7.O diabo mora ao lado
— Eulália, pode me fazer um favor? — Carolina perguntou ao entrar no quarto da filha.
— Que favor, mãe? — Perguntou Eulália, fechando a apostila.
— Vá até o mercado e compre algumas coisas que estão faltando?
— É sério? Mamãe, você sabe que eu detesto fazer compras.
— Por favor, filha? — Insistiu sua mãe.
Eulália suspirou.
— Ai, está bom, mas só dessa vez!
— Aqui está a lista. — Disse Carolina sorrindo.
Eulália pegou a lista e deu uma olhada.
— Hum, e o dinheiro? — Perguntou Eulália estendendo a mão.
— Está aqui. — Disse Carolina, entregando o dinheiro.
Eulália vestiu um casaco, pegou sua bolsa e saiu. Por sorte, o mercado não ficava tão longe. Ela só precisaria andar umas duas quadras.
Assim que chegou ao mercado, ela apanhou uma cesta e sem perder tempo, pegou todas as coisas da lista e entrou na fila que não estava grande. Fazia muito frio aquele dia e poucas pessoas se atreveriam a sair de casa.
Quando só faltava uma pessoa antes de Eulália ser atendida, ela ouviu passos pesados atrás dela. Alguém com um perfume forte e cantando Smells Like Teen Spirit estava atrás dela. Ela não se virou para trás para ver quem era aquele doido, mas podia imaginá-lo tocando uma guitarra invisível. Até que o maluco cantava bem. Talvez tivesse uma banda ou algo assim.
Eulália colocou suas coisas no caixa. A moça passou tudo rapidamente e Eulália empacotou suas compras.
— Quanto deu?
— É incrível como esse mundo é pequeno! — Disse o maluco bem próximo a ela.
Ela conhecia aquela voz… Mas não. Não podia ser ele. Seria muito azar!
Eulália pegou o dinheiro em sua carteira e pagou a mulher. Então, pegou suas compras e saiu apressada. Quando já estava fora do mercado, ela se virou e olhou… Sim. Era ele! Maldito Jaden. Mas o que ele estava fazendo ali… Com tantos mercados na cidade, ele escolheria justo aquele? Eulália correu ao ver que ele já estava pagando suas compras.
Jaden apanhou suas sacolas e saiu do mercado. Viu Eulália correndo como se tivesse visto o diabo e achou divertido. Ela estava fugindo dele? Ele adorava persegui-la. Era tão excitante! Sem pensar duas vezes, ele saiu correndo atrás dela e quando já estava perto o bastante, seguiu-a em silêncio. Ela nem desconfiava que estava sendo seguida. Quando já estava na rua em que morava, Eulália parou de correr. Uma mão tocou seu ombro. Ela gritou e se virou assustada.
— Buuu! — Disse ele, rindo.
— Ai, eu não acredito que você me seguiu até aqui.
— Eu não segui você!
— Hmm, Hmm…
— Eu moro por aqui.
— Sei…
— Está vendo aquela casa amarela ao lado da oficina de carros? Eu moro ali.
— Me engana que eu gosto.
— Não acredita em mim? Eu posso provar. — Disse Jaden tirando um molho de chaves de seu bolso. — É só me seguir.
Eulália o seguiu até a casa, e Jaden abriu o portão, mostrando que aquela era mesmo a sua casa.
Eulália não podia acreditar que ele morava há apenas cinco casas dela. Isso era um pesadelo. Tinha de ser!
— Viu só? Eu não estava mentindo!
— Ok. Eu tenho de ir agora.
— Se quiser, eu posso te acompanhar até em casa. Você sabe… Pra te ajudar a carregar as sacolas. — Disse Jaden, meio sem jeito.
— Não precisa. Minha tia não gosta de estranhos.
— Mora com sua tia?
— Não. Só estou passando alguns dias enquanto minha mãe está viajando. — Mentiu Eulália, torcendo para que ele acreditasse.
— Você sabe que outro dia eu vi o Bryan por aqui e fiquei pensando… O que ele estava fazendo por aqui?
— Mesmo? Eu não sei nada sobre isso. Bryan não me disse nada.
— Hum, e onde fica a casa da sua tia?
— Por que tanto interesse em saber onde estou? — Perguntou Eulália, desconfiada.
— Hum, nada. Curiosidade. — Falou Jaden disfarçando.
— Então, tchau. Nos vemos amanhã.
— Até amanhã. — Falou Jaden e deu um beijo no rosto dela, a surpreendendo.
Eulália corou, mas não pode negar a si mesma que gostou. Jaden sorriu, malicioso, e disse:
— Ou… Você pode entrar e podemos beber alguma coisa.
— Outro dia, quem sabe...
— Por que soou como um “nunca”? — Ele disse ainda sorrindo. — Para sua sorte, eu sou persistente e não desisto fácil do que quero.
— E o que você quer?
Jaden chegou tão perto que apenas alguns centímetros separavam seus lábios dos dela.
— Será mesmo que eu preciso responder a essa pergunta? Achei que estivesse explícito desde o início.
Eulália sentiu um arrepio e recuou depressa, antes que cedesse à tentação de aceitar o convite dele para tomar alguma coisa.
— Sabe que… Fugir de mim, não mudará o que sinto por você? Ao contrário… Só me deixará com mais vontade de persegui-la.
— O psicopata apaixonado… — Brincou Eulália.
