Ah que mundo machista!
Ele me puxou para o meio do salão, onde alguns casais dançavam. Pela primeira vez, senti o que era estar nos braços de um homem. O cheiro dele era maravilhoso. Fechei meus olhos sentindo o calor de seu corpo, estava um pouco tonta pela bebida ainda. Talvez por isso tenha me sentindo tão ousada de repente.
Ele puxou minha cintura me estreitando mais em seus braços. Eu deixei-me levar pela música lenta, me sentindo feliz, feminina, mulher.... No embalo da música nossos corpos se moviam. Era tão gostoso que eu me deixei levar com a cabeça apoiada no ombro dele. Quando a dança acabou, ele me afastou levemente, eu com um sorriso levantei o rosto para me despedir, foi então que senti seus lábios sob os meus.
Lábios macios e quentes, que se moviam na minha boca entreaberta pelo susto e atordoamento. Senti na hora meu coração disparar no peito. Um breve momento de magia e que durou pouco, pois logo ele me afastou. Fiquei a olhá-lo sem saber o que dizer, o coração agitado no peito. Tudo era muito novo para mim.
Seu rosto sério me encarou. Seus olhos procuraram os meus. Com certeza ele viu a minha confusão espelhada neles. Ele então, pegou minha mão e me levou para trás do salão, onde abriu uma porta, que só quem conhecia bem o ambiente, diria que se tratava de uma. Entramos em uma sala.
A claridade forte da sala, que parecia ser um escritório, me fez cair na minha dura realidade. Todo o encantamento do último momento havia sido quebrado.
— Desculpe-me, mas preciso voltar. Vim com minha mãe, e ela deve estar me procurando.
Ele deu um passo na minha direção.
— Qual é seu nome?
Dando um passo para trás, eu o encarei bem séria.
— Olha, isso não importa. Eu não deveria estar aqui. Adeus...
Tão logo eu saí de lá, fui alcançada por minha mãe, que me pegou pelo braço.
Salma disse alto por causa da música.
— Nádia, onde você estava? Estava te procurando como uma louca? —Sua voz saiu áspera.
— Estava circulando pelo salão.
—Layla também estava te procurando.
— Mamãe, tenho 20 anos e a senhora me trata como se tivesse quinze.
—Nádia, por favor. Nem vou entrar no mérito da questão.
Batidas na porta, interromperam meus pensamentos.
— Entre.
A porta de meu quarto se abriu e meu pai me procurou com os olhos. Ele sorriu quando me viu perto da janela.
—Preciso falar com você. É a respeito dessa noite.
Eu sorri de leve para ele.
Como filha única, a expectativa de meus pais era muito grande em mim. E eu nunca consegui me rebelar com suas imposições, ou qualquer coisa que eles colocavam como obstáculos.
Mas agora, tudo eu estava assustada com o rumo que as coisas estavam tomando. Pela primeira vez a rebelião se agitava, querendo manifestar minha vontade acima da vontade deles.
—Eu também, papai. Quero muito falar com o senhor.
Meu pai se sentou na minha cama e deu uma batidinha de leve nela para eu me sentar.
Eu em resposta, “como sempre", obedeci.
— Filha, como sabe, esse momento foi muito almejado por mim e sua mãe. Nós não duraremos para sempre, e você está numa idade boa para se casar. O homem que nós escolhemos, não poderia ser mais dotado de predicados. Boa índole e de boa família. No mundo dos negócios, ele é muito bem-sucedido. E acima de tudo, ele é da linhagem de nosso povo.
Eu senti um grande aperto em meu coração.
—Papai. E se eu não amá-lo? E se ele me for repugnante?
Vi meu pai ficar sem ação por um momento, e isso me fez ficar mais insegura.
— Filha, a beleza não está acima das qualidades de um homem.
—Ora essas! E se fosse ao contrário, eu não fosse atraente para ele?
Ele sorriu com humor dizendo:
— Nádia, mas você é... — Depois ficou sério. — E por que essa pergunta agora? Não pense no seu casamento como uma obrigação, mas que você é uma mulher afortunada em ter sido separada para ele. E ele também é um homem de sorte, por ter você como esposa.
Eu baixei a cabeça incerta.
—Papai, eu não me sinto feliz com essa situação como o senhor. O Senhor não pode desistir do acordo?
Meu pai se levantou como se tivesse levado um choque.
—Nádia! Por Allah, de maneira nenhuma! Você nem conheceu o rapaz para dizer uma coisa dessa. Você foi prometida. E como sabe o único que pode desistir de tudo é ele. A palavra de um homem árabe é irrevogável.
—Ah que mundo machista!
Meu pai me olhou perplexo.
—Filha! Não estou te reconhecendo.
Eu me levantei da cama e disse alterada:
—Vocês ditaram minha vida inteira, desde pequena tenho sido obediente, mas isso é assinar minha sentença de morte.
—Por Allah, Nádia, não seja dramática. O profeta Maomé agarrou num bordão e escreveu no solo: «Não existe um entre vós cujo lugar onde tome assento não tenha sido escrito por Deus, quer seja no Inferno, quer no Paraíso». Esse casamento estava escrito. Maktub!
Maktub? Eles ditavam a minha vida e era Maktub?
Eu reprimi a vontade de gritar como uma louca desvairada pelo quarto.
Lutei pela minha liberdade dizendo:
— Eu tenho uma intuição, então que esse casamento não acontecerá, você verá, Maktub! Estava escrito!
Meu pai se levantou nervoso.
— Só se você não colaborar, pois do contrário você tem todos os predicados para que esse casamento se realize.
