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CAPÍTULO 1

SOFIA SALAZAR

Itan e eu éramos muito unidos desde sempre. Prova disso, é o fato de nascermos até no mesmo dia. Sim, nós somos gêmeos. E foi por sair da mesma barriga que eu, logo após minha estreia nesse mundo, que ele obteve tamanha sorte em puxar minha beleza magnífica.

Mas, como nem tudo é perfeito, a semelhança que nos une se restringe somente ao campo da aparência física.

Itan era completamente oposto de mim no quesito personalidade.

Enquanto eu me portava de maneira livre e espontânea durante boa parte da nossa infância, Itan agia de maneira introvertida, enclausurado em meio a pilhas de livros e livros como um verdadeiro rato de biblioteca, isolando-se do restante das outras crianças e do mundo. O que é um comportamento completamente estranho para pessoa com tão pouca idade.

Porém isso nunca foi um empecilho entre nós dois, éramos como unha e carne. Andando juntos para cima e para baixo, brincando de casinha -não que ele vá assumir isso algum dia- ou de astronauta, formávamos uma dupla imbatível, como as pessoas gostavam de nos nomear.

Rio com a lembrança das diversas vezes em que nos metemos em encrencas e travessuras, e como resultado de nossas peripécias, acabávamos de castigo.

Bons tempos... Eu sinto saudade de quando a vida não era tão complicada assim.

Eu não sei o que aconteceu com o passar do tempo, que conseguiu nos distanciar um do outro. Talvez com a chegada da maturidade e a descoberta de novos desejos e ambições, o mundo tenha finalmente achado que era justo que nos separássemos para que outras pessoas pudessem ter a oportunidade de entrar em nossas vidas.

Talvez esse tenha sido o erro...

Acho que não foi algo que aconteceu da noite para dia, em uma quebra rápida e abrupta. Não. Foi uma acontecendo de uma maneira lenta, gradual e sutil. Tão sutil que nem percebemos ocorrer diante dos nossos próprios olhos. Quando vimos o estrago já estava feito. Mas não vou me lamentar, já está feito, o que importa é que eu ainda o amo e isso basta.

Como águas passadas não movem moinho, o melhor a se fazer é como as pessoas dizem por aí: segue o baile.

-Irmãzinha, está aí? -Itan perguntou com a voz abafada do outro lado da porta do meu quarto.

Falando no diabo...

-Não estou não. Eu morri só que esqueceram de enterrar o corpo. -resmunguei deixando minha cabeça cair sobre o travesseiro.

Fazia mais de dez horas seguidas que eu estava sentada na cama e não saía do quarto para nada. Eu não estava me sentindo nada bem. As minhas vistas o quarto parecia girar e girar, sem nunca parar. A cabeça dolorida era o menor dos meus problemas no instante, a garganta seca e a tontura conseguiam ser bem pior.

-Sof, abre a porta. Quero falar com você. -Itan insistiu mais uma vez batendo na porta.

Que inferno! Por que ele não ia simplesmente embora?

-Anda, Sofia. Pare de ser teimosa e abra logo essa merda para que eu não fique gritando feito um louco com um objeto inanimado. -ele socou com um pouco mais de força a porta.

Parecia que a qualquer momento ele iria a por abaixo. Como eu odiava quando Itan agia irritantemente.

-Some daqui, Itan. -eu rosnei para ele.

-Qual é o seu problema, Sofia? Você por acaso é louca? -Itan exclamou ofendido.

-Me deixa em paz! Vai embora. -eu berrei antes de perder os sentidos e minha visão escurecer por completo .

* * * *

Não sei quanto tempo depois, acordei me sentindo horrível. Boca seca, estômago dolorido e uma leve dor de cabeça.

O quarto estava mergulhado em um denso breu, me alertando que já estava de noite. Antes que eu pudesse tomar qualquer atitude, um reboliço se fez dentro de mim e em poucos segundos eu corria em direção ao banheiro e colocava o pouco de líquido que ainda restava dentro de mim para fora no vaso sanitário.

Quando não havia mais nada a ser expedido do meu corpo, apoiei as mãos nas bordas do vaso e apliquei a pouca força que existia em meus membros e me ergui com certo esforço.

Olhei minha imagem refletida no espelho e não gostei do vi. Meu rosto pálido exibia grandes bolsas e olheiras embaixo dos olhos e meus lábios estavam ressecados, meus olhos pareciam opacos, sem vida ou seja, eu estava com uma aparência terrível.

Fiz um coque frouxo no alto da cabeça, peguei a escova de dentes e me enfiei debaixo do chuveiro. Poucos minutos depois saí molhada do box e encharcando de água todo o percurso, fui até o quarto em busca de uma toalha.

Me vesti logo em seguida e criando alguma coragem que eu não sabia de onde vinha, destranquei a porta e caminhei pelo corredor vazio da casa e desci as escadas indo em direção a cozinha. Abri a porta da geladeira e retirei uma torta de morango e leite ninho, e uma jarra de água.

Coloquei tudo sobre a mesa, retirei um prato do armário e me servi de um pedaço de torta. Estava na terceira garfada quando senti uma leve tontura me atingir ao mesmo tempo que um fisgada atingiu meu cérebro. Fiz um careta de dor.

-Com ressaca? De novo? -a voz de Itan soou pelo silêncio do ambiente e eu dei um salto na cadeira assustando-me com sua aparição repentina.

-Isso já está se tornando um péssimo hábito. Ouso até dizer um vício. -ele disse aproximando-se e parou em frente a mim com a mesa nos separando.

-Você não sabe de nada. -eu murmurei sem fitar seu rosto.

E ele realmente não sabia mesmo. Pude ouvir Itan remexer em algum bolso do casaco que vestia e em seguida jogar uma cartela de comprimidos em minha direção. A cartela deslizou até parar perto do prato que eu segurava entre os dedos com certa força. Desconfiada, fiz questão de não pegar o objeto com receio do que seria.

-É para dor de cabeça e muscular. -ele respondeu como se adivinhasse meus pensamentos.

-Eu não sei o que você tem, Sofia. Mas se precisa de ajuda, tem que falar, tem que deixar as pessoas se aproximarem de você. Eu te amo e me preocupo com você, irmãzinha. Mas estou cansado de tentar e ser repelido. Você tem que decidir o que quer da vida. -Itan disse e se retirou da cozinha me deixando sozinha imersa em dezenas de pensamentos.

Eu me perguntei quando é que havia me tornado uma estranha dentro da minha própria casa, para a minha própria família. Mas nada obtive em resposta.

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