O segundo encontro
"Amar é despojar-se de nomes."
Otávio Paz
A manhã foi um pouco difícil. Um inconveniente entre os alunos nunca falta; É comum nessas datas, acho que é pela proximidade do final do ano letivo e são incontroláveis, exaustos. Algumas vezes, eles podem ser ouvidos nos corredores, o alvoroço dos meninos gritando por uma nova briga no pátio central. Os professores separam os adversários. Eles são levados para o escritório do diretor da escola.
Enquanto isso, atenta, olhava pela janela da sala, que dá para o pátio. "Graças a Deus, é sexta-feira", diz Daniela, minha sócia da Biblioteca. "Sim, graças a Deus, a semana acabou."
Os poucos momentos que tenho para pensar são invadidos pelo sorriso de Miguel.
Já um pouco sóbria, me questiono por isso: "O que diabos está errado com esse homem Anne?" é casado! Ignoro meus brotos de consciência. Eu nunca tinha sentido isso por nenhum outro homem. Por que ele deveria colocar barreiras em algo que talvez nem fosse possível?
Hora da saída. Saio a caminho da parada. Lá, Jesus, um dos meus colegas, se oferece para me levar para casa. Aproveito sua oferta. Não é muito agradável pegar um ônibus em horário de pico e menos em uma sexta-feira. –O que você vai fazer hoje à noite?– Ele me pergunta.
–Eu acho que vou a descansar um pouco. Ontem à noite eu estava em uma reunião e adormeci um pouco tarde– respondo –Mas... se eu mudar de plano, te aviso– acrescentou.
–Isso me parece perfeito. Vou encontrar um primo para ir tomar umas cervejas e cantar num Kareoke
–OK. Estamos em contato. Eu me despeço, ele me beija na bochecha. Saio do carro e entro na urbanização.
Eu sei que ele gosta de mim. Embora ele seja muito mais novo que eu. Aos quarenta anos, toda mulher se torna mais atraente porque não tem mais tanto a perder, nem menos a acreditar. É viver por sua conta e risco. Quando eu entro, Carlos sai em seu carro.
–Vizinha, eu tenho um livro de Miguel Ruiz “A maestria do amor”, passe na minha casa hoje à noite para emprestar para ele, é ótimo!
–Obrigada meu vizinho, passei por lá.
Vou para minha casa, abro a porta, entro no meu quarto. Ainda estou um pouco de ressaca. Deito-me para descansar um pouco. Eu caí no sono. Eu os ouço tocar meu pé, é Katrina:
–Levanta mamãe, vamos jantar.
–Jantar? - pergunto surpreso, enquanto procuro meu celular e vejo a hora 19:00.
–Depois do jantar, vou com Alejandra e Javier para a casa de Diego. Posso?
–Sim meu amor, vá. Eu vou estar onde Carlos vai me emprestar um livro. E possivelmente ir com Jesus a um Kareoke.
–Ok mamãe, me mande uma mensagem. Veremos alguns filmes.
Depois do jantar, Katri e eu vamos para Alicia. Carlos e outras três pessoas estão se encontrando. Quando me aproximo, ele está lá. Sinto meu coração palpitar só de ouvir sua voz. Um pouco triste, eu saúdo de uma forma geral. Carlos me oferece uma cerveja. Dizem que é bom pra ressaca tomar uma cerveja gelada.
–Vizinha, tome uma– diz ele, estendendo a mão para me dar uma cerveja.
Eu pego e me sento. Evito olhar para Miguel, mas ele me despe com o olhar. Nesse momento, Alicia sai acompanhada de Bianca. Ambos me cumprimentam. Ela se senta ao lado dele. Como um tolo, sinto ciúmes. Como se ela não soubesse que ele pertence a ela.
Bebo a cerveja, pego o livro da mesa e me despeço:
–Você está indo embora, vizinha?–pergunta Carlos.
–Sim, vizinho. Tenho um convite de um colega para ir a um Kareoke – dei tanta ênfase e emoção que pude ver pelo canto dos olhos, a atitude de Miguel com minhas palavras. Eu não seria a única sentir ciúmes.
–Bom vizinha, divirta-se!– comentou Carlos.
Levantei-me, disse adeus com um "boa noite" e fui embora. Andei apressado. Eu precisava me tranquilizar. Peguei a chave, abri a porta. Entrei no meu quarto. Peguei o livro e tentei começar a ler. Não conseguia me concentrar, sentia um ciúme absurdo e evidentemente havia perdido o controle da realidade.
Tentei reler o primeiro parágrafo do livro novamente, para focar minha atenção nele. "A vida não é um sonho e se formos artistas, criaremos nossa vida com amor", linda frase. Bonito e difícil de entender, principalmente quando o amor sempre foi um assunto de pouco interesse para mim.
Muitos dos poemas que escrevi durante a minha juventude passaram do amor à solidão e vice-versa. Mas confesso que acreditava mais na solidão do que no próprio amor. Talvez algumas decepções do passado, incluindo ter uma filha de um homem que não me amava com a mesma intensidade que eu o amava, me deram essa percepção.
No entanto, a atração que sentia por Miguel não era apenas incomum, mas poderosa. Fechei o livro; era inevitável, tudo me levou a ele. Levantei-me, fui até a cozinha pegar algo para comer. Olhei pela janela e vi o carro de Luiz. Lá estava ele como copiloto. No mesmo momento em que o vi, ele se virou para minha casa. Nossos olhos se cruzaram como o passado se cruza com o presente, sem poder evitá-lo.
Voltei para o meu quarto. Uma mensagem no chat. Jesus: eu passei por você? Preferi não responder. Eu não queria sair. Eu estava exausta e, de certa forma, me sentia presa nas teias de Miguel. Em seus olhos verdes, em sua voz melomaníaca e em seu sorriso. Liguei para Katrina. Como sempre, ela nunca respondeu; Deixei-lhe então um áudio: “Estou em casa, não vou sair. Te espero. Não chegue muito tarde da casa de Diego"
Eu não conseguia dormir. Eu já havia dormido muito durante a tarde. Eu me virei várias vezes na cama, meus pensamentos pareciam girar com meus movimentos mas eles sempre caíam no mesmo lugar, o nome dele tinha a ver com isso? Ele era um arcanjo e ele estava me perseguindo em todos os lugares? Sorri sarcasticamente ao lembrar que Lúcifer também era um anjo e por causa dos meus pensamentos contraditórios e imorais, deve ter sido algo mais infernal do que celestial.
