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2

As sobrancelhas de Vincet franziram–se enquanto tentava ser o mais paciente possível. Tinha a cabeça a latejar, o que o deixava mais mal disposto do que antes, e ainda por cima tinha de aguentar toda esta situação.

–Sério Liliana, tens muita lata em, passados 20 anos, vires pedir–me na cara que tome conta da tua filha assim sem mais nem menos. Ela não é maior de idade?– O homem não podia acreditar no que ela lhe tinha perguntado antes.

A rapariga sentada ao lado da mãe continuava de cabeça baixa e em nenhum momento a sua cara era claramente visível, o seu corpo estava tenso e nervoso. Vincet estalou a língua perante a reação dela, que era totalmente diferente daquela a que estava habituado e ainda mais devido à forma como estava vestido. Normalmente, as mulheres costumavam olhar para ele como, por exemplo, a mãe dela neste momento.

–Por favor, Vincet, não sejas tão trágico. São apenas 20 anos,– Liliana descartou o assunto como se fosse a coisa mais natural a fazer.

–Trágico?– soltou um bufo de indignação, –é uma pena termos tido três meses de relação antes de me traíres com um dos meus amigos, de me fazeres passar pelo embaraço do século, e agora apareces com a tua cara e o teu sorriso para tomares conta de quem, de uma menina mimada que não sabe cuidar de si própria. Por favor Liliana, é melhor saltares porta fora antes que eu o faça.

A jovem franze os lábios perante as palavras de desprezo que o homem lhe dirige, mas mantém–se em silêncio. A sua mãe estava por perto e tinha–a avisado antes. Abrir a boca poderia colocá–la em sérios problemas.

Não estou a pedir–lhe que tome conta dela para o resto da vida. Só preciso de a deixar com alguém que conheço durante pelo menos seis meses enquanto estou fora em trabalho. Como vê, a minha filha tem um atraso mental, não pode ficar sozinha, precisa de um tutor que a ajude diariamente. Ela estuda e frequenta a universidade, mas a sua saúde é fraca e ela não cuida bem de si própria.

–Ela é tua filha, não é minha, só fizemos sexo uma vez e o preservativo não se rompeu, por isso não uses a desculpa de que ela é minha filha só para me sacares dinheiro.

–Não, ela não é tua filha,– defendeu–se Liliana, –eu não sei quem é o pai, mas isso não vem ao caso. Não a posso deixar sozinha e não tenho ninguém para me ajudar. Tu és a única pessoa que eu conheço nesta cidade, Vincet, não me podes negar essa ajuda.

Ele levantou uma sobrancelha.

–Levem–na para um centro de cuidados, há vários, se quiserem posso mandar chamá–los agora mesmo, embora tenha a certeza de que a minha secretária vai estar mais mal disposta do que eu, porque ela pode finalmente ir descansar.

Liliana abanou rapidamente a cabeça.

Ainda me deves um favor, e sabes disso– desta vez não se conteve e usou a carta que tinha no bolso, até o seu tom de voz tinha mudado, –ou esqueceste–te de quando tive de suportar o desprezo da tua família quando me fizeste passar por tua noiva e que ias casar comigo para evitar o teu noivado. Nunca esquecerei a vergonha e a humilhação desse dia.

O corpo de Vincet ficou tenso com o que ela disse.

Sempre disseste que eras um homem de palavra, por isso não desistas, disseste–me que me pagarias por essa ajuda no futuro. É para isso que estou aqui. Não lhe estou a pedir dinheiro, nem bens, nem que seja responsável por nada em meu nome, só quero que deixe a minha filha ficar aqui em segurança durante apenas seis meses. Depois venho buscá–la e deixo as dívidas saldadas.

–Vincet rosnou por entre dentes cerrados, –Vens a minha casa para me chantagear dessa maneira.

–Não é chantagem, Vincet, seria se eu te dissesse que posso conseguir uma boa história com a minha história. Tenho a certeza de que muita gente está interessada na vida amorosa de um dos homens de negócios mais procurados da zona.

As órbitas azuis olhavam–na fixamente.

–Vejo que tinhas tudo planeado.

–Já passaram demasiados anos para isso. Portanto, sim, tinha tudo bem planeado. Se não gostares, sabes o que tens a fazer, mas se não concordares com o meu pedido, também sabes o que vou fazer. Não quero que chegue a esse ponto – Liliana tinha ido até ali para atingir os seus objectivos.

