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Capítulo 04

— Você fez o quê?! — Perguntou Ethan após eu mencionar tudo o que ocorreu na noite anterior.

— Ela precisava de ajuda, eu não podia deixá-la.

Ele me puxa para o canto.

— Não deve confiar na Gisele, em ninguém aqui!

— E em você? Devo não confiar? — Cruzo os braços.

Ethan suspira e desvia o olhar, ele sempre fazia isso quando sabia que eu tinha razão.

— Se eu não confiasse não o teria. — Minhas bochechas pegam fogo quando ele sorrir sutilmente de canto. — A questão é, eu só ajudei ela ontem, não estou dizendo que somos melhores amigas.

Ele pensa por alguns instantes e suspira.

— Certo. Se você diz.

Teve uma pequena parte que não disse a ele, Gisele estava grávida de um de seus clientes, se May soubesse daria cabo dela assim como fez com Amanda.

Mordo o lábio inferior.

Não sabia como ela iria resolver essa questão e me sentia brava por ainda pensar em ajuda-lá, ela nunca faria isso por mim.

— Tem mais algo?

— Hum?

— Você parece pensativa desde cedo.

— Ter visto ela tão fragilizada me lembrou que poderia ser eu ali.

Ethan olha para os lados e se aproxima de mim, tanto que faltavam poucos centímetros para um beijo.

— Não era e não vai ser. — Ele leva sua mão até minha mandíbula. — Antes que qualquer coisa aconteça vamos estar bem longe daqui.

Ouvimos passos no corredor, Ethan me largou e pegou de volta o esfregão. Vicent passou por nós mirando seus olhos em mim.

Voltei a limpar as mesas cheias de bebida derramada. May me deu o trabalho de ajudar Ethan a limpar a boate diariamente, eu não reclamava, pois, adorava passar o máximo de tempo com ele, me distraia de toda merda que vivo. Às vezes quando acabavam os serviços ele me contava coisa sobre sua vida na Inglaterra, antes de vir parar aqui por necessidades. Fazíamos planos, muitos planos.

Seria belo se não fosse trágico.

— Vou levar você para tomar chá com a vista do big bang ou prefere ir a Paris? Lá tem croissant. — Perguntou ele sentado ao meu lado.

— Já comeu um antes?

Ele sorrir e assenti.

— Bem, quero conhecer o lugar que você nasceu primeiro.

— E depois? — Perguntou com os olhos brilhando.

— Quero morar na Virgínia, podemos dividir a mesma casa. Sempre quis um cachorro. — Falo entusiasmada.

— Prefiro gatos. — Admitiu.

— Podemos ter os dois. Podemos fazer o quisermos.

Deito minha cabeça sobre seu ombro.

Observamos o salão limpo sendo iluminado apenas por uma lâmpada no centro e rachaduras da parede que faziam o sol raiar.

Ethan une nossas mãos, peço mentalmente que ele não sentisse o quanto elas estavam frias, porém ele sentiu e as colocou em seu pescoço fazendo pressão em cima com a cabeça para me aquecer.

— Promete-me que vamos morar juntos na Virgínia, ter um cão e um gato? — Pergunto.

— Prometo, Jade. — Sussurrou de volta.

Nossos olhos se encontraram, dessa vez ele não fugiu, mas meu coração disparou como sempre. Ethan desviou o olhar apenas para meus lábios que se abriram sozinhos, meu corpo suplicava por um beijo seu. Ele levou sua mão até minha bochecha e passou o polegar no lugar, senti minhas pernas amolecerem.

Quando seus lábios finalmente tocaram os meus, borboletas faziam festa no meu estômago, eu podia voar naquele momento. O beijo não passou disso, mas foi o suficiente para me deixar ainda mais apaixonada por ele.

Por fim, ele deitou sua cabeça sobre a minha, ficamos ali até May aparecer me dando mais ordens.

O que mais doía era saber que nossos planos morreriam conosco caso tentássemos sair daqui, porém May não podia nos impedir de sonhar.

• • •

Mais tarde Gisele passava maquiagem para cobrir seu olho roxo, May não se importou, pois, era comum haver clientes agressivos. Gisele podia ser sua preferida, mas não fugia da regra.

Por alguns instantes enquanto eu me preparava para minha apresentação, ficamos sozinhas, senti uma extrema necessidade de perguntar se ela estava bem. Me contive.

