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6

AGHATA

Depois que as semanas se passaram e as coisas se acalmaram com o decorrer dos dias, finalmente todos nós, tanto a família de Alice, quanto o pai de Lorenzo e a minha também, puderam voltar a respirar com tranquilidade, por ambos estarem se recuperando bem em suas próprias casas, após deixarem o hospital depois do acidente que sofreram.

Dessa forma, meu coração anda com a sensação de certo alívio pelo perigo maior ter desaparecido por completo. Com Alice e Lorenzo fora de risco, tudo parece estar de volta ao normal. Exceto é claro, pela confusão que anda rolando entre os dois, pois pelo que fiquei sabendo através de Luna, ambos não estão se falando e não é por culpa da Ali, e sim por causa de Lorenzo.

Ninguém sabe ainda o motivo pelo qual aquele loiro cabeçudo está evitando a pobre garota, todavia eu particularmente tenho algumas teorias formadas em minha cabeça a respeito disso, porém que evito compartilhar com qualquer pessoa por este ser um tópico sensível que certamente afeta minha amiga Luna. Mas para ser sincera, tenho uma ideia do que está acontecendo com ele. Acho que no fundo Lorenzo deve estar se culpando pelo ocorrido pois estava pilotando a moto no momento do acidente.

O que é uma bobagem total, é claro, penso comigo mesma.

Acredito que ninguém o culpa pelo o que aconteceu. Foi um acidente, poderia ter acontecido o mesmo ou até pior com qualquer um de nós. Por essa razão ele não deveria se sentir assim. Não deveria se martirizar por uma situação que estava fora de seu alcance. Lorenzo não tem culpa de nada, porém seu maior defeito nessa vida é assumir a responsabilidade por algo que não lhe compete.

Mas fazer o que se ele é assim?

Eu não posso fazer nada para ajudá-lo. Não somos tão próximos um do outro para que eu o aconselhe a fazer o que é correto, que é sentar-se com calma, conversar com Alice sobre o assunto e expor como se sente a respeito disso. Além do mais, quem sou eu para dar conselhos sobre relacionamentos para alguém? Seria o cúmulo do absurdo algo do tipo vir de mim. Logo eu, a pessoa mais azarada e confusa nesse quesito. Sou uma completa vergonha e negação quando se trata de tópicos como este, portanto não posso ser hipócrita e bancar a terapeuta de casal. Longe de mim uma coisas dessas.

-Aghata... Aghata! Terra... chamando Aghata. Você está surda, mulher? -Luna salta de repente a minha frente e estala os dedos próximos ao meu rosto, ao que eu coloco uma mão sobre o peito tomando um susto com sua aparição repentina e desavisada.

Essa garota louca ainda irá me matar do coração um dia desses... é o que reflito estreitando os olhos com seriedade em sua direção. Se ela não fosse minha melhor amiga eu já a teria mandado para outra galáxia há tempos.

-E você quer me matar do coração, sua bruxinha? -digo ao recuperar o ritmo normal da respiração com uma lufada de ar profunda, e retomo a caminhada rumo o estacionamento da faculdade onde minha moto está estacionada.

-Eu estou te gritando há um tempão, mas você parece não me ouvir... Acho que está viajando no mundo da lua ou pensando em algum gatinho que deve estar de rolo e ainda não me contou... -Luna reclama apertando o passo para me acompanhar, e eu rolo os olhos para seu drama desnecessário.

Lá vem ela e suas ideias malucas. Ah Luna... ah minha amiga, se você soubesse a verdade... Tenho certeza que ficaria escandalizada com os absurdos que se passam por minha mente. Mas é bom que nem saiba. Estou farta e cansada demais de pensar sobre essas coisas. Já passou da hora de virar a página e focar no que é importante, minha graduação e ir embora dessa cidade.

E por falar nisso, tenho que contar a ela sobre minha viagem. Luna precisa saber que em pouco tempo estarei deixando o país para me especializar na Espanha e que ficarei alguns anos fora. E se tudo der certo, Deus queira que sim, com sorte, depois desses mesmos anos estarei de volta formada, com meu diploma de direito em mãos e um coração novinho em folha, curado de todas as bobagens do passado. Bem, estes são os planos que tenho para o futuro, agora falta apenas colocá-los em prática.

-Fale, Luna. O que você aprontou dessa vez? -eu pergunto já sentindo o cheiro de encrenca no ar.

Luna está sempre aprontado algo, parece até um imã para problemas.

-E quem disse que eu fiz algo? -ela questiona desviando o olhar para longe, o que só confirma minhas suspeitas de imediato.

