Capítulo 06

Acho que nunca acordei tão feliz como hoje. E só agora a ficha está começando a cair. Nós ficamos mesmo ontem à noite, e foi tão bom. Estou ansiosa para vê-lo novamente. A loja em que ele trabalha só fecha às duas da tarde, por isso terei de esperar um pouco.

Desço para tomar café e começo a arrumar a casa. Como é sábado, minha mãe só trabalha meio período, e gosto de deixar tudo limpinho para ela não precisar arrumar mais nada quando chegar. Com tudo já pronto, subo, tomo um banho e me visto com um vestido jeans e um par de tênis.

Bia não gostou muito de ser acordada no meio da madrugada, mas depois que contei o que aconteceu, ficou animada e marcou essa ida ao shopping. Mando mensagem para ela avisando que já estou pronta, e vinte minutos depois ela para com seu carro na porta de casa e buzina. Saio e tranco a porta.

— Oi, amiga. — Beijo sua bochecha.

— Oi, sua safadinha. Se prepare pra me contar todos os detalhes.

Conversamos bastante durante o trajeto e eu lhe conto tudo o que rolou. E quando chegamos ao shopping, visitamos algumas lojas. Bia adora gastar, e posso dizer que não fico muito atrás. Compramos roupas e maquiagens e então decidimos almoçar na praça de alimentação.

— Bia, estou com medo de ter feito burrada por ter ficado com Lipe ontem. Tenho medo de ter estragado tudo. E se ele achar que estou querendo só sexo casual? Eu não sou dessas.

— Ele te conhece muito bem pra saber que você não é assim, não se esqueça disso. — Bia segura minha mão sobre a mesa. — Ana, você é uma mulher incrível. Você tentou. Se der certo, bem se não der, continuaremos nós três juntos. Os três mosqueteiros. Com certeza irá aparecer alguém que te mereça e te faça feliz. Se ele não se tocar e te pedir em namoro, quem vai sair perdendo é ele. — Ela sorri.

Concordo com um sorriso sem muita confiança; os pensamentos ainda em conflito. Algo dentro de mim me diz que as coisas não serão tão fáceis. Felipe poderia ter me mandado uma mensagem de manhã, ou agora na hora do almoço, mas nada.

— Vamos sair essa noite, nós três — Bia diz. — Abriu uma balada nova na cidade e tenho passes VIPs. Esse é um dos lados bom de ter um pai influente. Passo na sua casa por volta das nove, tá bom?

— Dois fins de semana curtindo balada. Você está me deixando mal-acostumada.

Nós rimos. Bia é sempre assim, me colocando para cima quando estou desanimada e puxando a minha orelha quando preciso. Eu amo isso nela.

— Gosto de mimar minha amiga.

Quando terminamos de comer, damos mais uma voltinha no shopping e decidimos ir embora. Bia me deixa em casa e eu subo direto para o meu quarto, guardo tudo que comprei em seu devido lugar e quando as coisas já estão organizadas, me deito um pouco.

O celular vibra com uma nova mensagem, e quando vejo que é Lipe, meu estômago embrulha.

"Docinho, vem aqui em casa pra conversarmos. Estou te esperando."

Me levanto e dou uma olhada no espelho para ver se tudo está no lugar. Pelo jeito eu realmente estava certa. Não vem coisa boa por aí.

Chego em sua casa, toco a campainha e Felipe aparece segundos depois. Ele me beija no rosto. E com isso meu temor aumenta. Ontem nos despedimos com um beijo, e agora já regressamos a isso?

— Pode entrar, fique à vontade.

— Obrigada.

Nos sentamos no sofá e no mesmo instante me lembro do que aconteceu entre nós noite passada, e acabo sorrindo. Um sorriso que se desfaz quando vejo a expressão séria em seu rosto.

