Capítulo 4 – O baile
O rei começou um discurso fazendo aquela reunião parecer mais do que uma caçada a nova esposa para o filho. Ele falou sobre responsabilidade, deveres e renúncias que todos que estavam dentro do reino deveriam ter. Falou brevemente sobre a história do seu reino e por fim passou a palavra ao filho.
Seus traços eram marcantes, e seu cabelo escuro contrastava com a palidez de sua pele. O príncipe não parecia entusiasmado com a reunião social, algo que rapidamente percebi. Ele não estava sozinho em sua aparente relutância; seus olhos, emoldurados por longos cílios escuros, transmitiam um mistério e uma profundidade que contrastavam com o ambiente festivo do baile.
"Boa noite." falou iniciando seu discurso, dando uma breve pausa para olhar cada uma naquele salão.
Por um instante seus olhos pousaram nos meus, e senti o medo percorrer minhas veias, lembrando de cada linha daquela carta.
"Como meus pais disseram, não haveria momento melhor para escolhermos uma princesa." seu sorriso pareceu forçado. " O reino tem pressa, e isso nos leva a fazer coisas além das compreensões de todos. Hoje aqui, todos são amigos e confidentes. São pessoas que acolhemos em nossa casa e que desejamos o melhor. Vocês serão testemunhas das maravilhas que Kingswood oferecerá ao mundo. Espero que não despedissem o meu tempo nem o de vocês." ele se inclinou fazendo uma breve reverência e todos os presentes fizeram o mesmo.
A música voltou a invadir o salão e os boatos sobre sua declaração começaram a inflamar a todos.
"Ele é excêntrico, não acha?" Lady Isobel falou ao meu lado e desfoquei meus olhos das costas do príncipe, que agora gesticulava com o pai de forma rápida e até feroz.
"Ele não está satisfeito com isso aqui." falei antes de pensar. Meu tempo observando a princesa Penélope me ensinou a prever os movimentos dela. Agora eu precisava aprender sobre ele para dizer ao rei qual a periculosidade do príncipe.
"O que quer dizer com isso?" Lady Isobel me cutucou e retornei meus olhos aos dela.
"Nada, esqueça. Foi um comentário infeliz." ela sorriu satisfeita com minha resposta e autorizou que eu dançasse com um rapaz que acabava de me abordar.
Um após o outro, os homens que estavam ali, tiravam as princesas para dançar enquanto o príncipe conhecia uma a uma. Meus pés não estavam acostumados a ficarem tanto tempo com aqueles sapatos de saltos e senti a pressão em meus dedos aumentarem, me fazendo mancar de leve.
"Princesa Penélope?" ouvi a voz grossa retumbar ao meu lado enquanto tentava disfarçar meu incomodo.
Me virei, me deparando com o príncipe com seu olhar clínico sobre mim.
"Vossa alteza." me apressei em uma reverência.
"Vejo que não está completamente satisfeita." ele avaliou a forma como eu me movia e senti um arrepio correr por minha coluna.
"Os sapatos são novos, logo estarão laceados o suficiente." ele me olhou de cima a baixo de forma desprezível.
"Eu preciso passar um tempo com a senhorita, quer dançar ou caminhar pelos corredores do castelo?" ele falou olhando algo além de mim.
"Eu não posso escolher." falei e um brilho passou por seus olhos.
"Não?" seu olhar me questionou, tentando entender o que se passava em minha mente.
"Não, porque se eu pudesse, não seria nenhuma das opções." falei sem pensar novamente e me arrependi. "Então prefiro, que vossa alteza, escolha nosso destino." não olhei em seus olhos, mordendo minha língua com força por estar tão irritada com meus sapatos.
"Me acompanhe." ele esticou o braço para mim e não pude fazer outra coisa a não ser segurá-lo.
Ele passou pelo meio do salão, onde todos abriam caminho para nós. Os sussurros continuavam a ser ouvidos e levantei meu queixo o máximo que pude, tentando imitar a postura que minha princesa teria.
