Regra número 4
Senti algo queimar minhas entranhas cada momento que o cheiro adocicado do perfume dele se aproxima de mim. Senti também meus olhos arderem e meus ouvidos entupirem a cada segundo que escutei a voz rouca e madura do jovem enquanto os comentários dos demais alunos invadiam minha cabeça para me deixar ainda mais agitada.
As palavras de Josh perfuravam minha mente tão forte que eu até conseguia sentir a ponta de uma agulha tocar meu cérebro como se alguém estivesse tentando estourá-lo.
Não soube dizer exatamente quanto tempo consegui suportar da aula, não soube dizer nem se eu realmente estava presente ali naquele instante. Era como se meu corpo flutuasse no ar sendo carregado pelas palavras que tentavam me deixar terrivelmente desconfortável.
Senti a mão tocar meu ombro quando tudo parecia que iria desmoronar e dei um pulo na cadeira com o susto que aquele toque me trouxe. Olhei para a pessoa de forma assustada, ainda que pedisse internamente para meu corpo suportar só mais algumas horas.
— Está pálida — sussurrou. Os olhos verdes dele me puxaram da imersão para à realidade do falatório ao nosso redor.
— É… eu não me sinto bem. — Falei gaguejante. Observei à sala e pude notar alguns olhares curiosos para nós, assim como ouvi algumas risadinhas mal intencionadas ao longe.
Nathally me olhou cortante, acho que aquilo só fez crescer minha angustia e um certo medo da garota.
— O que está sentindo? Quer ir para casa?
O professor perguntou fazendo-me tremer um pouco. Pensei que se dissesse que queria ir ele tentaria se oferecer para me levar. O que aumentaria os comentários. Eu não poderia deixar que nossas conversas s aprofundassem mais, para que ele não me chamasse para sair. Afinal eu não fazia a menor ideia do que dizer naquela situação e tudo o que pensava era em sumir repentinamente.
— Camila? — Voltei os olhos para os verdes que aguardavam uma resposta.
— Casa? — repeti e ele assentiu.
— Minha querida, você ainda está se sentindo mal? — Joshua entrou na sala naquele instante e caminhou às pressas em minha direção, eu me sentia atordoada principalmente com ele me chamando daquela forma. — Cami?
Olhei-o totalmente entorpecida, acreditando que poderia desmaiar a qualquer instante. Minha mente latejava como se uma orquestra tocasse um hip-hop alto dentro de meu cérebro.
— Josh, eu não…
— Sabia que não — ele me cortou segurando minha mão e me levantando. — Acho melhor levá-la para enfermaria e depois para casa, não acha melhor professor? Vou cuidar de você, minha querida.
Olhei Dylan por um instante e senti uma forte tensão em sua forma de encarar Josh. Seus esmeraldas poderiam virar uma arma letal a qualquer instante, pois eu poderia jurar ter visto a fumaça sair de sua cabeça. Mesmo assim ele respirou profundamente, parecia querer afastar qualquer atrocidade que estivesse tentando acabar com seus neurônios. O professor me lançou um olhar terno, triste e preocupado de uma forma que tudo isso conseguia se misturar em seus orbes claras. Ele nada disse para meu amigo, apenas o deixou me ajudar à sair dali como era o desejo de cada fibra do meu corpo
Cruzamos a porta e ela se fechou em nossas costas para o meu alívio, pois só assim eu consegui respirar direito.
Josh me encostou na parede quando o local já estava seguro para mim e ele me encarou com um enorme sorriso em seus olhos.
— Minha querida? — perguntei finalmente, conseguindo falar. Tudo o que mente havia captado de toda à situação fora aquela palavra.
— Deveria me agradecer, minha querida. Te livrei de dois problemas com uma pequena frase. Dois coelhos em uma única cajadada. — Franzi o cenho. Implorando que aquela parede me engolisse para que eu não precisa de explicações. — Bom, agora Dylan não vai te incomodar, pois pensará que está namorando e você não vai precisar participar da aula para poder colocar a cabeça no lugar. Eu sei que te coloquei em um abismo de perguntas sem fim.
Respirei fundo, Josh realmente havia salvo minha pele e eu estava grata por isso, mas extremamente enjoada também.
— Acho que vou para casa. — Comuniquei-o então e ele assentiu.
— Vou te levar.
Joshua me ajudou a voltar para casa naquele dia, ainda que eu dissesse que estava tudo bem em ir só, ele insistiu em me fazer companhia e avisou para o meu chefe que eu não poderia trabalhar por estar doente demais. Acredito que as estagiárias afirmaram aquilo, pois as garotas que trabalhavam na biblioteca do campus também eram estudantes da minha sala e viram toda minha situação. Então, por hora, eu tinha um descanso.