— Ana, eu pensei muito no que rolou ontem... Você me conhece e sabe como relacionamento pra mim é difícil. Eu acabei me deixando levar pelo momento. Não que eu esteja arrependido, porque foi maravilhoso. Mas você é muito especial pra mim, e não posso correr o risco de me comprometer e não conseguir ser o que você merece. Não quero acabar te magoando e estragando nossa amizade. Entre todas as mulheres do mundo você é a única que não quero machucar, que não quero perder.

Não era bem isso que eu esperava ouvir. Meu coração se parte em dois com suas palavras, mas não deixo transparecer. Não vou deixar ele perceber o quanto me machucou. Esse era o meu medo desde o começo. Eu tentei, ninguém pode falar que fui fraca, mas no fim deu tudo erado. Como sou idiota!

— Lipe, eu realmente gosto de você, mas como quer ficar somente na amizade, tudo bem. Talvez eu tenha confundido meus sentimentos. Nossa amizade é muito importante pra mim, e você sabe que te amo... como amigo. — Abro um falso sorriso.

— Não quero que nada mude entre nós, Ana. Não acho bom ariscar tudo por uma coisa que nem sabemos se dará certo. — Ele segura minha mão e me olha nos olhos, e posso perceber que também sente algo por mim. Mas por que é tão difícil aceitar? Será que eu não valho a pena? — Quer assistir um filme? — pergunta.

Eu puxo minhas mãos de volta.

— Obrigada, mas vou pra casa descansar um pouco. Vamos a em uma boate que vai inaugurar hoje. Bia conseguiu passes VIPs e disse que passa aqui às nove. — Me levanto e vou até a porta. — Até mais tarde.

— Até.

Chegando em casa, vou direto para a cama, onde sempre me refúgio. E as lágrimas que caem eu enxugo rapidamente. Não quero ficar com os olhos inchados.

Para distrair a cabeça, assisto o que está passando na televisão, e quando o horário que combinamos se aproxima, me levanto, tomo um banho e começo a me arrumar. Escolho o vestido mais sensual que tenho, um vermelho que fica bem colado ao corpo e que tem um lindo decote, faço cachos no meu cabelo e uma maquiagem bem produzida.

Quero que Felipe me olhe e babe, literalmente.

...FELIPE...

Passei a manhã toda pensando no que aconteceu entre Ana e eu. Meu coração me pede para mergulhar de cabeça nisso, que ela é diferente e vale o risco, mas minha mente me diz o contrário; diz que Ana é mulher demais para mim, e que pode não se contentar somente comigo. Que posso ter meu coração partido pela segunda vez. Eu tenho que tomar uma decisão, e não irei arriscar tudo.

Assim que chego em casa, a primeira coisa que faço é mandar uma mensagem para ela. E quando vejo Ana na minha frente, vários sentimentos tomam meu peito. Mas tenho que ser forte por nossa amizade. E não passa despercebido para mim o modo como entristece quando beijo sua bochecha. A convido para entrar e nos sentamos juntos no sofá. Respiro fundo e começo a colocar tudo o que penso para fora. E cada palavra parece feri-la profundamente, mas não posso voltar atrás.

— Lipe, eu realmente gosto de você, mas como quer ficar somente na amizade, tudo bem. Talvez eu tenha confundido meus sentimentos. Nossa amizade é muito importante pra mim, e você sabe que te amo... como amigo.

Por que ouvir tudo isso dói tanto se era exatamente o que queria ouvir? Ana é a mulher mais maravilhosa do mundo. Ela merece alguém melhor que eu. Alguém que não seja um galinha que procura sexo sem compromisso toda noite. Um homem que não pode ver uma mulher bonita que já quer levá-la para a cama. Ela merece alguém que não seja eu. Que tipo de amigo seria se continuasse com isso?

Eu fui sincero quando disse que não queria que nada mudasse entre nós, mas a partir do momento em que puxou sua mão para longe da minha e não aceitou o meu pedido para ficar e assistir um filme, vejo que é tarde demais. Nada mais será como antes.

Eu não devia ter deixado as coisas saírem do controle.