CAPITULO 05
Lisa Evans
— Mel, você deve fazer uma bolinha em volta da letra que vem depois do M — falei calmamente, porém, a resposta veio logo em seguida.
— Mamãe, eu sei fazer sozinha — disse a pessoa que se acha adulta, fazendo beicinho com uma pequena carranca.
— Se é assim, não vou dizer a você que deve circular a letra P — disse segurando o riso quando ela começou a sacudir a cabeça em negativa.
— Vou perguntar para tia Clara, se eu posso levar você comigo para escola.
— Por que você vai fazer isso, Melanie? — faço uma cara de quem não sabe o verdadeiro motivo.
— A senhora é grande, mas precisa aprender o alfabeto direito. Depois do M vem à letra N — coloca uma das mãozinhas no rosto, como se tivesse pensativa e depois prossegue. — Senta aqui que vou dizer desde o começo para você e a tia Quelzinha. A tia clara sempre diz que sou esperta, eu falei porque sou perita em falar.
Pronto, tanto eu, como Raquel não nos aguentamos e começamos a sorrir. Disso eu não tinha dúvida alguma, ela tinha uma facilidade incrível de aprender tudo que lhe era ensinado em pouco tempo.
— Eu sei mocinha, que depois do M vem o N e logo em seguida a letra O. Só queria ver se você sabia.
— Eu sou muito inteligente e quando crescer vou ser igual ao mocinho bonito da TV — fala com os olhos fixos na tela, que exibia uma reportagem com Baran Celikkol. Desde que o viu pela primeira vez, ela começou a chamá-lo assim.
— Não vejo nada de bonito nele — exclama Raquel, ostentando uma expressão fechada. Algo que de fato me incomodou, sei que todos nós temos o direito de gostar ou não gostar de alguém, mas não entendia porque ela mudava de humor quando elogiávamos justamente ele. Porém, eu até fiquei calada, mas ela tinha acabado de comprar uma briga com uma leoazinha.
— Tia Quelzinha, a Mel não gosta quando você fala assim. Ele é lindo e eu quero que ele seja o namorado da minha mamãe, assim vou ter um papai — engoli em seco, enquanto ela ficou olhando fixamente para a imagem exibida na tela a sua frente, ignorando a presença de Raquel.
Melanie sempre foi um doce, mas toda vez que Raquel dizia algo do tipo, ela se tornava irreconhecível e uma pequena defensora, porém, não esperava que ela gostasse tanto dele, ao ponto de desejar que um desconhecido que nunca viu pessoalmente, fizesse parte da sua vida, se bem que não era só ela que tinha tanto apreço por Baran.
Horas mais tarde...
Desde que saí de casa, um estranho pressentimento vinha me perseguido. A sensação era mais ou menos como se estivesse fogo líquido em minhas veias, me queimando por dentro, meus batimentos estavam agitados e minha respiração pesada.
— Lisa!
Embora agitada, luto contra aquele desconforto ao me deparar com Olivia.
— Vamos amiga, o movimento hoje está grande — falou me incitando a caminhar com ela em direção ao vestiário para que trocássemos de roupa.
Já estava com o uniforme da empresa, fui direto atender um cliente que havia chegado, quando parei perto a porta do veículo, o vidro foi abaixado e um homem que tinha idade para ser o meu pai, lançou um olhar malicioso em minha direção. Aquilo já me deixou agitada e ao ouvir as palavras asquerosas ditas por ele, meu estômago embrulhou.
— Vamos dar uma voltinha, chuchu — soltei minha respiração em silêncio, sem dar qualquer sinal de exasperação. Mas, ele não satisfeito, continuou. — Eu posso te pagar muito mais do que a merreca que você ganha nesse lugar.
A raiva explodiu dentro de mim e as palavras saíram como lâminas afiadas de minha boca.
— Acredito que o senhor sabe ler. Está vendo aquele letreiro enorme ali? — digo apontado na direção da placa. — Posto de gasolina Imperial. Aqui vendemos combustível e não é um lugar de prostituição — sua expressão se torna uma máscara dura.
— E... — ele abre a boca para dizer algo, mas antes que ele viesse a falar qualquer coisa, me manifesto novamente.
— Assédio é crime e nem o seu dinheiro vai fazê-lo escapar de um processo, além de passar um bom tempo atrás das grades — o rosto do homem estava vermelho de tanta raiva e o ódio estava estampado naquele rosto enrugado. Mas, eu estava com muita raiva e era hora de dar o golpe letal. Com o dedo indicador aponto para mim mesma e então digo. — Está vendo tudo isso aqui? — era uma pergunta retórica. — É muita bagagem para o seu caminhãozinho. E aquilo ali — digo mostrando as câmeras de monitoramento de alta resolução. — É um aviso que se o senhor continuar, não ficará impune.