Chegamos em minha casa rapidamente, depois de passarmos na farmácia para comprarmos algumas aspirinas para minha cabeça. Passamos a tarde assistindo filmes e conversando sobre a garota por quem meu amigo estava interessado. Isso me fez bem de certa forma, pois tinham muito tempo que eu não relaxava.
— E o que ela disse quando pediu para namorá-la? — Perguntei puxando a manta do sofá para me envolver quando senti os pelos do meu corpo se eriçarem. Um ar frio invadia as frestas da casa se fundindo ao ar-condicionado para me causar calafrios.
— Tenho namorado — ele fez uma voz feminina tentando imitar à garota. Gargalhei com aquilo.
A campainha tocou enquanto eu me contorcia no sofá e Josh levou a mão a minha testa checando como eu estava antes de se levantar. Ele seguiu para atender a porta, olhou na pequenina janela e riu um pouco.
— Cadê a chave? Ele vai surtar agora.
Apontei para a pequena vasilha em cima da mesinha ao lado da porta, ele abriu o objeto já descendo as escadas e sumindo do lado de fora.
"Quem vai surtar?" Pensei, aguardando meu amigo retornar para esclarecer aquilo.
Segundos depois minha resposta foi respondida, Dylan entrou seguido de Joshua. O professor me olhou terno, envolvido em um misto de tristeza e preocupação, à mesma reação que teve na sala de aula.
— Como está, Camila? Fiquei preocupado e o senhor Harry está para ter um filho de preocupação também.
— Me sinto melhor, professor. Foi um pouco de tontura e minha cabeça doía demais, mas Joshua cuidou de mim.
Olhar para Dylan e lembrar das palavras do meu amigo, causavam borbulhas em meu estômago. Era estranho demais saber que um professor tinha uma queda por mim, ainda mais sendo alguns anos anos mais velho dando assunto demais para todos. Eu me sentia totalmente paranoica e já me via tontear.
— É, ele me disse. Vocês dois me surpreenderam com essa história de namoro. Não pensei que à amizade de ambos fosse tão assim. Parabéns.
Apenas assenti, afinal eu era péssima com mentiras e acabaria dizendo a verdade se me apertasse muito. Ainda assim Dylan pareceu não acreditar e Josh também notou isso, então, meu amigo caminhou até mim colocando novamente a mão em minha testa.
— Bom, meu amor. Parece que você não vai ficar febril, não está com febre e sua cor voltou. Acho que está melhorando.
— Josh… eu soube ainda pouco que você tinha pedido para ficar com Paola na sua aula de história da Música mais cedo? — Dylan sorriu largamente e tenho certeza que a palidez tomou conta de mim novamente.
— Ah, isso? — Meu amigo deu um aperto em meu ombro parecendo se enraivecer e eu o olhei fingindo confusão naquela informação. Como se realmente fosse sua namorada. — Foi uma brincadeira, pois Camila e eu tínhamos brigado. Então dei um showzinho infantil e pedi a Paola para me ajudar, mas Aria me chamou dizendo que Camz não parecia bem. Aí deixei o orgulho de lado por amor. Sabe como é né?
— Sei, sei — Com aquilo conclui que meu amigo inventava histórias rápidas o bastante para sair de enrascadas, mesmo Dylan ainda aparentando desconfiança. — Então se beijem.
Senti a palpitação em meu peito crescer e martelar contra as paredes de meus pulmões. Dylan parecia empenhado em provar nosso relacionamento e isso me deu claras evidências dos rumores que se espalharam pelo campus. Nossos olhos arregalados se fixaram um no outro, pois tínhamos sido pegos na mentira.
— Uê gente — ele voltou a falar. — Se são namorados não tem problema, não é? Eu acho fofo o amor jovem.
Beijar meu melhor amigo? Seria como beijar um irmão mais velho e isso não parecia nada certo. Era ainda mais errado do que ficar com meu professor. Isso me fez dar um longo suspiro ainda com os olhos presos nos de meu amigo.
— Tudo bem. — Joshua falou por fim dando-me mais alarde. Eu gritei internamente para ele deixar de loucuras e implorava que uma enorme cratera se abrisse no chão em minha frente.
Meu amigo se ajoelhou de frente para mim, colocou suas mãos em minhas pernas cobertas pela manta começando a se aproximar calmante, pressionei o tecido nervosamente.
