Capítulo 6. Luta
Mina
Como se tivessem ouvido minha pergunta, o que socava falou.
– É verdade. A luta de hoje também foi um tremendo plano mirabolante para driblar o Gatuno. Dizem que ele tá furioso atrás do Soco que sumiu. Mas o Kid, arranjou aquele galpão no porto, perto da Rodoviária e marcou a luta mais cedo, às oito horas. Como o Gatuno só chega depois das 10, vamo se dá bem. Com o soco fora, só vai dá nóis.
A porta do salão se abre e o vigia entra, já trocado para ir embora.
– Aí rapazes, não esqueçam a hora da princesinha chegar, heim? Já tô indo, arrasem hoje à noite – deu um aceno e se virou pra sair.
– Valeu primo, nós vamo ficá de olho. Brigadão, aí – o vigia/primo saiu e eu fiquei pensando no susto que vou dar nesses caras. Mas não vai ser agora não.
Saí pelas sombras, silenciosamente, deixei que se cansassem, treinando bastante, amanhã eles poderão descansar. Sorri de canto de boca, pensando no que faria com eles e ainda recuperaria o prejuízo que me causaram.
– Alô, Rui! – Falei, quando ele atendeu. Sabia que estava no trabalho.
– Tá precisando de alguma coisa, não é, querida? – Perguntou ele, disfarçando.
– Preciso sim, que você faça algo para mim, é muito importante. – Respondi sem dizer o que era.
– Ihhh, lá vem parada errada. Quando você fala assim, até tremo na base. – Exagerado, até parece que peço coisa errada.
- Já transferi todo meu dinheiro para sua conta da academia, cancelei minha conta no banco e peguei todos os documentos. Agora tenho de ficar invisível de novo. Para isso, preciso desvincular minhas digitais do sistema. Preciso que você apague os sinais da existência de Patrícia Aguiar.
– Eu sabia! O que você vai aprontar agora, guria? – Ele perguntou, bravo.
– É para hoje! Até...- desliguei o celular antes que ele começasse a mesma ladainha de sempre.
Agora é só esperar.
Rafael
Recebi uma ligação do delegado da 17 DP, nosso informante deu o ponto de luta dessa noite, será mais cedo por causa do Gatuno. Tenho que rir! Hoje, até a senha eu tenho, como ninguém conhece minha aparência, vou entrar na cara dura, mas não quero me meter, só quero achar o Soco da noite. Se tornou questão de honra, achar esse cara. Não tenho dúvidas de que, se ele estiver lá essa noite, eu o pegarei.
Depois a polícia arma o barraco e prende os meliantes, mas o Soco é meu.
Narrador
Ninguém percebe o vulto se esgueirando pelas sombras, andando com passos leves e a cabeça coberta por um capuz. Desde sua última luta, havia mudado muito, seu cabelo estava maior e sua pele mais clara e lisa, mas o corpo continuava o mesmo. Não deixou de treinar nem um dia, está até mais forte.
O galpão que estão utilizando é bem espaçoso e cabe bastante gente. As pessoas já começaram a chegar, a maioria homens. O espaço ficou cheio. No centro, só uns tatames e ao redor, os homens que irão lutar, já prontos.
Em duas mesas pequenas, próximas ao local da luta, dois homens fazem as inscrições e combinam as lutas e as apostas. Tudo preparado para ter um grande faturamento.
Rafael já está ali como Gatuno, só observando num canto, escondido nas sombras.
Mina
Cheguei! Vim pelas sombras para ninguém me ver, olho para todos os homens, procurando os que eu quero.
Assim que os identifiquei, fui à mesa falar com meus amigos. Quando me viram arregalaram os olhos. Fiz sinal para não fazerem alarde. Não quero alarmar meus oponentes.
As lutas já começaram com os pesos leves.
– Aí, Kid, quero lutar com aqueles ali, primeiro o Mustang, depois o amiguinho dele. – Apontei os dois.
– Aqueles dois armários? É por isso que eu te amo, você faz minha clientela ir à loucura. Tá pronta? – Ele estava todo sorriso.
– Sempre! Mas tem uma surpresa, hoje vou sem disfarce – A cara dele foi ao chão, e ele vibrou mais ainda.
A luta que rolava terminou e o povo começou a pedir mais.
Kid fala com o irmão Sid, que imediatamente pega o microfone:
– A próxima luta é uma surpresa muito grande e excelente para todos nós. Nosso grande lutador, que ficou afastado por quase três meses, está de volta. Com vocês, para lutar com Mustangue,
SOCO DA NOITEEEE!!!!!!!
Fui para o tatame e tirei o agasalho, foi um coral de "Oh", depois começou o burburinho, Mustangue reclamou que não ia lutar com uma mulher:
– Tão pensando que eu sô o que, pra lutá com mulherzinha? – Falou sem sequer mirar o meu rosto.
Alguns disseram que era luta de vale tudo, então valia mulher, kid e Sid levantaram e disseram ao mesmo tempo:
Lutem!
Fui para o centro e quando ele chegou, muito a contragosto, dei-lhe logo uma queixada, ele não esperava e quase caiu para o lado, mas se aprumou e partiu para cima, dei um salto pra trás (macaco), já mandando um chute no queixo, pulei dando um martelo no meio da cara, girei novamente e quando ele veio com um soco, esquivei e dei-lhe uma cotovelada tão forte no meio das costelas, que ouvi o osso estalar, enquanto ele se curvou de dor com a mão na costela, me afastei e saltei, metendo ao mesmo tempo uma tesoura em seu pescoço. Ele caiu, mas já se virou, não adiantou pois eu já tinha lhe prendido com as pernas num golpe de jiu-jitsu, puxando seu pé. Já era, fiquei com ele ali, até ele pedir arrego e acabou a luta.
Levantei como se nada tivesse acontecido e estendi a mão para ajudar ele, que estendeu seu braço esquerdo, pois o direito estava deslocado. Aproveitei e falei em seu ouvido
- Está demitido!
Ele ficou meio aturdido, olhou pra mim sem entender, até que me reconheceu. O susto foi tão ou maior que a surra e o deixou paralizado.
O povo todo gritava: foi derrotado agora, não por Soco da noite, mas por uma mulher. Riam de se acabar.
Ele olhou para mim com ódio nos olhos e saiu apoiado por outro cara.
Agora faltava o outro e esse, eu não vou aliviar, respirei fundo e sinalizei para Sid que estou pronta.
Rafael
Foi uma surpresa tremenda, ninguém esperava, ela soube se disfarçar muito bem e a bichinha luta muito. Bichinha? Mulherão, pequena, mas poderosa, alem de conhecer bem os golpes. Começou com golpes de capoeira e terminou com jiu jitsu. Agora ela vai lutar com um armário. O cara parece dar dois dela. O outro foi para enfermaria improvisada no canto do galpão, de onde dava para ouvir a luta narrada pelo locutor.
Apesar dela, Soco da Noite, já estar meio desgrenhada, parece inteira e pronta para recomeçar. Diria até que tem sangue nos olhos, não sei o que esses caras fizeram para ela, mas parece que ela quer vingança.
Quando o locutor chamou para a luta, ela voltou ao centro do tatame, estranhei colocarem tatames para luta livre… Mas como é luta clandestina, não dá para exigir um octógono. Até sorri com esse pensamento.
O cara chegou na beirada, erguendo os braços, tentando intimidá-la e chamando a torcida para si, um verdadeiro show man. O desgraçado ria e gritava, querendo chamar a atenção.
– É sério locutor? Vou lutar com essa ratinha? – Continuou rindo dela.