Wordwell, Verão de 2014
Wordwell, Verão de 2014
Desci do ônibus e procurei pelos cabelos grisalhos do meu pai, mas nem sinal dele.
Bufei.
Que bom! Ótimo!
Tudo que eu preciso é ficar nesse calor e com sede puxando uma mala pesada!
Passo por entre as pessoas erguendo minha cabeça, ainda tentando achar meu pai, ou meu irmão mais velho. Paro em um canto e procuro em minha bolsa meu lenço. Passo na testa. Sem prestar atenção no barulho dos ônibus estacionando na estação. Estes que chegavam a todo momento e nem no barulho dos carros de uma avenida movimentada ao lado. Sento-me em um banco pensando na última vez que vi meu pai. Foi em um feriado prolongado há seis meses atrás quando ele foi à Londres com meu irmão me visita. Todo esse tempo, eu fiquei hospedada na casa de tia Susan. Segui os mesmos passos do meu irmão mais velho. Ele também ficou na casa dela para fazer o ensino médio. Mas ele é bem mais velho e concluiu também se hospedando lá o curso de Veterinária.
Eu acabei o ensino médio e voltando para casa para ficar com papai. Voltarei novamente para Londres para continuar os estudos, pretendo fazer enfermagem. Wordwell é um lugar de fazendas. Uma região muito afastada de boas escolas e universidades. Por isso, sem opção, tivemos que nos afastar por um tempo de casa.
Uma leve brisa sopra, fazendo com que os meus cabelos castanhos cubram meu rosto. Afasto os fios da minha boca e os coloco atrás da orelha. Ao longe vejo um homem parado. Ele me observa atentamente. Reparo na calça jeans escura que molda perfeitamente todos os músculos de sua perna, uma camisa branca que revelava os ombros largos e os quadris estreitos. Os olhos parecem ser verdes. Um arrepio me passa pelo corpo. Trinta anos eu dou para ele. Sinto algo familiar nele, penso com o coração agitado. Continuo o observando. Ele é bem alto, musculoso. Uma beleza rústica, máscula. A pele morena e os cabelos castanhos com tons claros se revelam quando ele tira o chapéu da cabeça.
Meu coração se agita com sua beleza bruta. Meu olhar cruza com o dele, desvio meus olhos, perturbada com a sensação que ele me provoca, lanço outro olhar para ele e descubro com embaraço que ele ainda me observava pensativo.
Eu desviei meus olhos novamente.
Deus! É Miguel?
Eu ergo meu rosto e percebo que ele está vindo em minha direção.
Sim, Miguel Alvarez, o capataz da fazenda.
—Laura? —Ele diz com um sorriso amigável no rosto revelando aqueles dentes perfeitos. —E aí? Mudei tanto assim?
Eu sorrio com nervosismo diante da transformação do jovem que eu vi na fazenda para o homem forte que Miguel tinha se tornou.
—Miguel! Você ...está diferente. —Eu sorrio para ele, ainda custando a acreditar que aquele rapaz magrinho é o homem à minha frente. Viril e forte. Ai que calor...
Ele apenas sorri e abaixa a cabeça confirmando.
— Esta é toda sua bagagem? — Inclina-se e ergue as malas com facilidade.
—É, sim.
—Vamos? — Miguel pergunta e logo se vira, caminhando e nem esperando para ver se eu o acompanho.
Eu pisco surpresa pensando que ele fosse conversar. Perguntar sobre mim, falar dos velhos tempos. Achei rude da parte dele.
O dia de verão está ensolarado, uma leve brisa sopra para refrescar a atmosfera quente. Miguel Alvarez joga a minha mala na parte de trás de sua camioneta velha, depois dá a volta sem abrir a porta para mim. Eu abro a porta do carro com dificuldade, entro me sentindo estranhamente nervosa.
A verdade é que eu esperava que meu pai viesse me buscar. Em vez de ser recebida por Miguel que agora me tratava como algo inconveniente. Como se ele tivesse mais coisa para fazer do que buscar uma jovem na rodoviária. Miguel ocupa seu lugar ao volante. Eu me sinto minúscula ao lado dele, de tão forte e alto que ele é. Ele cheira bem, uma mistura de tabaco, creme de barbear, e roupa lavada.
Eu o observo com minha visão periférica suas mãos fortes e ágeis, conforme ele dirige com destreza pela avenida ultrapassando os carros. Reparo nos pelos escuros e grossos de seu braço, onde um relógio barato brilha. Como se ele se sentisse observado ele vira sua cabeça para mim.
Eu engulo em seco e pergunto:
—Por que meu pai ou meu irmão não vieram me receber?
Ele tira os olhos do meu rosto e volta sua atenção para a estrada.
—Hoje é dia de separar o gado para a venda. E eles precisam estar presente. —Ele disse simplesmente.
Novo silêncio e eu percebo que Miguel não está a fim de conversar.
—Por que você está tão rude. Não gostou de deixar seu trabalho na fazenda para me buscar na rodoviária?
Miguel aperta mais o acelerador e faz uma nova ultrapassagem, então ele me encara por um momento.
—Você tem a tendência de julgar as pessoas prematuramente? —Ele questiona com certa hostilidade.
—Como? —Pergunto aturdida.
— Pois, engana-se. Não tenho motivo para gostar ou desgostar. Sou um empregado. Simplesmente faço o que me for mandado.
Eu fico surpresa com seu jeito frio de falar comigo. Resolvo mudar de assunto:
—E Maria?
Maria é a mãe de Miguel. Uma pessoa maravilhosa que praticamente me criou depois que mamãe morreu. Ele me olha atentamente dessa vez.
—Ela está bem. Morre de saudades de você. —Sinto a frieza dele se evaporar quando ele fala essas palavras.
Eu sorrio para ele.
—Sua mãe é maravilhosa. Foi a mãe que não tive.
Miguel volta sua atenção para a rodovia.
—Ela a considera como uma filha também.
Eu suspiro de saudades de casa.
—É muito bom voltar para casa...lembra quando você me ensinou a cavalgar?
Miguel relanceia o olhar para mim.
—Sim. Você era uma criança muito peralta.