Ainda que meu amigo fosse muito bonito eu estava tendo uma pequena crise de nervos. Seus lábios carnudos e pele clara reluziam com à claridade do dia que já estava chegando ao seu fim. O rosto fino e sobrancelhas também finas de Josh pareciam mais atraentes com aquela aproximação e isso atiçou algo em meu interior, mas o carinho que eu havia depositado nele me dizia que aquele beijo seria um desastre.
Seu olhar terno penetrou as minhas orbes e seu nariz tocou a ponta do meu, causando-me calafrios. Os lábios rosados do meu amigo tocaram e roçaram minha pele enquanto eu tentava me manter relaxada.
Ele começou com um simples selinho, o que me fez apertar ainda mais o tecido da manta, porém seu beijo tomou um ar intenso e gostoso que me fez liberar o caminho para transformar aquilo em algo calmo e demorado.
Apoiei as mãos em seu pescoço, acariciando os fios curtos dos cabelos de sua nuca deixando-o explorar minha boca enquanto os segundos rolavam ao nosso redor.
— Camz? — Fiz um barulho nasal indicando que ele continuasse a falar. Abri meus olhos, deparando-me com a porta por onde Dylan passou sem se despedir. — Você beija bem.
Olhei meu amigo uma vez mais e fui pega de surpresa com aquela reação de nosso contato. Percebi que os olhos deles se tornaram intensos e vibrantes, então seus lábios se chocaram contra os meus e seus braços envolveram minha cintura puxando-me do sofá para pressionar nossos corpos um contra o outro.
— Josh… Para…
Ele pareceu não ouvir meu pedido, pois me dominava loucamente enquanto eu tentava me livrar do seu abraço. Senti meu corpo pesar quando ele se debruçou sobre mim sem deixar nossos lábios se soltarem. Eu já estava desesperada pelo ar.
— Joshua, não. — Falei um pouco mais alto mesmo que nada parecesse pará-lo naquele momento, porém, seu corpo foi puxado de mim e derrubado no chão para longe.
Olhei confusa e com a visão embaçada para a sombra que o segurava preso no meu tapete.
— Perdeu o controle namoradinho? A garota mandou parar. — percebi que o professor não havia partido e isso me deu um certo alívio. — Chega de brincadeiras. Vá para casa, Joshua.
— Não, me deixa falar com ela, professor. Eu preciso me des..
— Saia daqui! — Bradou Dylan.
Estava tudo bagunçado em minha volta, eu ouvia Karl me pedir desculpas de longe enquanto o homem mais velho o mandava sair. Também ouvia pés furiosos, mas uma hora me perdi de qualquer som ou visão. Tudo ficou preto e silencioso, como se à paz me tirasse daquela loucura e me deixasse respirar tranquilamente.
Acordei atordoada. Senti uma pontada forte na cabeça como se eu tivesse tomado sol o dia todo em uma longa caminhada. Tudo estava aceso em minha casa e um cheiro gostoso de comida sendo preparada exalava pelo ambiente. Nas janelas era possível ver a noite dançar ao lado de fora e isso me fez questionar o tempo em que fiquei desacordada. Perguntei-me internamente se tudo não havia passado de um terrível sonho, mas minhas perguntas foram respondidas quando Dylan surgiu da cozinha usando meu avental rosa por cima de sua roupa e sorrindo com ternura.
— Como você está? — Perguntou ele sentando-se no sofá do lado do meu.
— Não sei, tive um sonho estranho. O que faz aqui?
— Sinto dizer que não foi um sonho, ele atacou você depois de tentarem me provar que estão juntos e eu sinceramente queria entender porque queriam fazer isso? — engoli em seco. Era hora da verdade.
— Eu não tenho certeza. Ele me disse que queria me ajudar. — Dylan franziu o cenho fazendo-me suspirar. — Natally contou que você havia deixado ela e que fez isso por estar afim de mim. Eu me senti estranha em saber disso e Josh fez aquele teatro, pois não queria me ver vomitar de nervoso caso você quisesse mesmo algo comigo
Disse tudo de vez sem parar para respirar. Me senti aliviada em poder dizer o que estava me tirando o sossego. Dylan pareceu confuso, ainda que uma certa compreensão parasse em seus olhos. Já eu não sabia mais como reagir.
— É tão ruim assim saber que estou gostando de você?
— Não é isso. É que eu fico assim quando descubro que alguém gosta de mim. Acho que tenho algum tipo de alergia ao amor ou algo do gênero — Parei um pouco vendo Dylan achar graça e o lampejo me veio naquele mesmo instante quando entendi bem suas palavras. — Espera, está gostando mesmo de mim?
— Estou — disse ele diretamente fazendo um um calafrio percorrer meu corpo. — Mas você pareceu gostar do beijo que recebeu.