-Porque você só me procura com tamanha urgência e com essa cara de lavada, quando faz alguma coisa, criatura. -respondo o óbvio e Luna cruza os braços visivelmente contrariada por não ter um bom argumento para rebater na mesma medida.

-Não foi nada demais. É só que... -ela começa sendo vaga nas palavras, o que me faz encara-la fixamente e torcer os lábios para sua enrolação.

Luna sabe que essa velha tática não funciona comigo. Ela pode tentar me enrolar o tanto que quiser, porém nenhuma de nós duas sairemos do lugar enquanto ela não abrir a boca e contar o que houve.

-Eu e a Ali brigamos. E foi... meio sério dessa vez. -Luna diz chutando uma pedrinha para longe com a ponta do tênis sem me fitar.

-E por que motivo, Luna?

-Eu não sei, amiga. A Ali surtou do nada, só porque me viu conversando com o Enzo lá no estacionamento do prédio onde ele mora...

Ela dá de ombros fazendo pouco caso, porém sinto que há mais por trás do que ela não está me contando.

-A maluca gritou comigo na frente dele, depois disso fiquei com tanta raiva e vergonha por ter sido tratada daquela maneira, que fui embora na mesma hora e vim para faculdade tentar refrescar a cabeça. Eu precisava falar com você e saber o que você acha disso tudo.

-Luna, eu sei que você não está me dizendo cem por cento da verdade... -digo com um longo suspiro, sentindo- me exausta mentalmente com tantos problemas em mente para lidar no momento. -Mas mesmo assim vou te perguntar uma coisa.

Faço uma pequena pausa antes de prosseguir.

-Até quando pretende ficar nessa disputa com sua irmã? Você não pode continuar com i...

-Aghata, você é minha amiga! Deveria me apoiar e não apontar o dedo na minha cara como está fazendo neste instante.

Ela me interrompe no meio da frase com uma pontada de revolta que me faz ficar a um passo de perder a paciência. Por Deus... Às vezes tenho uma enorme vontade de socar Luna até que ela crie um pouco de vergonha e bom senso. Mas ela é minha amiga, lembro-me voltando a razão, e respiro fundo para me acalmar.

Se controle, Aghata, se controle.

-Eu vim até você para conversar, para saber o que fazer e não para ser julgada! -ela exclama extremamente ofendida, então eu perco o restinho de paciência que ainda me resta e explodo de uma vez por todas.

-Só que eu não vou estar aqui para sempre, Luna! -digo num único rompante e ela se assusta com o que acaba de ouvir.

-O que? -Luna se aproxima com os olhos maximizados, observando-me com um misto de atenção e cautela.

-Isso mesmo que você ouviu. Nem sempre eu vou estar por perto para ajuda-la ou aconselha-la quando cometer um erro, Luna. Porque eu estou indo embora. -confesso com a sensação de estar carregando o peso do mundo sobre meus ombros.

Todavia é bom me livrar desse fardo e contar logo a verdade para minha melhor amiga. Crescemos juntas e compartilhamos tudo uma com a outra a vida toda, então mais cedo ou mais tarde Luna teria que saber sobre isso, mesmo que doa.

-Embora? Como assim você está indo embora, Aghata? Do que está falando? Indo embora para onde? E por que? Eu não entendo. Me diz que é brincadeira, por favor... -Luna pede os olhos marejados e me sacode pelos ombros com certa dose de desespero no olhar. -Você está brincando, né?

-Infelizmente não estou, amiga. -eu a respondo com o coração pequenininho e apertado, sentindo meus olhos arderem com a eminência do choro que está por vir. -Já estou preparando tudo para realizar minha mudança e dentro de alguns meses, eu estarei indo para a Espanha para continuar meus estudos por lá.

-Por que, Aghata? Por que?

-Porque eu preciso pensar no meu futuro, amiga. -seguro seu rosto entre minhas mãos e enxugo com os polegares algumas lágrimas que rolam por suas bochechas. -Será muito difícil deixá-la, mas eu tenho que fazer isso... por mim, pelo meu futuro, por...

-Não vai, amiga... por favor, não vai. -Luna insiste e me puxa pelo pescoço para um abraço apertado.

-Eu preciso, amiga... -retribuo o carinho envolvendo-a com meus braços ao seu redor.

-Promete que não vai me esquecer? -ela pergunta chorosa e eu fungo melancólica.

Logo as primeiras lágrimas escapam dos meus olhos e meu peito se comprime de tamanha tristeza. Pelos céus, como isso dói.

-Eu prometo, Luna. É claro que eu prometo. Jamais irei me esquecer de você...

Na verdade, eu não irei me esquecer de ninguém que deixar para trás, penso no meu íntimo. Principalmente aquele que está sendo o motivo da minha partida.

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