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6

Alice e Lorenzo (21 anos de idade)

[Lorenzo]

-Ei, Lorenzo! -a voz animada de Alice soa do outro linha quando atendo o celular. -O que está fazendo de bom por aí?

-Nada demais, porque a pergunta? -questiono curioso com sua empolgação e afasto para trás o notebook na mesa em que estava trabalhando até pouco tempo.

Com o dedo indicador levanto os óculos de leitura para esfregar meus olhos um tanto cansados pelo excesso de tempo em frente à luz do computador, e giro na cadeira de rodinhas de um lado para o outro, me concentrando na conversa.

-Porque estou ligando para te fazer uma intimação com o intuito de salva-lo dessa vida entediante que leva nesse escritório de engomadinhos. -ela debocha com uma risada sarcástica e eu rolo os olhos.

-Você sabe que não está falando com a Malu, né? Pois que eu saiba é ela quem trabalha com um monte de engravatados o dia inteiro. -eu brinco e Alice ri em concordância. -Mas voltando ao assunto, ao que se referia quando mencionou algo sobre me tirar do tédio? -questiono institivamente curioso com as ideias mirabolantes que essa garota possa ter inventado.

-Corrigindo, eu disse salvar, entretanto como ia dizendo, essa noite vou te levar a um lugar. -Alice faz uma pausa dramática para criar um clima de suspense antes de prosseguir. -Vamos nos divertir até nossas pernas doerem, ou seja, nada de querer pular fora do barco cedo, está me ouvindo, senhor Lorenzo?

-Alice... -começo a protestar, já pensando em uma desculpa plausível para escapar do compromisso, porém sou cortado logo de cara.

-Nem vem com esse papo de Alice, mas isso... mas aquilo, Lorenzo! Temos que ir e pronto. É só uma festinha... pequena e com poucas pessoas. Eu prometo! -Alice insiste sem ao menos medir esforços para me convencer do contrário.

-Eu ainda estou no trabalho. -suspiro ao olhar para o relógio em meu pulso e verificar que ainda faltam duas horas para encerrar o horário de expediente.

-Eu busco você! Pronto está resolvido. Passo no escritório para te dar uma carona, estou com o carro da mamãe mesmo. Então estamos combinados? -a expectativa em suas palavras me faz repensar uma segunda vez antes de fazer a recusa.

-Poxa, Enzo, não vai vacilar comigo não, né? -sinto uma pontada de tristeza e desânimo em sua voz, e como o bobo que sou, acabo cedendo a sua vontade.

Mais uma vez, é claro.

-Tudo bem, Ali. -respondo por fim após alguns segundos de silêncio. -Eu vou com você, só porque insiste tanto. Mas você vai ter que me deixar aqui de novo na volta porque eu vim trabalhar de moto e preciso dela amanhã novamente.

-Ok, ok! Tudo o que você quiser, Lolo. -ela ri. -Beijinhos e até logo mais. -e simples assim, ela encerra a chamada, talvez com medo de que eu volte atrás em minha decisão.

***

Quando finalmente o ponteiro do relógio alcança as dezenove horas da noite, começo a desligar o computador e os outros equipamentos que estão na tomada. Guardo os papéis de um novo projeto em minha pasta e sigo para a saída como os demais funcionários também estão fazendo. Entro no elevador que felizmente não está tão cheio, cumprimento alguns colegas e jogo conversa fora com Felipe e Susan sobre amenidades enquanto descemos os sete andares que nos levam até o térreo. Ao sair pelas portas da empresa sou surpreendido por um abraço inesperado vindo do nada. Só tenho tempo ao cambalear um passo para trás, de retribuir o gesto ao passar meus braços por uma cintura delgada.

-Graças à Deus que você apareceu. Já estava quase indo te buscar lá em cima no laço. Por que demorou tanto? Achei que ia me dar um cano. -Alice desfaz o abraço, porém uma de suas mãos continua em meu ombro mantendo o contato.

Seus olhos verdes me avaliam rápida e minuciosamente de cima abaixo por um instante, enquanto um sorrisinho de lado surge em sua boca.

-Já disse o quanto você fica um gato com essas roupas sociais, senhor engenheiro? -Alice ajeita o colarinho da minha camisa e suas mãos habilmente abrem os dois primeiros botões revelando mais do meu tórax.

