Salva pelo gongo
Léo pede mais uma dose da bebida que estava bebendo, enquanto eu, indo a tudo que me foi ensinado e aos exemplos que tinha sempre espalhado por aí, dei um bom gole na bebida rosa com morangos.
- Não sou mais estranho? - Ele pergunta, com um leve sorriso nos lábios carnudos.
Suspiro
- Parece que não - Apoio os cotovelos em cima do balcão - Há quanto tempo trabalha lá?
- Desde os 18 - Ele trás o copo para perto da boca - E já tenho 27.
10 anos me era mais tempo do que o necessário.
- Já viu ele? - Com tantas perguntas que podia fazer, a mais idiota saiu da minha boca.
- Quem exatamente? - Ele bebe boa parte do líquido de uma vez.
- Victor Krum.
Léo fixa o olhar num ponto a frente, antes de me olhar inicialmente com a expressão séria, dando de ombros por fim.
- Ás vezes ele passa por lá.
Claro que Victor passava por lá, era empresa dele.
Me mexo inquieta na cadeira, sem saber como fazer a próxima pergunta e não parecer interesseira, já que para mim, aquela situação, era de puro interesse.
- E como você vai fazer? Vai me indicar para alguém no RH? - Ele não responde, invés disso termina a bebida e pede outra.
- Em relação à isso, não se preocupe.
Engulo em seco, mexendo na ponta da minha orelha.
- Isto está parecendo que vai custar um rim - Ele me olha de imediato com o cenho franzido - Quer dizer, acho que não tenho dinheiro suficiente para pagar você.
- Vemos isso depois - Ele mexe o líquido no copo agora com gelo, antes de me olhar novamente - Mas para que dê certo, preciso do seu número.
- Tem outros jeitos de pedir o número de outra mulher - Ele me entrega um caneta e um guardanapo.
- Estamos fugindo dos meios convencionais no momento.
Ergo um dos cantos da boca num sorriso, escrevendo a sequência de números no guardanapo.
- Como vou saber se vai mesmo conseguir isso?
- Sou homem de palavra.
De fato, a palavra dele não era uma garantia, mas precisava pagar para ver.
- Vamos ver se é mesmo - digo me afastando, andando de volta para a mesa.
Beca me olha assim que sento, pausando a conversa animada que estava tendo com os demais.
- Você sumiu. Tudo bem?
- Tudo sim.
Ela volta a conversar, rindo e contando sobre uma viagem que fez para o Peru.
Quase que disfarçadamente, olho na direção do bar e não vejo mais Leonard ou Léo, como ele gostava de ser chamado e me questiono se ele era real mesmo ou só havia sido um fruto da minha cabeça. Algum tipo de alucinação causado pelo tempo que fiquei na piscina.
Me despedi dos meus colegas de sala, assim que saímos do bar, pegando um táxi logo a frente. No meu celular, havia quatro chamadas perdidas de Camille, mas nenhuma de Leonard.
Camille estava parada em frente a porta, quando abro a mesma. Com as mãos na cintura e a expressão preocupada, parecia até intimidadora.
- Estava preocupada com você. Onde você estava?
- Saí com umas pessoas e perdi a noção do tempo.
- E não ouviu o celular tocar?
- Não. Desculpa - Ela solta o ar dos pulmões, passando ás mãos no rosto.
- Aqui é diferente de Marin County. Só comecei a pensar diversas coisas.
- Não se preocupe que vou dizer pra Maggie, que cuidou muito bem de mim - Sento no sofá, tirando a bota de cano baixo que calçava.
- Vai dormir, Robbie. Já está tarde - diz saindo da sala - Deixei seu jantar no forno.
Naquela mesma noite, antes de dormir, verifico se não há nenhuma ligação de Leonard. E para minha decepção ou não, não havia nenhuma, muito menos mensagem de texto.
Mesmo em um sono considero profundo, ouvia ao longe o celular. Não era o despertador, o toque era diferente.
Lutando com a vontade de ignorar, abro os olhos, percebendo por causa da fresta na cortina, que já havia amanhecido.
Atendo o celular as cegas, sem olhar para o identificador.
- Alô - digo rouca, fechando os olhos.
- Pensei que era do tipo que madrugava - Abro os olhos, incrédula.
- Léo?
- Pelo menos lembra meu nome.
- Como esqueceria?
Um breve silêncio se instalou, antes dele quebrar o silêncio.
- Consegui uma entrevista pra você.
- Você o quê? - Sento na cama, duvidando do que havia acabado de ouvir.
- É hoje. Ás duas.
- Não vai ter como eu ir - murmuro, lembrando do curso.
- Isto é você que decide - Ele desliga sem ao menos ouvir um obrigada da minha parte.
Ótimo. Por que não começar o dia com um dilema?
