Capítulo 2 - Vida Noturna
Lauren Miller | Miami, Flórida, 17:30 AM.
Depois de se certificar que o seu avô estava dormindo, pôde finalmente relaxar. Seu avô ficava muito cansado depois da hemodiálise, o tratamento era muito complicado e doloroso. Ela sabia que era a única solução, e ela faria qualquer coisa por ele, o amava como o pai que nunca teve.
Após longas horas de sono, se ergueu da cama para jantar antes de sair. Percebeu que seu avô já havia jantado, pois seu prato estava na louça. Ela se apressou pela cozinha, fazendo um simples e delicoso macarrão com queijo, e partiu para um banho. Antes de sair, resolveu passar no quarto do seu avô. Ele estava assistindo TV.
— Já vou indo, vovô!
— Você preparou um lanche para levar? – ele perguntou, e logo após teve uma série de tosses. Ela entrou no quarto, e se aproximou dele, lhe fazendo um carinho nos cabelos brancos. Ofereceu um copo de água a ele, que aceitou.
— Sim, vovô, não se preocupe! Antes que acorde já estarei em casa! – deixou um beijo em sua testa, e foi se retirando. — Descanse!
— Tome cuidado! – ele respondeu.
— Pode deixar.
Ela trancou a casa e partiu, se apressando pelo o caminho para não perder o horário do metrô. Era sempre assim, sua vida é uma correria. No caminho, ela se entreteu pensando na loucura que Lia lhe contou, sobre a família do pai. Nunca imaginou uma coisa como essa, pensou que a amiga havia se isolado porque estava triste com a perda da mãe. A própria sabe que sentimento é esse.
E mal percebeu quando chegou no ponto. Ela andou apressada pela ruas, como sempre. As meninas já deviam ter começado suas apresentações, e logo ela seria a próxima. Assim que chegou no prédio, percebeu a boate lotada, e a longa fila que ainda esperava para entrar. Correu para os fundos, e entrou pela área de serviço.
A música estava abafada pelo o barulho das pessoas, o camarim compartilhado estava uma bagunça, então decidiu se arrumar no canto mais isolado que encontrou. Uma das meninas, que ela já estava acostumada com os comentários desnecessários que ouvia da mesma, revirou os olhos, e Lauren supirou esperando pelas suas palavras.
— Que vida boa, chegar e trabalhar na hora que quer! – reclamou. A garota encaixava uma peruca loira na cabeça.
— Tenho meus motivos para atrasar, não sou uma vagabunda – retrucou. Elo, que vinha por trás das garotas que se arrumavam, chegou perto das duas, e lançou um olhar duro para ambas.
— Quero atividade, e não conversa! Anda, você tem quinze minutos – Elo disse, para Lauren, que apenas assentiu.
Elo era a chefe das garotas, ela não era a dona da boate, mas administrativa as apresentações e os funcionários. Elo sabia das condições de Lauren, e perdoava seus atrasos. As outras garotas tinham inveja disso, e sempre que podiam implicavam com ela.
Lauren se olhou intensamente através do espelho, enquanto aplicava seu rímel. Ela gostava de sombras escuras pois realçava o verde dos seus olhos. Escolheu um batom vermelho, que combinaria com a Lingerie da mesma cor, e então vestiu a fantasia da noite. Hoje, ela seria uma colegial. A saia xadrez ficou um pouco curta, mostrando demais suas coxas, mas essa era a intenção. Por fim, colocou seus saltos, e partiu para o palco.
Ouviu os aplausos que fazia a despedida da dançarina que saia do palco pelo os fundos, por onde ela mesma entraria. A garota que vinha olhou para ela e piscou.
— Uh, mama! – Lauren sorriu, revirando os olhos. Mandy era a única garota legal que a tratava bem.
— Seus dólares estão caindo da sua calcinha – ela respndeu, arrancando uma risada da dançarina, que logo apanhou a nota do chão.
— Vai lá e arrasa! – Lauren assentiu, logo subindo os degraus.
O palco estava um breu, e ela seguiu com cuidado na direção da barra de pole dance. Assim que se posicionou ao lado da barra, a luz principal a iluminou, fazendo a plateia se agitar. A maioria era homens, obviamente, mas também havia mulheres no meio. A boate era de luxo, então não era qualquer um que se sentava ali.
