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Capítulo 5

- Abre a porta, Guy! Ei, olá!

Levantei-me bruscamente na cama e pestanejei como um gatinho cego, tentando perceber o que tinha acontecido. O meu marido parou de ressonar abruptamente, esforçou-se por se levantar da cama e gemeu fracamente, apoiando-se esquecidamente no braço dorido.

- Ele tem estado a cacarejar como um louco desde manhã cedo....

Recostei-me silenciosamente nas almofadas e enrolei-me - estava a começar a amanhecer do lado de fora da janela, era sábado, um dia de folga bem merecido, e Vasilko, um amigo do meu marido com quem trabalharam juntos na mina, estava a gritar debaixo das janelas. E como a mulher dele só o tolera - não só constrói as casas de toda a gente, como não deixa os outros viverem. E ele está aqui por causa de um disparate! De uma coisa tenho a certeza - agora não vou conseguir dormir. O meu marido saiu de casa e eu olhei pela janela - Vasilko estava no portão com uma forquilha nas mãos e vestido à pressa.

Quando Gai apareceu, estava a gesticular vigorosamente e a explicar qualquer coisa de forma confusa. Estaria bêbedo? Mas o marido também estava a mexer-se, apesar do braço enfaixado, correu para o pátio, mas não foi para casa. Sentindo-me vagamente inquieta, atirei o meu casaco por cima da camisa de dormir e corri para a rua.

- O que é que se passa?

- Ami, volta a dormir. Eu volto já. - Ao ver-me, Guy franziu o sobrolho infeliz, segurando uma pá com a mão livre.

- Olá, Ami. - Vasiljko sorriu: “Tenho uma coisa urgente para fazer.

- Às sete da manhã? - Olhei de soslaio, desconfiado, sem sequer pensar em entrar”, ”Deve ser algo muito importante!

- Ami! - Guy levantou ligeiramente a voz. - Eu explico tudo quando chegar a casa.

- Bem, não, estou à espera de uma explicação agora mesmo. Nem sequer me vou mexer!

Vasilko suspirou alto, com um ar de dúvida no rosto, e Gai abanou a cabeça, indicando claramente que devia ficar em silêncio. Isso deixou-me ainda mais furioso. Aparentemente, ao ver a emoção na minha cara, Vasilko cedeu:

- “Vá lá, Gaius. Toda a gente vai saber. O nosso Mikola apareceu. Veio ter com a avó coberto de lama, a uivar, a rosnar, a babar-se pela boca. Tentou atacar a avó, mas ela fugiu, correu pela estrada, gritando a plenos pulmões. A nossa gente saiu a correr, correu para dentro de casa, disseram que o telhado do avô estava a pingar, que ele estava sentado a um canto, a grunhir, com os olhos vermelhos e frenéticos. Dizem que lhe aconteceu alguma coisa na floresta, ele não parece humano. Não fala, só muge. Chamaram um médico, mas acho que ele não vai servir de nada. Não é o departamento dele. - Vasilko baixou misteriosamente a voz e olhou em volta, como se tivesse medo de ser ouvido”, disse, ”acho que se virou, já vi isso em filmes de lobisomens.

- Não digas asneiras! Vivemos no mundo moderno e vocês continuam a falar disso. Vocês enlouqueceram todos em Togius. - Caio sorriu e olhou para mim: “Vou ver o que se passa.

- Tu também vives aqui”, Vasilko riu-se, ”não percebes o que se está a passar? Há meses que algo se passa na nossa aldeia e nada foi comunicado às autoridades. Estou a dizer-vos - o Mikola é um lobisomem! Cinco dias no bosque e agora está a molestar a avó até à exaustão. Se calhar foi ele que atacou a ovelha à porta do bar. Aposto que foi ele, não viste a mão dele!

- Certo, eu vou convosco. Nem pensar. - Se o avô é um lobisomem, gostava de o ver. Nunca vi um em pessoa.

Voltei para dentro de casa e vesti as primeiras roupas que encontrei. Não precisámos de tirar o carro da garagem e não demorámos mais de cinco minutos a chegar a casa do Mikola. Caminhámos a passo rápido e em silêncio, cada um de nós a pensar nas suas próprias coisas, e eu voltei a pensar no Nathan: estaria ele em casa? Ou estaria a esconder-se de pessoas como a Hannah? Voltei a sentir-me zangada comigo própria. Porque é que estava a pensar nele, porque é que me estava a lembrar dele? Parecia que o meu corpo e a minha mente estavam a viver vidas separadas - não conseguia controlar os meus pensamentos, que giravam em torno dele! Tremia, sentindo o ar frio do outono com irritação; rasgava-me os pulmões a cada respiração.

