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Baile no morro - Parte 2

Relata ele

Eu ainda me recuperava no hospital sentindo poucas dores, seguia pensando em Carolaine e no quanto eu gostaria de saber mais sobre ela...me intrigava o seu jeito recatado e sempre tão simples. Eu estava entediado de passar todo o tempo deitado, sou um homem muito ativo.

 Naquela manhã recebi uma visita...ela entrou insinuante e se sentou na cadeira ao lado da minha cama.

Felipa - E ai super herói? Como você está?

Henrique - Bem, apesar de um pouco dolorido.

Felipa - Isso é natural...você foi baleado. (Suspiro) Eu pensei em te trazer uns doces, mas no hospital não deixam entrar comida de jeito nenhum.

Henrique - Lamentável, mas é verdade.

Felipa - Espero que fique novo em folha e bem rápido, não sei se deveria te dizer isso mas eu gostei muito da noite que passamos juntos.

Ela veio para perto e quis me dar um beijo na boca, virei discretamente o rosto. Não queria alimentar nela falsas ilusões de algum futuro entre nós.

Felipa - Precisa de alguma coisa?

Henrique - Estou bem, agradeço muito por ter se lembrado de mim gata.

Felipa - Me ligue caso precise de alguma coisa.

Ela se despediu e fiquei com meus pensamentos mais uma vez. 

Em casa, Carolaine trabalha para entregar suas encomendas com a ajuda de Palmira na cozinha.

Palmira - Ainda suspirando pelo policial gostosão?

Carolaine - Ele é só uma paixão platônica, nunca olharia para uma mulher como eu.

Palmira - Por que diz isso? Tu é mó gata, ainda por cima trabalhadora, por que ele não poderia querer?

Carolaine - Ele é policial, sabe bem o que ele pensam das pessoas de comunidades como a nossa. Vamos parar de falar nele e nessas coisas e manter o foco nas encomendas, graças a Deus as creches reabriram e os meninos agora não vão atrapalhar de cinco em cinco minutos.

Palmira - E o vagabund*, continua te ligando?

Carolaine - Quase todos os dias, não me dá sossego e continua fazendo as mesmas ameaças de antes.

Palmira - Tem fazer um B.O, só por que é pai dos teus filhos não tem direito de ficar na tua cola o tempo todo.

Carolaine - Tenho pena da dona Janete, já é uma idosa para ter que visitar filho marmanjo na cadeia.

Palmira - Pena da ex sogra? Ela que ensine o filho a aceitar, que perdeu a parada contigo.

Relata ela

Para Palmira tudo parecia ser facilmente resolvido, mas além disso ele é pai dos meus filhos. Se eu o mandar para a prisão, o pouco dinheiro que ele nos dá fará falta em casa, a aposentadoria do meu pai mal dá para os remédios dele...então a única renda que temos, vem das minhas encomendas de bolos e dessa pensão dos meninos.

Palmira - Tá ligada que o primo do Bernardo conhece seu tal policial.

Carolaine - É sério? E o que esperava para me contar?

Palmira - Disse que ele tem 29 anos, se chama Henrique....adora um rabo de saia e nunca assume nenhum compromisso com ninguém.

Carolaine - Deu para notar pelo jeito dele, também pelo lugar onde estávamos.

Palmira - E o fato dele ser policial, se eu fosse você pulava fora mesmo. Tenta achar um cara aqui mesmo da comunidade!

Carolaine - Meus filhos estão muito pequenos para eu colocar outro homem na minha vida. É melhor a gente mudar de assunto!

Começamos a falar sobre a vida alheia, por que a nossa estava complicada demais.

...

Aquele dia foi tranquilo, enquanto Carolaine trabalhava e conseguia entregar as encomendas dentro do prazo. Henrique seguia internado e louco para receber alta e poder ir para casa. Ele havia se tornado uma celebridade para o pessoal da comunidade e todos só falavam no tal policial herói deixando Carolaine ainda mais pensativa, queria esquecer dele...mas com todas as perguntas que faziam sobre o dia do tiroteio era impossível conseguir.