O som da música Unholy de Sam Smith preencheu o ambiente, destravando os quadris de Lauren. Ela girou, deixando que todos vissem melhor a roupa que usava. Assim que as batidas começaram, ela andou até enfrente a uma mesa, e requebrou seus quadris descendo até o chão.
Ela usava uma máscara pequena no rosto, mas que escondia sua identidade perfeitamente. Ela não via mal em dançar, ela era boa nisso, afinal desde nova o fazia maravilhosamente bem. Uniu o últil ao agradável. Ela precisava de um emprego, e procurou em outros lugares antes desse, mas foi o que conseguiu. E tudo bem.
Ela voltou a se aproximar da barra, e resolveu se desfazer da blusa, conforme a coreografia que ensaiou. A peça voou até as mãos de um dos caras da platéia, que gritou a chamando de "gostosa". Isso a fez sorrir, as vezes os imaginava como animais. Eles agiam sob um desejo carnal ardente, que parecia se incendiar em um lugar como esse.
As reações deles inflavam o ego dela, que rodopiou suspensa na barra, fazendo sua saia flutuar, a fazendo sentir o vento frio do ar condicionado bater em seu bumbum. Lauren era dona de uma beleza natural e latina, tinha belas curvas que favorecia seu trabalho. Ela soltou seus longos cabelos castanhos, que caíram como cascatas em suas costas, assim que ela parou de rodopiar, se colocando se pé.
Ela soltou a barra, e de costas para a platéia, tirou a saia xadrez, que também teve o mesmo destino da blusa. Todo gritaram, e jogaram algumas notas no palco. Assim que o refrão chegou, ela se suspendeu na barra mais uma vez, fazendo movimentos calculados, e poses que exigiam de seu talento. Ela se equilibrava perfeitamente, acompanhando as batidas sensuais da música.
Ela deixou seu corpo deslizar pela barra, até cair de joelhos no chão. Ela respirou fundo, e seus olhos bateram em um homem elegante que estava acomodado numa mesa distante. Ele estava sério, enquanto a assistia. Ela sorriu, pois encontrou seu desafio da noite. Ela sempre encontrava alguém para concentrar melhor seu trabalho, era mais fácil.
Ela se colocava de quatro, rebolava até onde podia, se jogava na coreografia como sempre se dedicava, e nada de conquistar uma expressão naquele rosto congelado, aquele olhar frio apenas a seguia pelo o palco. Então ela pensou que ele devia ser apenas reservado, e tentou dar atenção para os outros, inclusive para as mulheres que a chamaram para colocar alguns dólares em sua calcinha, e ela deixou.
Assim que a música mudou para Streets de Doja Cat, ela voltou para a barra. Sua próxima coreografia seria mais sensual e intensa, pois a música passava essa energia. Ela respirou fundo mais uma vez, e se suspendeu na barra, deixando seu corpo girar suavemente, como se estivesse flutuando.
— Casa comigo, sua gostosa! – disseram.
— Essa vadia me deixou duro.
Ela decidiu ignorar à todos, e se entregar na dança. Quando ela estava em sintonia com a música, era como se sua mente viajasse de um plano para o outro. Ela criou essa válvula há muitos anos atrás. A música era um portal que a levava para um estado de consciência que lhe permitia relaxar sob qualquer situação.
Ela se esticava, empinava seu bumbum avantajado, e permitia seu olhar viajar sob o cômodo iluminado, com luzes azuis e vermelhas. As pessoas a assistiam bestificadas. Era uma linda mulher, com uma bela lingerie vermelha que se destacava em sua pele alva, dançando como se tivesse nascido para fazer isso, para todos enlouquecerem e se perderem nas curvas de seu corpo.
Ela terminou a coreografia de quatro no chão, com seus peitos encostados no chão, e seus braços esticados a sua frente, como se fosse uma felina se espreguiçando. Seu olhar estava no mesmo homem de antes, que ainda mantinha a mesma expressão. As luzes se apagaram, a deixando ser engolida pela escuridão.
