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TRÊS

— O que fará depois do jantar? — Encaro minha mãe do outro lado da mesa, sem entender essa pergunta completamente absurda.

— Você sabe, fazer-lhe companhia.

— Ora, filha, o vilarejo está todo arrumado para a festa da colheita. Por que não vai se divertir um pouco?

— Não vou deixá-la sozinha, mamãe! — rebato.

— Você sabe que com os efeitos dos remédios, dormirei muito rápido e depois? Vai mergulhar nos seus livros?

— Adoro os meus livros!

— Lara, você é jovem e trabalha muito. Precisa sair um pouco, precisa se divertir.

— Mãe, não adianta! Não vou deixá-la sozinha! E eu nem tenho roupa para esse tipo de coisa. — Ela sorri e eu sei que não desistirá dessa ideia maluca.

— Tem o vestido que fiz para você no seu último aniversário. — Penso nos balões coloridos que vi na entrada da vila, em todas as barracas montadas com todas aquelas comidas. Com certeza será uma festa linda. Sorrio internamente.

— Tudo bem, mas não ficarei fora de casa mais que uma hora — replico e seu sorriso se torna ainda maior.

— Combinado! — Após deixar a cozinha arrumada e de ter a certeza que dona Sara tomou seus remédios, corro para o velho guarda roupas e pego o vestido branco de algodão, guardado dentro de uma saco plástico e o ponho em frente ao meu corpo. Olho-me no espelho gasto colado em uma das portas do guarda-roupas e sorrio satisfeita. Sem demora, livro-me das roupas em meu corpo e o vesto imediatamente. Calço uma rasteirinha e solto meus cabelos, que caem como uma cascata, alcançando a minha cintura. Sinto-me linda e antes de realmente sair de casa, dou uma olhadinha em minha mãe. Ela já está dormindo. Constato. 

O vilarejo está especialmente iluminado essa noite e a música animada, alegra ainda mais o lugar. O movimento de pessoas, os jogos e brincadeiras, as barracas que vendem seus produtos, tudo isso tem uma alegria contagiante demais. Mas foi a pista de dança no centro do pátio, que me chamou atenção.

— Quem te viu, quem te ver! Lara Dibuar, resolveu viver um pouco? — Lázaro, um rapaz que mora aqui no vilarejo, fala com um tom debochado. É um homem bonito e é trabalhador, mas é mulherengo e o fato de saber disso, me mantém distante dele e dos seus amigos. Resolvo não responder ao seu comentário e continuo olhando a dança. — Você está uma gata! — Continuou. Olho-o rapidamente e volto o meu olhar para a dança. — Quer dançar?

— Não, obrigada!

— Por que não?

— O quê?

— Você se vestiu para vir a uma festa e não quer dançar, por quê?

— Eu só não quero, ok? Não preciso de um porque — rebato e tento me afastar, mas ele segura o meu braço, puxando-me ao encontro do seu corpo. Lázaro inclina um pouco a sua cabeça e os seus olhos se fixaram nos meus.

— Não devia me esnobar assim, Lara. Sabe, você precisa muito da ajuda de todos aqui e eu posso lhe dar muito mais, se aceitar ser minha — sussurrou, inclinando-se ainda mais, e logo os seus olhos caíram para a minha boca. Engoli em seco e o empurrei para longe de mim.

— Não dependo de você para nada! Tenho braços e pernas fortes e perfeitos para trabalhar. Tenho uma saúde de ferro e consigo sustentar a mim e a minha mãe sozinha. E mesmo que você fosse o último homem na face da terra, ainda assim, não recorreria a você para nada!

— Escuta aqui garota… — Ele me interrompe furioso, mas é cortado imediatamente, por uma voz grossa e firme.

— Se afaste dela, se não quiser que eu quebre essa sua mão atrevida! — Ambos olhamos para o homem muito bem-vestido, em pé ao lado de Lázaro, que o olhava com sangue nos olhos.

— Quem é você, imbecil? — Gael veio para o meu lado e inesperadamente levou uma mão a minha cintura, puxando-me para mais perto dele. Os olhos de Lázaro pararam sobre a mão possessiva na minha cintura e eu simplesmente não sabia o que fazer.

— Sou o namorado de Lara, e quero você bem longe da minha garota! — Lázaro me olhou-me com espanto, mas ergueu suas mãos e imediatamente começou a afastar-se de nós dois. Só então Gael folgou seu aperto em minha cintura e se afastou um pouco. Ele parecia sem jeito e eu mais ainda. — Parece que você gosta de viver perigosamente — cantarolou com humor.

