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No anonimato.

Eu tinha já avisado Raquel que eu ficaria no anonimato. Lá eu seria apenas Sacha. E a proibi de falar meu nome, ou meu sobrenome. Meu nome não era muito comum e eu tinha medo que as pessoas me reconhecessem.

No caminho, para ocupar minha mente, peguei meu iphone e comecei a jogar.

—Joguinho novo?

Ergui meus olhos para Roger e sorri.

—Na verdade, estou ansiosa. É a primeira vez que participo de uma festa com pessoas de classe social diferente da minha.

—Será ótimo para a senhorita.

Guardei o iphone na bolsa, muito interessada na conversa.

—Eu sei. Sabe como me sinto? Como uma criança poupada de pegar bactérias, onde os pais a protegem ao extremo, mas eles não sabem que quando ela tiver contato com uma, ficará muito doente, pois não criou mecanismos de defesa.

Ele riu.

—Seus pais se preocupam com você. Seu avô, não foi diferente. Seu pai não conhece outro meio. Ele nunca se misturou. Estou um tanto surpreso que sua mãe tenha liberado sua ida.

—Roger, eu tenho vinte e dois anos. Acho que ela se deu conta que meu pai exagera. E por favor, não conte nada para ele.

Roger lançou o olhar pelo retrovisor.

—Pode ficar tranquila. Estou há anos com seu pai e nunca me meti na vida de vocês, nunca me envolvi com qualquer tipo de comentário. Sei aonde é meu lugar.

—Você sabe que mora no meu coração, não sabe? —Eu perguntei de repente com muito amor pelo meu motorista, que eu conhecia desde sempre.

Ele sorriu emocionado.

—Eu sei sim, senhorita.

Quando despontou a rua de Raquel, eu disse a ele:

—Roger, por favor, pare antes. Não quero que ninguém me veja com motorista. Hoje ficarei no anonimato.

—Verdade? —Ele soltou uma risada, estacionando o carro um quarteirão de distância. — Quando te ouço falar assim me dou conta o quão diferente você é de seus pais. Às vezes me pergunto por quem a senhorita puxou.

Eu sorri.

—Eu acredito que pela minha bisavó materna. Mamãe me disse que ela era uma mulher de fibra. Antes de meu bisavô enriquecer ela trabalhava como recepcionista em uma fábrica. Numa época onde as mulheres não costumavam sair para trabalhar.

—Está explicado! —Ele sorriu.

Com a mala na mão, caminhei pela calçada. Perto da casa de Raquel, eu já conseguia ouvir a música do U2 “With or without you”. Que estava num volume bom, graças a Deus não estava estridente.

Parei em frente à casa dela, um sobrado branco, estilo Tudor. Jardineiras com azaleias vermelhas presas as janelas e um lindo jardim lateral cheio de botões de rosas vermelhas, outras abertas exalando seu perfume.

Abri o pequeno portão branco, e antes de entrar acenei para Roger que estava em pé na calçada me observando. Enquanto eu não entrasse, ele não iria embora.

Foi inevitável sentir o coração acelerar na expectativa e ansiedade pelo desconhecido. Um sexto sentido me dizia que depois dessa festa, algo dentro de mim iria mudar.

Toquei a campainha. A porta se abriu e um rapaz loiro de olhos azuis surgiu. Quando ele me viu, estacou por um tempo e me mediu com os olhos, então sorriu.

Raquel logo chegou e tomou a frente da porta.

— Sacha! — Ela disse animada, piscando para mim, mostrando que ela se lembrou do combinado. “Não falar que eu era filha de Arnold Bertolini e não falar meu nome completo”.

Um sorriso se formou em meus lábios ao vê-la.

— Que bom que conseguiu vir! — Ela continuou quando me aproximei.

Seus cabelos castanhos cacheados eram cortados na altura do queixo. Os olhos grandes e castanhos, repletos de maquiagem marrom, estavam ansiosos.

—Estou feliz de ter vindo. —Eu disse com um sorriso.

Havia pessoas dançando. Algumas delas estavam se beijando. Tudo muito estranho para mim…Mas eu estava amando!

E viva a liberdade!

