Capítulo 6
Seus olhos verdes estavam cheios de pura loucura. Eram dois mares tempestuosos. Ele parecia prestes a explodir e por um momento temi que ele fosse matá-los.
-Ah, mas na verdade vou levar os dois! Perguntando se eles realmente acham que ele é um idiota! Um idiota que deixa um amigo foder a namorada bem debaixo do nariz dele! -.
"Não, Oliver." Agarrei seu braço, temendo sua reação, mas mais preocupada que ele pudesse se meter em encrencas.
-Deixe-me!-. Com um solavanco, ele se libertou do meu aperto, mas perdeu o equilíbrio e acabou batendo na porta. Ele deve ter se machucado, mas tentou esconder.
Aproximei-me dele hesitantemente enquanto um Oliver desconsolado se deixava levar contra a velha madeira daquela porta até chegar ao chão.
Dei um passo à frente, sem saber realmente como agir. Eu nunca o tinha visto tão quebrado. Fui um desastre por ser um conforto para os outros. Com Oliver então, ela nem tinha certeza do que deveria dizer. Eu não sabia que ele se importava tanto com Isabelle.
-Porque?-. Mal ouvi sua pergunta, embora ele ainda não me desse chance de responder. -Por que ninguém quer ficar comigo? Por que todo mundo me deixa em paz? -.
Ele não estava bravo comigo, ele não queria uma resposta. Eu estava falando sozinho. E ele estava chorando. Ela estava mais do que convencida de que ele havia esquecido que ela estava lá.
Inclinei-me na frente dele e coloquei a mão em seu ombro em um gesto gentil que o tirou de sua autopiedade.
Duas íris verdes e decepcionadas apontaram para mim, me fazendo entender que cada uma das minhas palavras seria decisiva naquele momento.
"Você não está sozinho, Oliver." Eu queria muito abraçá-lo, confortá-lo, fazê-lo se sentir melhor.
-Sim, mas. Você não sabe o que é... não ter ninguém e ver todos em sua vida te deixarem em paz.
Engoli em seco, sentindo um nó na garganta.
-Acredite, eu sei o que isso significa. É por isso que lhe digo que você não está sozinho.
-Olhe para mim! Estou sentado no chão do banheiro de um exame de higiene básica sujo e impróprio, chorando como um bebê porque... porque... nem sei por que diabos estou chorando! Eu não dou a mínima para Mark, Isabelle, essa porra de trabalho! -.
Eu acreditei nele nisso. Talvez descobrir a traição da minha irmã com a amiga o tenha desestabilizado, mas, como negador crónico, eu sabia que essa não era a razão daquela crise.
Senti uma estranha necessidade de ajudá-lo, pelo menos um pouco. Como eu gostaria que alguém me ajudasse nos piores momentos da minha vida.
-Eu sei, Oliver, mas você não está sozinho…-. Meus olhos arderam e fiquei com raiva ao pensar que alguém poderia se sentir assim.
-Pare de repetir!-. De repente ele se levantou do chão segurando na parede. Eu o segui com meus olhos. Sua testa estava suada e ele estava branco como um lençol.
Ela caminhou até o espelho e olhou-o diretamente nos olhos. Um grunhido frustrado saiu de seus lábios e ele se virou para mim com raiva.
Ele não me deixou falar mais nada porque estava me evitando, saiu apressado da sala, indo rapidamente em direção à mesa de sinuca. Eu o segui com o coração na boca pensando em todas as possíveis cenas que deveria ter presenciado.
Foi ainda pior. Sem dizer uma palavra, Oliver agarrou Mark pelo pescoço e deu um soco forte no rosto dele, deixando-o cambaleando enquanto cambaleava para trás, atordoado.
-Que diabos está errado com você?!-.
Jacob se colocou entre os dois parecendo alarmado.
-Você é um porco bastardo. "Eu nunca deveria ter me aproximado de você novamente", ele disse calmamente, cerrando os punhos ao lado do corpo. Ele havia desabafado toda a sua frustração com aquele golpe.
-Você está louco?! Quanto diabos você bebeu?! -. Marcos não entendeu. Ninguém parecia entender.
-Ela é uma garotinha…-.
Isabelle deu um passo à frente, incrédula, com os olhos brilhando, para longe de Mark.
-Acalme-se agora e explique-se!-.
Minha irmã ainda não tinha somado dois mais dois. Talvez porque se não estivéssemos naquele banheiro, Oliver não teria como descobrir.
-Você, você se atreve a me dizer para me acalmar?!-. Sua risada amarga provocou em mim mais ternura do que medo. "Eu não pensei que você fosse capaz de algo assim."
-Oliver, não entendo o que você é…-. Minha irmã fechou os olhos por um momento, finalmente percebendo o que estava acontecendo com o namorado e se acalmando. -Como você descobriu isso?-.
-Não é importante. O que eu sei é que para mim podemos encerrar aqui. Não quero ficar com alguém como você.
