Capítulo 2
De volta à escola.
Ausente.
De culpa.
E nem pensei no ano passado.
Depois de ouvir quase todo o álbum, estou sem fôlego e quase roncando. Paro a máquina, apoiando-me nos joelhos cansados.
Surpreendentemente, a cantoria não para e só então ouço uma voz. É claramente masculino e até bem afinado. Abro a porta, mas, a não ser que esteja faltando um dos namorados da minha mãe, não há ninguém neste andar, talvez nem na casa.
Fecho a sala com a sensação ruim de estar sendo vigiada, sem saber exatamente onde e, principalmente, quem.
Mas assim que me viro, vejo alguém na janela ao lado. Alguém olhando para mim.
-Pervertido. _ — digo, fechando abruptamente a varanda e a cortina.
O despertador não é mais necessário, pois o Gipsy, meu gato sem raça definida e de pelagem cinza, mia na frente dele até eu acordar.
Sento-me na cama, ainda acordado, e enxugo os olhos, esperando que os vestígios de uma noite de menos de três horas de sono desapareçam. Franzo a testa quando vejo meu edredom e meu travesseiro caídos no chão, e então percebo que sonhei em voar pela segunda vez esta semana. Coloquei meu olho branco.
Vou até o banheiro no final do corredor, com o sol entrando pelas janelas da sala e iluminando o segundo andar.
Lavo o rosto com água gelada e torço o nariz. Olho para o meu reflexo, com minhas olheiras e meu cabelo bagunçado. Deixei escapar uma pequena risada, porque eu não poderia me importar menos. A maioria dos alunos da West Coast High deve estar se preparando há horas, afinal, é o primeiro dia de aula e, no meu caso, o último ano. Mas agora eu só queria que um buraco negro me engolisse, ou mesmo que o sol engolisse a Terra inteira.
Abro o espelho do armário e tiro minha escova de dente. Quando fecho, assusto-me com a imagem refletida.
— Meu Deus, você não pode parecer assim. — digo recuperando o fôlego e apertando o peito.
- Desculpe. —limpa a garganta — eu só queria ver se você estava bem. Você sabe, é a primeira vez na escola desde...
—Estou bem, Maria. - eu a interrompo
abruptamente.
Não quero que você termine a frase. Eu não preciso ser lembrado.
—Já conversamos sobre isso, Skyler.
Só então percebo o que disse.
- Me desculpe mamãe.
Quando ela era pequena, ela me pedia para chamá-la pelo nome, principalmente na frente de outras pessoas. Ela me teve quando tinha dezoito anos e meu pai, igualmente jovem, não aguentou muito bem e praticamente fugiu. Lembro-me de algumas visitas, mas não tenho notícias dele há cerca de cinco anos. Não que eu me importe porque quanto mais longe, maior será a pensão. Mas agora que Marie acompanhou seu relógio biológico interno, ela está tentando recuperar o tempo perdido.
Visto as primeiras roupas limpas que encontro e desço para tomar um café. Tento fazer cereal, mas quando abro o leite e sinto o cheiro percebo que é uma má ideia. Pego uma maçã e a devoro enquanto coloco a comida em potes com os respectivos nomes dos meus animais. Gipsy, Pantera e Hannah M.
—Hannah, não coma comida de gato de novo. Você está me entendendo? —Montana fica de olho no meu dedo indicador, e por um momento acho que ela está prestando atenção.
Bem, isso é antes de tentar mordê-lo e rolar de bruços no tapete. Me rendo .
Finalmente, fecho a porta e vou em direção à única escola pública decente na costa oeste, então não, não vou para lá por opção.
É estranho fazer isso de novo depois de tanto tempo. Mesma hora, caminho, quase mesma rotina. Até o próprio sol atrás das nuvens, me aquecendo com a brisa fria da manhã. Mas embora eu pensasse que, pelo menos, os extremos do caminho seriam iguais, eu vejo isso.
Bem ao meu lado está meu novo vizinho. Com o mesmo sorriso provocativo de ontem e os lábios entreabertos, como se dissesse que conhece todos os meus segredos. O que não é verdade, ninguém sabe.
— Nesse ritmo você mal se parece com a garota da sala.
Sua voz é rouca e descontraída, com muita intimidade, ele praticamente esquece que estava entrando no carro e corre para caminhar ao meu lado.
Eu me viro e examino o rosto até então desconhecido. Ontem eu estava muito preocupado em me esconder de um possível pervertido para perceber. Estou surpreso ao ver como é lindo. Considero relativo o conceito de beleza, mas não é feio, na verdade não, e não é preciso muito para chegar a essa conclusão. Ele é alto o suficiente para levantar o queixo e sua mandíbula é fortemente definida. Seus cabelos levemente cacheados esvoaçam ao vento, mas ainda assim, hoje não há necessidade do casaco preto, que combina com a calça escura e a camiseta branca.
— Me desculpe se não estou feliz depois que você me espionou e violou minha privacidade. — Seguro bem as alças da mochila.