CINCO
Agatha tentou me acordar. Mas 6h da manhã é covardia, mesmo que você tenha ido dormir cedo.
Depois que meus pais foram embora, não havia muito o que fazer. Ninguém pra conversar, nenhuma atividade "extracurricular". Então eu dormi.
Mas isso não significa que eu deva ser acordada as 6h da madrugada.
— Ei, bom dia!
Abro os olhos e encontro o Doutor Tyler, abaixado próximo a minha cama.
— A enfermeira me informou que você não queria acordar.
Seu sorriso está lindo, mesmo a esta hora da manhã.
Pelo amor Deus, ainda está escuro lá fora!
Afundo a cabeça no travesseiro. Ele ri e se levanta.
— Você desmarcou minha consulta.
— Não dá pra entender o que você fala assim, Júlia.
Tiro a cabeça do travesseiro e olho através dos meus cabelos.
— Você desmarcou minha consulta.
— Tem uma razão importante.
— Sempre tem. - Me aconchego no meu travesseiro e puxo mais o cobertor. — Apaga a luz e fecha a porta ao sair.
— Não quer saber o que é?
— Não.
— Vem, vai valer a pena.
— Eu não quero.
Ele se abaixa de novo, bem próximo a mim.
— Preciso da sua ajuda para uma tarefa.
— Eu não lavo louça e nem faço faxina.
— Juro que não é nada disso. - Ele ri. — Vem comigo?
— Me espera lá fora.
Tomo um banho rápido, me visto com as roupas brancas do hospital, arrumo os cabelos e pego uma maçã.
— Você é rápida.
— Comece a rezar, eu fico louca às 6h da madrugada.
— Ainda bem que estamos no hospício.
Ele ri e eu também. Subimos um andar e chego a um espaço vazio, bem parecido com o meu quarto. Ele também tem um banheiro como o meu, uma janela grande e é bastante amplo. Mas aqui não há nenhum móvel. Apenas uma caixa enorme.
— Vamos lá, abra a caixa. - O Doutor diz com um sorriso enorme.
— Esta é a cadeira de eletrochoque, não é?! Eu vi isso em filmes. Não vou abrir abrir o meu objeto de tortura.
— Você tem o dom do humor, senhorita Júlia. Mas é mais interessante que uma cadeira de choque. Abra e veja.
Vou até a caixa e, cuidadosamente, a abro. Baldes de tintas de varias cores, pincéis e equipamentos para pintura estão todos arrumados lá dentro. Olho para o doutor.
— Estou com este espaço muito branco e quero alguma cor nele. Mas não entendo nada do assunto, você poderia me ajudar com isso?
— Você está brincando? - Ainda não acredito no que está acontecendo. Ele nega com a cabeça e vou até ele e pulo em seu colo, o abraçando. Ele me suspende e me aperta em seus braços e eu coloco a cabeça na curva de seu pescoço. Seu perfume é tão bom. Ele me coloca no chão e nos afastamos.
— Então, mãos à obra. - Ele diz.
— Você vai pintar com essa roupa?
— Eu não vou pintar.
— Ah, vai sim! Eu é que não vou fazer tudo isso sozinha. - Coloco as mãos na cintura.
— Tudo bem. Vou arrumar uns macacões de pintura para nós dois.
— E como ficarão meus exames, consultas e tratamentos? - Com o itinerário rigoroso que eu tenho, vou demorar muito pra conseguir pintar tudo.
— Quanto tempo você precisa pra terminar?
— Depende do quanto de tempo eu tenho disponível.
— Eu fechei minha agenda pelo próximo mês e a sua também. Você acha que dá? - Ele franze a testa.
Me jogo em seus braços novamente. E beijo seu rosto.
— Esta é a melhor notícia do mundo. Finalmente vou ficar livre daqueles velhos.
— Mas você terá um médico sempre de olho em você. - Ele me lembra.
— Se for você, eu topo. - Não era pra ter parecido um flerte.
— Vou arrumar os macacões. Você fica bem aqui sozinha? - Ele fica sem graça e muda de assunto.
— Eu passo muito tempo sozinha, doutor. - Também não era pra ter soado tão amarga. — Não se preocupe, vou tentando imaginar o fazer aqui.
— Que bom. Então faça seu melhor.
— Qual a finalidade do espaço? - Pergunto.
— Como assim?
— O que vai ser espaço? O que devo pintar?
— Este será um quarto de uma paciente minha. Ela é uma garota doce e precisa de um pouco de cor em sua vida. - Não era pra eu sentir essa pontada de ciúmes.
— Ela gosta de borboletas? Porque eu imagino uma floresta delas nesta parede aqui. De todos os tipos, tamanhos e cores.
— Eu amei a ideia. E tenho certeza que ela vai adorar as borboletas.
Fico olhando para todo o espaço branco, pensando como preencher aquilo. Decido que vou fazer como se fosse pra mim, dar o meu melhor para ajudar a colorir a vida de outra pessoa.
Passo um bom tempo examinando as paredes, as tintas e os acessórios. Tem uma infinidade de possibilidades aqui e tudo isso me anima tanto.
Um pouco de cor nesse mundo branco que eu vivo.
Nem percebi que o Doutor Tyler saiu e já estava de volta, com os dois macacões na mão. Um rosa e um azul.
— Você foi rápido. - Digo, enquanto me levanto do chão.
— Não queria te deixar muito tempo sozinha. Veja, trouxe um macacão rosa pra você. Tem mais alguns no seu quarto.
— Obrigada. - Pego o macacão e vou ao banheiro me trocar.
Quando volto, ele não está lá. Provavelmente foi se trocar também.
Pego um lápis e começo a desenhar pela parede. Tento trazer a memória algumas das borboletas que mais me marcaram e as transponho para a enorme tela a minha frente.
— Começou sem mim. - Ele diz, assim que entra e fecha a porta.
— Você demorou demais. - Dou de ombros.
— Então, - Ele estrala os dedos. - Por onde eu começo?
— Pega um pincel.
Ele pega um pincel enorme, mas tomo de sua mão e entrego um de ponta fina.
— Com esse aqui nós vamos terminar no ano que vem.
— Não seja apressado, as melhores coisas levam tempo. - Dou um sorriso de lado e seguro sua mão, o levando a parede em que comecei a desenhar. — Esta é uma Maculinea alcon, mais conhecida como Borboleta Azul. A encontrei na minha primeira viagem à Europa. Eu a amo.
Seguro sua mão que está com o pincel, coloco na tinta azul e o ajudo a pintar. Paro quando vejo que ele está olhando pra mim e não para parede.
— Desse jeito o senhor não vai aprender, doutor?
Ele sorri e volta a olhar pra parede. Continuo guiando sua mão pela parede.
— Por que está pintando esta borboleta primeiro?
Solto sua mão e me viro de frente pra ele.
— Este é o azul dos seus olhos.
Ele engole em seco. Sorrio, pego sua mão e continuo a pintura.
Sorrio, pego sua mão e continuo a pintura.
*****
Oi gente,
O que estão achando de descobrir este lado da Júlia? Já estão shippando?
Quando pensam no Doutor Tyler, quem vocês imaginam? Mandem os nomes pra mim!
Lotem de estrelinhas e marquem os amigos.
Amo vocês.
Beijos, S. ?