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A Primeira Onda

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Lili Marques
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Resumo

Cristina tinha a vida perfeita, a família milionária, o pai que a amava e o avô que faria tudo por ela. Mas a verdade é que nada daquilo era verdade, sua vida era uma fachada bonita para os jornalistas. Joe é um surfista que vivia um dia de cada vez, levando a vida com leveza e diversão. Não queria compromisso com nada, nem com ninguém, curtia sua liberdade e acreditava que o amor era para tolos. Até que os dois se encontram de forma inusitada e o tesão fala mais alto, depois de uma noite tórrida Joe foge, não querendo dar chances aos sentimentos confusos que está sentindo por ela. Mas as coisas se complicam quando Cris se torna a nova patrocinadora do seu irmão mais novo. Agora ele vai ser obrigado a conviver com a mulher que tem bagunçado seus pensamentos.

amorpaixaoromancebilionário

Capítulo I

Encarei o céu ainda escuro, não eram nem seis horas da manhã e eu já estava irritado com aqueles dois pela demora.

Eu, Matheus e Ian, seguíamos esse ritual de ver o nascer do sol dentro do mar, começamos quando eu tinha quinze anos e desde então não perdíamos um dia sequer, faça chuva ou faça sol, nós três estávamos ali para ver o sol raiar.

“Mais cinco minutos e eu vou entrar na água com ou sem vocês.”, meu áudio se juntou às outras mensagens que eles faziam questão de ignorar.

A farra ontem tinha sido boa, eu sabia disso, Matheus e eu chegamos juntos em casa, só não vi Ian chegar, mas não era nenhuma novidade, ele sempre garantia que Lua chegasse em casa em segurança.

Chutei a areia úmida e olhei ao longe na esperança de ver ao menos a cabeça daqueles dois idiotas, mas a única coisa que avistei foi um corpo esguio, na beira da praia.

Será que eu estava vendo coisas? Semicerrei os olhos tentando enxergar melhor, da distância que estava só conseguia ver o corpo vestido com uma roupa que definitivamente não era para nadar, os cabelos curtos estavam ao vento, mas eu não conseguia distinguir se era uma mulher ou homem.

A única certeza que eu tinha era que a pessoa estava perto demais do mar e continuava a caminhar em direção às águas revoltas. Eu estava acostumado a surfar ali, especialmente nesse horário e sabia que não era nada fácil com a maré daquele jeito.

Mas a pessoa não parecia se importar, mesmo com seu corpo cambaleando cada vez que a água atingia a areia com força, ela continuou.

— Ei! — gritei tentando chamar a atenção de quem quer que fosse ali. — Não pode entrar ai desse jeito!

Desisti de gritar e corri em sua direção no meio do mar. A última coisa que vi antes de entrar na água gelada, com prancha e tudo, foi uma onda engolindo a cabeça da pessoa.

A correnteza estava me puxando com força e aproveitei isso para chegar até onde avistei o corpo pela última vez, então soltei meu pé da corda e mergulhei tentando encontrar qualquer sinal da pessoa com os braços, quando finalmente submergi uma onda me acertou em cheio me arrastando ainda mais para o fundo.

Dei braçadas longas tentando encontrar a superfície mais uma vez, por um minuto me arrependi de ter me soltado da prancha, de ter entrado no mar justo naquela parte onde as ondas quebravam e os corais dominavam o fundo.

Puxei o ar com força quando consegui tirar a cabeça debaixo da água e busquei em volta pela prancha e por sinal do corpo. Avistei a prancha poucos metros de mim e foi enquanto eu tentava alcançá-la que vi um braço girando antes de sumir novamente.

Subi em cima do shappe e nadei até o lugar, havia sumido por um segundo, com sorte ela ainda estaria perto. Procurei em volta atento, o sol ainda estava despontando no horizonte, ia demorar até que tivesse luz suficiente para conseguir enxergar tudo com clareza, mas eu faria o que estivesse ao meu alcance para ajudar.

Pulei novamente na água e procurei por sinal dela, até que o fôlego me faltasse. Estávamos perigosamente perto de alguns corais e eu comecei a ficar realmente preocupado, a praia estava cada vez mais longe e a maré não parecia que daria trégua tão cedo.

Era minha última tentativa antes de sair dali e ligar para os bombeiros, disse para mim mesmo antes de mergulhar mais uma vez. Mergulhei o quanto consegui, descendo cada vez mais, até que senti algo em volta e abrindo os olhos avistei os braços para cima, como se o corpo boiasse.

Me aproximei com rapidez e vi que era realmente uma mulher, ela estava desacordada, o corpo flutuando e a única coisa que o impedia de subir eram as pernas enroscadas em um coral.

Desci até alcançar suas pernas envoltas em uma calça jeans e me amaldiçoei por não ter nada que pudesse cortar aquele tecido e livrá-la de uma vez. Segurei firme em suas pernas, pronto para puxar, com certeza se cortaria mais do que já estava, mas se eu demorasse demais ela poderia morrer com a água entrando em seus pulmões.

Senti os espinhos e a casca grossas do coral cortarem minhas mãos e braços, cada vez que eu me embrenhava tentando evitar ao máximo machucá-la ainda mais.

Quando finalmente soltei suas pernas do emaranhado de corais subi com pressa, segurando seu corpo em um braço. Puxei uma lufada de ar, recuperando o folego e nadei rápido puxando-a até a prancha, deitei o corpo mole sobre shappe e remei com os braços em direção a praia.

O desespero me tomava e eu tinha certeza que meu coração não estava batendo daquele jeito apenas pelo tempo sem ar, mas sim por medo do que iria acontecer com aquela mulher.

— Joe! — Ouvi a voz de Matheus me gritando da praia e me permiti sentir um pouco de alívio.