Vincet fechou os olhos e respirou fundo. O peito doía–lhe devido à força com que o seu coração batia, tanto pela raiva como pela indignação. Levantou–se e caminhou na direção de Liliana.

Vem comigo– agarrou–lhe no braço e puxou–a para fora do quarto. Não era um homem violento, tocar numa mulher sem ser para a fazer gemer de prazer estava fora do seu código, mas desta vez tinha usado um pouco mais de força do que estava habituado com as mulheres.

Era isso que Liliana pretendia com os seus pedidos descabidos.

As duas pessoas desapareceram da sala, deixando a jovem mulher sentada no sofá com a cabeça baixa. O seu cabelo ensombrava–lhe o rosto até que ela o levantou um pouco e olhou para onde eles tinham ido. Estava num lugar que lhe era completamente desconhecido. E não sabia realmente o que iria acontecer.

A mãe devia estar mesmo louca para a deixar sozinha em casa de um homem que era conhecido por gostar muito de ter casos com várias mulheres sem nada de sério, só porque tinha um plano em mente, mas será que a mãe gostava mesmo dela? Não era algo que ela pudesse dizer com franqueza, nem tinha meios para o expressar livremente. Agora só lhe restava ver o que fariam com ela, como se ela fosse um mero objeto.

Ela soltou um suspiro e soltou um pouco as mãos. Estava mesmo cansada de tudo aquilo, mas talvez esta fosse a sua oportunidade. Liliana não era a única esperta, e enquanto as duas pessoas discutiam na sala ao lado, ela examinava a sala, registando cada parte dela e as coisas que podia usar, para o caso de ter de usar algo para se defender.

Outra coisa que teve de admitir foi que o homem, Vincet, como a mãe lhe chamava, era muito mais bonito em pessoa do que na fotografia que a mãe lhe tinha mostrado de uma revista. O rosto tinha traços faciais bem definidos, os lábios em linha reta davam–lhe um ar mais sério do que o habitual, maçãs do rosto altas, olhos azuis rodeados de espessas pestanas pretas e cabelo da mesma cor que lhe caía em franjas sobre a testa, pelo menos naquele momento molhada e a outra parte que tinha sido puxada para trás.

A fotografia também escondia o corpo que ele lhes tinha mostrado sem escrúpulos quando se abriu. Mostrava que ela tinha feito exercício, com umas costas largas, braços grossos, peitorais duros e um abdómen definido até à borda das calças, nas ancas. A imagem tinha–a feito engolir em seco, pois era bastante intimidante, pelo menos para uma rapariga como ela, que não tinha grande relação com o sexo. Algo com que ele estava muito familiarizado.

Ah, a sua integridade parecia estar em risco dentro daquelas paredes. Algo que ela tinha a certeza que iria perder nos próximos seis meses... porque isso fazia parte do plano, não era?

Passaram pelo menos dez minutos até que as duas pessoas regressassem. O rosto de Vincet estava completamente congelado enquanto o de Liliana não mostrava que estava realmente feliz mas também não estava desapontada, por isso Alicia definiu que... ela tinha ganho?

–Vais ficar com ele, querida. Eu telefono–te constantemente e telefonas–me se precisares de alguma coisa– Liliana aproximou–se dela e deu–lhe um beijo rápido na bochecha, sussurrando–lhe ao ouvido antes de se afastar: –Não me desiludas.

E levantou–se com um leve sorriso.

Deixo–a ao seu cuidado, Vincet, ela é uma boa rapariga.

–A tua rapariga, como dizes, tem 21 anos– rosnou ele com os braços cruzados sobre o peito e visivelmente tenso. Quero dormir.

–Sim, precisava de fazer isso e amanhã, com a mente mais clara, pensaria no que fazer com a rapariga.

Liliana apenas o olhou de relance antes de se virar e ir embora desacompanhada para a saída. Quando a porta se fechou, deixando apenas as duas pessoas no interior, o ambiente tornou–se tenso. Vincet ficou à frente da rapariga à espera que ela dissesse alguma coisa, mas ela não disse.

Ele estalou a língua em exasperação e inclinou–se para agarrar o queixo dela entre os dedos e levantar–lhe o rosto. Os olhos cor de avelã, muito mais claros do que os da mãe, estavam fixos nos dele.

–Primeira regra em minha casa, quando vou falar contigo, olha–me diretamente nos olhos, entendido?

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