virou olhando para os lados para ver quem o chamava.

-Bela bunda, hein?! -gargalhei e enfim ele olhou em minha direção quando a chihuahua entrava no quarto.

-Tá vendo aquele cara lá fora? -perguntei a elas. -Ele é uma delicia para os olhos... -suspirei. -Todo sexy com esse jeito mandão e esse corpo maravilhoso.... sem falar nessa bunda, que por si só é uma perfeição. -sorri.

Chihuahua e a Megan alguma coisa me olharam com os olhos arregalados.

-Sargentooooooo gostosão, vem cá me dar um beijo. -chamei-o.

Ele olhou sem graça para os lados sem saber como reagir. Me perguntei mentalmente por que ele estava com vergonha, se era o cara mais durão do pedaço.

-Veeeeeeeem cá, sargento gostosão, veem. -chamei mais uma vez e não sei se ele veio porque eu havia chamado ou se era para evitar mais um escândalo.

-Cara, você tá muito drogada! -Cristina gargalhou.

-Eu acho que sim. -ri também.

-Oi, bonitão. -cumprimentei-o quando já estava mais próximo de mim.

-Doutora. -respondeu polido estreitando os olhos.

-Viram só essa voz? Me arrepiei todiiinha. -cantarolei.

-Você percebe que está falando do meu irmão, né? E isso é tão... eca, nojento! -disse Megan sei lá das quantas.

-É o sargento gostosão.... não é assim que chamam ele? -olhei para Cristina

-Eu não sei de nada. -ela respondeu em um gatilho.

-Ah, sabe sim, todo mundo no hospital sabe.... -ponderei com um sorriso no rosto. -Mas acho que ele não devia saber disso. -rio.

-Bom, eu já vou indo. Tenho uma ronda para fazer agora, com licença. -ela disse se afastando.

-Tchauu, Cris. -acenei em sua direção sem obter resposta.

-Eu também vou indo, acho que para mim já deu por hoje, ver você chapadona foi o ápice do meu dia entediante. -Megan disse.

-Sofia, vamos deixar a doutora Fernanda descansar. -disse o Sargento.

-Tudo bem. Tchau, Fernanda, e não falte mais as aulas do proerd, hein?! -ela ri e sai acompanhada pelo irmão que fecha a porta em seguida.

Finalmente sozinha, fitei o teto branco do quarto achando engraçado o barulho que os aparelhos hospitalares faziam. Fiquei assim por alguns segundos até que me senti entediada, então resolvi fazer uma ligação para alguém que com certeza me tiraria desse tédio.

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