— Que merda aconteceu? — Ian questionou quando conseguiu focar no corpo sobre a prancha.

Os dois não esperaram que eu pedisse, já estavam na água se aproximando. Com a ajuda deles em poucos segundos meus pés tocaram a areia macia, mas não me detive ai, afastei os cabelos de seu rosto e iniciei uma respiração boca a boca.

Me afastei para fazer a massagem cardíaca, mas meus olhos não saíram de seu rosto pálido, Matheus precisou tomar a frente e começar as compressões ritmadas, enquanto eu a esquadrinhava, havia olheiras profundas, quase roxas e as maçãs do rosto eram protuberantes, mas o que mais me preocupou foram os lábios roxos e a pele cada vez mais acinzentada

Voltei meus lábios para os dela com pressa, seguindo tudo o que havia aprendido no treinamento de primeiros socorros. Soprava cada vez com mais força e rezava para que ela não morresse.

— Cara, a ambulância já está a caminho.

Eu ignorei qualquer coisa que Ian dizia, tudo o que queria agora era descobrir a cor dos olhos dela, ver a cor voltar as suas bochechas, poder ouvir o som do seu coração bater contra meus dedos.

— Vamos lá, não é sua hora agora. — Me ouvi dizendo de forma desesperada.

Continuei a respirar por ela, tentando empurrar a vida de volta no seu ser, como se a minha própria dependesse disso, eu não aceitaria que ela morresse, não quando eu estava há metros de distância e demorei tempo demais para vê-la, porque estava tão absorto no atraso dos meus irmãos.

— Irmão... não tem ma.is nada que possamos fazer. — As palavras de Matheus tiveram o efeito oposto que ele queria, me deram combustível para soprar ainda mais forte em seus lábios, torcendo para que dessa vez seus pulmões recebessem o ar e o coração voltasse a bater enquanto ela expelia toda água que havia engolido.

Senti a mão de um deles em meu ombro, mas não parei, eu não podia. Então as sirenes soaram mais perto e de alguma forma eu sabia que ela ficaria bem, só precisava continuar com aquilo.

— Não faz isso comigo linda, volta pra mim — sussurrei antes de colar meus lábios aos seus e soprar mais uma vez ar em seus pulmões.

Foi quando finalmente senti a água subir por sua boca que me afastei depressa, seu corpo sacudiu e ela tossiu colocando um pouco de água para fora, só então consegui respirar aliviado. Meus irmãos se apressaram em virar o corpo dela de lado para que conseguisse cuspir tudo, pois eu estava paralisado, ainda não conseguia acreditar que ela tinha realmente voltado.

Então olhei em seus olhos pela primeira vez, os olhos verdes, vivos e doces, pareciam perdidos, até que ela os focou em mim e eu podia afirmar que ela era a garota mais linda que eu já tinha visto.

O sol pintou o céu de um tom de laranja forte, que refletia em seus cabelos castanhos, deixando-os brilhando, então ela abriu os lábios carnudos e uma onda de tosse lhe atingiu novamente.

— Aqui! — Ouvi Ian gritando e ergui os olhos para vê-lo acenando na direção dos socorristas.

— Agora tudo vai ficar bem, tudo vai ficar bem! — garanti a ela.

Toquei sua bochecha, sentindo a pele macia contra meus dedos enquanto ela ainda me encarava assustada, com certeza não entendia o que tinha acontecido. Em um minuto estava se afogando e no outro estava na areia, com três desconhecidos a cercando.

Rapidamente eu fui arrancado de perto dela enquanto os paramédicos a examinavam, cobriam seu corpo e a colocavam em uma maca. Só então eu me permiti olhar para o resto do seu corpo, a calça jeans estava em trapos e o tom carmesim ali me dizia o quanto ela tinha se machucado nos corais, em seus braços haviam alguns arranhões e eu me perguntei se ela estaria ferida em mais lugares.

— Você vem conosco? — questionou um dos socorristas, se virando em minha direção e eu fiquei em duvida, queria saber mais sobre ela, mas não queria ser invasivo nem nada. — Seus cortes, precisam ser tratados.

Olhei para onde ele apontava e vi alguns cortes nas minhas mãos e braços, não tinha notado nenhum até esse momento.

— Vamos levar ele, estamos logo atrás. — Matheus tomou a frente e me segurando pelos ombros ele me olhou nos olhos, como se para ter certeza que eu estava bem.

Eu não sabia como me sentia naquele momento, mas meu irmão viu algo em meu olhar que não gostou, pude ver em sua expressão de tristeza.

Então antes que eu voltasse a ter controle sobre mim, os dois se apressaram em pegar as pranchas e outras coisas que estavam jogadas na areia.

— Vem Joe, vamos logo para o hospital, antes que tia Julia note nossa demora e enlouqueça. — Ian disse.

Concordei com ele no automático, ainda estava atordoado com tudo o que tinha acontecido, precisaria de um longo tempo para processar aquela manhã. Ao menos meu coração não estava mais pesado, com culpa por não ter ido até aquela garota a tempo, mas havia um aperto ali que não existia antes e quanto mais longe ela ficava, mais o aperto aumentava.

Queria correr atrás da ambulância e ter certeza de que ela estaria bem, queria conversar e entender o que tinha acontecido com ela para entrar no mar daquele jeito.

Mas senti uma mão em minhas costas me empurrando para fora da areia, até onde o carro estava estacionado.

— Vamos lá, você precisa de cuidados, está sangrando também.

As palavras de Ian me trouxeram um incomodo, assim como ela eu estava sangrando, mas algo me dizia que havia muito mais acontecendo com ela, mais dor, mais machucados, mais cortes do que podíamos ver.