Assim que chegamos ao corredor, Tyler deu alguns passos para além da movimentada festa e nos levou a um lugar que não existia uma alma viva sequer.
Fiquei assustada, eu sabia que moças solteiras não podiam ficar sozinhas com homens, mesmo que eles fossem o príncipe anfitrião.
Um segundo depois, Tyler me empurrou contra a parede e parou seu rosto bem perto do meu. Senti seu hálito lamber meu rosto e a fúria de seus olhos queimar os meus.
"Era isso que a senhorita tinha em mente?" sua mão apertou minha cintura e seu corpo se colou ao meu. " Era essa a opção que escolheria?" sua boca desceu ao meu pescoço e fiquei em pânico, o empurrando o mais forte que consegui.
Ele gargalhou com minha reação e ergui minha mão para bater em seu rosto, mas ele foi mais rápido.
Puxei minha mão com toda a força que existia em meu corpo. "Nunca mais coloque suas mãos sujas em mim." gritei e sai correndo em direção a festa.
Procurei Lady Isobel e assim que a encontrei a puxei para fora daquele lugar.
"O que aconteceu, alteza?" ela falou assombrada. "Seu rosto está todo vermelho." eu queria chorar pela forma como aquele monstro tinha me tratado.
"Nada, só estou com dor de cabeça. Vamos para a cama." falei andando a sua frente.
"Mas senhorita, é uma falta grave sair antes da família real, e a senhorita ainda nem dançou com o príncipe, como terá chances de conquistá-lo?" a mulher andava alvoroçada a minhas costas.
"Eu quero que ele e esse castelo queimem no inferno." brandei e ouvi seus passos pararem. Continuei a andar sem olhar para ela e alcancei meu quarto poucos minutos depois.
Bati a porta com tanta força que as dobradiças rangeram em protesto.
Segundos depois senti meus joelhos se encontrarem com o chão. Meus olhos começaram a verter água e me senti ainda menor do que era em Thalassia.
Aquele príncipe só queria abusar das princesas que estavam ali esperando que ele as levasse ao altar. Cada uma ali sabia o que estava em jogo, mas eu não me entregaria por um reino que não me via como sua filha, mas sim como uma escrava pronta para o abate.
O desespero continuou a me consumir enquanto eu estava ajoelhada em meu quarto, lágrimas escorrendo pelo rosto. Sentia-me encurralada, presa dentro deste castelo opulento, onde o príncipe Tyler mostrara sua verdadeira face.
Foi então que, entre soluços, comecei a ponderar um plano de fuga. Sabia que não poderia permanecer aqui sob o olhar implacável do príncipe. Precisava escapar, não apenas de Kingswood, mas também de Thalassia.
Enquanto minhas ideias se misturavam em um emaranhado confuso, ouvi um som suave vindo da porta. Levantei os olhos e olhei em direção ao barulho. Para minha surpresa, um envelope havia sido deslizado sob a porta de meu quarto.
Apanhei o envelope com mãos trêmulas e abri-o com cuidado. Dentro, encontrei um bilhete com uma mensagem curta e enigmática. Ele dizia: "Você passou no teste - T."
Minha mente começou a girar com suspeitas. Quem poderia ter enviado essa mensagem? Seria alguém tentando me ajudar ou alguém tentando me manipular ainda mais? A letra "T" indicava claramente o príncipe Tyler, mas qual era o significado por trás disso?
Uma coisa era certa: eu não podia confiar em ninguém neste castelo, nem mesmo em Lady Isobel. Decidi que precisava manter essa mensagem em segredo. Fui até a lareira e estiquei a ponta da carta no fogo, deixando que lentamente ela queimasse entre meus dedos. Joguei o final na brasa encandeceste e a vi se transformar em uma fuligem negra.
Enquanto a festa continuava a todo vapor do lado de fora, eu estava em meu quarto, começando a traçar os primeiros passos do meu plano de fuga. Era uma tarefa difícil e arriscada, mas a alternativa era insuportável. Eu não poderia me entregar àquele príncipe cruel.