2. A cobrança
Marcos Rossi
Aquela garota era a imagem viva de Paola, que Deus a mantenha bem longe de nós. Já a irmã, esta possuía uma aura intrigante que ele ainda não conseguia desvendar. Naquele momento, ela estava em seu carro, olhando pela janela perdida em pensamentos. O destino, às vezes, era irônico, colocando as pessoas certas bem na sua frente. Ele se sentia um homem de sorte.
Primeiro, ele não deixaria aquela gracinha sozinha. No cemitério, ouviu o tio dela sendo bem categórico: eles a chantageariam e fariam a mesma merda que fizeram com Paola. Seu coração acelerou ao lembrar das palavras frias e calculistas daquele homem sem escrúpulos. Ele precisava agir. Marcos Rossi tinha um objetivo em mente e aquela garota agora fazia parte de seus planos.
Ela estava molhada, a pele branca e arrepiada, encharcando o assento de couro do carro. Mas ele não se importava, se pudesse lamberia cada gota que estava escorrendo de seu corpo. Seria por uma boa causa. Mal sabia ela o que estava por vir. Ele sorriu. Os olhos inquietos não paravam de observar o entorno, e ele se perguntava quanto tempo demoraria até que ela percebesse a realidade da situação. Que ela não estava indo para um ponto de ônibus.
A estrada escura parecia interminável. O motor do carro roncava, um som grave que se misturava com o barulho incessante da chuva. A voz dela, uma mistura de desespero e determinação, ecoava no interior do veículo enquanto tentava, em vão, abrir a porta trancada. Ele já havia dito para ela se tranquilizar, e Marcos achou que ela tinha entendido.
Quando finalmente chegaram ao portão grande e imponente da mansão, seus homens já estavam a postos, abrindo a passagem. Ele entrou, seguindo pela estrada ladeada de árvores antigas, cujas sombras dançavam sob a luz dos farois e um balé das gotas da chuva deixavam tudo mais sombrio.
O chafariz ao centro do pátio surgiu imponente, uma herança de seu avô que sempre dizia que quem tivesse um chafariz na entrada de casa teria o mundo a seus pés. Era como se Marcos ouvisse a voz do avô. Ele nunca deu muita importância a isso, mas agora parecia fazer sentido.
Ele saiu do carro e abriu a porta para ela. Assim que a mulher sentiu a liberdade, correu em direção ao portão com todas as suas forças. Seus pés batiam rítmicos no chão molhado, e o som parecia ecoar em sua mente.
— Sério que você vai tentar fugir? — Sua voz saiu firme, mas com um toque de ironia. Ele respirou fundo e começou a persegui-la. Cada passo que dava aumentava a tensão no ar, enquanto a chuva caía pesadamente, quase como uma cortina entre eles. A adrenalina corria em suas veias, e ele sabia que, naquele jogo de gato e rato, ele tinha a vantagem.
Ela sabia que não iria conseguir sair dali. Por que essa louca estava correndo, então? O desespero parecia alimentar seus passos. Quando ela viu os homens no portão, a mulher desviou, correndo pelo jardim da mansão, transformando aquilo em uma verdadeira caçada. E Marcos gostava de caçar, mas não na chuva e no barro.
Ele correu atrás dela, mas a mulher era uma atleta nata, cada passada uma demonstração de agilidade e resistência. O chão de barro dificultava a corrida, tornando cada passo um desafio. Marcos escorregou e ela conseguiu uma distância.
— Vamos parar com isso aqui, está chovendo e frio — ele gritou, a voz se misturando com o som da chuva pesada.
— Vá a merda, me deixa sair daqui — ela retrucou, a voz carregada de fúria e medo.
Ela correu até o chafariz, as gotas de chuva explodindo na água e no mármore, criando um cenário caótico. Ela girava ao redor do chafariz, tentando despistá-lo, mas ele já estava farto daquele jogo. Com um movimento decidido, ele a alcançou. Pegou-a pela cintura e a jogou sobre o ombro, sentindo o corpo dela tenso e a respiração ofegante.
— Não faça isso, seu... — ela começou, mas foi interrompida por um tapa firme no bumbum.
— Não fuja novamente — ele ordenou, a voz firme e autoritária.
Ele correu pelos corredores da mansão, manchando o mármore. Chegando ao escritório, ele a colocou no chão com um pouco mais de cuidado. Ela estava com a calça cheia de barro e a camiseta branca grudada ao corpo, delineando suas formas. A mochila dela, provavelmente, tinha caído em algum momento durante a tentativa de fuga. Ele a observou, seus olhos duros.
— Nunca mais faça isso. Nunca mais fuja, garota — ele disse, a voz baixa e carregada de ameaça.
— É melhor você me deixar ou alguém virá atrás de mim, e as coisas não vão ficar boas para você — ela retrucou, tentando manter a coragem.
Ele deu uma risada seca, cheia de desdém.
— As coisas não vão ficar boas para você, querida.
Ele jogou um envelope sobre a mesa, o nome "Paola Maziero" escrito nele. O que poderia haver ali dentro? O ar no escritório ficou pesado, carregado de mistério e tensão. Ela olhou para o envelope, o coração batendo acelerado, enquanto tentava decifrar o que aquilo significava. O que ele sabia? E até onde iria para proteger seus segredos?
— O que tem neste envelope?
— Abra e veja você mesmo.
Ela foi até perto da mesa de mogno escuro e sentou-se na poltrona em frente à mesa. O envelope amarelo estava em suas mãos trêmulas enquanto ela o abria. Os papéis foram tirados de lá de dentro, e a mulher observava cada um deles, seu rosto mostrando confusão e crescente desespero.
— O que é isso aqui? — ela perguntou, a voz trêmula.
— Pensei que você fosse mais inteligente — Marcos respondeu, um sorriso de superioridade brincando em seus lábios.
— Há quanto tempo Paola tem pegado dinheiro emprestado?
— Sua irmã gostava de gastar. Deve ter puxado isso da sua mãe e do seu tio. Sabe, tenho pena da sua priminha, tão jovem e prestes a ficar na rua - ele debochou - Sua família deve muito dinheiro para mim, e chegou a hora de cobrar.
— Você vai cobrar dívidas da minha irmã que morreu? — ela perguntou, incrédula.
— Vou sim. E cobrarei de você.
As palavras dele caíram como um peso sobre ela. Sentiu-se impotente diante da ameaça velada, da crueldade disfarçada sob a máscara de um sorriso gélido. Seu coração acelerou, as mãos tremendo enquanto segurava os papéis que agora revelavam um lado obscuro da história de sua irmã. O que mais ele saberia? Até onde ele iria para garantir que pagasse pelas dívidas de Paola?
O silêncio no escritório era opressivo, apenas quebrado pelo som da chuva lá fora. Ela olhou para ele, os olhos cheios de uma mistura de medo e raiva.
— E se eu não puder pagar? — ela sussurrou, a voz mal conseguindo sair.
Ele se aproximou dela, tão perto que ela podia sentir seu hálito frio.
— Então, minha querida, você terá que encontrar uma maneira.