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Capítulo 6

Rose

Quem em sã consciência manda flores às 20h? Eu não sabia o que pensar e o semblante fechado de Antônio me fazia ficar ainda mais em dúvida.

— Senhoritas, senhora — ele falou olhando para minhas irmãs — Fiquem à vontade, vou me recolher — ele não olhou mais para mim, apenas se virou e saiu andando direto para as escadas.

— Vocês brigaram? — Dulce falou atraindo minha atenção.

— Eu não tenho que lhe dar explicações. — falei levando o buquê para a cozinha e o colocando em um vaso. Eu não sabia o que sentir, nem o que pensar. Eu queria sair daquele furacão de emoções que estava me arrastando para um lugar desconhecido.

Voltei para a sala e me sentei na poltrona em frente as três.

— Não vai falar mais nada? — Emma questionou — O que está acontecendo com você?

— Nada! — fui enfática. Eu não queria que elas se metessem em minha vida. Eu não precisava de mais um se achando no direito de exigir algo que eu não estava disposta a dar.

— Rose, nós somos suas irmãs e queremos o melhor para você, não seja tão dura com a gente. Sabemos que quando está assim é porque as coisas não estão indo bem. Então por favor, lembre-se que nós te amamos e que nunca vamos te desamparar — Bria se levantou e veio em minha direção se sentando em meu colo e me abraçando forte.

— Irmã, nós sentimos sua falta — ela sussurrou e uma lágrima correu por meu rosto.

— Eu também sinto a de vocês — suspirei tentando ser forte e não demonstrar a devastação que acontecia em meu peito sem eu entender exatamente o porquê.

—Então nos diga o que está acontecendo, para que possamos te ajudar — Emma me olhou intensamente. Sua barriga de 5 meses estava redondinha e eu podia sentir o quanto ela estava feliz com esse momento de sua vida.

—Eu não tenho o que dizer, já que também não sei. Eu só preciso de tempo, só isso.

— Tempo? — elas se olharam sem entender o que eu estava dizendo.

— Tempo, somente o tempo vai curar os pequenos buraquinhos que se abriram em meu peito.

— E por que eles se abriram? Nos fale irmã, eu não quero que se sinta sozinha. Estamos aqui para tudo o que precisar.

— São coisas que somente eu posso resolver.

— Você não é mais criança, Rosely — Emma ficou séria — Sabe onde moramos e quando precisar se abrir estaremos lá para você. — Eu assenti com a cabeça apertando Bria um pouco mais — Mas saiba que se Antônio tiver alguma coisa a ver com isso, eu vou arrancar o couro dele — ela se levantou alisando a barriga e eu sorri.

— Não tem nada a ver com ele, sou somente eu. Não se preocupe — eu mentia, e ela sabia, todas sabiam. Eu não sabia o que pensar em relação a ele. Eu não sabia o que sentir perto dele. Na verdade eu não deveria sentir nada, talvez dar uma chance a Arthur fosse o único jeito de afastar esse incomodo que se instalava em meu peito.

A campainha tocou e ouvi Janice ir até a porta atender.

— Boa noite meninas — Álvaro entrou na sala e Emma foi em sua direção. — Vim buscá-las. — Ele falou e eu já comecei a sentir falta delas.

— Venham amanhã, vou fazer um chá da tarde para nós. Otávio adora brincar no jardim nesse período, assim vocês poderão vê-lo.

— Sim pode deixar, vou trazer uns quitutes novos que Frida começou a fazer e amamos — as menores reviraram os olhos. — Ué que foi, eu e meu bebê amamos.

— Só vocês — Álvaro falou e todas rimos. — E meu irmão, onde está?

— Já se recolheu — falei.

— Já? Ele está mesmo mudado — tentei não pensar o porquê. — Bom, vamos meninas, já está ficando tarde e tenho certeza de que Rose também quer descansar. — Elas concordaram e abracei forte cada uma delas.

— Não seja boba, ele gosta de você, mas tem tantos bloqueios que nem ele nem você estão percebendo — Emma cochichou em meu ouvido e revirei os olhos.

