Capítulo três
MAJU
Sequei o suor que descia pela minha testa, respirando fundo. Tomei coragem, terminando de fazer aquela série de exercícios, levantando o peso com as minhas pernas, malhando as mesmas e os glúteos.
Ao terminar, sai do aparelho e peguei a minha garrafinha de água, tomando a água que estava ali. Sinto os olhares dos homens ao meu redor, alguns não faziam a mínima questão de disfarçar. Revirei os meus olhos, levemente irritada, mas decidi ignorar os meninos.
Percebi quando um grupo de mavambo subiu as escadas, todos parando pelos aparelhos perto de mim. Eles sempre fazem isso, não podem nem saber em qual local que estou que logo vem atrás, chega a ser irritante.
Desde pequena passei longe de mavambo, não entendo nada disso de movimento e muito menos sei quem está no controle. Tento me manter o mais afastada possível, o que acaba atraindo a atenção para cima de mim por ser tudo, menos uma Maria fuzil.
Tantas meninas rendendo para eles, dando de tudo pra ficar só com um deles. Mas eles vão querer quem? A princesa aqui, que quer passar bem longe deles.
Não tenho preconceito ou algo do tipo, afinal eu cresci nesse mundo. Sei que tem muitos policiais bons, mas em compensação, existem uns que não merecem a farda que vestem.
Sendo realista, a diferença entre os traficantes e muitos que se dizem do bem por aí, mas fazem muita merda, é porque eles assumem o que fazem e não ficam contando mentiras para se safar. Neste sentido, acabam tendo até mais honra do que muitos por aí.
Me afastei deles, indo para o outro lado da Academia. Realizei mais uma série ali, ignorando ao máximo todos os olhares que recebia. Ao terminar aquele exercício, já tinha finalizado o meu dia de exercícios, o que foi um alívio.
Quando chegam os mavambos, também chegam as Marias fuzil.
__ Oie princesa.--- Um dos meninos, um moreno parou ao meu lado.
O ignorei, colocando o aparelho no lugar.
__ Qual o seu nome?--- Insistiu.
Olhei na direção dele, pegando o meu celular. Ele soltou um sorriso de lado, provavelmente com a esperança de ganhar o meu número. Coloquei na tela inicial, uma foto bem linda minha de biquíni, fui até o meu aplicativo de músicas e coloquei o som no mais alto possível, mostrando para ele que já estava com o seu celular em mãos.
__ Qual foi?--- Desmanchou o sorriso.--- Faz isso não, gatinha.
__ Ja fiz.--- Soltei uma piscadinha na direção dele, saindo de perto dele.
Passei perto dos amigos dele, que riam da cara do mesmo. Homens, sempre igual.
Desci as escadas da Academia, me despedi das meninas da recepção e sai. Continuei com os fones no ouvido, sei bem que essas piadinhas não vão parar nem tão cedo, afinal muitos encaram as minhas roupas de malhar como um passe livre para suas falas nojentas.
No início era algo que me incomodava em tantos níveis, mas aos poucos fui obrigada a me acostumar. Entendi que falar não iria adiantar de nada, a única coisa que poderia acontecer é me deixar abalada emocionalmente e extremamente estressada. Se tem uma coisa que aprendi bem é que nada nesse mundo vale a minha paz.
Abri a porta de casa, sentindo no mesmo momento o meu cachorro nas minhas pernas.
__ Cadê o neném da mamãe?--- Fiquei de joelhos, brincando com ele.--- Cachorrão bonito.
Sei que se eu pegar ele no colo, nesse exato momento, o bonito vai acabar fazendo xixi em mim. Billy tem dessas, quando sente alguma emoção de uma forma intensa, ele acaba ficando com a urina solta.
Por isso, sempre que eu chego, primeiro brinco com ele no chão. Depois que ele se acostuma um pouco comigo, eu o pego no colo e faço um carinho no mesmo, caminhando para o sofá da sala.
Sentei no mesmo, com o meu cãopanheiro ao lado. Billy, nem um pouco folgado, logo deitou no meu colo e já fechou os seus olhos, pronto para dormir. Esse meu cachorro vive no colo, dormindo para ser mais exata. Sabe aquele companheiro para uma boa noite de sono? É ele mesmo.
__ Chegou, princesa?--- Perguntou minha vó, de uma forma totalmente carinhosa.
__ Cheguei, minha rainha.--- Concordei com a cabeça, fazendo carinho no cachorro em meu colo.
__ Trabalha hoje?--- Sentou-se ao meu lado.
__ Querendo trazer um dos contatinhos aqui, coroa? Me expulsando de casa.--- Impliquem com ela.
__ Coroa é a tua buceta menina, me respeita.--- Revirou os olhos.--- Tô te expulsando de casa não, caralho. Só quero saber se você vai ficar pra jantar, assim faço um prato que você gosta. Menina ingrata.