Allah! Eu sabia disso, eu era a candidata perfeita para esse casamento. Desde pequena fui preparada para ser a esposa perfeita: Aprendi a nossa língua numa escola árabe, culinária, costura, etc. Aprendi de tudo um pouco.
Eu me sentei, limpando uma lágrima que desceu do meu rosto. A expressão do rosto de meu pai suavizou e ele se sentou novamente:
— Você conhece a minha história com sua mãe. Eu, quando me casei, era exatamente igual a você. Não sabia o que me esperava. Se sua mãe daria uma boa esposa, se eu a amaria. E você pode comprovar que meu casamento foi escolhido por Allah, pois não me vejo com outra esposa que não seja sua mãe.
— Eu sei disso, mas...
—Não tem, “mas. ” Quanto mais fácil você aceitar seu destino, melhor para você. —Meu pai se levantou encerrando a conversa. —Se prepare para essa noite. Fique bonita. Sua mãe vai ajudar você a escolher um vestido bem bonito. E lembre-se que queremos o melhor para você.
Quando ele saiu eu joguei meu corpo para trás, caindo de costas no colchão.
Eles armaram minha forca!
Horas mais tarde, por mais incrível que pareça, eu estava lá, sorrindo quando fui apresentada pelo meu pai, à família de meu futuro noivo e ao meu futuro esposo. Logo que entrei reparei nele. Ele era um homem comum. Não era sexy, não era alto, não era forte. Ele usava óculos, barba semicerrada, muito magro e quando me viu, deu um sorriso gentil. Não parecia o tipo de pessoa que me faria sofrer, mas também não parecia o tipo de homem que me faria feliz, onde eu me sentiria realizada. Ele não me atraia nem um pouco.
Allahhhhhhhh! Estava ali, como uma condenada, mas sorrindo como uma cordeirinha, preparada para o sacrifício.
Minha mãe tinha caprichado no jantar, que foi um verdadeiro banquete. Eu com a ajuda de minha mãe, eu tinha caprichado no visual, usando uma maquiagem bem leve e joias. O vestido que escolhi foi com a aprovação dela, claro! Era um todinho preto bem-comportado, ideal para o meu sacrifício.
Depois do jantar, tive oportunidade de conversar com Rashid. Ele parecia ser do tipo tímido. Coloquei um chiclete na boca e avancei para ele sorrindo provocativamente.
Fiz de propósito, na hora pensei: Quem sabe eu o inibiria com minha atitude e desistisse de mim?
—E aí? Pronto para o casório? —Perguntei mascando meu chiclete.
Nessa hora o sorriso do moço morreu.
Oh! Acho que eu o decepcionei…
Pobre rapaz!
Ele sorriu nervoso, meio desnorteado. Sorri de contentamento em vê-lo sem ação.
— Você é sempre assim, tão expansiva?
Cheia de adrenalina correndo minhas veias, resolvi encenar mais:
— É o meu natural. —Sorri docemente. —Adoro dizer o que penso. Mas prometo ser uma boa esposa. Tenho muitos predicados, sei lavar, passar. —Olhei minhas unhas de modo afetado. — Cozinhar não sei muito bem, mas com a prática, aprendo. Ah, e sou muito bem-humorada, seus convidados irão me amar.
Ele não disse nada. Eu continuei a encenação. Olhei minha pulseira de ouro e passei a mão em um colar que eu usava.
— Adoro joias. Fica a dica. — Sorri.
Ele me encarou muito sério e com um gesto gentil de cabeça me disse:
— Com sua licença.
Sorri para ele e o vi se afastar. Com o coração batendo vi ele falar algo para seu pai, que me olhou sério, eu em resposta, sorri para o velhote.
O senhorzinho desviou os olhos de mim e fitou a esposa dizendo algo em seu ouvido e disse para minha família. Com certeza disseram que precisavam ir.
— MAKTUB! Estava escrito!
Meu pai sentiu o baque das palavras do senhor Ibrahim e assentiu, mas vi claramente desapontamento nos olhos dele. Quando eles saíram, ele me fulminou com seus olhos negros. Eu o olhei com uma cara bem inocente, eu parecia um anjo. Desviei meus olhos dele e reparei como mamãe apertava as mãos nervosamente no colo.
Allah! Ela deveria estar sentindo como se tivesse falhado comigo. Isso apertou meu coração.
Allah! Mas era meu futuro em jogo!
— Nádia. O que você fez?
Eu o fitei com cara de paisagem.
—Nada.
Meu pai avançou em mim, como se fosse me bater. Assustada, dei um passo para trás. Mamãe nessa hora gritou:
—Mustafá! Hamed!
Ele se virou para a minha mãe.
—Essa menina é uma ingrata. Como pôde fazer uma coisa desta? Uma família tão boa, um rapaz maravilhoso.
—Não tenho culpa de não ter agradado. —Disse de forma inocente.
Meu pai avançou sobre mim, furioso. Pegou meu braço, seus dedos pareciam aços.
— Pois muito bem. Não pense que se safou dessa. Não pense que você se unirá a esses ocidentais, pois não se unirá. Se tiver que casar um dia, será com alguém da linhagem de nosso povo.
—Tudo bem eu não me caso. Mas eu fico só.
Ele sorriu de maneira diabólica.
—Não, isso está fora de cogitação. Mas vou encontrar alguém para te domar. Ele não será igual esse rapazinho meigo que veio aqui. Duvido que você o assuste.
Eu fiquei a olhar para ele sem resposta. Fitei minha mãe que só chorava do outro lado.
Por que ela chorava?
Decepção comigo?
Se sentindo culpada?
Aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii. E eu? Ninguém levava em conta meus sentimentos?