— Ele não gosta de mim, me tolera, essa é a verdade. — Emma me encarou e não disse mais nada me dando apenas um beijo no rosto antes de sair. Fechei a porta e me encaminhei para a cozinha onde meu prato de comida estava coberto por um pano de prato sobre a mesa.

Me sentei e olhei a comida, mas não senti fome, não senti nada, apenas o vazio que continuava ecoando em mim, com uma sensação estranha de estar fazendo algo muito errado, mas ao mesmo tempo que era certo para mim.

Antônio

A noite foi longa e insone, tentei diversas vezes fechar os olhos e desligar, mas a moça de cabelos negros, olhos puxados e pele branca se fixaram em minha mente. Tentei ler, mas lá estava ela novamente. Tentei pensar em Margareth, e mesmo assim Rose continuava tomando seu lugar.

"Ninguém vai tomar o meu lugar!"

Meu subconsciente me lembrou, as palavras de minha mulher sempre ecoavam, mesmo que o rosto de Rose permanecesse em meus pensamentos. Eu tinha prometido, jurado que nunca colocaria ninguém em seu lugar e continuaria assim, até que meu tempo se findasse na terra.

E depois de várias tentativas resolvi que o melhor era ir até o escritório trabalhar, já que eu não conseguia dormir de forma alguma.

Me afundei nos papeis que se acumularam do dia anterior e observei todos os registros que meus irmãos tinham feito. Eles queriam muito essa nova matéria prima para a produção de tapetes na fábrica. Os valores não eram absurdos pela qualidade que o fornecedor tinha nos prometido e as cores eram tão vivas que eu sabia que eles tinham tomado a escolha certa ao me fazer enxergar que precisávamos mudar.

Vi o amanhecer do sol, com sua subida lenta até dominar todo o céu, meu corpo não parecia sentir falta do descanso, ele estava tão aceso quanto o astro no céu.

— Com licença — ouvi a batida na porta e Janice entrou com uma bandeja.

—Entre. — Ela depositou uma xícara de café em minha mesa.

— A srta. Rose, pediu para avisar que o café da manhã ficará pronto em 5 minutos. — E lá estava ela se preocupando novamente. É só porque eu sou seu patrão, seu idiota. Me repreendi, eu tinha que parar de pensar que ela fazia as coisas para me agradar. Isso não existia.

— Diga, que quero que ela me acompanhe, preciso tirar umas dúvidas com ela — MENTIRA! Eu só queria a sua companhia.

— Sim, senhor —ela saiu e olhei para o relógio. Já eram 7 horas e eu nem havia percebido, tão imerso a pensamentos.

Tomei em um gole o café preto e forte, sem açúcar, do jeito que eu gostava. Era isso, olhar para ela e me convencer de que nada iria mudar, ela continuaria cuidando de Otávio e a atração que eu estava sentindo sumiria assim como ela chegou.

Cheguei à sala de jantar e Rose acabava de entrar, arrumando os fios de cabelo que estavam fora do lugar. Seus olhos me avaliaram e eu me concentrei nos seus tentando ler qualquer coisa que eles pudessem me passar.

— Bom dia — falei mais alto do que gostaria. Eu parecia uma adolescente.

— Bom dia, senhor — eu odiava tanto esse senhor, era tão formal, tão rude.

— Já disse para não me chamar assim — me aproximei dela e puxei a cadeira para que se sentasse. Ela nada respondeu, mas não recusou minha oferta se sentando ao lado da cabeceira da mesa, onde eu me sentava.

— Janice disse que gostaria de falar comigo. — Acenei com a cabeça me sentando em seguida.

— Como Otávio passou a noite? — ela me serviu novamente com café e depois a si. Peguei a cesta de pão e ofereci a ela que recusou, pegando uma bolacha caseira que eu sabia que era uma das suas especialidades.

— Bem, não acordou nenhuma vez, aparentemente era uma gripe, como o Dr. Daniel havia falado. Mas vou continuar com a medicação até amanhã para que ela não volte.

— Bom, faça isso. Mas se precisar chamar o doutor para dar mais uma olhada nele, fique à vontade.