Izzy engoliu em seco e acenou com a cabeça. Ele sabia que estava errado, mas, talvez, aquele epílogo fosse exatamente o que ele queria porque, pela primeira vez, decidiu não insistir. Ela se comportou como uma covarde, não conseguiu encontrar coragem para dar um passo tão importante. Ele podia imaginar as centenas de pensamentos que lotavam sua cabeça. Viver em nossa família também não foi fácil para ela. Fui um tolo em pensar que estava tudo bem. Minha irmã precisava de mim e eu não estava lá para ajudá-la.
"Sinto muito", ele disse apenas em um sussurro, enquanto Oliver balançava a cabeça quase em desgosto. Ele olhou com desdém para o amigo que, após um momento inicial de confusão, agora parecia sinceramente arrasado com o ocorrido.
Mas é basicamente assim que funciona. Você nunca percebe o dano que causa às pessoas, especialmente àquelas de quem você gosta, até vê-las ir embora sabendo que você é o único responsável pela dor delas.
E, depois de tudo que passou, ele só conseguia imaginar como Oliver se sentia agora.
***
Parei em frente à casa dos meus pais e desliguei o motor. A viagem de volta foi muito tranquila, conhecendo meu passageiro. Ele até pediu que desligassem o rádio.
-Izzy...-.
-Não conte para mamãe e papai. "Quero que você saiba disso para mim", ele me interrompeu, parecendo quase aterrorizado com nossa cabana.
-É coisa sua. Não direi nada. Eu nunca teria permitido isso.
Suspirei. Doeu-me vê-la assim. Ela sabia que o papel da garota forte e confiante que ela exibia todos os dias era uma mera fachada. Que Isabelle Mayer era muito mais do que a garota de 22 anos que era arrogante em relação à faculdade e às pessoas. Foi ela quem sofreu todas as críticas da mãe e do pai. Quando ela se destacava na escola, era ela quem tinha que aturar frases como “por que você não é como sua irmã?” A mesma irmã que anos depois arruinou a sua vida ao seguir um caminho falso, fortemente marcado pelo seu coração. Isabelle teve sorte de não ser como eu, mas nunca percebi quantos problemas ela poderia causar até aquela noite.
"Você quer me dar um sermão?", ele retrucou, torturando as mãos com ansiedade.
-Não-. Eu não estava na posição. -Posso perguntar por que você fez isso?-. O mesmo acontece com Marcos. O melhor amigo de Oliver desde o colégio.
-Não sei-. Eu a ouvi suspirar, sua voz quebrada por um grito iminente. -Eu-Oliver e eu ficamos juntos por acidente há alguns meses. Todo esse tempo não fizemos nada além de discutir, mesmo por causa da coisa mais estúpida. Tenho certeza de que ele não me ama, nem eu o amo. Nunca juramos amor eterno e sei que deveria ter sido sincero, mas não consegui e agora ela me odeia e por todos os motivos do mundo.
Eu a vi chorando e não sabia o que fazer. Raramente acontecia que minha irmãzinha começasse a chorar na minha frente. Nós dois costumávamos ficar sozinhos naquelas horas.
-Eu sei que nunca conversamos sobre isso mas é sobre... é sobre sexo? -. Achei que tinha entendido isso do banheiro.
-Não, quero dizer, talvez até. Eu o amo, ele é um bom menino e merece uma garota que o aprecie pelo que ele é. Mas não sou a pessoa certa para ele. E eu estava errado, mas esta noite perdi peso.
Apesar das lágrimas, ela tinha certeza de que ele estava falando sério. Ela não queria machucá-lo, ela simplesmente foi uma covarde por não confrontá-lo antes. Ele estava errado, mas tinha o direito de ser feliz.
-E Mark no lugar dele? Você ama ele?-. Não sei por que, mas me deu nojo imaginar aquele loiro arrogante colocando as mãos na minha irmã. Ele certamente se aproveitou da fragilidade dela.
-Claro que não! Só vou para a cama. Ele não é meu tipo e não quero um relacionamento agora. Ela parecia determinada quando disse isso e eu queria acreditar nela. Ele tinha idade suficiente para assumir a responsabilidade.
Foi estranho ouvi-la falar assim. Estávamos separados por quatro anos e ela sempre foi minha irmã mais nova que eu tinha que proteger a todo custo. Ouvi-la falar sobre sexo era novo para mim.
"Lamento que você não tenha ouvido falar de mim antes de falar sobre isso."
-Evelyn...-.
-Espere. Sinto muito e quero que você saiba que sempre pode me procurar para qualquer coisa. Estou aqui, você não precisa fazer tudo sozinho.
Isabelle sorriu para mim, talvez pela primeira vez com sinceridade e um olhar cheio de gratidão.
-Eu te amo, Eva-.
"É a primeira vez que você me diz isso em mais de vinte anos", eu disse, caindo na gargalhada.
