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Cap 3 - " Com grandes poderes. Vem grandes responsabilidades."

Dois meses se passaram e Clarice jamais aceitou a história de que o Anttone preferia ficar no Brizolão. Após ela pedir várias vezes para o menino chamar a mãe e Maria nunca aparecer, Clarice tomou uma decisão.

A professora pediu a um do seus ex-alunos que chamasse a mãe do Anttone. Tito estava viajando, além de roubo ele transportava droga da Colômbia para o Brasil dentro de mercadorias lícitas que ele era contratado a transportar.

Maria chegou de forma hostil para falar com Clarice, que desmentiu Tito e contou toda a verdade a mãe do Anttone.

- Cê acha que sô troxa é? Cê num me engana, co essa cunversa pa boi dormir. Sei bem que cê qué robá meu fi.

- Não. Justamente ao contrário. Sei que mãe tem instinto e conhece sua cria - Clarice olhou bem no fundo dos olhos de Maria e disse - conversa com o Anttone e a senhora saberá a verdade, só você e ele.

Maria ao mesmo tempo que era submissa, se enfurecia quando era enganada. Anttone implorou a mãe para que não dissesse nada ao seu pai, ele tinha ciência que coisas ruins poderiam acontecer.

Anttone também disse a Maria que já não queria mais mudar de escola que era para deixar tudo como estava.

[...]

"Hoje tem a semi-final da copa do mundo, o único chato é que por causa do jogo a aula acaba mais cedo. É ruim, mas pela seleção até que vale a pena, vou ver o Romário e o Bebeto marcarem muitos gols, o Branco vai deixar o dele, só que de falta, o Tafarel vai fechar o gol. Também tem a parte chata, o capitão Dunga gritando com todo mundo, eu não gosto de grito, sempre tem um chato que grita, faz parte."

- Tone meu fi vem tumá seu lethe anti que esfie. - grita sua mãe da cozinha fazendo Anttone se sentir um bebê.

Sentou-se à mesa, tinha na cabeça que ninguém cozinhava melhor que sua mãe. Caso não se controlasse comeria tudo o que Maria postava a mesa.

Seu pai só iria chegar no outro dia, Maria era exagerada fazia um montão de comida só para os dois.

Anttone era o tipo nerd e favelado, se comesse tudo o que achava que teria de comer, seria um nerd, favelado e gordo, perfil quase completo para encarnação de gente soberba.

Tomou o café e partiu para escola. Ao chegar a professora Clarice o levou até a sala dos professores, abriu o armário que tinha o nome dela e de dentro tirou uns formulários.

- Anttone esse são os formulários para inscrição do concurso para o CEI Centro Educacional Imperador é simplesmente o melhor colégio federal do país nos últimos três anos consecutivos. — o menino a escuta com atenção — desde que foi fundado sempre esteve entre os melhores. Esse formulário já está todo preenchido por mim, só falta a assinatura e uma xerox do documento de um dos seus pais e enviamos pelo correio o pedido de isenção de taxa.

Os olhos do menino brilharam, era possível vê-lo cobiçar cada uma daquelas páginas cheias de quadradinhos nas mãos da professora. Em seu devaneio pensou:

"Como eu queria uma escola que pudesse me surpreender, que cobrasse mais de mim, que me fizesse pensar."

Pensar era o que Anttone mais fazia nessa vida. Era muito jovem, mas sabia que as consequências de seus atos poderiam ser graves. Sensível o menino começou a chorar e deu um basta naquela situação.

- Tia Clarice, depois da minha mãe a senhora é a pessoa mais importante da minha vida. Por esse motivo vou dizer algo muito sério a senhora. Eu não vou prestar esse concurso.- A professora estranha tamanha firmeza do menino e franze o cenho, Anttone por sua vez toma fôlego para seguir falando. - Se a senhora continuar a insistir, vou mudar de escola como tanto quer, mas irei para escola municipal da Baixa, aqui na favela. Aquela que o ensino é pior do que aqui. Onde nunca tem aula, porque a escola está sempre fechada por conta do tiroteio na Baixa. E quando tem, as crianças vão sujas e sempre tem surtos de doenças contagiosas.

- Anttone! Você está falando sério? - perguntou a professora com a voz embargada.

- Sim tia Clarice. Estou. - responde com a firmeza de um adulto.

