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INTERNATO (5 anos atrás)

{Primeiro dia}

[Fernanda]

Hospital da Graça, esse é o lugar. -penso ao adentrar a recepção observando cada detalhe do lugar com certa admiração e fascínio.

O coração batendo disparado no peito, ali estava o meu futuro e realidade!

-Cada um de vocês presente aqui, está cheio de expectativa. Até pouco tempo atrás, estavam na faculdade aprendendo sobre medicina. Hoje vocês exercerão a medicina de verdade.

Um homem alto, cabelos escuros feito a noite, com frios e calculistas olhos azuis, dentro de um jaleco branco nos apresentava o que seria nossa vida daqui para frente.

-Os anos que passarão aqui serão os melhores ou os piores de suas vidas, cada um será testado até o seu limite.

Ele nos olhou com um sorriso um tanto sádico enquanto continuava o percurso conosco em seu encalço.

-Olhem a sua volta e diga oi para o seu concorrente. Alguns de vocês vão trocar para outra especialidade mais fácil. Outros vão desistir por não aguentar a pressão... Esse é o ponto de partida, se irão se sair bem ou não é o que vamos descobrir.

***

-Tudo bem, Felipe, Lucas, Diego, Alex. -um cara de jaleco chamou os nomes e saiu logo em seguida.

-Só homens foram chamado para essa turma? -perguntei a uma menina ao meu lado, ela tinha olhos ligeiramente puxados e um corte chanel ousado.

-É, as mulheres não são muitas esse ano. -ela resmungou. -Só falta ter que aturar um bando de macho se achando para cima de mim. -ela rolou os olhos.

-Você é a Cristina, não é?

-...andem logo, não tenho o dia todo. -alguém disse irritado.

-Com que residente te colocaram? Fiquei com Luíza Mafra. -ela disse.

-A satã? Eu também. -respondi.

-Pegou a satã? Eu também. Pelo menos seremos torturados juntos. Sou Jonathan Borges, com t e h no final. Nos conhecemos na primeira visita ao hospital, eu fui o cara que derramou refrigerante nas próprias calças, bom, tecnicamente foi um acidente quero dizer. -um rapaz que estava a alguns metros de nós interrompeu.

A garota que se chamava Cristina olhou para mim como se perguntasse de onde saiu aquele cara. A olhei sem saber o que dizer.

-Bom, agora vocês acham que eu sou desastrado... e que vou acabar fazendo alguma merda.

-Uhum. -Cristina murmurou e saiu para longe.

-É que... eu estava meio nervoso, sabe? -concordei prendendo o riso.

-Jonathan, Cristina, Fernanda, Isabel. -alguém chamou do corredor.

Chegamos todos no enfermeiro que havia nos chamado.

-Vocês da Luíza Mafra, final do corredor a sua esquerda. -ele disse e nos deu as costas.

-Como ela deve ser? -o tal Jonathan perguntou.

-Uma velha má, esquelética e que usa os óculos do inferno. -Cristina respondeu.

Chegamos até o local que nos foi indicado e uma mulher de estatura média, cabelos ruivos e ondulados examinava uma prancheta no balcão.

-Pensei que satã fosse uma velha enrugada. -a menina que havia se ajuntado por último falou.

-E eu que fosse feia. -Jonathan disse.

-Talvez seja apenas algum boato que algum de seus colegas sexistas ultrapassados tenha inventado sobre ela... porque talvez, ela seja melhor do que eles. Aí colocaram esse apelido para depreciar sua autoestima e confiança. -a garota continuou.

-Deixe-me adivinhar, você foi eleita a líder do grêmio na escola, isso subiu a sua cabeça e você achou que era a presidente da nação. -Cristina a provocou.

Isabel, que deveria ser seu nome, já que fora o único nome feminino além do meu e de Cristina a ser chamado para essa turma, cerrou os olhos para Cristina e foi até nossa residente.

-Bom dia, meu nome é Isabel Cor...

Luíza a olhou de modo tão cortante que a garotou parou no meio da frase.

-Tenho algumas regras, e é bom que vocês se lembrem delas.

-Primeira delas: Não quero saber a porcaria do seu nome. Eu não me importo, odeio cada um de vocês, nada que fizerem vai mudar isso.

Me assustei com o tom e a arrogância em sua voz.

-Protocolos de trauma, lista, chamadas, as enfermeiras chamarão um de vocês. Irão responder cada chamada correndo, entendem? Co-rren-do. -ela falou com se fossemos retardados.

-Segunda: Seu primeiro plantão começa agora e dura quarenta e oito horas.

Pisquei para acompanhar as informações, enquanto a seguíamos pelos corredores do hospital.

-Lembrem-se de uma coisa, vocês são internos ou seja, o nível mais baixo da cadeia alimentar cirúrgica. Cumprem ordens até desmaiarem e não reclamam. Usem as salas de descanso para dormirem o quanto conseguirem ou quando for possível, o que nos leva a terceira regra: Se eu estiver dormindo, nunca, jamais, em tempo algum, me acordem. Se virem, já são crescidinhos o suficiente.