-Hoje ainda não. -gracejo. -Mas nos outros dias em que ouço não levo muita fé. Sei que as mulheres dizem tal coisa somente para iludir um pobre coitado feito eu, querendo elevar minha autoestima. -digo fingindo estar desolado. -Afinal de contas sou apenas um estagiário de engenharia, não um engenheiro de verdade.

-Não seja ridículo, Enzo. -ela ri e nós caminhamos para onde carro de Ana Júlia está estacionado.

De longe é possível ver aquela aberração colorida que a mãe de Alice insiste em manter até os dias de hoje. A famosa lata de sardinha cor-de-carnaval, segundo fora intitulado tão carinhosamente por Michele, sua melhor amiga.

-Você é um profissional incrível, só lhe falta o diploma. Mas isso é questão de pouco tempo até que se resolva. -ela gira a chave na ignição e arrancamos do lugar. -E que negócio é esse de "as mulheres que dizem tal coisa..." ? -Alice estreita aquelas duas esmeraldas em minha direção e eu fico sem entender.

-Que que tem? -pergunto alheio aos seus motivos, e Alice franze o cenho cerrando os lábios em uma linha tensa.

-Só eu que deveria elogiar você dessa maneira. -ela dá um tapa em minha coxa e eu rio.

-Está com ciúmes, Alice? -provoco, ela retira imediatamente a mão do local e a coloca sobre o volante.

-E se eu estiver? -Alice devolve o desafio e pela primeira vez não sei como reagir.

Alice e eu nunca fomos de trocar flertes e o que estamos fazendo agora se parece muito com isso. Ou será que tudo não passa de mero fruto da minha imaginação fértil?

-Hum... por nada, eu acho. -dou de ombros desviando o olhar para a janela.

-Esquece isso, cara. Vamos aproveitar a noite. -ela diz descontraída ao piscar um olho para mim.

-Você me enganou, sua pequena trapaceira! -grito por cima da música alta que explode nos alto-falantes da casa de shows em que estamos.

-Uma omissãozinha de nada. Super inofensiva. -ela responde com um ar travesso permeando o rosto e se coloca de pé.

São oito horas da noite agora, assim que chegamos no local escolhemos uma mesa mais afastada devido a grande quantidade de gente que lotava o lugar, o que tornava praticamente uma missão impossível circular por qualquer canto sem ter os pés pisoteados ou levar uma ou duas cotoveladas no processo.

-Vamos dançar, Enzo! -Alice agarra minha mão e me puxa em direção a pista de dança.

-Eu não gosto, Ali. Sabe disso. -resmungo com seriedade enquanto sou arrastado entre um mar de gente.

-É só por hoje, não corta o clima, Lorenzo. -ela diz quando enfim encontra um espacinho que considera adequado para a atividade, e envolve meu pescoço com seus braços.

-Me abraça, Enzo. -ela pede ao fazer com que minhas mãos rodeiem sua cintura.

Sinto seu perfume marcante invadindo meu olfato com força total quando Alice se aproxima ainda mais colando nossos corpos. Tenho plena ciência de cada curva perfeita, da pele macia e sedosa que se esconde por debaixo do vestido justo e incrivelmente sexy que a mulher a minha frente usa. Alice está vestida para matar e eu provavelmente serei a vítima da noite.

Estou quase enlouquecendo com o roçar de nossos corpos durante a dança, o atrito entre nossas peles é quente, necessário e tão... certo.

Um cacho que se desprende de seu penteado cai sobre meu rosto quando a mesma se inclina em minha direção para me dizer algo. Com o rosto agora a ínfimos centímetros de distância, nossos narizes colados um ao outro e a respiração num ritmo curto e rápido, sinto um turbilhão de sensações arrebentarem em meu peito.

O que raios está acontecendo? É o que minha mente grita.

Não posso acreditar. Não quero me iludir. Não devo alimentar um sonho e possivelmente estragar nossa amizade de anos. Mas... e esse fogo que vejo refletido nesses lindos e atraentes olhos verdes? É real? Ou é minha mente me pregando uma peça?

-Você pensa demais, Lorenzo. -Alice desliza um dedo por meu rosto parando em meu queixo e eu arrepio. -Esse é o seu problema. -suas unhas se cravam em meu pescoço mantendo-me no lugar.

Pff! Como se eu quisesse mesmo sair dali. Nunca tive essa intenção, penso comigo mesmo.

-Mas deixa que eu resolvo isso para você. -e antes que eu possa entender do que se trata, Alice cola nossas bocas com urgência e sofreguidão, em um beijo para lá de indecente.