Ela vestia um biquíni cavado, não estava conseguindo amarrar a parte de trás, me prontifiquei com as mãos trêmulas. Dei um nó tentando não focar meus olhos no local onde limpei líquido seminal na noite anterior. Quase gorfei.

— Não pense que somos amigas devido ao que aconteceu ontem. — Indagou ela.

— Eu disse algo? — Aperto o nó com força e ela fecha os olhos.

— Disse ao seu amiguinho faxineiro? — Limpou o batom borrado no canto de seus lábios.

— Não. Ethan não sabe que você está... bem. — Pigarreio.

Gisele me lança um olhar feio e olha para os lados.

— Não fale sobre isso!

— Você não vai conseguir esconder isso para sempre, Gisele.

— Pensa que eu não penso nisso toda hora? — Sua voz embarga.

— Desculpe...

Ela respira fundo e enxuga seus olhos delicadamente para não borrar a maquiagem.

— Já tem algum plano?

— Se tivesse não seria da sua conta.

Dou de ombros.

— Me tratar mal não vai mudar esse fato.

Olho novamente no espelho antes de sair, mas Gisele começa a falar.

— Amanda falou sobre um médico que faz abortos, é mais comum do que pensam.

— Por que não faz?

— Não tenho dinheiro, mesmo com o que May me dá não chega nem na metade do valor. — Ela respira fundo. — Você tinha razão, Jade. Somos iguais. Vamos morrer uma hora ou outra aqui dentro.

Saio da sala com um peso no peito, pela primeira vez não me senti bem por estar certa. Gisele não conseguiria esconder a gravidez por mais tempo, sendo assim ela teria o mesmo destino que Amanda: a morte. Mais uma vez coloquei na minha cabeça que não era da minha conta, Ethan tinha razão.

Me apresentei cantando At Last da Etta James, dessa vez meu público estava atônito, todos esperando pela tão esperada apresentação sensual de Gisele.

— Sai daí, deixa a gostosa dançar! — Alguém gritou da plateia.

Continuei a cantar, eu só precisava finalizar aquela música.

— Quando você vai tirar a roupa, gata? — Gritaram outra vez tirando risadas dos outros.

Fiz o último agudo da música ouvindo as pessoas gesticulando sobre Gisele. Me senti enojada por só ouvir, imagino ela, deve se sentir um objeto.

Saí do palco sufocada, nunca conseguiria achar aquela situação normal. Dessa vez não vi sua apresentação, preferi ficar nos bastidores me recompondo e me esgueirando do Ethan, pois nosso beijo me deixou ainda mais tímida.

Fui para o quarto onde eu escondia meus míseros trocados, dentro de um buraco na parede repleto de notas amassadas de tudo que já ganhei por aqui. Quando escondia dentro do meu travesseiro, certa vez algumas notas sumiram, então tive que mantê-las em um local mais seguro.

Não sabia que haviam tantas, talvez fosse o suficiente para ajudar a Gisele.

Não. Pensei.

Larguei o dinheiro no chão. Não era da minha conta, esse dinheiro seria para minha fuga.

Passei as mãos no rosto com força.

Ethan me repreenderia, ele teria razão, mas ele também não é obrigado a dar seu corpo a homens estranhos todas as noites. Gisele não merecia, mas ela continuava sendo uma mulher desesperada, e se eu pudesse ajudar faria.

Escondi as notas dentro do meu vestido. Esperei longas horas no corredor, era nítido que ela teria muitos clientes hoje. Me sentei no chão com minhas pernas fracas, antes que eu fechasse meus olhos ela finalmente apareceu com um cigarro entre os dedos, cambaleando pelo corredor.

Levantei e tirei as notas amassadas, estendi para ela que franziu o cenho.

— Pegue. — Estendo novamente.

Ela ficou algum tempo tentando assimilar, balançando a cabeça, com os olhos vermelhos.

— Jade...

— Pegue. É tudo o que tenho. Faça o que precisar.

Gisele me surpreendeu com um abraço apertado, não correspondi de início, mas depois dei batidinhas na sua costa.

— Não sei como agradecê-la, trabalharei em dobro para pagá-la. — Falou emocionada.

Balanço a cabeça.

— Não precisa.

Tudo que eu menos queria era que ela se esforçasse mais.

Gisele me abraça mais uma vez, dessa vez eu correspondo.

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