Capítulo 3.2
— Oi! — Uma garota diz se aproximando da varanda. Ela aparenta ter uns quinze anos. Penso em meu filho. Ele deve ter os seus vinte e cinco? Não sei. Já deve ser um homem ou uma mulher. Suspiro.
— Oi! — respondo ao cumprimento da garota. Ela sorri.
— Posso? — Ela aponta para cadeira ao lado.
— Claro.
— Você deve ser Edgar. — Ela diz com convicção e eu a encaro aguardando por mais.
— E, quem é você? — pergunto.
— Me chamo Maria Flor, sou a filha de Morgana. — O que me diz me deixa surpreso e automaticamente olho ao meu redor a procura da sua mãe. — Ela me contou muito sobre as histórias de Edgar Fassani e de Rose Falcão — diz atraindo a minha atenção outra vez. Sorrio. Morgana era a melhor amiga de Rose aqui na fazenda. Ela era a pessoa que nos encobria para podermos namorar sem sermos descobertos. Nossa cúmplice, posso assim dizer.
— Como está a sua mãe? — Procuro saber. A menina fica séria.
— Ela está bem. Soubemos da morte da senhora Giovanna e viemos imediatamente para cá.
— Você a conhecia? — A garota parece pensar em uma resposta, mas logo faz um não com a cabeça.
— Pessoalmente, não, mas minha mãe me falou muito sobre ela. — Arqueio as sobrancelhas para essa informação. Certo que Morgana viveu aqui desde que nasceu, mas ela sempre manteve distância das fazendas Fassini, pelo óbvio. Enrico Fassini mantinha meus amigos distantes. Apenas assinto para a menina e resolvo sair um pouco, caminhar pelo jardim, até parar na pequena casa onde ela morou.
— Senhor Edgar? — Mariana indaga apreensiva.
— Será que posso entrar um instante? — peço. Ela puxa a respiração e assente receosa.
— O senhor aceita um café? — oferece.
— Não, obrigado! — A casa é bem humilde e tem as paredes brancas, alguns poucos móveis. Tem um piso de cerâmica branca e na velha estante de madeira clara, há alguns porta-retratos. Um em especial me chama a atenção. É uma foto minha e da Rose ainda criança brincando em um jardim que eu não conheço. Em outro há uma foto dela com seus catorze, quinze anos ao lado da melhor amiga que encontrara nesse lugar. Tempos bons. Não havia preocupações ali, apenas diversão e risos. Encaro a imagem por algum tempo, até perceber a presença de Josué no cômodo.
— Boa tarde senhor, Edgar, o que faz aqui? — Ele indaga com um tom áspero na voz. Ponho o porta-retratos de volta no lugar e encaro o homem sisudo em pé na minha frente.
— Preciso falar com você.
— Não temos o que conversar, senhor Fassini, não tenho nada a dizer.
— Preciso saber onde está a Rose, para onde ela foi? — Ele me lança um olhar firme. — Josué, por favor, eu preciso encontrá-la!
— Não sei onde ela está. Rose deixou de ser a minha filha desde que ágil feito uma vagabunda qualquer — rosna impaciente.
— Josué! — Mariana o repreende.
— Como pôde expulsar a sua própria filha de casa e, ainda por cima grávida? — inquiro com um tom intimidante. Josué abaixa os olhos e suspira, me encarando com uma carranca.
— Como eu disse, ela não é mais a minha filha — Dito isto, ele me dá as costas. Inconformado, eu encaro a Mariana.
— Tenho algo para você. — Ela diz baixinho, como se me confidenciasse algo e tira um papel dobrado de dentro do seu avental branco. — Sabia que viria atrás de respostas, por isso o guardei comigo — fala me estendendo o papel e eu suspiro ao ver que se trata de um endereço no Rio de Janeiro. Engulo em seco. Finalmente há um rastro de esperança correndo em minhas veias. — Eu mantive contato com ela, nós nos falamos por alguns meses, pelo menos até o nascimento da minha neta. — Neta, é uma menina, uma filha! Tenho uma filha! Meu coração parece que quer sair pela boca.