Na casa ao lado, dona Irene recebia um dos filhos que veio de Blumenau para passar um tempo com ela. Se chama Juliano, tem 42 anos e tinha acabado de se divorciar. Nas comunidades apesar da violência, muitas pessoas tem o hábito de se sentarem na porta de casa ao fim do dia para conversar.

Carolaine estava acompanhando Palmira até a porta de casa.

Carolaine - Amanhã você vem me ajudar também? Ainda tenho três bolos para entregar.

Palmira - Preciso ver se o coroa vai abri o salão, mas eu te aviso pelo whatsapp se eu conseguir uma brecha no trabalho.

Ela foi embora e Carolaine cruzou os braços, olhando para a rua e se lembrando do dia do tiroteio.

Irene - Boa noite Carolaine, como vão os meninos?

Carolaine - Boa noite, eles estão bem sim...minha mãe está com eles vendo televisão.

Irene - E como Bruninho está depois do grande susto que levaram?

Carolaine - Ele vai ficar bem, vez ou outra comenta sobre o que aconteceu...mas não ficou bolado com isso.

Irene - Felizmente...esse é meu filho Juliano, veio passar um tempo por aqui.

Carolaine - Muito prazer Juliano.

Ele era um homem bonito, forte e trabalhador...Carolaine percebeu assim que apertou sua mão cheia de calos.

Juliano - O prazer é meu, minha mãe sempre falou muito bem das pessoas aqui da comunidade.

Carolaine - As pessoas de fora tendem a ser preconceituosas pelo que veem pela televisão, a violência aqui é fato...mas a grande maioria são de pessoas de bem.

Juliano ficou interessado em Carolaine, o seu jeito espontâneo de ser logo o deixou com vontade de saber mais sobre ela e dona Irene logo percebeu.

Irene - Devia levar ele para dar uma volta um dia desses.

Juliano - Poxa mamãe, ela deve ter mais o que fazer do que servir de guia turística para mim.

Carolaine - Seria um prazer ir com você, um dia desses.

Relata ela

Não consigo entender por que dona Irene queria me empurrar o filho, convenhamos que uma mulher separada e com três filhos não é bem o perfil de nora que uma mãe procura por ai. Talvez por me conhecer bem e saber o quanto eu prezo pela minha família, ela possa de alguma forma me admirar como mulher e como mãe.

Juliano era a oportunidade perfeita para tirar a paixão platônica por Henrique da minha cabeça de vez, era vacilo usar um cara para esquecer outro. Mas eu precisava disso para me sentir melhor, já que o momento não me permite viver romances que pelo menos eu possa passar momentos legais com ele. No final das contas, na pior das hipóteses nos tornaremos bons amigos.

Sorri e me despedi dos dois, entrei em casa e fui ajeitar os meninos para dormir. Lá pelas 2:00 da madrugada ouvi o som de algo cair no chão com força, durmo em uma cama de casal com meu filho mais novo desde que me separei do traste do pai deles...eu me levantei devagar e fui até a sala para verificar.

Acendi a luz da sala e fui surpreendida com alguém me cobrindo a boca e encostando o cano gelado de uma arma em minha cintura.

- Se tu abrir a boca estouro teus miolos!

Carolaine - Pelo amor de Deus moço, como pode ver nossa casa é humilde. Não há nada aqui que possa querer!

- Tá errada tchutchuca, aqui nessa casa tem uma coisa que interessa ao meu camarada e eu só saio daqui quando levar tudo!

Ele me empurrou contra a parede e fez sinal para que eu me calasse, ele se abaixou e parecia procurar por algo no chão da casa. Meu pai chegou por trás e acertou ele na cabeça com uma garrafa de vidro, infelizmente não pegou em cheio e o maldito...que apontou a arma para nós dois colocando a mão na cabeça que sangrava e destrancou a porta e fugiu.

Carolaine - Papai o senhor está bem?

Walter - Sim filha, estou!

Carolaine - O que esse homem estava procurando? O senhor tem alguma ideia do que seja?

Walter - Não sei filha, mas seja lá o que for está aqui debaixo dos nossos pés.

