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Quero exclusividade (II)

- Hoje iremos ao laboratório de arte e vocês farão uma escultura de gesso com o seguinte tema: “O homem e suas mudanças físicas através dos séculos”. Quero muita criatividade... Soltem suas mentes... E produzam algo único.

Levantei o dedo e ele fingiu não me ver por um tempo, enquanto continuava a falar. Até que comecei a balançar meu braço para um lado e para o outro, sendo que o professor Jax foi obrigado a se dirigir a mim:

- Senhorita Dave... Alguma dúvida?

- Creio que minha mente e criatividade possam ir bem além, senhor Gatti... Minha dúvida é: posso fazer o pênis na minha escultura?

Ele me encarou um tempo antes de responder:

- Como eu disse... Use sua criatividade e imaginação.

- Acontece que estou em dúvida porque quero fazer um pênis bem grande na minha escultura...

Risos novamente até que Jax novamente se saiu bem:

- Se sua criatividade quer modelar um pênis grande, já que acredita que esta seja a mudança física do homem através dos séculos, sinta-se à vontade. Só não esqueça que não é somente sobre modelar sua escultura... Não pode fugir do tema que propus.

- Por que nas esculturas antigas os pênis são tão pequenos? – Uma colega questionou.

- Ótima pergunta, senhorita Stanford – ele aplaudiu-a - Para os gregos e romanos antigos, órgãos genitais grandes eram considerados feios. Os escultores só modelavam órgãos genitais pequenos para deixar claro: este homem é um intelectual racional e, como tal, tem seus instintos sob controle.

- Que interessante! – Outro colega exclamou.

- E o senhor tem seus instintos sob controle, professor? – Provoquei, com um sorriso debochado.

- Sim... Ao menos no trabalho, onde o intelectual e o racional habitam em todo meu ser! Em casa, com minha esposa, abandono este ser intelectual e me torno um animal irracional. – Sorriu e piscou.

Todos aplaudiram e houve até quem assobiou, venerando a ideia de que ele só dormia com a esposa e era um homem fiel. Engoli em seco a afronta e percebi que talvez Jax não cederia às minhas investidas.

Quando o professor Jax nos encaminhou até a sala onde era o laboratório de artes plásticas, peguei minha bolsa e fui diretamente para a sala do reitor.

- Quero falar com o reitor. – Olhei para a secretária.

- O senhor Jackson está ocupado.

Ignorei a fala dela e fui em direção à porta, abrindo-a. Deparei-me com o senhor Jackson lendo alguns documentos, concentrado.

- Senhorita... Dave? – Retirou os óculos de grau quando me viu, surpreso.

Fechei a porta atrás de mim e sentei-me à frente dele, sem que me solicitasse.

- Vim falar sobre o senhor Gatti. – Anunciei, sem rodeios.

- Algum... Problema? – Ele arqueou a sobrancelha.

- Sim... Muitos problemas.

- A propósito, como está seu pai, o senhor Júlio Dave?

- Ocupado, como sempre. – Revirei os olhos, entediada.

- Será que o senhor Dave concorrerá este ano novamente a governador do nosso estado? Seria um prazer votar no melhor político que já tivemos à frente de...

- Estou me fodendo para o meu pai! – Deixei claro – Vim aqui denunciar um caso de importunação sexual.

- Importunação sexual?

- Sim... O senhor Gatti está me importunando sexualmente.

- Poderia, por favor, não usar o termo “fodendo” na minha sala, senhorita Dave?

Eu ri:

- Meu pai praticamente sustenta esta faculdade com suas “grandes doações” em dinheiro vivo para bancar bolsistas folgados... E o senhor diz que não posso dizer um simples “fodendo”? Este lugar praticamente é uma extensão da minha casa, já que é sustentado pelo meu pai. Portanto, falo o que quero, como e da maneira que eu bem entender, senhor Jackson.