Ela se apressou para catar as notas no chão e correu para os fundos. Para sua surpresa, Malia estava lá, lhe oferecendo um roupão.
— Você foi ótima! – Lauren sorriu. — Aliás, me desculpa o atraso.
— Não tem problema, vou ter um tempo de intervalo antes das outras apresentações particulares.
— Tudo bem, vamos para o lugar de sempre? – Lauren assentiu, cobrindo seu corpo com o roupão.
As duas foram para o terraço, lá elas teriam privacidade. Só havia algumas mulheres fumando, e outras fazendo ligações. Era um lugar tranquilo para relaxar nos intervalos de cada dança.
— Então quer dizer que quando você ligou pra ele, exigiram que você fosse até lá? – ela assentiu.
— Sim, depois que cheguei lá ele ficou comigo o tempo todo, ele me contou que tinha formado uma família também. A regra deles é simples, "família em primeiro lugar". Disse que pretendiam voltar para Miami, agora que nada está os impedindo.
— Será que sua mãe sabia que eles iriam até você quando ela morresse? – Malia suspirou, assentindo, tirando uma carta do bolso de sua jaqueta.
— Ela deixou uma carta, tinha o número do meu tio Barton no fim, e ela também pediu que eu tivesse cuidado. Que lamentava muito que nossa família não tenha dado certo.
— Então ela previu...
— Ele contou que o acidente de carro que matou meu pai foi proposital, que meu pai estava indo encontrá-lo para entregar uns papéis importantes. Por isso ela queria distância deles, ela tentou fazer com o que nossa família fosse o mais normal possível, mesmo meu pai não deixando a mafia.
— Ele disse o que tinha nos papéis?
— Eram senhas de contas bancárias que continham bastante dinheiro. Esses papéis pertenciam a outra pessoa, e meu pai roubou.
— Nossa – Lauren respirou fundo, e Malia a acompanhou.
— Eles me contaram alguns esquemas que eles fazem, eu não entendi grande parte, mas é muita coisa, principalmente lavagem de dinheiro... – Lauren riu sem querer.
— Desculpa, é que isso parece uma fanfic, sua vida em uma realidade alternativa – Malia também riu.
— Bem queria que fosse... – Lauren assentiu, e Malia continuou. — Eles ainda não me pediram para fazer nada, mas disseram que só me ajudariam se eu concordasse em fazer parte. Caso o contrário, eles fingiriam que não existo, e que se eu os denunciassem eles disseram que eu iria pagar caro. Enfim, aceitei porque não quero ficar sozinha, e eu quero descobrir mais coisas sobre eles, e meus pais. Querendo ou não, são minha família, não sei se você vai entender isso, e eu sei que é muita loucura...
— Eu sei como é ficar sozinha, não é bom. Eu entendo a razão, mas não deixa eles mudarem quem você é. Você é boa, você nunca fez mal à ninguém – Lauren disse, tomando as mãos de Malia.
— Isso nunca vai mudar. – Malia garantiu.
— E Lia, eu te amo, independente da situação.
— Eu também, Lauren – Malia a puxou para um abraço. — Você sabe que é como uma irmã para mim. E agora – elas se soltam. —, que eles me deixaram bem financeiramente, o que precisar é só pedir!
— "Bem" quanto? – Lauren gargalhou, com a ousadia de Malia em se esbanjar.
— Eu não sei, só sei que se eu precisar de qualquer coisa é só pedir que eles me dão.
— Resumindo, você ganhou na loteria! – Malia deu de ombros, rindo com sua amiga.
— Eles ainda estão me ensinando algumas coisas, nos falamos muito pouco por celular, no fim de semana virão me visitar. E eu ganhei um cartão de credito para comprar o que precisar.
— Entendi, e se um dia tudo isso der errado, conheço alguém que te arrumaria passaportes falsos pra você fugir deles! – elas riram.
— Pois é, espero que não chegue à isso.
— Também espero – Lauren suspira, olhando para ao redor, e para o céu estrelado sobre suas cabeças. — Bom, você vai pra casa, e eu vou voltar lá pra baixo.
— Obrigada por me ouvir e tentar me entender – Lauren assentiu.
— Somos você e eu sempre.
— Sempre!