— Menina? — pergunto quase sem voz. Ela assente e deixa as lágrimas escorrerem. Puxo mais uma vez a respiração para conter as minhas lágrimas.
— Ana Júlia Falcão, esse é o nome dela.
— Ana Júlia. — Pronuncio o nome, sentindo uma sensação diferente dentro de mim.
— Esse foi o único endereço que ela me passou. Não sei se ainda moram no mesmo lugar. Já faz muito tempo.
— Vou procurá-las e prometo que vou encontrá-las. Obrigado, Mariana! — Ela se aproxima para me dar um abraço apertado.
— Eu não devia te dizer isso — sibila ao se afastar. — Josué é um homem fiel ao seu patrão, ele jamais diria.
— Do que está falando? — A interrompo.
— Seu pai nos procurou na noite anterior a sua viagem, ele nos deu um ultimato. Lembro-me como se fosse ontem.
"— Filha atenda a porta por favor — pedi enquanto tirava a travessa do forno. De repente ouvi o som vozes alteradas na minha sala e corri para ver o que está acontecendo. O pânico se alastrou dentro de mim, quando percebi o senhor Enrico segurando a minha filha pelos cabelos e gritando em alto, feito um louco descontrolado.
— Sua vagabunda, oportunista! Pensou mesmo que ia enlaçar o meu filho? Ele é muito para você. Você é uma rata de esgoto, uma infeliz. Fique longe dele — rosnou agressivamente, enquanto a minha filha gemia dolorosamente com o seu aperto.
— Mas o que está acontecendo aqui? — Josué perguntou entrando na sala em seguida. O senhor Enrico encarou o meu marido com fúria e soltou a Rose bruscamente, aproveitei e corri para perto dela, segurando-a com carinho em meus braços.
— A vagabunda da sua filha, deitou-se na cama do meu filho. É uma oportunista. Quer subir fácil na vida? Mas, não nas minhas costas. — Ele cuspiu cada palavra como se tivesse nojo de nós.
— Diga que isso é mentira, Rose. — Josué pediu quase ficando vermelho de raiva. Rose apenas chorava escondendo o seu rosto em meus braços.
—Ela não pode, peguei isso com a Morgana. - Estendeu um papel para o meu marido. Eu estava tão nervosa com isso aquilo.
— Está grávida, Rose? — Josué perguntou com amargura. Meu mundo estava desabando de uma só vez só sobre a minha cabeça.
— Por Deus, filha, diga que isso é engano — pedi desesperada. Mas, minha menina só chorava com desespero.
— FALA, PORRA! — Ele gritou e aquele som me despedaçou, quando senti a minha frágil menina estremecer.
— Quero essa vagabunda fora daqui ainda hoje!
— Por Deus, senhor Fassini, ela é apenas uma menina! — intercedi, rompendo em lágrimas.
— Uma menina esperta demais para o meu gosto. Achou mesmo que eu não descobriria o golpe da barriga? Eu lhes darei duas opções… Ela aborta esse bastardo ou vai para rua. Enrico deu o ultimato e saiu."
— Filho da puta, desgraçado, eu o mato! — brado furioso me dirigindo a porta de saída da casa. Mariana me segura pelo braço, me fazendo encarar os olhos amedrontados.
— Edgar não! Sua mãe acabou de ser enterrada, respeite a sua morte. Só se afaste, esfrie a cabeça e pense. Prometa que não enfrentará o seu pai. Se você disser uma palavra eu e o meu marido estaremos no olho da rua. — Ela suplica. De repente algo me acomete.
— Ela escolheu ter o nosso filho — sussurro emocionado. Ela assente sorrindo em meio às lágrimas.
— Encontre-as, Edgar. Essa é uma nova chance para vocês — pede. Meu sorriso se amplia Pela primeira vez em anos, sinto que respiro aliviado. Ela não me deixou de fato. Sinto-me fortalecido, renovado e… vivo outra vez.
— Vou encontrá-las e voltarei para buscá-los — prometo e ela sorri ainda mais.
— Obrigada, meu filho! Sabia que quando voltasse, resolveria tudo isso. Ajeito o meu terno e caminho de volta para a mansão.