— Sim, senhor — bufei e vi o canto de sua boca se curvar em um pequeno sorriso.

— Como está Emma, não tive tempo de perguntar ontem.

— Está bem, disse que ontem ela e Álvaro foram a uma nova loja de bebê que abriu na cidade.

— Deveria ir até lá também. — falei tomando mais um gole do meu café e pegando uma bolacha.

— Eu?

— Otávio não precisa de nada? — a olhei com curiosidade.

— Ah sim, claro — ela ficou sem jeito e não entendi sua reação. — Vou dar uma olhada em suas roupas, talvez ele precise sim.

— Compre tudo o que ele precisar, depois peça para que o dono mande a conta para mim na fábrica.

— Sim, senhor.

— Não tem como eu te fazer parar com isso? Me chame de Antônio, Rose, apenas Antônio. — bufei.

— Eu não posso, senhor — seus olhos demonstravam apreensão.

— E por que não?

— Não é certo.

— Eu digo que é.

— Mas eu digo que não — e lá estava a Rose defensiva que eu via todos os dias.

— Tudo bem, não vou mais entrar em atrito com você. Não quero mais isso. Nós tínhamos uma boa convivência, não sei quando isso mudou. Me chame do que quiser. — Ela apenas confirmou com a cabeça e abaixou o olhar. —Me desculpe por ontem, novamente. — Me levantei sem esperar por qualquer resposta dela. Eu não conseguia ficar muito tempo sem falar nada, sem acabar provocando-a de alguma forma.

Subi as escadas correndo e fui até o quarto do meu filho. Ele ainda dormia quando entrei, seus traços tão parecidos com os meus. O admirei por um tempo sem me preocupar com nada. Sai do quarto e terminei de me arrumar no meu.

Desci as escadas e coloquei meu blazer para ir até a fábrica. Dei uma última olhada em minha casa e sai, era como se eu esperasse algo antes de sair, mas ainda não sabia o quê.

— Bom dia, Sergio — ele me cumprimentou e me levou a fábrica, questionando se eu tinha lido o jornal de hoje. Neguei e ele me passou o seu exemplar. Na manchete de Antunes em Fatos, estava a foto do Duque com sua família e a breve explicação sobre a visita deles a cidade. Ali eles colocaram tudo sobre a vida deles e principalmente que os herdeiros eram solteiros e em época de se casar.

— Não sei para que todo esse exibicionismo. — Mas agora eu tinha mais certeza ainda de quem tinha mandado as flores para Rose, e não fiquei nenhum pouco satisfeito.

Cheguei à fábrica mordendo o canto da boca de raiva.

— Bom dia, meu filho — Mamãe veio me abraçar e retribui o carinho.

— Bom dia — mas minha voz transpareceu o que eu não queria revelar.

— Está tudo bem?

— Sim — falei me afastando, mas ela veio atrás de mim.

— Não está não, Antônio Campos. Te conheço melhor do que você mesmo.

— Pois é, então já sabe que não vou querer conversar sobre isso.

— É algo com meu neto? — seu olhar preocupado me encarou.

— Não, ele está ótimo — ela continuava me encarando. — Não é nada mamãe, não se preocupe, logo eu resolverei tudo.

— É claro que me preocupo. Estou te achando mais distante que o normal, filho. Você sempre foi fechado, mas depois de tudo que aconteceu, não quero que fique doente.

— Não vou, pode ficar despreocupada — era a mesma coisa que dizer se preocupe muito.

— Vou até sua casa, conversar com Rose. — Sentenciou e conseguiu toda a minha atenção.

— Por quê?

— Porque gosto dela e estou com saudades.

— Você a viu ontem — eu realmente tinha medo desse contato.

— Mas não conversei, vocês começaram a discutir e eu nem pude falar com ela.

— Já resolvemos isso.

— Acho bom, aquela menina tem que ser tratada como uma rainha, meu filho. Ela é muito especial e trata vocês bem demais.

— Eu sei.

— Não parece — ela saiu da sala sem falar mais nada e me deixou questionamentos que desde a madrugada eu não conseguia responder.

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