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A ficha caiu.

(Tomaz)

Minha cabeça dói. Dói como se estivesse 20 escolas de samba desfilando ao mesmo tempo dentro dela. Que droga!

Pausa pro almoço.

Quando eu ía sair da minha sala, meu pai entra. Bufo alto demonstrando irritação.

_Já iria correr pro bar, não é?_Ele me interroga._Ou iria pra sua casa beber lá?

_Não interessa._Respondo massageando minhas têmporas._Preciso de um remédio, só isso.

_Seu remédio contém alto teor de álcool._Ele toca no meu ombro._Por que você não tira umas férias com sua mulher? Ela iria adorar viajar com v...

_Não! Que droga!_Explodo._Eu não quero viajar, só quero viver em paz. Com licença, pai.

Saio da sala o mais rápido que posso. Desde que casei trabalho nessa empresa, mas confesso que não é nada fácil trabalhar com um pai que vive querendo controlar minhas ações. Entro no meu carro e penso em realmente ir diretamente pro bar que tanto gosto, mas acho que vou passar em casa pra tomar um banho.

Minutos depois desço do meu carro e entro em casa. Sigo diretamente pro quarto afim de tomar um banho logo. Algo está diferente. Ignoro e vou pra debaixo do chuveiro. Pensamentos torturantes invandem minha cabeça e então decido sair do banho o mais rápido que consigo. Tenho que beber, logo. Me visto correndo, passo perfume e desço a escada. Estranho. A Bianca deveria estar me tentando fazer comer alguma coisa, sempre é assim.

Vou até minha garrafa de whisky favorita e vejo um papel perto. Observo melhor e vejo que é a caligrafia da Bianca na carta. Abandono o copo e a garrafa, pego o papel e sento no sofá pra ler. Ela bem quer me dizer que foi pra casa de alguma amiga, claro.

Minha cabeça volta a doer ao me deparar com a primeira frase escrita.

"Tudo começou quando perdemos nossa filha."

Ela sabe que odeio esse assunto. Odeio!

As lágrimas surgem quando ela começa a dizer coisas que sei bem e me maltrato todos os dias por isso. Engulo seco ao ler outra frase impactante.

"E aqui estou eu, grávida e te deixando."

_O quê?_Pergunto em voz alta._Mas...

Continuo a ler e confirmo o que meu coração se recusa a acreditar. A Bianca foi embora, e estando grávida.

Droga, Bianca!

Olho pra garrafa de whisky com dor nos olhos. Pego a garrafa e subo até a sala onde fica salvo as imagens das câmeras. Desligadas.

Um gole.

Tiro o celular do meu bolso e ligo para ela. Escuto o celular tocando de dentro do nosso quarto. Pego o aparelho jogado em cima da cama onde meu contato está salvo com o nome amor e rejeito a ligação.

Segundo gole.

Terceiro gole.

Quarto gole.

Pego meu celular novamente e ligo pro Fábio, meu amigo de infância. Ele avisa que está chegando em alguns minutos.

Quinto gole.

Sexto gole.

Desço a escada e fico aguardando meu amigo com a garrafa pela metade e a carta na outra mão. Como você pede pra eu recomeçar, Bianca? Não tenho motivo nenhum pra recomeços.

Sétimo gole.

A campainha toca e eu pouco cambaleante, abro a mesma. Fábio entra não entendo a urgência da minha ligação desesperada.

_Ela foi embora._Digo sentando no sofá._Grávida. Pediu pra eu não segui-la. Ela quer ser feliz. Quer um recomeço.

Oitavo gole.

A garrafa é tirada das minhas mãos.

_E você me diz isso assim? Como se não tivesse culpa?_Ele coloca a garrafa longe.

_Eu não te chamei aqui pra que você me acusasse, Fábio._Tento soar irritado, mas pareço mais um condenado._Ela foi embora, você me ouviu?

_Dou razão a ela.

_É o quê?_Levanto do sofá._Ela é minha mulher, casada comigo e foi embora. Me deixando apenas a porcaria de uma carta, Fábio. Você dá razão a ela?

_Sim, dou._Ele reafirma._Ela já não era tua mulher, cara. Ela era parte da decoração da casa e você não estava nem aí. E a festa? Cara..._Ele ri sem humor negando com a cabeça._Ela organizou tudo aquilo e você parecia ter voltado a si, mas não demorou nem 24 horas e você voltou a ser o bêbado imprestável que vem sendo desde que a Nathalie morreu.

Caminho até ele na tentativa de lhe dar um soco, mas sou derrubado com uma rasteira.

_Não fale da Nathalie!_Grito caído no chão._Não fala da minha filhinha... Não fala, por favor... Não...

As lágrimas desciam tão descontroladas e eu não lembrava quando foi a última vez que chorei assim. Ainda caído no chão, consigo enxergar a mão do Fábio estendida pra me ajudar.

_Você não pode ir atrás da Bianca._Ele me levanta e me empurra no sofá._Você é um bêbado que vai dizer palavras duras a ela. Ela vai ficar melhor sem você.

_Eu amo aquela mulher!_Grito parecendo uma criança._Ela não pode ficar longe de mim.

_Mas você ainda é um bêbado egoísta que deixou sua mulher sozinha na morte da filha de vocês e todos esses anos._As palavras dele estavam doendo mais do que as do meu pai._Eu sou teu amigo, Tom, mas não sou daqueles que passa a mão na cabeça e te oferece bebida pra acalmar. Eu sou daqueles que vai te bater se necessário, e eu não hesito quanto a isso.

Eu estava me sentindo tão ridículo. Eu não quero reviver essas lembranças...

Dói. Sufoca.

A Bianca soube passar pelo luto. As mulheres são mais fortes que nós homens. Eu não consigo, mas a quero comigo.

_Preciso descobrir pra onde ela foi._Digo enxugando as lágrimas.

_Não, você não vai._O tom de voz de Fábio me faz o observar incrédulo._Você só vai procurá-la quando deixar de ser um babaca, bêbado e egoísta. Vai se tratar, e melhorar.

_Isso vai demorar muito?

_Ela esteve aqui esses anos todos e você não estava nem aí. Não seja hipócrita de sentir a falta dela só por que a mesma foi embora. Agora levanta e pega algumas roupas. Vou te levar em uma clínica de tratamento ótima. Só depois de consciente, você vai decidir o seu futuro.

***

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