__Oh meu amor, fica assim não, to te zoando só.--- A puxei para um abraço. De início minha vó até tentou fugir, mas foi só dar um pouco de chamego que já estava me apertando também.--- Amor da minha vida, papo reto.
__Fala logo o que você quer, Maju.--- Mandou enquanto saia do abraço, pegando o cachorro do meu colo.
__ Vamos jantar no mirante da Rocinha?--- Convidei.
__Partiu.--- Concordou animada.
__ Vou chamar a Mari.--- Avisei e ela concordou.
__Agora vai tomar banho, ta fedendo a cecê.--- Implicou comigo, batendo na minha bunda assim que levantei.
__ Vai me da estrias, porra.--- Murmurei, ganhando como resposta um sorriso debochado.
Peguei o preguiçoso do meu cachorro no colo, segurei o celular e subi para o meu quarto. Aproveitei e mandei logo mensagem para a Mari. Já estávamos marcando esse rolê há um tempo, ela já estava me cobrando.
Deixei Billy na minha cama, vendo que em questão de segundos ele se acomodou e ficou me olhando todo curioso. Coloquei o meu celular para carregar, enquanto deixava alguma música tocando na caixinha de som.
Sou uma pessoa totalmente movida a música. Não sei explicar o porquê, mas é como se me desse um gás ainda maior para fazer as coisas. Não tenho um ritmo definido, tudo depende do meu humor e sentimentos no dia.
Abri o meu guarda roupa, encarando as milhares de opções. Preciso confessar, sou uma consumidora nata. Quando se trata de qualquer coisa relacionada a aparência, compro sem pena. Amo comprar roupas, ter o meu guarda roupa, penteadeira e caixinha de joias cheias. Sou extremamente vaidosa e cuidadosa com a questão do cheiro.
Não chamo muitas pessoas para a minha casa, muito menos para o meu quarto. Mas aqueles poucos que vêm ficam admirados e, na maioria das vezes, acabam implicando comigo da mesma forma, falando que eu tenho o próprio shopping em casa. Ainda não chegamos nesse ponto, mas estamos caminhando para esse sentido.
Primeiramente peguei um conjunto de lingerie de renda na cor branca, decidida a montar o meu look todo nessa cor. Peguei uma saia, coladinha ao corpo e duas palmas abaixo da polpa da bunda. Como ela é coladinha, acaba por valorizar as minhas coxas grossas e as nádegas avantajadas. A blusa é um top de mangas compridas. Algo bonito na sua simplicidade.
Para combinar, peguei uma sandália de salto alto prateado. Peguei um brinco no estilo de festa, sendo todo brilhoso, semelhante a bolsinha que escolhi para essa noite. Basta acertar no penteado, na maquiagem e ficarei mais do que deslumbrante. O segredo não está apenas nas roupas, mas sim em saber misturar muito bem as peças com os acessórios.
Deixei tudo ali, pegando apenas as peças íntimas e a toalha. Fui ao banheiro, agradecendo internamente pelo mesmo estar livre. Tirei as roupas que estava usando, colocando elas no cesto de roupa. Tomei um banho bem lento, digno da rainha que sou. Aproveitei para lavar o meu cabelo, passar a máscara no mesmo e depois de dar o tempo, enxaguei tudo, dei a devida atenção ao meu corpo e sai. Se eu demorar demais a vó me mata.
__ Ta se masturbando nessa merda, Maria Julia? Demora do caralho.--- Falou dona Ana, totalmente delicada enquanto batia na porta.
__ Estava mesmo, inclusive te aconselho. Toda estressada, quase quebrando a porta.--- Debochei enquanto abria a mesma, saindo do banheiro.
Antes, como não sou nem maluca, tinha secado e arrumado a bagunça que havia feito.
__ O respeito você enfiou onde? Desceu pelo ralo do chuveiro, só pode.--- Murmurou entrando no cômodo.
__ Tenho um vibrado novinho no quarto, se quiser.--- Impliquei mais um pouco.
__ Vai se fuder.--- Xingou batendo a porta na minha cara, retirando uma gargalhada de meus lábios.
Amo implicar com a minha vó. Na verdade, amo tirar a paciência de todos aqueles que amo, é o meu jeitinho de demonstrar o quanto são importantes para mim. Sem contar que rende momentos engraçados e valiosos.
