Capítulo 6
Daniel recitou em voz alta, de pé sobre um pedestal improvisado feito de uma enorme pedra encontrada em um canto isolado do nosso pátio habitual.
-Ou eles vão te destruir.- Concluí por ele, encerrando sua coleção de poemas e citações.
-Jovens rebeldes. Eu adoro esse filme. - Ele pulou da pedra grande e se curvou para mim pela minha atuação.
Ele se virou, olhando em volta, como se pudesse capturar a cena com seus olhos sonhadores e gravá-la em sua mente para sempre.
-Allen Ginsberg, o melhor poeta de toda Nova York, gênio do caralho, volte à terra e me ensine seus segredos!- gritou ele, abrindo os braços e erguendo a cabeça em direção ao céu num gesto teatral.
Eu não conseguia parar de rir, estava olhando para ele lá de baixo, sentado de pernas cruzadas no asfalto.
Sempre esperávamos o pôr do sol assim, ele falava demais e eu adorava ouvi-lo.
-Você não acha que o superestima um pouco? Ou você só é tendencioso porque o ator que o interpreta tem o mesmo nome que você? - perguntei rindo.
Ele colocou a mão no peito dolorido.
-Você me machucou, eu conheci aquele poeta antes do filme ser lançado.-
-Suponho que sua admiração se deva à sua -transgressividade-.- levantei a hipótese.
-Bem, sim, se você somar o fato de que seus poemas foram proibidos e considerados escandalosos apenas por serem homossexuais e estarem trancados em um hospital psiquiátrico.-
Ele anotava pensamento após pensamento, desenhos do que o intrigava, frases, tudo e muito mais em seu caderno, e depois me entregava o relatório semanal de suas reflexões, e eu lhe contava as minhas à minha maneira.
“Você já amou tanto algo que deixou que isso o destruísse?” Perguntei enquanto ele se sentava ao meu lado.
"Não, mas amei muitos para torná-los meus para sempre", respondeu ela, ajustando os óculos quadrados no nariz.
-Se você não quer ser destruído, não se afaste dele- ele continuou olhando para o céu ainda claro.
-E se você for forçado a deixá-los ir?- Comecei a traçar o chão abaixo de mim com seu lápis.
-Você viverá uma vida sofrendo por eles.-
O sol começou a se pôr, colorindo nossos rostos, iluminando nossos cabelos, nos mostrando que apesar de tudo, só de olhar pode se tornar uma forma de seguir em frente.
————
-Não! Não! Nicole, sinto muito, mas ainda não chegamos.-
Foi a terceira vez que o produtor me interrompeu e me fez recomeçar, eu estava cansado e começando a perder a concentração.
-Comece de novo, quero uma voz rouca e mais baixa. Tente fazer melhor porque você está atrasando todo mundo.-
Agarrei a alça do microfone com força, mordendo a língua para não responder à única pessoa que se ofereceu para nos levar a sério.
Olhei para Carter atrás do vidro, "você consegue" ele imitou com os lábios, fechei os olhos por um momento recomeçando com o primeiro verso.
Cantei, olhando para meu amigo de olhos azuis em busca de um rosto que não fosse o rosto exigente de Nathan.
Mas logo, à direita de Carter, também encontrei Ryan.
Olhamos nos olhos um do outro pelo resto do tempo, que pareceu passar em câmera lenta.
Presumi que éramos só eu e ele, vi-o sorrir e a voz saiu sozinha.
Consegui terminar a música e foi a última gravação do dia.
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“Você precisa de lições sobre como interagir com o público”, disse Nathan, reunindo todos para si.
“Principalmente você, Ryan,” ele continuou, fazendo uma risada geral enquanto o garoto, que havia recentemente voltado a se vestir como de costume, corava violentamente.
-Agora quero que todos vocês entrem nesta plataforma.-
Estávamos em outra ala do prédio, em uma sala vazia com piso esponjoso e acolchoado, típico de academia.