As pessoas aglomeravam-se à porta da casa do Mikola. Eram, na sua maioria, vizinhos preocupados das casas vizinhas, que se acotovelavam à entrada, hesitantes em entrar. A avó Prokofya era o centro das atenções, tapando a boca mirrada com um lenço e uivando baixinho, como se estivesse num funeral. Se calhar, para ela, estava mesmo. Quando nos viram, afastaram-se, murmurando qualquer coisa como: “Não vão, ele é violento.

O palheiro desarrumado era frio e escuro. Tropecei imediatamente num saco de cebolas que estava na soleira e praguejei baixinho. Era uma espécie de farsa - entrar em casa de um estranho com forquilhas e uma pá, acreditando mesmo que havia um lobisomem perigoso na sala. Tudo o que eu sabia sobre lobisomens era que eram uma personagem de ficção. Uma pessoa que se transforma num lobo quando a lua está cheia não pode ser real. Não é natural. Afinal de contas, a fisiologia não o permite. Tal capacidade não é uma recompensa, é mais um castigo. Mas aqui, se nos lembrarmos dos filmes, a maioria dos lobisomens representa o mal, e há pouco de bom neles. Mesmo que o avô de Mikola se tenha transformado em lobo, porque é que não voltou atrás? Era de manhã cedo e a lua já tinha desaparecido há muito. Ou será tudo uma ficção cinematográfica?

- Ei, está alguém em casa? - Estremeci involuntariamente ao ouvir a voz de Vasilko e agarrei a manga do meu marido.

- Eu disse-te para ficares em casa”, murmurou Caio, e nesse momento ouvimos um rugido vindo do segundo quarto. Era definitivamente animalesco! Senti arrepios na pele.

- Avô, bebeste muita bebida alcoólica? Eu disse-te para não a tirares ao Grishka, ele fá-la com maçãs ácidas!

Olhámos para a porta da sala: à direita, um sofá montado, uma parede antiga com portas de vidro encostadas à parede, à esquerda, perto da janela, uma mesa sobre a qual brilhava orgulhosamente um grande televisor com o seu ecrã apagado. Tudo igual ao de toda a gente. Exceto que Mikola não estava em lado nenhum. Cheguei a olhar para o teto, lembrando-me de repente de uma cena de um filme de terror em que um monstro retorcido com uma cara retorcida estava sentado a um canto, mas não havia nada disso.

- Mikola! Onde é que tu estás? Pára de brincar! - Vasilko abanou a forquilha de forma ameaçadora e ouvimos de novo o rugido.

Dois pontos brilhantes brilharam debaixo da mesa e só passados alguns segundos é que percebi que eram olhos e que o avô do Mikola estava sentado debaixo da mesa. Como é que ele se tinha conseguido enfiar naquele espaço tão pequeno era um mistério, cuja resposta eu não queria saber. O Gaio empurrou-me para o lado e sussurrou-me para ir lá para fora. Mas eu abanei a cabeça em sinal de negação - nunca saía quando isto estava a acontecer. Talvez fosse apenas uma espécie de raiva.

- Bem, encontraste um lugar para te esconderes. - Vasilko fingiu surpresa, mas eu percebi, pelos nós dos dedos brancos, que ele também estava tenso. “Vamos, saiam, ou estão presos? Anda, eu ajudo-te a sair.

Ele rosnou de novo, fazendo-me gelar o sangue. Parece que os rumores são, afinal, parcialmente verdadeiros. Não acredito em lobisomens, mas alguma coisa aconteceu ao avô, isso é certo. Desde que não fosse contagioso. A sugestão deixou-me pouco à vontade e dei um passo atrás.

- Não sejas parvo, avô! Sai daqui! Estou a contar até três. Um, dois, três!

Nesse momento, a mesa estremeceu e, se não estou em erro, algumas lascas voaram para o lado. Mal conseguia evitar esfregar os olhos. Isto não pode estar a acontecer! A enorme televisão inclinou-se e rolou suavemente para o chão. Houve um estalido ensurdecedor de plástico. Antes de saltar para cima de Vasilko, o avô Mikola endireitou-se até à sua altura máxima, e eu pude ver os seus olhos a brilhar e a sua boca aberta, revelando dentes tortos e demasiado compridos. Parecia que tinha umas mechas de cabelo a sair da cara, como se não se tivesse barbeado bem ou o tivesse feito no escuro. Foi a última coisa em que reparei. No segundo seguinte, ouvi o grito de Vasilko, de partir o coração.

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