Capítulo 25
Foi um lindo dia de verão
Nem todas as lesões são superficiais. Alguns são mais profundos do que se pode imaginar. É impossível vê-los a olho nu. E depois há as lesões que nos pegam de surpresa, aquelas que nunca teríamos imaginado. O segredo para qualquer tipo de lesão é cavar fundo o suficiente para encontrar a verdadeira fonte da dor e, uma vez encontrada, é nosso trabalho curá-la.
“Nona? Ellie se senta em uma cadeira na cozinha.
Marguerite, que guarda seus preciosos pratos de porcelana nos armários, levanta a cabeça para encarar a filhinha.
"O que é isso?, ela pergunta.
A jovem hesita por um momento sobre como abordará o assunto. Finalmente, ela suspira e começa.
"Você se lembra quando Charlie veio deixar Annie em casa?" »
A velha acena com a cabeça, embora não saiba de onde Ellie vem. A jovem brinca nervosamente com as mãos sobre a mesa de madeira pintada de branco.
“Você me prometeu que explicaria o que aconteceu a Charlie, mas não o fez”, Ellie estremece. Você pode me dizer algumas palavras agora? »
Surpresa com o pedido, Marguerite coloca delicadamente os pratos à sua frente no balcão.
"Tem certeza de que deseja conversar sobre este caso?" Não é da nossa conta, a velha levanta uma sobrancelha.
Ellie balança a cabeça.
- Lucy o contratou há alguns dias, a garota informa.
- Oh. »
A velha fica surpresa por Lucy ter concordado em contratar o jovem. Ela sabe que o povo de Edgartown desconfia muito de Charlie.
" São boas notícias. »
Ellie dá de ombros sem saber o que dizer. Desde que Charlie trabalha ao lado dele, ele tem estado quieto como um túmulo e gentil como a porta de uma prisão. Quando a garota explica algo para ele, ele apenas balança a cabeça de maneira abstrata, como um robô. Ele até decidiu não receber ordens, mas apenas servir, decisão que Lucy parece aderir. Dessa forma, ele não precisa falar com os clientes.
"Por favor, vovó, eu adoraria saber por que todo mundo parece estar sussurrando sobre Charlie nesta cidade", Ellie bufa, cansada de ficar no escuro quando se trata do jovem. O que aconteceu ? ela pergunta com uma voz calma.
Marguerite suspira e se acomoda ao lado da neta, cruzando as mãos sobre a mesinha branca sobre a qual está colocada uma vela.
"O que exatamente você quer saber?" pergunta Margarida.
“Eu gostaria de saber o que aconteceu com a família Wolf”, diz Ellie honestamente.
Marguerite suspira mais uma vez, mas finalmente decide falar.
"Seis meses atrás, algo terrível aconteceu com esta família", começa Marguerite, com uma expressão séria no rosto enquanto Ellie deseja saber mais. Era um lindo dia de verão. O sol estava forte, o céu estava de um azul tão claro que era misturava-se com o mar, e o ar estava tão quente que as crianças ficavam sem camisa lá fora. Foi um dia especial, pois neste dia de verão comemoramos os quarenta e cinco anos da cidade. Edgartown nunca esteve tão movimentada como hoje. »
Marguerite sorri levemente com a lembrança enquanto Ellie ouve atentamente.
“O pequeno porto tornou-se o recanto dos jovens que se refrescavam saltando do alto dos pequenos pontões. Lembro-me de ter passado por ali naquele mesmo dia e de que todas as crianças da nossa pequena cidade, de todas as idades, estavam lá. »
Marguerite relembra aquele dia que começou tão bem.
“Charlie também estava lá com os amigos”, acrescenta Marguerite ao ouvido atento da neta. Você deveria tê-lo visto, ele não tinha nada a ver com Charlie atualmente. Ele estava cercado pelas pessoas com quem cresceu. Até me lembro dele sorrindo naquele dia. »
Um leve sorriso se forma nos lábios da garota.
“Ele e os amigos se divertiram jogando os pequenos na água. O dia estava tão lindo, mas infelizmente não durou. »
A velha faz uma pausa em seu discurso. Suas mãos estão apoiadas na mesa de madeira, amarradas. Seu rosto está fechado e é difícil identificar seus pensamentos.
“Por volta das 22h, a casa do Lobo pegou fogo”, ela anuncia de uma só vez.
Os olhos de Ellie se arregalam, mas não diz nada, deixando a velha terminar sua explicação.
“Thomas, marido de Mona, foi o primeiro a chegar ao local e...” Marguerite hesita em continuar.
Suas mãos amarradas se movem sobre a mesa enquanto seu olhar vagueia. Um silêncio pesado e pesado se instala na pequena sala. Está ficando tarde e a sombra da vela dança no rosto da velha.
“E que vovó? Ellie pergunta, ansiosa para saber o que vem a seguir, mas sua voz é calma, trazendo Marguerite de volta à sua história.
A velha suspira antes de continuar sua história.
“Charlie já estava lá. »
Marguerite olha para Ellie. Esta última fica maravilhada com o que ouve.
“Thomas me ligou imediatamente e fui até lá. Quando cheguei, muitas pessoas já estavam lá. Você deveria tê-los visto, ele estava ali sem fazer nada. »
Marguerite franze a testa e levanta a voz com essa lembrança.
“Mas não foi isso que mais me impressionou, a velha suspira mais uma vez, lembrando-se perfeitamente da cena. Charlie ficou na frente de sua casa, com as costas retas e o rosto fechado. Ele parecia tão calmo. Seus olhos estavam fixos nas enormes chamas que assolavam sua casa. Ele estava tão imóvel que era como se o tempo tivesse parado. Seu rosto estava coberto de terra preta, como quem volta da mina”, conta Marguerite.
Ellie escuta atentamente, sem tirar os olhos da avó.
“Pouco depois os bombeiros chegaram, afastando todo mundo. Eles imediatamente tentaram apagar as chamas. Foi quando Charlie acordou do transe. Ele entrou em pânico e começou a correr em direção à casa. Os bombeiros o pararam, mas ele lutou. Marguerite suspira e passa a mão fraca no rosto dele. Você deveria ter visto, Ellie. »
A velha senhora pousa delicadamente a mão na da neta.
“Era como se ele tivesse acabado de perceber o que estava acontecendo. Lembro-me do rosto dele naquele momento..."
O olhar de Marguerite se perde na chama inocente entre ela e a neta.
“Ele estava tão histérico, tão irreconhecível. O grande e charmoso sorriso que antes estava gravado em seu rosto havia desaparecido. Apenas cinzas salpicaram seu rosto, assim como algumas feridas. Os bombeiros então o embarcaram em uma ambulância, explica Marguerite.
“É… Ellie hesita. Eles estão todos mortos?
Marguerite assente, triste.
— O incêndio matou os pais de Charlie e seu irmão. »
A respiração de Ellie fica presa com essa revelação. Ela tem dificuldade em imaginar o que o jovem deve ter sentido.
“E Ana? pergunta a garota.
— A pequena Annie foi convidada para ir à casa de um amigo naquela noite.
"Oh", isso é tudo em que Ellie consegue pensar.