Capítulo I - Sophie
— Você vai casar com o senhor Carter e não tem mais discussão, Sophie! — aquela era a palavra final de Charles.
Eu já deveria ter desistido de discutir e tentar convencê-lo do contrário, mas não podia desistir tão facilmente, era minha vida e eles já tinham destruído ela todos esses onze anos.
— Mas eu não posso me casar com um homem que nem conheço! Não sei nem quem são os Carter’s.
— Isso só mostra o quanto você é desinformada queridinha. — Magie a esposa do meu tio falou com puro deboche, jogando o cabelo loiro para trás. — Eles são simplesmente a família mais rica do país, as joias deles vendem ao redor do mundo todo.
— Porque um homem assim iria querer se casar comigo? Ele pode ter qualquer mulher no mundo, tem que ter outra forma de fechar esse acordo! — bati o pé e Charles deu a volta na mesa ficando de frente para mim.
Eu tinha aprendido a temer o homem com o passar dos anos, aprendi a baixar a cabeça e engolir as coisas que ele falava, pois isso significava menos surras e castigos.
— Escuta aqui fedelha, te criamos esses onze anos mesmo depois que aqueles seus pais ladrões fugiram e morreram no processo, te demos de tudo, então agora é hora de você retribuir! — engoli em seco, querendo gritar que não acreditava em suas palavras sobre meus pais, mas fiquei quieta. — Vai casar com Patrick Carter, dar todos os herdeiros que ele quiser e vai fazer isso sorrindo!
Justo agora quando faltava apenas um ano para que eu conseguisse minha independência isso não podia acontecer, logo quando eu finalmente me veria livre daquele inferno, daquelas pessoas sem coração, agora eu seria jogada nos braços de um homem que eu nem conhecia.
— Sim senhor. — respondi a contragosto.
— Se anima priminha. — Louis disse rindo do sofá enquanto virava mais um copo de whisky. — Ouvi dizer que ele é um deformado, que vive recluso em uma casa nas montanhas, tenho certeza que vai ser como nos seus livros bobos.
Queria socar e xingar, ou arranhar a cara daquele desgraçado como fiz anos atrás, mas só de lembras as marcas em minhas costas um arrepio gelado subia por minha coluna, me lembrando que manter a boca fechada ali era questão de sobrevivência.
— O casamento é amanhã, o tabelião virá até aqui e você vai assinar os papéis, depois disso eu e o pai dele resolveremos o restante dos detalhes.
— Ele não vai vir? Não vamos casar na igreja? — perguntei perplexa que até mesmo isso estivessem tirando de mim.
Meu sonho de entrar na igreja de véu e usando o vestido da minha estava mesmo indo por água a baixo e eu nem podia fazer nada.
— Não seja tola garota! Isso não é um casamento cheio de bobagens e frescura, isso aqui é uma transação comercial.
Meus olhos se encheram de lágrimas com a constatação que eu era uma mercadoria de troca, eles levavam uma mulher para dar herdeiros ao filho e meu tio levava muito dinheiro para a empresa.
— Odeio vocês! — juntei toda minha raiva e joguei para cima a ideia de ser uma boa menina, se ele estava me vendendo não tinha porque continuar com aquilo.
Charles ergueu a mão pronto para me bater, mas Magie gritou o parando.
— O casamento é amanhã, quer mesmo que ela tenha o rosto marcado e eles desistam do acordo?
— Tem razão linda, bem lembrado. — ele olhou para ela comendo a com os olhos, antes de me dispensar com um aceno de mão. — Vá para o seu quarto e não saia de lá até a hora de assinar os papéis, não quero ver essa sua cara mais!
Sai de lá pisando duro deixando que as lágrimas escorressem por meu rosto e me tranquei no meu quarto.
Chorei por muito tempo, até pegar no sono, tinha me acostumado a passar os dias trancada dentro do quarto e dormir para esquecer a fome, eles sentiam prazer em me dar aquele tipo de castigo.
Uma batida na porta me acordou e eu peguei a pequena faca que deixava em baixo do meu travesseiro, tinha sido assim desde o dia que acordei com meu primo em cima de mim me tocando.
— Quem é?
— Sou eu menina, a Rosa, abre aqui. — suspirei aliviada quando ouvi a voz familiar de uma das minhas pessoas preferidas naquele mundo. — Rápido, fecha rápido pra ninguém me ver.
A mulher baixinha e rechonchuda entrou carregando uma bandeja com o que deveria ser meu jantar.
— Não deveria ter feito isso Rosa, não quero você se colocando em problemas por minha causa. — lembrei a ela, mas já fui me sentando pra comer. — O que vai ser de mim se eles te colocarem pra fora?