— O que faz aqui? — indago cheia de curiosidade, ignorando o seu comentário, e ele dá de ombros, levando as mãos aos bolsos das calças.

— É uma festa, por quê não estaria aqui?

— Desculpa! É que você não se encaixa nesse lugar. — Resolvo ser sincera. Ele sorri, mas parece confuso com o meu comentário.

— Pensa que eu não me encaixo aqui? Que infeliz comentário, senhorita! — Faz graça, mas eu não sorrio, porque me senti envergonhada. Suspiro baixinho e tento lhe explicar o melhor possível.

— O que eu quis dizer, é que você não tem a pele queimada do sol, como todos aqui. Ela é bem tratada e o seu cabelo também. E suas roupas arrumas, e parecem ser bem caras.

— Ok, entendi. Já você se encaixa perfeitamente. Tem a pele bronzeada, os cabelos estão sempre soltos e, é muito linda! — fala a última parte com um tom mais baixo e olhando em meus olhos. Senti minhas bochechas queimarem e abro um sorriso acanhado para ele, desviando o meu olhar para a dança, contendo outro suspiro. — Quer dançar? — Seu convite me faz olhá-lo, dessa vez com receio.

— Ah! Não. É que eu não sei dançar. — Minha voz tremulou e ele sorriu.

— Se você quiser, eu te ensino. — Gael me estendeu sua mão e eu a olhei hesitante. — E então? — insistiu. Senti meu coração bater violentamente em meu peito e mesmo vacilante, segurei a sua mão e nós fomos para o meio das pessoas que dançavam animadas. O som tinha um ritmo agitado e Gael começou a se mexer bem diante de mim, ditando alguns passos. Comecei a repeti-los meio desengonçada e isso o fazia rir ainda mais, mas aos poucos, fui relaxando e na terceira música já tinha mais firmeza. — Suponho que você me enganou — fala ofegante, me fazendo girar em seu braço e logo o meu corpo estava colado ao seu e nos mexemos juntos. Nossos olhos se conectaram de um jeito que eu não consegui desviar e a música chegou ao fim, mas permanecemos colados e nos olhando. Perfect , de Ed Sheeran começou a tocar e nos afastamos. Eu ofegava e ele também, e pensei em sair dali, mas, mais uma vez Gael me estendeu sua mão. Cogitei dizer que não, mas me peguei segurando sua mão outra vez e logo os seus dedos apertaram de leve a minha cintura, e o meu corpo logo estava perto demais do seu. Ele começou a se mexer lentamente e como em uma sincronia inexplicável, o meu corpo seguiu o seu. Quis esconder o meu rosto do seu, na verdade, eu queria me esconder inteira. É estranho pensar que estar tão perto assim me fez sentir coisas que não sei explicar?  No meio da dança, ergo os meus olhos e encontro os seus intensos, me puxando para um mundo completamente desconhecido, e foi quando os seus olhos desceram para a minha boca, que senti um calafrio e me afastei.

— Eu preciso ir — falei.

— Agora? — Fiz sim, com a cabeça.

— Deixei minha mãe sozinha — explico e nem sei o porquê. Eu não precisava me justificar para um estranho, certo?

— Eu te acompanho.

— Sério, não precisa, eu…

— Eu não me perdoaria se algo te acontecesse, então faço questão, senhorita. — Não consego evitar um leve sorriso de satisfação.

— Nesse caso. — Do de ombros e saímos caminhando lado a lado, sem nada a dizer  por alguns poucos minutos, até chegarmos na frente da pequena casa. Puxo uma respiração e o olho determinada a sair dali quanto antes. — Boa noi… — Gael aproxima-se rápido demais, segura o meu rosto em suas mão e antes que eu pudesse pensar em qualquer coisa, sua boca ávida estava na minha. A sua maciez e calor contradizia a tempestade que se formou dentro de mim, meu coração batia descontrolado demais e eu mal conseguia respirar. Havia uma turbulência acontecendo dentro de mim e eu senti perder as minhas forças. E quando se afastou, seu olhar prendeu o meu.

— Boa noite, Sara! — sussurrou. Mexi-me no automático, abrindo a porta e entrei me encostando nela. Ainda respirava com dificuldade e os meus lábios ainda estavam dormentes, sentindo o seu ataque. Um delicioso ataque! Sorri levando dois dedos a minha boca.

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