5
Marcos Albuquerque
Acordo com meu telefone tocando incessantemente em cima do criado mudo e rosno um palavrão, quando uma dor de cabeça infernal começa a latejar. Me forço a abrir os olhos e a dor parece aumentar consideravelmente. Olho a tela do celular e respiro fundo fechando os meus olhos para tentar suportar as cobranças da dona Laura.
— Oi mãe! — Minha voz soa ainda rouca de sono.
— Como assim, oi mãe? — Ela cobra com voz firme. — Seu irmão te deu o recado? — retruca autoritária e eu bufo me sentando na cama e levando a mão a testa tentando aplacar a dor.
— Que recado? — pergunto passando a mão no rosto tentando despertar. Porra! Me sinto atordoado. Se brincar não sei nem que dia é hoje. Resmungo internamente.
— Semana que vem eu e o seu pai vamos viajar, Marcos. Ele precisa descansar um pouco, sair daquele escritório agitado. Portanto, vamos nos reunir no restaurante da família, para nos despedir. — Eu bufo em resposta.
— Mãe, eu não posso...— Tento falar, mas ela me corta impaciente.
— Não pode ou não quer, Marcos Albuquerque? — inquire ríspida. Puxo a respiração de modo audível, tentando manter a calma.
— Mãe, eu realmente não posso. Eu tenho que trabalhar, sabia? — falo irônico.
— Sem argumentos, Marcos, não seja um filho ingrato. Nós vamos passar dois meses fora do Brasil e eu quero que esteja lá no restaurante na quarta à noite e não aceito desculpas — diz enfática. Dona Laura Albuquerque é uma mulher impiedosa quando quer ser. Penso fechando os meus olhos e respirando fundo, aceitando a situação.
— Tudo bem — digo vencido. — Eu vou fazer uma forcinha e chego a esse jantar, melhor assim? — respondo debochado.
— Está perfeito, filhote! — diz e desliga na minha cara.
— Droga! — resmungo encarando a tela do celular. Acho que ela ficou chateada comigo. Penso dando de ombros e devolvo o celular ao criado mudo. Sério galera, eu amo a minha mãe e a minha família, mas o fato de que eles querem me ver preso a um casamento e formando uma família, é o que me mantém distante. Dona Laura, seu Arthur, Guilherme e a Gisele juntos em uma única noite? Eu não sei se aguento não.
Já é quase meio dia e eu não consigo mais dormir, resolvo sair da cama e tomar uma ducha fria e demorada para despertar de vez. Depois vou até a cozinha e tomo um copo de suco com uma aspirina e sigo para sala, para assistir TV. Adoro o meu cantinho! É aonde encontro o meu sossego e posso ficar mais à vontade, sem ter que dar satisfações da minha vida para ninguém. Algumas horas depois meu celular volta a tocar e sorrio ao olhar a pequena tela brilhante.
— Fala Fábio, como estão as coisas aí na França? — pergunto com animação na voz. Fábio é o nosso engenheiro terceirizado, ele está na França para iniciar as obras do nosso mais novo empreendimento.
— Nada bem cara, as obras pararam por aqui — diz com um tom totalmente desanimado, me fazendo brochar imediatamente. Suas palavras me deixaram bem chateado.
— Eu preciso de você aqui, Marcos e é para ontem! — Fábio parece apreensivo.
— Qual é, cara? É final de semana e ninguém trabalha em um final de semana, Fábio! — resmungo.
— Você que sabe — diz com um tom seco. Eu bufo.
— Segunda eu passo aí e resolvo o que tem de ser resolvido e você fica feliz, pode ser? — jogo a sugestão.
— Segunda então! — diz com desdém e eu sorrio aliviado.
— Pronto, caso resolvido — solto um sarcasmo e desligo o celular sem esperar a sua resposta. Passar o final de semana dentro de um avião só para arrumar a bagunça dos outros? — Nem fodendo!
Passo o resto do meu sábado largado no sofá, comendo pizza com refrigerante e jogando vídeo game. Essa é a vantagem de você morar sozinho. Você faz o que quer, quando quer, como quer e não tem ninguém para meter o nariz. Bebo e como o que quero e não tem ninguém te cobrando nada. No meio da tarde ligo para alguns amigos marcando uma noitada de domingo, afinal semana que vem é chumbo grosso pra mim... Ter que viajar às pressas para França e resolver os pepinos do Fábio e ainda aguentar um jantar em família onde eu sei que a pauta da conversa serei eu. Com certeza preciso de um relaxamento antecipado. — Penso. São sete da noite quando Guilherme e Cia resolvem aparecer no meu apartamento. Eles trazem algumas sacolas com comida chinesa e um vinho envelhecido para acompanhar. Essa parte eu adorei! Visita que não me dá trabalho e ainda te traz comida? Isso é bom demais! Amanda parece um pequeno furacão solto pela casa, ela corre o apartamento inteiro e sobe e desce nas coisas falando sem parar. Beijo a minha cunhada no rosto assim que ela se livra das sacolas e abraço o meu irmão em seguida.
— Nossa, Marcos! A quanto tempo você não arruma esse apartamento? — Gisele resmunga olhando a bagunça de caixas de pizza e garrafas de refrigerantes espalhadas por toda sala. Sua cara espantada é impagável. Dou de ombros.
— Almerinda vem fazer uma faxina amanhã, dei folga para ela esse final de semana — expliquei.
— O que não quer dizer que você tem que virar um porco — retruca. — Não tem lixeira no seu apartamento não? — indaga recolhendo algumas garrafas em cima da mesinha de centro. Reviro os olhos e ela me dá as costa, levando o lixo para a cozinha. Viu? É disso que eu estou falando... Cobranças e mais cobranças. Não dá para imaginar uma mulher aqui dentro, metendo o seu fedelho em minhas coisas.
— Tio, posso brincar no seu Xbox one? — Amanda pergunta esperançosa. Sua respiração está acelerada por causa da correria dentro do apartamento.
— Você pode tudo, princesa — digo a pegando nos meus braços, eu a jogo para o alto e ela solta um gritinho e quando a pego de volta nos meus braços, beijo todo seu rostinho rosado. — Depois o tio vai se juntar a você tá bom? — A pergunta soa sugestiva e a garota me retribui com um sorriso gigante. Eu a ponho de volta no chão e ela dá alguns pulinhos e sai correndo para sala de jogos. Depois de recolher o meu lixo e de deixar a minha sala um brinco, Gisele abre as sacolas com as comidas que estão sobre o balcão e começa a pôr a mesa. Ela serve a comida nos pratos e todos nos acomodamos a mesa. Eu olho para Gui e Gisele sentados do outro lado da mesa e para Amanda que está ao meu lado. É um ensaio para o jantar em família que vem por aí. Penso.
— Que tal se você for passar o domingo com a gente lá na chácara, Marcos? — Gui inicia uma conversa nada a ver. — Amanda vai adorar ter o tiozão dela por perto — diz e depois levar uma garfada da comida a boca. Eu suspiro baixinho.
— Amanhã não dá, Gui, tenho uma programação... — Tento dizer, mas sou interrompido bruscamente.