- Tudo bem! Não irei mais tocar nesse assunto. - Clarice segurou a mão de Anttone - nessa vida se temos um sonho, temos que ter fé. Ao menos o direito de sonhar não devemos deixar ninguém nos tirar. Às vezes não podemos concretizá-lo no momento que gostaríamos, mas deixe o sonho vivo até o momento oportuno. Nunca desista, não seja a pessoa que querem que você seja, siga seu caráter e coração e tenho certeza que você chegará ao topo.

A jovem e doce professora o abraçou de forma emotiva, um abraço apertado e terno.

[...]

O morro e os moradores estavam todos decorados de verde amarelo, Anttone era o único de azul. Maria tinha ido para quadra assistir a partida pelo telão depois de muita insistência por parte da vizinha. Anttone preferiu ficar sozinho sentou a sala e ligou a Tv. Sua mãe havia deixado um pequeno banquete para ele. Antes do jogo começar o menino já degustava.

* 16:00 concentração para partida Brasil X Suécia.

* 16:30 a bola rola

* 17:20 termina o primeiro tempo no 0x0

* 17:35 começa o segundo tempo

* As17:50 Suécia fica com um a menos. Sofre uma expulsão.

* 18:00 Tito chega no morro ao subir observa movimentação na escola.

* 18:05 Romário faz um gol e põe o Brasil na frente rumo a final.

* 18:10 falam para o Tito que sua família está assistindo o jogo na quadra e ele se dirige direto para lá.

* 18:15 Tito chega a quadra e vai direto falar com Maria.

Tito se aproximou sorridente, esperava de sua companheira o mesmo fervor de todas as vezes que ele voltava das longas viagens que fazia para concretizar seus serviços sujos.

Dessa vez Maria estava muito irritada, era uma mulher transparente, não conseguia disfarçar a decepção que Tito havia lhe causado com a mentira da escola do Anttone.

o bandido abraçou sua esposa que por sua vez continuou com os braços para baixo, lhe deu um beijo que não foi correspondido percebeu o descontentamento de sua mulher e questionou.

- Tudo bem amor? - pergunta sentindo algo estranho no ar.

- Sim - responde secamente.

- Respondeu com uma palavra só, já sei que está chateada comigo - o bandido coça a barba e o pescoço - demorei mais de um mês amor, porque tive que fazer entrega no norte do país. - sem saber o real motivo Tito deduz que a raiva de Maria era por ele ter passado mais uma vez fora de casa.

- Antônho mi deche vê u jogo. - Maria responde ainda tentando se conter.

- Me chamou de Antônio! A coisa é mais feia que parece. - Maria continuava a olhar para Tv, mas só para fugir do Tito, pois não ouvia nem via mais nada, momentos depois tudo piorou. - Cadê o Anttone? - Maria fingiu que não ouviu, Tito começou a perder a paciência. - Mulher olha para mim quando estiver falando com você. Cadê o Anttone?

- Tá veno o jogo im casa. - olhou para Tito como ele ordenou, mas continuou a responder com empáfia.

- E porque ele não veio para cá junto com você?

- Sabi que u minino num gosta de ta junto de muita gente.

- Anttone não tem que gostar de nada, tem que está onde a família dele está.

Tudo desandou, Tito viu um lado de Maria que nunca tinha se voltado contra ele, até aquele momento.

- Meu fio num é um bicho, munto menos um capacho, tem as vuntadi dele. - disse com a voz elevada completamente exaltada.

- Que isso! Perdeu o juízo? Abaixa o tom de voz, estamos na rua.

- Num perdi juízo, só quero que ocê deche meu fio em paz - Maria fala já mais calma.

- O Anttone é nosso filho. Tudo o que faço é pensando na educação dele. Se soltamos as rédeas o garoto sai fora do caminho.

- Quar caminho? Da bandidagem? Meu fio tem todo o direito de escolhê ondi ele qué vê o jogo, que caminho ele qué siguí - ela se exalta e altera a voz novamente - e istudá na iscola que tivé vuntadi.

O bandido sorriu meio transtornado percebeu que sua companheira já estava inteirada da verdade. O ódio em seu olhar apareceu de forma instantânea, afinal sua submissa mulher jamais tinha se rebelado contra ele, ainda mais à frente de alguns moradores da favela. Coçou sua barba e de forma robótica disse:

- Você está um pouco alterada, vai pra casa e lá conversamos.

Deu as costas e desceu a favela pensando que iria dar um jeito nessa situação, que toda a humilhação que passou só tinha uma culpada.

* 18:30 de 13 de julho, o jogo acaba e o Brasil está na final da copa do mundo de 1994.

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