Ele engoliu em seco e percebi suas bochechas se enrubescerem de imediato. Não era novidade para ninguém que meu pai mandava e desmandava naquela porra de cidade, estado e havia sido inclusive cogitado para ser presidente. Júlio Dave ajudava praticamente todas as instituições de caridade, doava dinheiro para faculdades, a fim de manter quem não tinha condições com bolsas de graduação e pós e eu tinha que cuidar com a minha boca? Não, eu não precisava ter papas na língua! O sobrenome Dave mantinha aquele homem que estava à minha frente no poder.

- Os atos de 'passar a mão', apalpar, beijar à força, ejacular em público, entre outras ações, que aconteçam sem o consentimento da vítima e sem violência física ou grave ameaça são considerados “importunação sexual”. – Deixei claro.

- E qual destes atos o senhor Gatti cometeu, senhorita Dave?

- Durante a semana tive algumas dúvidas sobre a aula dele... E depois que todos saíram, fui até sua mesa e pedi esclarecimentos... Não quis perguntar durante a aula, em público, porque não me senti a vontade e tive um certo receio de ser ridicularizada. Acontece que primeiro o senhor Gatti resistiu em esclarecer minhas dúvidas, alegando que já o tinha feito em aula, sendo que ele não é pago por hora e sim mensalmente, como é de seu conhecimento. Ou seja, tinha obrigação sim de me auxiliar e sanar minhas inquietações intelectuais...

- Inquietações intelectuais? – Ele arqueou a sobrancelha, confuso.

- Então, depois eu ter praticamente implorado por ajuda ele decidiu enfim me auxiliar e enquanto eu falava, recostei-me à mesa, para mostrar-lhe meu laptop... E senti seus olhos sobre meus seios, de forma libidinosa e...

- Não há como afirmar isto, senhorita Dave. Talvez ele realmente estivesse olhando para o laptop. O senhor Gatti é um dos melhores professores que temos na faculdade de Belas Artes. Além de totalmente qualificado, é um ótimo profissional... Ético, dedicado e... Sempre muito elogiado não só pelos alunos, mas também por seus colegas.

- Ele tocou meus seios, senhor Jackson!

- O que? – Ele franziu a testa e arregalou os olhos – O senhor Gatti fez isto?

Deixei as lágrimas escorrerem e ele me entregou um lenço de papel:

- Acalme-se, senhorita Dave... Por favor.

- O senhor Gatti tocou meus seios de propósito... E sinceramente, não esperarei chegar ao ponto de deixá-lo me beijar à força ou ejacular em mim, sem meu consentimento, para tomar uma atitude e denunciá-lo por “importunação sexual”. Quero o professor de Artes Plásticas fora desta faculdade... E não gostaria de envolver meu pai nisto, se é que me entende. Afinal, não quero prejudicar a faculdade e o nome que ela tem a zelar com o que me aconteceu.

- Eu... Sinceramente não esperava isto do senhor Gatti... – ele balançou a cabeça, atordoado – A senhorita... Fará uma denúncia formal, na Polícia?

- Eu sei que deveria... Mas não desejo prejudicar o senhor Gatti de tal forma, já que sei que ele tem uma família para sustentar e talvez não consiga nunca mais um emprego. Apesar de tudo, sou humana e empática.

- Mas... A senhorita foi... Tocada por ele. Se sequer passar pela cabeça do seu pai que isto aconteceu nas dependências da faculdade e eu não tomei as providências cabíveis... Nem quero pensar no que o senhor Dave faria.

- Posso guardar este segredo, senhor Jackson.

- Não é sobre guardar um segredo, senhorita Dave... Eu não posso deixar isso em sigilo. Irei demitir o senhor Gatti e obviamente ele deverá saber o motivo. Iremos até o fim nesta história e os culpados serão punidos.

- Não... Definitivamente eu não gostaria de prejudicá-lo desta forma. Quem irá pôr comida na mesa daquelas pobres crianças que ele chama de... Filhos?

- A esposa dele tem uma doença autoimune. O senhor Gatti definitivamente precisa muito deste emprego, até mesmo pelo plano de saúde. E exatamente por este motivo ele deveria ter sido correto e ético e não ter cometido o crime que cometeu dentro desta instituição. Ele será punido... Não só como funcionário desta faculdade, mas também na forma da lei.

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