-Quarta, é bom que não matem ninguém enquanto estiverem trabalhando comigo. Não quero entrar para o ranking das péssimas estatísticas. -ela disse tão séria que não houve margem para que alguém a questionasse.

-E por último, não sejam lerdos em nenhum instante, aonde eu for vocês vão atrás feito cachorrinhos obedientes abanado o rabinho.

Ela disse ao sair correndo e todos nós fomos atrás.

-Saiam do caminho! -ela gritou para as pessoas.

Um grave paciente havia dado entrada na emergência do hospital, Luíza designou a cada um de nós para realizarmos vários tipos de exames, com isso, somente muitas hora depois é que tivemos alguns minutos para comermos qualquer coisa que nos mantivesse de pé.

-Esse turno é uma maratona, me sinto na corrida de São Silvestre só que sem os tênis de corrida. -disse Jonathan na mesa durante nossa breve refeição.

-Deixa de ser fresco, o pior ainda nem começou. -Cristina criticou mastigando seu sanduíche natural.

-Aquela... acho que ela me odeia. -Isabel comentou colocando uma colher de iogurte na boca.

-Ah, cala essa boca, para que tanto drama? Ela parece odiar todo mundo, mas você não vê ninguém reclamando.

-Olha só seu chiuaua de chanel, você fala dela mas é tão arrogante e prepotente quanto. -Isabel rebateu e todos na mesa prenderam a risada.

-Boa tarde, internos. -quase dei um pulo da cadeira ao ouvir uma voz grave e forte falar atrás de mim.

Lentamente virei o pescoço para olha-lo assim com todos faziam no momento. Era o mesmo cara que nos havia apresentado o programa de internato. Ele estava com um sorriso estranho no rosto, mas quando viu eu me virar para ele seus olhos se estreitaram e seu sorriso vacilou por um instante.

-Está no quadro, mas eu resolvi dar a boa notícia pessoalmente. Como se sabe, a honra de auxiliar e ser o braço direito por um dia do chefe da cirurgia, aprender tudo em primeira mão e realizar procedimentos mais avançados os quais seus colegas não terão a mesma oportunidade, é reservado para o interno mais promissor.

Todos nós o fitamos mais atentamente, não que eu quisesse fazer isso, até porque eu me sentia um pouco insegura para isso, mas mesmo assim é um caso a se pensar, uma coisa que contaria na hora de preencher o currículo.

-Como o chefe da cirurgia ainda não chegou, sou eu quem escolherá. Ele olhou para todos nós e depois simplesmente declarou: Fernanda Bertotti.

-Eu? -olhei para ele sem entender.

-Sim, acho que você escutou da primeira vez, não é?

-Sim, senhor. -respondi engasgando.

-Ótimo. -ele se retirou sumindo do nosso campo de visão.

***

-Ei, moço! -cutuquei o cara que estava de costas para mim e lia algo no balcão.

-Meu nome é Rafael, mas para você pode ser só meu amor. -ele se virou e sorriu sedutor.

-Legal, mas eu queria saber onde encontro o doutor...? Ah, eu nem sei o nome dele. Mas eu procuro o chefe da cirurgia.

-Doutor Thomas, ele é neurocirurgião. Deve estar no quarto andar vendo algum paciente.

-Obrigada. -agradeci apressada.

-Tente se informar mais se quiser sobreviver nesse hospital, gata.

-Ata... -resmunguei o deixando para trás.

Peguei o elevador e subi até o quarto andar, procurei em todos os quartos mas não o encontrei em lugar algum, e nenhuma daquelas enfermeiras fofoqueiras souberam me informar onde encontra-lo.

Resolvi descer e pedir por alguma informação com algum outro médico, eu tinha que correr para não me atrasar e foi por isso que quando as portas do elevador mal se abriram e entrei com tudo, apertei o andar do térreo e fiquei batendo o pé nervosa até o último fio de cabelo.

-Você poderia fazer a gentileza de parar com isso? Está me deixando irritado. -congelei no mesmo instante em que ouvi aquela voz, implorei mentalmente para que fosse outra pessoa, mas quando me virei tive para certificar-me, tive certeza de que hoje não era o meu dia de sorte.

-Doutor Vicente.

-Esse é o meu nome. Senhorita Fernanda, gostaria de saber se não fui claro o suficiente hoje mais cedo?

Pisquei para conter o nervosismo e não consegui formular uma resposta coerente, eu estava em pânico!

-S-sim, mas é que eu...

-Não quero saber de desculpas. Está atrasada.

-Mas o doutor...

-O doutor Thomas não poderá comparecer essa tarde e nem a noite.

-Ah. Então isso quer dizer que eu... estou liberada?

-O que? Claro que não, garota! Você está comigo agora. Tome esse prontuário, leia, decore, para ontem! -ordenou ríspido.

Comecei a ler enquanto pensava que o estava seguindo, até que o ouvi me chamar.

-Anda logo, garota. -ele disse já no final do corredor e eu corri para alcança-lo.

E eu pensando que não poderia ficar pior... ledo engano, era apenas o primeiro dia!

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