— Só… Apaixonado, eu diria… — Ele falou sério.
Os dois se encararam em silêncio por um tempo, até que ela se virou e foi embora. Caminhando rapidamente e sentindo que ele ainda a encarava fixamente. Ela ainda não entendia porque ele a deixava tão nervosa e ao mesmo tempo tão curiosa sobre ele.
Eulália decidiu passar reto por sua casa e virar na outra rua. Ficaria escondida por lá até ter certeza de que Jaden não a estava seguindo ou a olhando, como ela sabia que ele estava, mas, sua mãe estragou seu plano ao aparecer no portão.
— Droga! — Disse Eulália baixinho.
— Você demorou! — Disse Carolina.
— Eu, literalmente, vim correndo! — Eulália olhou para trás.
Jaden não estava mais em frente ao portão. Ufa! Com muita sorte, ele não havia descoberto onde ela morava. Eulália entregou metade das sacolas a sua mãe e entrou em casa.
Após ajudar sua mãe a guardar as compras, Eulália foi para seu quarto e ligou para Bryan.
— Oi, Eulália? Tudo bem? — Disse Bryan, feliz por ela ter ligado para ele.
— Oi, Bryan. Eu queria te pedir um favor.
— Sim. O que você quiser. — Disse ele se afastando do computador. Antes dela ligar, ele estava jogando RPG.
— Quando vir a minha casa, deve tomar muito cuidado para não ser visto por ninguém.
— Por quê? — Perguntou Bryan. Será que ela estava com vergonha de ser vista com ele?
— Ai, você não vai acreditar, mas, hoje, eu descobri que o Jaden é meu vizinho!
— O quê?
— É isso mesmo o que você ouviu… O Jaden Todd é meu vizinho, mas eu dei um jeito de disfarçar e mentir que essa é a casa da minha tia, que só estou passando alguns dias aqui, enquanto minha mãe viaja. Não sei bem se ele acreditou, mas… Não quero que ele saiba onde moro. Ele é muito chato e poderia me incomodar muito. Você entende, não entende?
— Sim. Eu entendo. Não se preocupe. Vou tomar cuidado para não ser visto da próxima vez que eu for aí.
— Ah, obrigada Bryan.
— Eu queria te ver.
— Também queria te ver.
— Não pode vir a minha casa? — Bryan sabia que ela não aceitaria, mas não custava tentar. Talvez, ela mudasse de ideia.
— Não. Sinto muito. Eu queria, mas… Não dá. Preciso terminar de passar a matéria para o Todd.
— Por que não me deixa te ajudar?
— Não é justo. Não foi você quem fez nenhum trato com ele.
— Não importa. Você é minha amiga. E eu gosto de te ajudar.
— De verdade?
— De verdade.
Eulália suspirou. Ela queria ver Bryan, falar com ele cara a cara. Mas não queria que ele fizesse aquele maldito trabalho. Isso era ela quem devia fazer. Não ele.
— Seus pais são chatos?
Bryan riu da pergunta.
— Eu sei que da minha mãe você vai gostar.
— E seu pai?
Bryan suspirou.
— Ele devia ser o pai do Jaden ou do Samael.
— Jayla me disse que ele é um pouco exigente.
— Um pouco? Ele é um tirano. Não importa o que eu faça. Nada está bom pra ele. Ele me odeia!
— Sinto muito.
— Tudo bem. Eu já estou acostumado.
— E a que horas eu posso ir aí?
— Eu não posso ir te buscar?
— Hum, pode ser.
— Hum, que tal às seis e meia? Está bom para você?
— Sim. Está.
— Mal posso esperar.
|Horas depois…
Após tomar um café com a mãe de Eulália e conversarem um pouco, a senhora Beltran decidiu que já era hora de ir para a sua casa. Não queria chegar tarde para não ouvir seu marido reclamar que ela era uma irresponsável, que não parava em casa, que só gastava dinheiro e fazia compras. Seu marido era um chato. Ela havia se separado dele há pouco tempo, mas decidiu dar outra chance a ele por causa de Jayla, que gostava muito dele.
— Foi um prazer conhecê-la, senhora Dodson. Mas agora, eu preciso ir.
— Também foi um prazer conhecê-la, senhora Beltran.
Eulália seguiu Bryan e Jayla até o carro da mãe deles.
— Eu vou me sentar no banco da frente! — Jayla gritou como uma criança e abriu a porta, apressada, como se alguém pudesse roubar o seu lugar.
— Ei, Jayla? Devagar. — Disse Bryan e abriu a porta para Eulália. Ela estava prestes a entrar no carro quando percebeu que Jaden estava parado em frente a casa dele. As luzes de sua casa estavam todas apagadas. Ele estava vestido de preto da cabeça aos pés. Um capuz enorme escondia seus cabelos loiros. Ela mal podia ver o rosto dele. Mesmo assim, tinha certeza de que era ele. O que ele estava fazendo ali? Estava esperando alguém ou estava espiando ela? Ele fumava algum cigarro vagabundo e a encarava. Eulália sentiu um arrepio. O que ele estava fazendo? Garoto esquisito.
— Ei, Eulália? Algum problema? — Perguntou Bryan.
— Não. — Disse Eulália disfarçando e entrando no carro. Bryan entrou logo depois dela.
Quando a senhora Beltran já estava dirigindo o carro, Eulália virou-se para trás para ver se Jaden continuava parado a encarando. Não estava.