-Não fale besteiras-.
Oliveros
Eu tinha tomado minha decisão. Não adianta ficar aí conversando ou discutindo sobre isso. Naquela noite de sexta-feira eu estava bêbado, irritado e nervoso, mas a história não mudou. Eu já fiz isso. Com Mark, com Isabelle. Eu terminei com todos. Eles poderiam ter agido de um milhão de maneiras para não me fazer parecer o idiota do momento, mas preferiram me trair. E não havia mais lugar na minha vida para pessoas assim.
-Não quero mais ver um Meyer, nem em fotos. E naquele momento eu estava firme e determinado. Nunca mais.
Meu interlocutor olhou para mim com ceticismo, desviando o olhar de seu trabalho por uma fração de momento.
-E o que Evelyn teria feito com você agora? -.
É incrível como Andrew conseguiu extrapolar de um discurso inteiro apenas o que lhe interessava.
"Você realmente acha que eu não sabia?" Era ridículo, elas eram irmãs.
-Pelo que você me contou, sim. Ela ficou tão surpresa quanto você.
Já tinha passado pela minha cabeça que a morena não sabia de nada de tudo, ela estava tão atordoada quanto eu naquele banheiro. Mas ela não conseguia esquecer a figura feita à sua frente. Eles me embebedaram e me despiram, sem pensar muito nas consequências. É por isso que ele estava determinado a não vê-la novamente. Teria sido humilhante e ela teria olhado para mim como os psicólogos da minha antiga escola faziam. Eu não aguentava mais aqueles olhares preocupados. Também porque era bom.
-Não estou interessado. Eu terminei com ambos.
Eu não queria correr o risco de encontrar Isabelle mesmo por acaso ao sair de casa. Eu sabia que meu comportamento era completamente irracional, afinal éramos vizinhos, mas foi assim que me senti na época. Eu não queria ver nenhum deles ainda.
-Não acredito…-. Drew riu e apontou uma ferramenta para mim. -Você ainda gosta?-.
-Que?! Não! Você está louco?-. Essa conversa estava tomando um caminho perigoso e sem sentido.
- Eu não disse quem. Além disso, a minha foi uma pergunta e você obteve uma reação que vale mais do que uma resposta real. Meu primo sorriu satisfeito, diante do meu olhar irritado.
-Não está bem. quanto ele tinha? Quinze anos? É estupido-. Desviei o olhar e suspirei. Era improvável que depois de todos esses anos ele ainda estivesse apaixonado por uma garota mais velha. Esse período já havia passado há muito tempo.
-Oliver, você agora é um homem adulto, pode admitir que gosta de uma garota.
-Mas não é assim!-.
- Acho que você está agindo como uma criança. Você tem o direito de sentir algo por uma garota, mas se tiver certeza disso... -.
Essa conversa morreu exatamente como havia começado. Procurei ele em busca de conforto após o rompimento com Isabelle e acabamos conversando sobre Evelyn.
Essa obsessão boba com meu vizinho começou depois que meu pai morreu. Um momento de fraqueza que me levou, então com quinze anos, a me apaixonar pela linda e intrigante garota de dezessete anos que eu via da janela do meu quarto. Muito tempo se passou desde então.
Depois que ele se acalmou, ofereci-lhe, em sinal de paz, que fossem juntos à confeitaria tomar o café da manhã.
-Você não está trabalhando hoje?-.
-Sim, claro, mas tenho tempo-.
Foi tudo assim, assim que Brown entrou ele me pediu para ir pegar seu terno na lavanderia, pedir tinta de impressora ao seu fornecedor e voltar com seu almoço. O trabalho perfeito para seu assistente pessoal. Ele nem tinha ido discutir. A situação naquele lugar piorava a cada dia.
-Já que estou indo para lá, também tenho que cuidar do aprendiz dele-.
-Você ainda está determinado a demiti-la?
-Sim-. E foi um absurdo! Ela não poderia fazer isso sozinha. Ela precisava de ajuda e, por mais que eu odiasse meu novo emprego, não conseguia sustentá-la como antes.
Cada um de nós chegou à padaria com seu próprio veículo, para que depois do café da manhã pudéssemos retomar nossos respectivos trabalhos. Embora a vontade de voltar ao que era meu diminuísse a cada segundo. Brown nunca teria me considerado um jornalista e adeus à oportunidade de provar meu valor a ele.
“Ouvi o barulho daquela engenhoca infernal no laboratório”, comentou tia Clara, colocando sobre o balcão um cabaré de bolos.
-É uma moto, tia. Um meio de transporte prático e rápido de usar- Andrew sorriu.
-Até você bater em algum lugar, vilão.
O menino se virou e beijou o rosto da mulher, que balançou a cabeça. -Legal-.
-Eu também te amo-.
Tia Clara suspirou e simplesmente encerrou a conversa. Com o Andrew eu nunca venceria, já sabia disso.