Carolaine - Sim...mas deixe para procurar amanhã, os meninos podem acordar.

Claro que acordaram depois daquele barulho todo e da pancada que o cara levou na cabeça, sentei eles no sofá e expliquei para minha mãe o que havia acontecido.

Carolaine - Invadiram a casa e ele estava procurando alguma coisa!

 Ela ligou imediatamente para a polícia, demoraram cerca de três horas para virem até nossa casa.

Policial - Podem descrever como era esse homem?

Carolaine - Ele não era muito alto, tinha e pele escura e os cabelos descoloridos. Usava uma touca de meia calça...mas ainda assim eu consegui ver. Sei que o que ele queria pegar está aqui embaixo.

Policial - Vamos ter que verificar.

Carolaine - Está bem.

Eles pegaram as ferramentas e já amanhecendo o dia começaram a cavar no meio da nossa sala, fizeram um buraco enorme e encontraram um baú de tamanho médio. Forçaram até conseguir abrir, haviam alguns malotes e pela cara dos policiais eu sabia bem o que era.

Policial - Vocês moram a quanto tempo nessa casa? E quantos são?

Walter - Aqui nessa casa, a uns doze anos e somos apenas minha esposa, filha e as crianças.

Policial - Seja quem for o meliante que enterrou ou viu essa droga ser enterrada, estava desesperado para conseguir ela de volta. Estimo que a maconha que tem em casa, seria comercializada por pelo menos uns 23 mil reais...e infelizmente o senhor terá que nos acompanhar até a delegacia.

Carolaine - Não, por favor policial eu disse toda a verdade. Por que vão levar ele? Se tivéssemos alguma coisa a ver com isso...não teríamos por que chamar vocês!

Policial - Não se preocupe dona e fique calma, seu pai terá que vir conosco por ser o atual proprietário da residência. Isso não significa que está sendo preso...vamos fazer algumas perguntas para ele e o liberar. E a senhora e sua mãe serão intimadas também em alguns dias.

Eu não sabia se aquele policial havia dito isso apenas para me acalmar, mas aquela maldita droga não era nossa e não tinham por que levar meu pai assim como um bandido. Fiquei com o coração partido junto com a minha mãe vendo ele sair naquela viatura...felizmente não algemado.

Na porta de casa todos os vizinhos viram meu pai sair assim, por que o dia já havia amanhecido.

Irene - O que está acontecendo? Por levaram seu Walter preso?

Carolaine - Essa noite invadiram a nossa casa, era um homem e ele queria desenterrar algo na sala. Chamamos a polícia e encontraram muitos quilos de maconha embaixo do piso!

Irene - Deus!

Juliano - Mas sem provas não podem levar seu pai assim!

Ele veio mais perto e me amparou, eu precisava dos braços de alguém para me sentir um pouco melhor. Minha mãe e eu levamos as crianças para dentro e longe dos comentários infelizes de pessoas maldosas, aquele dia seria longo e eu queria tanto poder falar com meu pai e saber o que estavam fazendo com ele naquele momento.

Dei banho nos meninos e levei as crianças para a creche, depois fui até a delegacia e exigi ver meu pai de qualquer jeito.

Policial - Ele está prestando um depoimento nesse momento.

Carolaine - Mas depois ele vai poder vir comigo para casa não é?

Policial - Se ele convencer o delegado sim, vamos torcer para que ele esteja de bom humor. 

Fique sentada naquela cadeira esperando por horas e acabei ouvindo uma conversa entre eles.

Policial 1 - E aí teve notícias do Henrique?

Policial 2 - Está se recuperando no hospital Pérola, mais um milímetro e a bala acertava a artéria femoral.

Engoli seco, ele realmente poderia ter perdido a vida para salvar meu filho e eu. Fiquei pensando...no meu pai e agora nele, gostaria de agradecer novamente mas para isso antes eu precisava tirar o meu pai desse apuro.

Me levantei, andei de um lado para o outro enquanto algumas pessoas chegavam para registrar boletins de ocorrência a todo momento. Um homem saiu, pela imponência e seriedade só podia ser o delegado!

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