Rapidamente o homem puxou o dinheiro e falou que era para encher o tanque. Quando saiu feito um louco, fritando os pneus, soltei uma lufada de ar, tentando recuperar o meu equilíbrio emocional.
— Muito bem, garota — disse Olivia batendo palmas.
Quando comecei nesse emprego, por pouco não desisti. E foi ela quem me ensinou a cortar o mal pela raiz. Mesmo temerosa, eu precisava assumir uma postura ou esses sem vergonhas iam tomar ainda mais liberdades.
Raquel Colombo
Estou parada próxima à cama da fedelha que passou o dia todo emburrada comigo. A princípio, eu até gostava dela, mas de uns tempos pra cá, está cada vez mais insuportável, vibrei intensamente quando ela começou a reclamar que sua cabeça estava doendo e acabei percebendo que estava com febre, pois alguma coisa nesse mundo tinha que parar esse projeto de gente. Acabei dando um remédio e a chatinha capotou, dou uma última olhada no ursinho que está ao seu lado e caminho para fora do ambiente, ao chegar à sala, aproveitando que estou sozinha, ando até a mesa, agacho-me e passo a mão no objeto que está escondido, não hesitarei em usar caso for preciso. Afasto-me, indo até o pequeno sofá e ao acomodar-me, fecho os meus olhos e meus pensamentos me levam para seis meses atrás.
Contra a minha vontade, eu fui obrigada a deixar todos àqueles que eu amava, mas essa era a única chance de a família Colombo não ser extinta por completo por aquele demônio. Com o coração dilacerado as minhas últimas palavras ditas ao meu pai, foi que daria um fim ao reinado de Celikkol, que aquela fera sangrenta seria massacrada em breve.
Tudo que trouxe comigo, além do dinheiro que daria para eu sair do país, mesmo correndo o risco de ser pega, foi a minha arma, um pouco de roupa e dentro da mochila, o objeto que poderia ser um grande trunfo a ser usado.
Sabendo que aquele desgraçado e seus homens são como animais, que sentem o cheiro de sua presa a distância, eu precisava me esconder até o momento de agir. O meu pai deu um jeito para que eu chegasse até Wyoming, sendo um estado americano com grande taxa de pobreza, seria mais difícil de ser reconhecida. Tudo havia dado certo, mas precisava encontrar um lugar que eu não precisasse pagar aluguel e assim ser descoberta pelos homens de Baran.
Atordoada, perambulei pelas ruas naquela noite e de longe avistei a garota que conversava com duas mulheres, ali eu vi uma luz no final do túnel, só precisava agir rapidamente. Eu mesma me agredi e todo um teatro foi feito por mim.
Mesmo sabendo que era errado, eu acabei envolvendo Lisa e Melanie em algo que pode custar suas vidas, mas na luta pela sobrevivência, vidas são sacrificadas e não me importa que sejam as delas.
Cada vez que ouço as duas elogiando aquele maldito, meu corpo todo fica em chamas e minha vontade de gritar e dizer que elas não sabem que o infeliz é um monstro, um lobo em pele de cordeiro e a própria personificação da maldade, é enorme, porém, me contenho.
Passo bastante tempo distraída, pensando em como darei um jeito de me aliar aos russos e conseguir a vingança que tanto desejo contra Celikkol e a Cosa Nostra.
Abandono os pensamentos quando ouço o barulho da porta sendo destravada. Assusto-me por ter passado tanto tempo divagando, ao ponto de Lisa já ter chegado, meu olhar se volta rumo à porta quando a maçaneta é girada.
— Amiga! Chegou ced... — as palavras falham. — Você! — digo em um fio de voz, arquejando em desespero, dou um salto, ficando de pé.
"Não pode ser, ele me encontrou" — penso em desespero.
Seus olhos sombrios refletem frieza, contudo, a raiva contida neles é quase palpável. E para minha total descrença, ele exibe um sorriso de lado gélido, predador.
— Sim! E vim buscar aquilo que me pertence — ao som de sua voz, todos os meu pelos ficam eriçados em pavor.
Em pânico, ranjo os dentes, sentindo meu coração bater mais forte, tremores tomam conta do meu corpo e um nó se forma em minha garganta, num encolher de ombros, penso...
"É o fim! Não tenho escapatória."