A verdade
Beatrice Costello
Seus olhos escuros parecem ter sido tomados pelo ódio ao mesmo tempo que vê meu estado e se apieda. Os cabelos bagunçados e a barba sempre bem-feita completando o rosto familiar, percebi a culpa no seu olhar.
— Beatrice! – Sussurrou — Aquele filho da puta vai morrer! Por que não disse nada?
— O que poderia dizer irmão? Stefano é meu marido, filho do Don Sartori. Não é como se ele fosse punido por usar a sua puta.
— Cazzo! Você é a esposa dele porra! – exasperou abaixando a voz logo em seguida e olhando para a porta.
Mesmo que as regras da família fossem claras sobre respeito, fidelidade e não machucar as esposas Stefano não era qualquer um, por baixo da pele dele havia um verdadeiro demônio. O que uma simples mulher poderia alegar para que todo um conselho feito por homens não veja o meu estado como uma simples educação?
Não duvido que outras mulheres na organização passem por coisas iguais ou piores, o resultado de um comando que só valoriza a própria casa, o Don parece não perceber que alimenta os próprios lobos, deturpando todos os nossos valores da Sicília.
Sem ter como argumentar, abaixei o lábio inferior para que visse a minha marca como propriedade de Stefano Sartori, seus olhos se arregalaram.
— Eu vou matá-lo – Giacomo parecia pronto para correr, segurei seu braço com toda a força que resta depois de dias sem comer.
— Como você me achou? –Temi que meu marido voltasse e o encontrasse ali.
— Aparentemente, não sei o que fez nem irei perguntar, mas parece ter conseguido a lealdade de um dos soldados do seu marido.
— Frank? – Perguntei.
— Sim, ele foi até meu apartamento dizer que você estava sumida há cinco dias só que na verdade Stefano estava te mantendo presa.
— Eu descobri estar grávida, ele me espancou e me usou até que perdesse mais um bebê. – Solucei e os braços do meu irmão apoiaram meu corpo fraco
— Você não pode matar ele, seria uma guerra Giácomo, faz três dias que ele saiu deve voltar a qualquer momento...
A fúria emergindo em ondas com o relato, a verdade é humilhante e a culpa é toda minha por não ser uma boa esposa.
— Foda-se vou fazer esse filho de uma puta pagar, não vou conseguir me perdoar por não ter te libertado disso antes.
Todo esse tempo mantive a farsa do casamento perfeito, de esposa perfeita uma boneca, tentei perdoar meu irmão mais velho, afinal, ele só cumpriu com seu papel dentro da organização.
Desde a morte do nosso pai, ele se tornou tudo para mim cuidando de todos nós e fazendo de tudo para nos manter unidos.
Soltei os braços do meu irmão, andando pelo quarto pensando num modo em que possamos sair todos vivos, as ideias fervilhando na mente nervosa cheia de sussurros horrendos e um desejo enorme de vingança.
— Hunter! – Exclamei — Fale com Hunter, ele conhece vários fornecedores de drogas, pegue alguma que possa derrubar Stefano e uma que se pareça com um boa noite cinderela.
As ligações do meu marido com certos contatos seriam apenas um brinde, as ideias ganhando vida e os pensamentos macabros tomando conta do corpo, de poder ter uma vingança dele e dos culpados pelos pesadelos horrendos. Cada um deles que destruiu uma parte da garota sonhadora, cada um que provocou um aborto tirando a oportunidade de a vida existir.
O modo grotesco como perturbou e matou cada parte boa dentro da minha alma, suas formas de tentar convencer sobre o quanto seu amor é forte e logo depois suas mãos se fecharem ao redor do meu pescoço. A culpa deve ser toda minha, por desejar um dia sem uma surra ou sonhar com um toque de amor, fiquei presa aos sonhos ingênuos esperando que Stefano se torne outra pessoa, abdicando de todas autoestima para viver em função dele, esperando por ele ansiando para que depois da dor viesse o toque quente e carinhoso.
Olhei para meu irmão sabendo que tudo estava prestes a mudar.
Livraria o mundo de Stefano e de brinde o colocaria no poder da família.
— O que quer fazer Beatrice? – A voz baixa e grave expressando a curiosidade
— Primeiro a morte dele me pertence – Meu irmão mais velho balançou a cabeça desacreditado — Você acabou de dizer que não se perdoaria, essa é a sua oportunidade irmão. – Sem nenhum escrúpulo aproveitei da sua dor pela minha ruína.
Por mais que tenha tentado nunca conseguir perdoar verdadeiramente Giácomo por ter me entregado tão jovem a esse demônio, se ele me tirasse a oportunidade de matar Stefano essa dor nunca iria passar.
Nossos olhares entraram em um embate silencioso, seus olhos viajaram pelas mordidas em meus braços e todas as marcas visíveis pelo pequeno pijama sujo. Aproveitei sua inspeção minuciosa para soltar a bomba.
— Vamos matá-lo e forjar a minha morte para a família, deixaremos os rastros para que acreditem que foram os sicilianos, Don Sartori vai caçar os culpados cego de ódio – Vi seu silêncio como um incentivo para continuar — Os Sartori vão sumir do mapa Giácomo, e você, o mais velho da família Costello, vai tomar a cadeira.
Meu único motivo para lutar por uma vida vai ser colocar as minhas mãos em cada um deles e tê-los implorando por uma morte rápida, quando tudo que vão conseguir é o pequeno monstro ensinado, amestrado e educado pelo próprio Diabo.
Oceano negro, gelado e escuro