— Vou levar sua mala e sua bolsa para o quarto de hóspede. —Ah, deixe eu te apresentar. Esse é Travis. Ele estuda medicina e trabalha como estagiário no hospital que papai trabalha. —O rapaz era o que me atendeu na porta, que ainda olhava para mim com um sorriso.

—Prazer em conhecê-la.

—O prazer é meu. —Eu disse educada tirando a minha bolsa e dando para Raquel, junto com a mala.

—Fique à vontade. — Raquel disse se afastando em direção a escada que a levaria aos quartos e um pequeno banheiro.

Travis pegou meu braço.

—Vem comigo!

Eu estranhei. Não estava acostumada ser tocada sem conhecer a pessoa direito e percebi que muita coisa, nesse novo ambiente, eu ia estranhar.

Livre! Assim que me senti E viva a liberdade!

Sorri para ele e me deixei ser conduzida para dentro da casa.

Alguns móveis foram encostados à parede para dar maior espaço na sala, que não era pequena. As lâmpadas fortes da sala deram lugar a lâmpadas mais fracas e coloridas.

Muito legal!

Me lembrei do filme Embalos de Sábado à noite, na época da Disco Music.

É... bem diferente das festas que eu ia, onde o ambiente era o mais iluminado possível para o desfile dos vestidos, anéis e colares.

Passei os olhos pelos convidados. A grande maioria eram jovens da minha idade. Os rapazes e moças deveriam ser jovens médicos, que faziam universidade com Raquel ou trabalhava com ela no hospital.

Quando eu percebi, ele tinha me levado num canto distante das caixas de som, onde poderíamos conversar.

—Sacha. —Ele repetiu meu nome. —É um nome Russo?

Eu ri.

—Não, é diminutivo de Natasha.

—Lindo nome.

—Obrigada.

—Quer beber algo? —Ele me perguntou com um sorriso.

—Uma Coca- cola. —Eu disse. Essa era uma bebida proibida em casas, engordava, fazia mal para os dentes e para os rins.

—É para já. —Fez uma espécie de aceno, e se afastou de mim em direção a uma mesa onde tinha uma caixa térmica.

Senti um toque no ombro direito. Era Raquel.

—Travis já está atacando?

—Atacando?

Ela sorriu.

—É, dando em cima de você?

Eu neguei com um forte não de cabeça.

—Não, ele apenas está sendo simpático. —Eu o procurei com os olhos. Ele estava com a lata de refrigerante na mão, e uma garota o tinha parado no meio do caminho.

—Sei. —Ouvi Raquel dizer e a encarei. — Que bom que convenceu sua mãe.

Eu sorri animada.

—Verdade. Eu estou feliz de sair da redoma que me colocaram. É tudo tão diferente.

—Espero que se divirta!

—Já estou me divertindo. —Eu disse sorrindo.

Raquel me olhou como se não acreditasse muito.

—Seu refrigerante. —Travis apareceu na minha frente e estendeu a lata gelada, onde gotinhas de água escorriam dela.

Eu a peguei na mão e fiquei a olhar para ela. Era a primeira vez que ia beber direto na lata. Minha mãe sempre me alertou que elas eram contaminadas.

—Foram lavadas. Pode beber tranquila. —Disse Raquel com um sorriso maroto.

Que incrível, ela tinha lido meus pensamentos.

Eu ergui meus olhos para ela e sorri.

—O que você faz, Sacha? —Travis perguntou.

O que eu fazia?

Resposta: Nada!

—Eu me formei em administração, mas agora estou parada. —Disse disfarçando minha tristeza.

—Bem, vou deixar vocês à vontade. —Raquel disse piscando para mim.

Quando eu estava para encarar Travis, não soube porque, mas meu olhar foi atraído a um a um homem que descia as escadas. Prendi a respiração.

Ele era alto, pernas compridas, bronzeado. Conforme ele foi descendo, mais a meia luz da sala o revelava. Finalmente o visualizei melhor.

Seu rosto era bem marcante, bem masculino, forte. O nariz reto, queixo firme com covinha e lábios sensuais

Seus cabelos curtos eram densos de um negro lindo e brilhante. Ele era diferente de todos ali, mais maduro. Ele deveria ter uns trinta e poucos anos.

—Sacha? —Com dificuldade desviei meus olhos dele e fitei Travis.

—Desculpe-me. —Forcei um sorriso. — O que disse?

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