Me surpreendo em um primeiro segundo, mas não fico inerte por muito tempo. Quando me dou conta do que está acontecendo respondo com o mesmo ardor e ímpeto o beijo que ela começou.

Aumento o aperto em sua cintura com gana, com fome, trazendo-a para mais perto, tentando fundir nossos corpos, nossas almas. Infiltro uma de minhas mãos por seus cachos e faço um emaranhado predendo-os entre os dedos, mantendo sua cabeça cativa junto a minha.

MEU. DEUS. DO. CÉU.

Quanto tempo eu esperei por isso?

Quando que eu poderia imaginar que esse dia finalmente chegaria? Me sinto nas nuvens. Ter Alice em meus braços de verdade, tão entregue ao momento, a esse sentimento quanto eu, é muito melhor do que eu havia sonhado por todos esses anos. Contudo minha hora chegou e não irei desperdiçar minha melhor e talvez única oportunidade. Alice é minha. Só minha!

-Lorenzo... -Alice murmura meu nome com a voz rouca bagunçando meus cabelos.

Em um impulso bem calculado, ela salta sobre mim e rodeia minha cintura com sua pernas torneadas.

-Alice... o que você está fazendo comigo, mulher? -suspiro agarrando suas coxas firmes e descobertas pelo tecido do vestido. -Você me enlouquece. Estou queimando por você, mi princesita. -desço meus lábios por seu pescoço chegando até o início do colo.

-Lorenzo... sua voz me chama.

-O que você quer de mim, Alice? Diga. Porque eu só quero te amar essa noite. -mordo seu ombro, talvez isso deixe uma marca, mas não ligo. O que importa é que ela está aqui e agora, comigo.

-Lorenzo... -ela me chama novamente.

-Hum... -resmungo embriagado com seu cheiro.

-Lorenzo... -ela insiste mais uma vez.

-O que, Alice? -pergunto sem ao menos prestar a devida atenção.

Minhas mãos sobem por sua coluna e então...

-Lorenzo! -sinto um forte tapa em minha testa que me faz pular.

-Mas que merda! -ralho irritado esfregando o lugar que agora arde devido o golpe. -Droga! -levo a mão ao coração assustado ao dar de cara com um par de olhos azuis me fitando com ironia.

-Que droga digo eu. -a pessoa responde sarcástica. -O que pensa que está fazendo, Lorenzo? Por acaso perdeu o juízo, cara? -Israel questiona cruzando os braços em uma postura desafiadora.

Então eu desperto para a realidade e olho ao redor com grande espanto. Nesse momento meu rosto deve ser a perfeita máscara de puro horror, pois o pirralho a minha frente se acaba de tanto rir da minha miséria.

Não estou em uma casa de shows e muito menos acompanhado de Alice, percebo decepcionado. Com a coluna protestando de dor por estar em um posição desajeitada, me ergo sentando-me corretamente no sofá... da casa de Alice.

-Você tem muita sorte que sou seu amigo.

-É mesmo? -soo irônico, coço os olhos sonolento e bocejo em seguida.

-É. -ele concorda. -Luna e Dante estavam nessa sala até pouco tempo e quase que presenciaram essa cena vergonhosa que você estava protagonizando. "Oh, Alice isso... Oh, Alice aquilo..." tava bem feio, cara, na real.

Ai droga! Arregalo os olhos desesperado. Não bastava ser um sonho, eu ainda tinha que dizer aquilo em voz alta?

-Ainda bem que os dois são crianças e não entenderam nada, aí eu os enxotei daqui com a desculpa de que você estava tendo um pesadelo ruim com a presença deles por perto. -ele ri. -Mas queria ver se fosse o Henrique, você ia tá ferrado. O pai dela comeria seu fígado no almoço se te ouvisse dizendo aquelas coisas sobre a filhinha dele.

-Acho que vou nessa. -fico de pé constrangido, apalpo os bolsos da calça em busca das chaves e da carteira de motorista, mas só encontro as chaves.

-Aqui. -Israel joga a carteira em minha direção e eu a agarro no ar. -Cara, você está vermelho feito um tomate maduro. -ele gargalha com gosto e eu rolo os olhos impaciente.

O que será que eu fiz para merecer essa vergonha?

-Relaxa, seu segredo está bem guardado comigo. -ele diz esboçando um sorrisinho de lado.

E com mais essa provocação, junto meus pertences para ir embora, antes que eu acabe surtando com o deboche descarado de um pirralho de quinze anos que mal saiu das fraldas.

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