Entrei no quarto, tirando a toalha e estendendo na cabeceira. Sentei na minha penteadeira, secando os meus cabelos e passando uma prancha no mesmo logo em seguida. Quero bem lisinho. Fiz uma pele bem lisinha, bem iluminada. Um olho um pouco mais forte, com aquele espumado de milhões, o delineado e os cílios postiços que não podem faltar nunca.
Modéstia a parte, a mãe aqui arrasa na maquiagem e sejamos sinceros, eu sou maravilhosa.
Passei um hidratante pelo meu corpo, coloquei a minha roupa, inclusive o salto. Passei um perfume próprio para cabelo, outro no corpo, mas apenas nos pontos certos. Os perfumes são do mesmo conjunto do hidratante, assim não fico com diversos cheiros pelo corpo, mas sim algo harmônico e agradável.
Foi só o tempo de terminar de me arrumar e a campainha tocou. Provavelmente é Mariana, minha melhor amiga que carinhosamente chamo de Mari. Crescemos juntas, ela foi o meu estepe quando o meu pai morreu e por causa disso o meu mundo se tornou uma bagunça completa. Vovó foi fundamental nessa fase da minha vida, mas sem essa louca que chamo de amiga, tudo teria sido muito mais difícil.
Abri a janela do meu quarto, dando direto para a rua. Se não fosse pelo abafador de som que coloquei, jamais conseguiria dormir dependendo do dia.
__ Vaca, abre aqui a porta.--- Pediu me encarando.
__ Estou descendo, xuxu.--- Sorrir apoiando o meu corpo na janela, já esperando pela sua patada.
__ Teu rabo, né Maju.--- Revirei os olhos.--- Xuxu você encontra em qualquer lugar, mas essa princesa aqui é única.
Falo toda cheia de si, jogando o seu cabelão para o lado. Ela não está errada e sou obrigada a admitir, a minha amiga é uma preta muito mais do que linda. Se eu fosse dez por cento menos hetero e nós duas não tivéssemos essa amizade tão forte, eu pegava sem pensar duas vezes.
__ Me encanta a forma que você mesma acredita nas suas mentiras.--- Suspirei, fingindo admiração.
Como resposta, ganhei apenas um dedo do meio. Sorrir boba, fechando a janela do quarto e pegando tudo que ia usar antes de sair, deixando tudo no sofá da sala e só então abrindo a porta.
__ Caralho, ta gata hein.--- Elogiou assim que me viu, entrando em casa.
__ Querida, eu sou linda.--- Pisquei na sua direção, fechando a porta.
__ Depois eu quem sou convencida.--- Revirou os seus olhos, fingindo impaciência.
__ Tira uma foto minha?--- Pedi fazendo uma carinha manhosa, estendendo o celular na sua direção.
__ Você vai tirar minhas depois.--- Avisou pegando o meu celular.
Concordei com a cabeça, posicionando-me e fazendo as minhas poses. Minha amiga, conhecendo-me tão bem, tirou diversas fotos, assim seria quase que impossível não gostar ao menos de uma. Apesar de saber que é bem capaz disso acontecer comigo, afinal está para nascer alguém que seja mais indeciso que eu.
Tirei diversas fotos da minha amiga, babando em como ela consegue ser tão fotogênica e ter ficado perfeita em quase todas. Af, preciso fazer um curso com ela e aprender todas as suas dicas. Parece até modelo, sem brincadeira.
__ Olha a tia Ana, gostosa toda vida.--- Elogiou Maria assim que viu minha vó descer as escadas.
__ De quem você acha que a Maju puxou esse corpo dos deuses? Isso daqui é tudo genética, meu amor.--- Falou toda empoderada, certa da sua beleza.
__ Genética boa essa de vocês.--- Mari.
__ Olha quem fala.--- Debochei secando o seu corpo na cara de pau.
__ Somos todas gostosas, essa é a realidade e as invejosas que lutem.--- Falou minha avó.--- Agora vamos logo, porque eu não me arrumei toda para ficar em casa.
Olhei para ela de ladinho, prendendo o sorriso. Amo vê a minha vó assim, dou a minha vida por essa mulher sem pensar duas vezes. Quando eu mais precisei ela esteve aqui por mim, fazendo de tudo por mim, passando até mesmo por humilhações para não deixar o que faltar na mesa. Hoje eu mato e morro por ela, então o que eu puder fazer por ela eu farei.
Como Mari tem o seu carro, ganhou do irmão que é do movimento, fomos no dela mesmo. Em meio a muitas gargalhadas e conversas, fomos em direção a nossa noite das meninas.
Hoje eu não quero saber de trabalho, apenas em ser feliz com as minhas meninas.