Subimos todos em uma plataforma encostada na parede, fazendo fila, esperando novas direções.
-Bom, agora você terá que se revezar dando um high five para meu assistente sem deixar que ele te solte.-
Olhamos um para o outro, perplexos com o que ele estava nos pedindo para fazer.
“Com licença, o que tudo isso tem a ver com música?” Carter perguntou para todos.
-Se você realmente quer ter sucesso, também precisa saber administrar shows e estar preparado para os fãs. Nem todos ficarão calmos e pacíficos, você deve saber que os shows de rock são os mais confusos e selvagens.-
Parecíamos crianças dando os primeiros passos, a cada dia aprendíamos coisas novas nas quais nunca havíamos pensado.
Brooke ficou na nossa frente estendendo a mão para nós, os meninos se revezaram tentando correr para cumprimentá-la, saindo do topo da plataforma.
Carter, Ryan e Jody fizeram isso perfeitamente, Sam por outro lado foi muito lento, foi fácil para Brooke apertar sua mão e tirá-lo do -palco-.
Todos riram loucamente ao ver Sam caído no chão, menos eu que tive medo de fazer o mesmo.
Desci correndo para tocar a mão na minha frente e então rapidamente me levantei e voltei para o meu lugar.
Foi divertido e diferente do habitual, ideal para uma pausa do peso dos ensaios.
Brooke forçou Sam a ensaiar mais algumas vezes enquanto Nathan explicava aos demais várias técnicas para envolver o público, coisas para as quais Carter tinha um talento natural.
Ryan e eu, por outro lado, ficamos tão envergonhados que ele estremeceu.
-Vocês dois estão perdidos agora, vocês acham que por acaso têm que cantar em um cemitério?-
Nos entreolhamos envergonhados em meio às risadas gerais.
-Escute, o projeto da turnê é sério. Estamos gravando há semanas e está tudo pronto para lançar seu primeiro álbum, então é melhor você se preparar para a ideia.-
Era tudo tão absurdo que foi difícil, quase impossível, para mim perceber.
Uma coisa era tocar para cerca de cinquenta estudantes em um bar suburbano e outra era tocar ao vivo para um número desconhecido de pessoas.
-Você precisa experimentar as técnicas que acabei de te explicar e ao mesmo tempo aproveitar para experimentar o dueto também, amanhã com isso teríamos finalizado todas as gravações.-
Então Nathan virou-se para o resto dos meninos.
-Os outros podem ir, terminei com você por hoje.-
Ryan e eu observamos, perplexos, os meninos saírem da sala, seguidos pelo homem com a menina vermelha ao seu lado, deixando-nos sozinhos ali.
Demorou alguns segundos até percebermos que precisávamos nos mover.
Ryan arrastou duas cadeiras da sala ao lado, tirou o violão dos ombros e apoiou-o no joelho direito.
Sentei-me na cadeira em frente a ele, limpando a garganta, visivelmente exausto depois de uma longa semana de esforço.
-Suas cordas vocais estão danificadas, você deveria fazer um exame.- Ele mudou a posição dos dedos no teclado sem tocar nas cordas, memorizando apenas os acordes, fios de cabelo preto caíram na frente de seus olhos, escondendo seu rosto.
-Eu faria se não estivéssemos fechados aqui todos os dias para gravar.-
Senti seu olhar em mim e era pesado, não conseguia parecer tão confiante quanto queria que ele acreditasse, só estava com vergonha e queria ir embora.
-Pare de olhar para mim.-
-Não me perguntes.-
-Ryan...-
Ele se levantou colocando o violão na cadeira vazia, ficou na minha frente se abaixando na altura dos meus olhos... abrindo minhas pernas para me agachar.
Eu estava segurando os braços dele no colo, mas não tentei me mexer, estava fraco demais para ele e era tudo culpa dele.