— Ah! É que Joshua tem gosto de cereja. — Corei ao perceber que isso foi estranho. Vi um olhar vagamente incomodado no professor, então supus que havia dito merda. — Desculpa…
— Tudo bem, não precisa se desculpar por nada. Enfim, eu fiz o jantar. Você quer comer? Tem frango assado, salada de pepino, tomate e um suco de maracujá, pois você precisa de nutrição.
Me encontrei dentro do meu subconsciente e me questionei se o professor sempre encarava as coisas daquela forma. Calmo e fingindo não se importar. Seus olhos tentavam transpassar aquilo de fato, mesmo que uma pequena pontada no brilho dos seus orbes dissesse que aquilo lhe incomodou.
Questionei-me também em como deveria ser o relacionamento dele com Natally e se era por essa razão ambos ficaram tanto tempo juntos. Pois Dylan era calma e paciente, julguei que isso o fizesse aturar os altos e baixos da garota.
— Camila? — Olhei para ele ao perceber que me chamava já tinha um tempo, e assenti. Eu entrava em pensamentos tantas vezes que parecia viver em outro mundo. — Vou preparar seu prato. Tudo bem?
Ele se levantou e se dirigiu até o cômodo dividido pelo enorme balcão, mas eu queria saber mais dele e o segui até a cozinha quase cambaleante devido à fraqueza.
— Professor…
Seus olhos verdes encontraram os meus depois de seus lábios terem provado o molho da carne. Havia uma pergunta martelando na minha mente desde o momento que descobri sobre seus sentimentos e naquele momento eu estava tentando encontrar coragem para tirar aquela pergunta de mim.
Respirei fundo algumas vezes quase desistindo de seguir. Mas minha curiosidade era grande demais e eu poderia morrer de angústia se não soubesse. Eu tive muita vontade de perguntar para minha amiga como era estar com alguém mais velho quando ela me contou que iria se casar com nosso antigo professor e aquilo me perseguiu até aquele momento com o homem que estava em minha frente esperando-me perguntar. Eu decidi então que iria perguntar de uma vez por todas.
— Como é? — Vi seu cenho franzir e seu rosto se encher de perguntas. Pensei que seria bom se ele lesse mentes, assim eu não precisaria me esforçar tanto para ter coragem.. — Como é ver alguém que você gosta beijando outra pessoa?
Troquei as perguntas no fim de tudo, pois à vergonha venceu à curiosidade naquele momento, fazendo-me sentir vontade de bater à testa no mármore do balcão.
— Dolorido. — Respondeu o homem, me olhando confuso.
— Sinto muito. — Os olhos de Dylan dissolveram para algo mais triste e aquilo me machucou.
Meus pais sempre me disseram que era alguém frágil por dentro, sempre assumindo as coisas que não me pertenciam e eu estava fazendo isso novamente naquele momento. Meu peito parecia estar sendo perfurado por algo pontudo que me deixou completamente chateada comigo mesma.
— Não se desculpe, você não tem culpa de não sentir nada por mim. — O professor falou por fim tentando me dar seu melhor sorriso.
— Sinto um carinho muito grande por você.
— Isso doeu ainda mais. — Deixei à desolação aparente ao ver que eu só piorava tudo. Então o professor pigarreou, mantendo seu sorriso. — Eu vou ficar bem. Vamos comer?
— Posso perguntar algo íntimo? — Tentei novamente, dessa vez aos sussurros torcendo para que ele não ouvisse, mas ele me entendeu muito bem, pois assentiu. Tomei fôlego, então para perguntar e dessa vez gritei para minha mente que ela não iria impedir nada. Soltei o ar então e o olhei fixamente. — Como é estar com alguém mais novo?
— Não sei — ele confessou me fazendo franzir o cenho. — Não tive nada sério com Nathally. A gente só se pegou em algumas festas.
— E por quê ela ficou tão brava quando a dispensou?
— Por que eu não a dispensei. Só disse que realmente não estávamos sério e que eu tinha muito trabalho à fazer. — Ele deu outro suspiro longe, passou o prato com a comida para mim e pegou o seu.
— Então não disse a ela que gostava de outra pessoa? — Ele negou, deu a volta pelo balcão e colocou seu prato na mesa.
— Mas eu deixei evidente porque não tirava os olhos de você. — Corei novamente e ele deu de ombro. — Não sei esconder a verdade.
— Parece que você também não se importa com o que as pessoas diriam sobre um professor namorando uma aluna. Você até parece gostar desse tipo de perigo.
Dylan me analisou cautelosamente e novamente deu de ombros, mas eu pude ver que sua mente pensava em minhas palavras com cautela.