— Acho que agora não faz mais diferença, não é menina? Hugo me contou tudo que ouviu os patrões conversando. — engoli rápido a comida que ainda estava quente só pra responder.
— Vai ser meu fim Rosa, estou tentando nem pensar nisso.
Ela deu uns tapinhas na minha mão e sorriu de forma solidaria. Então se levantou e abriu o guarda roupa começando a tirar as poucas roupas que eu tinha.
— Porque não tenta ver isso de outra forma minha filha? — franzi a testa em confusão. — Você finalmente está saindo dessa casa maldita, vai poder ter sua vida, fazer o que quiser...
— Você não sabe como as coisas vão, não sei nem como é esse homem. — mas boa coisa não deve ser, já que quer pagar para se casar comigo e nem mesmo vai aparecer aqui para assinar os papéis.
— Tem que tentar ser feliz pela primeira na vida, apenas isso. — Rosa fechou a mala e a colocou ao lado da cama, então se sentou novamente e segurou minha mão. — Eu posso não conhecer esse homem, mas conheço você, sei que é doce e capaz de tocar corações, tenho a certeza que não vai se dar por vencida e deixar que ele te trate como bem quer. Quero que me prometa que vai lá e vai conquistar o coração daquele homem!
Meus olhos se encheram lágrimas com as palavras dela, mesmo sabendo que tudo poderia piorar ela estava me animando. Ela era minha única figura materna desde que eu tinha dez anos e meus tios mandaram Jenny embora.
— Rosa, eu te amo. — me agarrei a ela sentindo que podia ser a última vez.
Acordei no outro dia decidida a fazer o que ela me disse, eu conquistaria meu marido, mesmo que esse casamento estivesse começando da forma errada eu faria dar certo.
Coloquei o vestido que Magie tinha escolhido, era horrível e não me valorizava, nem mesmo em um tom branco aquela mulher foi capaz de comprar.
Só me deixaram descer quando o tabelião chegou, então eu tinha certeza que os pais do meu futuro marido também já estavam ali. Entrei na sala de jantar, meu tio, o tabelião e um homem alto de cabelos brancos me esperava na ponta da mesa.
— Você é linda! — uma mulher exclamou surgindo a minha frente. — Ai me desculpe querida, sou Audrey Carter, sua sogra.
— É um prazer conhecer a senhora. — murmurei ainda sem jeito, não esperava uma pessoa tão animada e calorosa já que o acordo com meu tio com certeza envolvia uma grande quantia em dinheiro.
— Oh linda, me chame de Audrey, logo seremos família.
Abri um sorriso maior tentando ser educada e entender toda aquela situação.
— Viu só o que lhe falei, ela é uma menina calma, saudável e nova. — Magie falou se aproximando, eu quis lhe dar um tapa e mostrar que não tinha nada de calma como ela falava, mas não ia estragar minha chance de ficar livre dela. — Sophie vai te dar muitos herdeiros.
— Tenho certeza de que vamos nos dar muito bem. — Audrey envolveu meu ombro com o braço e me levou para longe daquela nojenta. — Esse aqui é meu marido, James Carter.
O homem alto e de cabelos brancos, com mais rugas do que eu poderia contar, abriu um sorriso largo, os olhos castanhos me encararam e ele se curvou abraçando meu corpo me surpreendendo ainda mais.
— Olha, não me disseram que era tão bela essa menina. Estou muito feliz em conhecê-la e mais ainda com essa união, tenho certeza que você e meu filho serão muito felizes juntos.
Eu não queria nem pensar em como era seu filho de verdade, porque eles estavam parecendo empenhados de mais em serem legais comigo.
— Estou ansiosa pra conhecer ele. Porque mesmo Patrick não veio?
— Não liguem pra curiosidade da minha sobrinha, ela vai ter tempo de conversar tudo isso com o marido quando se encontrarem!
É claro que meu tio iria intervir e tentar adiantar a cerimônia só para poder assinar esse acordo. Assinei o papel, notando que a parte de Patrick já tinha sido assinado, pelo visto ele não saia de casa mesmo.
Depois disso eles conversaram e almoçamos juntos, mas antes que eu pudesse voltar ao meu quarto meu tio me mandou pegar minha mala, pois o carro que Patrick mandou para me buscar tinha chegado.
Segui sem reclamar, como uma ovelha indo para o matadouro. Foi uma viagem de três horas até que eu alcançasse a cidadezinha e mais uma até o topo da montanha onde ficava a mansão dele.
Parei na frente da casa sentindo o vento gelado me arrepiar inteira, a casa era linda, cercada de flores e árvores, mas tinha algo de triste ali e eu podia ver. Olhei para cima e avistei alguém na janela, mas antes que pudesse ver melhor a pessoa se afastou.