-Olhe-me nos olhos e diga-me para ir embora.-
Eu insisti em não olhar nos olhos dele mas foi inútil, ele agarrou meu queixo me obrigando a me virar, ele estava me tentando... ele era um mestre nisso.
-Você não vai, você não quer que eu vá embora.-
Engoli. Essa proximidade não fazia bem à minha lucidez. Senti suas mãos descendo pelas minhas pernas e estendi a mão para detê-lo.
Mas ele pegou minha mão e apertou com tanta força que doeu.
Ele estava certo. Eu não queria que ele fosse embora.
-Não seja egoísta-, mas eu queria ser.
-É para o seu bem-, mas eu preferi o meu.
Senti sua mão deslizar pelo meu corpo, apertando levemente meu pescoço, aplicando pressão para me forçar a aproximar meu rosto do dele.
-Eles se tornam parte de você ou te destroem-, ele era parte de mim apesar da dor que me causou, da amargura que deixou em minha boca após cada momento compartilhado.
Ele me beijou com entusiasmo e eu instintivamente respondi abrindo os lábios, abandonando-me a ele.
Foi ruim, mas eu não me importei.
Eu teria me arrependido, mas estaria disposto a fazer isso de novo.
A mão dele estava firme no meu pescoço, a outra apertava minha perna, sua língua procurava a minha e não tinha como parar.
Ele se sentou no meu lugar e eu acabei montando nele enquanto ainda o beijava, aproveitando suas mãos nas minhas costas.
Eu não tinha ideia de quanto tempo havia passado, mas depois de um tempo ele se afastou de mim, olhando para mim com um meio sorriso.
-Vamos sair daqui.-
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Não conseguiria descrever em palavras o quanto sentia falta daquele telhado da Garagem, daquele frio glacial que perdia força ao lado dele.
Ele me despiu com impaciência, sem parar de me beijar.
-Foda-se, vou até assinar aqui.-
Ele arrancou a camisa e passou da boca dela até o pescoço, chupando a pele delicada, queria deixar sua marca.
Ele passou a mão pela minha calça jeans, desabotoando-a e deslizando-a para dentro.
Mordi o lábio, com vergonha de deixar passar.
"Você não vai conseguir se conter por muito tempo", ele sussurrou em meu ouvido, me fazendo estremecer.
Ele os tirou e se despediu, entrando em mim com força, sem esperar nem mais um minuto.
Não pude deixar de começar a gemer, apertando fios do seu cabelo nas minhas mãos.
Eu era completamente dele e nada iria mudar isso, eu nunca negaria meu corpo a ele e ele sabia disso.
Ele pressionou a mão contra meus lábios, percebi que estava gritando, mas não parei até chegar ao clímax e ele estar comigo.
Ele caiu em cima de mim e eu passei meus braços em volta dele, aproveitando seus cabelos em meu rosto, o contato com seu corpo, sua respiração em meu pescoço.
“Terei que esconder isso amanhã.” Apontei para o chupão que ele havia deixado na base do meu pescoço, logo acima da minha clavícula.
-Qualquer um que o vir saberá que deve se virar.-
-Calculando idiota.-
“Como está a dupla?” perguntei, tirando uma mecha de cabelo do rosto dela.
-Vamos improvisar.-
Na manhã seguinte não consegui encontrá-lo.
Ele deveria ter esperado isso, ele não precisava ficar.
Levantei-me do sofá de couro dolorido, a persiana estava na metade, subi na caixa velha no centro da sala notando pelo canto do olho sua jaqueta de couro na bateria de Sam.
Coloquei-o, fingindo não me machucar por estar ali sozinho.
Enganando-me de que consegui o que queria, de que o que havia era suficiente para mim.
Olhei para a tela do telefone desligado, concentrando-me na marca que ele havia deixado em mim.
Uma forma como qualquer outra de ter controle, de satisfazer seu ego.
A lembrança da noite passada, ainda doce em minha mente, logo se tornaria amarga quando eu fingisse que nada havia acontecido entre nós.