Graças a ligação de Léo, tive tempo o suficiente para pensar e tomar uma decisão.
Estranhamente, meu colegas de sala naquela manhã estavam animados e de princípio não entendi o motivo.
- Por que toda essa animação?
- Não viu o quadro negro? - diz Beca. Me viro para frente, lendo com os olhos Aula Prática de Sobrevivência na Selva.
Com certeza explicava toda aquela animação.
Animação essa que só durou alguns minutos depois da prova, ao se verem em uma espaço que simulava uma parte da selva.
A primeira tarefa aparentemente fácil, porém difícil, era ascender uma fogueira.
- Não é melhor usar pedras? - Beca pergunta, quando pego o canivete.
Maggie costumava ascender fogueiras na praia, quando éramos crianças e praticamente decorei como se fazia isso, usando apenas um canivete afiado e algumas palhas. As faíscas surgiram quando começasse a afiar a palha.
- Canivete é bem melhor.
A construção do abrigo acabou que sendo em grupo, o quê dividiu opiniões. Parecia que todo mundo tinha um jeito certo de se construir um abrigo eficaz, que aguentaria fortes pancadas de chuva.
Duas horas depois, ainda não tínhamos um abrigo pronto e faltava meia hora para ás duas da tarde. Me afastando do grupo, vou até o instrutor que vagava entre os “abrigos”.
- Não estou me sentindo bem. Posso sair da aula?
- Está no meio de um exercício.
- Eu sei. É que não estou me sentindo bem mesmo.
Ele sustenta meu olhar por uma fração de segundo, antes de simplesmente baixar o olhar para a prancheta.
- Tudo bem.
Descendo rapidamente os degraus das escadas, cronometro o tempo que ainda tinha, dando sinal para o primeiro táxi que vejo.
A sede de San Francisco era ainda mais incrível pessoalmente. Todos aqueles vidros espelhados, tinha um certo charme.
No térreo atrás de um balcão cinza fosco, um homem desviou a atenção do computador a frente para mim, não esboçando muita reação ao me ver.
- Tenho uma entrevista.
- Nome.
- Robbie Julie Davis.
Os dedos dele deslizam pelo teclado.
- 7° andar.
Dou um sorriso rápido, pegando o crachá de visitante.
A impressão do elevador estar subindo lentamente, ajudou com que minhas mãos começassem a suar. Durante toda a manhã, pensei no que iria dizer, nas respostas promissoras que daria mas, naquele momento, um branco recaiu sobre minha cabeça, apagando tudo.
Num toque baixo, as portas do elevador se abrem, me trazendo rapidamente para a realidade.
Realidade essa, na qual ainda precisava fazer uma entrevista que definitivamente era minha vida.
- Srta. Davis? - Uma mulher de cabelo vermelho em um coque e terno cinza pergunta.
- Eu mesma.
- Por aqui - Saindo do elevador, a sigo por um corredor, até uma sala logo a frente.
Camille adoraria aquela sala, já que a decoração conseguia ser a mais simples possível. Sem muita cor além do cinza e do branco, cores que já haviam virado marca registrada da companhia de Victor.
- Você ainda está cursando o curso de comissário de bordo.
- Falta pouco agora.
- Suas notas estão na média - diz continuando a folhear um conjunto de páginas - Mas por quê nossa empresa?
Dou um leve sorriso.
- Sou uma grande fã de Victor Krum.
- A maioria é - diz séria - Mas por quê se acha qualificada para fazer parte da empresa?
O sorriso some lentamente do meu rosto.
Nunca havia me feito aquela pergunta. Ser fã e saber de cor a história de vida do Victor, já me parecia ser o suficiente.
- Amo aviação, desde criança. Me imaginei nessa empresa diversas vezes - E por parte, estava realizando um sonho.
A porta abre de repente, interrompendo qualquer resposta que eu estivesse prestes para dar.
- Leonard - diz ela com certa impaciência na voz.
Me viro para a porta, encontrando Léo parado na porta com as mãos nos bolsos da calça.
- Vejo que já conheceu a Robbie.
- E estou em meio a uma entrevista. Foi você mesmo que indicou ela.
- Só quero garantir que nada dará errado.
Ela volta a olhar para os papéis em sua frente, os folheando.
- Ela parece ser capacitada.
- Mas?
Ela ergue uma sobrancelha ao voltar a olhar para ele.
- Ainda não terminou o curso. Precisamos do certificado e nota da prova.
- Isso não é problema.
- Ótimo - Com um aceno da cabeça de Léo, entendo que é para levantar - E, Leonard - Ele se vira para ela, a poucos passos de sair da sala - Não esqueça de cumprir sua parte.
Ele esboça um sorriso.
- Sempre cumpro com minha palavra - Ao sair da sala, ele fecha a porta.
