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Capítulo 5 - Desconfianças

Chiara

Acordei com um barulho no quarto. Rafael estava lá. Ele me deu um beijo suave na testa e me surpreendeu com um café da manhã carinhoso.

— Sinto muito pelo que aconteceu ontem à noite, Chiara — disse Rafael, com sinceridade. — Não queria que terminássemos o dia brigados.

Enquanto ele falava, as palavras e inseguranças da noite anterior ecoavam em minha mente. No entanto, aceitei o café da manhã com gratidão e começamos a conversar sobre planos para o dia.

— Chiara, tenho algo em mente — disse Rafael, parecendo hesitante. — Gostaria de te ajudar a reivindicar o que é seu por direito.

Essa declaração me pegou de surpresa. Sabia que minha mãe havia vivido com luxo, mas não estava segura se eu tinha direito a aquilo, ou se Vittorio estava dizendo a verdade.

— Eu compreendo que é complicado, Chiara — continuou Rafael, percebendo minha confusão. — Mas você merece isso. Conheço um ótimo advogado que pode te ajudar. Ele é discreto e lida bem com situações delicadas.

A oferta de Rafael de ter um guia no mundo legal era tentadora. Nunca havia tratado de assuntos financeiros, e a sugestão era atraente. Após um momento de reflexão, concordei em pelo menos falar com o tal advogado.

Horas depois, estávamos no escritório do advogado. O lugar era elegante, repleto de livros encadernados e com uma vista impressionante da cidade. O advogado, uma figura experiente de meia-idade, nos cumprimentou calorosamente.

— Chiara, estou ciente de sua situação e entendo a delicadeza disso — começou o advogado. — Para reivindicar os bens de sua mãe, precisaremos de documentos que confirmem a propriedade.

Ele detalhou o processo, ressaltando a importância de provas documentais. Sugeriu que procurássemos pela mansão onde eu cresci, pois documentos vitais poderiam estar lá.

Saí do escritório com um misto de esperança e ansiedade. No caminho de volta ao apartamento de Rafael, ele me incentivou a retornar à mansão e procurar os documentos conforme sugerido pelo advogado.

— Acho que ainda não estou pronta para lidar com Vittorio — confessei a ele, sentindo o desconforto aumentando.

Não me sentia preparada para compartilhar minhas verdadeiras razões de insegurança com ele.

— Chiara, sei que é um passo difícil, mas acredito que isso te ajudará a encontrar respostas e paz — ele afirmou.

As palavras persuasivas de Rafael gradualmente começaram a envolver meus pensamentos. Era meu direito entender o que minha mãe havia deixado para trás.

No fim das contas, acabei cedendo. Meu coração batia mais rápido enquanto Rafael dirigia de volta à mansão. Ao chegar ao hall de entrada, Henriqueta já estava me esperando. Imaginei que os seguranças tivessem a alertado sobre minha chegada.

— Minha querida, que bom que voltou! — Henriqueta me abraçou com emoção.

Brincando, comentei:

— Henriqueta, eu só estive ausente por um dia, não foram semanas!

Ela riu alegremente, seus olhos brilhando com emoção contida.

— Eu estava preocupada com você, Chiara. Nunca a vi passar sequer um dia longe desta casa.

Henriqueta estava certa. Afinal, ela era minha única família, considerando o quanto me importava com aquela gentil governanta.

— E onde está o todo poderoso? Já voltou para a Sicília? — Curiosa, perguntei.

— Estou aqui, Chiara. Deseja falar alguma coisa importante comigo? — sua voz soou, carregada de sarcasmo.

A voz de Vittorio me surpreendeu, sua presença imponente no hall me fez dar um pulo de susto. Ele estava ali, como sempre, com seu jeito brusco e imponente.

— Na verdade, não. Estou aqui apenas para organizar todas as minhas coisas e amanhã estou indo embora desta casa. De uma vez por todas.

Minha resposta não foi somente para Henriqueta, mas sim uma afirmação direta a Vittorio.

— Não pode fazer isso, querida! — Henriqueta me repreendeu quase imediatamente.

Minha resposta, porém, tinha um alvo: Vittorio. O observei atentamente e pude notar sua expressão descontente com minha atitude. No entanto, não tinha medo dele, e estava determinada a deixar isso bem claro a cada instante em que estivéssemos juntos.

— Chiara é livre para fazer o que desejar, Henriqueta — Vittorio disse com tranquilidade suspeita — No entanto, eu tenho uma proposta para fazer. Pode me acompanhar até a biblioteca?

A curiosidade foi maior que qualquer outra coisa e concordo em seguir Vittorio até a biblioteca.

— Eu fiz uma promessa alguns anos atrás — Vittorio começou a dizer, após sentar-se na cadeira imponente por trás da escrivaninha de mogno — Infelizmente eu não consegui cumprir aquilo que prometi e isso me deixa bastante irritado, Chiara.

— Fico triste em saber disso — Eu estava sendo irônica — Mas eu realmente não posso te ajudar.

— Ainda assim, farei uma última tentativa. O que acha de esquecer essa ideia de casamento e me acompanhar de volta para a Itália? Tenho certeza que vai gostar de morar na Sicília.

Foi impossível conter uma gargalhada.

— Isso só pode ser uma piada, Vittorio — Não me contive — Há cinco anos você é meu tutor, mas nunca se preocupou em me conhecer, em estar perto de mim. Agora quer que eu abandone toda a minha vida em São Paulo e vá morar na Sicília? A resposta é não, Vittorio. Eu não vou com você.

Não esperei para ver a reação do meu tutor. Apenas dei-lhe as costas e saí da biblioteca sentindo grande satisfação por ter recusado o convite de Vittorio, algo que sempre sonhei em fazer.

Durante anos eu esperei pelo momento em que o meu tutor finalmente iria prestar atenção em mim. No início, apenas porque eu me sentia sozinha após a morte da minha mãe e precisava que qualquer pessoa estivesse comigo. Com o passar do tempo, o sentimento foi mudando e quando eu procurava pelas fotos de Vittorio, não era mais de maneira tão inocente e singela.

Após o meu aniversário de dezoito anos, não foi apenas o meu corpo que mudou. Os meus pensamentos se tornaram mais pecaminosos. Eu passei a ver Vittorio de maneira diferente e a aguardar ansiosa pelo momento em que ele viria me visitar.

Quando isso finalmente aconteceu, a decepção de receber um ursinho de pelúcia como presente de aniversário me fez recuar. Eu tentei chamar a atenção de Vittorio ao me recusar vê-lo. Fiquei dentro do quarto e me recusei a sair de lá. Mas ele não pareceu se importar com a minha atitude e simplesmente foi embora. Voltou para Itália sem ao menos insistir em me vê. Isso me deixou muito decepcionada.

Agora que eu conheci alguém especial e que tenho a possibilidade de formar a minha própria família, Vittorio tenta se aproximar e me impedir de fazer aquilo que desejo. Ele está muito enganado se pensa que uma viagem para Itália vai me convencer a desistir.

— Você recusou, não é mesmo? — Henriqueta perguntou, ao me ver subir os degraus apressada.

— Claro que recusei! E não penso em mudar de ideia.

Subi para o andar de cima disposta a ir para o meu quarto e lá permanecer até que a minha raiva diminuísse um pouco. Porém, ao passar pela porta do quarto que pertenceu a minha mãe, eu mudei de ideia. Aquele era um bom momento para tentar encontrar algo sobre o meu passado e o que é meu por direito.

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