Resumo
Reza a lenda, que se uma criança for pega andando pelas ruas estreitas de Itororó depois da meia noite, o farfalhar dos sininhos de uma terrível senhora anunciará sua ida ao além. É em meados de 90, numa cidade do interior da Bahia, que três crianças desaparecem deixando apenas resquícios de uma antiga falácia que contavam os moradores. Para isso, uma investigadora conhecida por seus vícios, humor alternante e afiada capacidade analítica, vai atrás de respostas sem a ajuda de bancos de dados ou impressões digitais. Como num jogo de pôquer, é preciso estar atento aos pequenos detalhes. Este é um romance policial acompanhado de muitas doses de café, onde o cérebro é o único instrumento de investigação.
PRÓLOGO
Os ventos que circulam a cidade de Itororó, contam a antiga história de uma senhora e sua bicicleta...
A bicicleta pedalava pelas ruelas da pequena cidade, e a senhora carregava consigo uma cesta cheia de livros com historinhas de terror. A meninada, por sua vez, chegava mais perto ao ouvir os inconfundíveis sininhos chacoalharem. Era a hora do medo.
Para todos que passavam, ela dizia: "Pode me chamar de Nancy, dona Nancy, ou como quiser!". Todavia, as línguas da vizinhança não demoraram a maliciar. Corria a falácia de que uma terrível decepção amorosa desajuizou a velhinha, fazendo-a esquecer de sua verdadeira identidade e pedalar por toda a cidade à procura de ouvintes para suas espetaculares narrações.
A morte, que para ninguém demora a tardar, visitou dona Nancy. Após cinco dias sem dar as caras nas ruas estreitas de Itororó, foi encontrada com o corpo roxo e estático na cama. Motivo do óbito: infarto fulminante. Assim, sem mais e nem menos, a velha fez jus a sua vida tendo uma morte solitária.
A vizinhança se sensibilizou com o falecimento súbito de Nancy, e após uma vaquinha, ela pôde descansar em um caixão acolchoado. E as crianças, mesmo sem entender muito bem o ocorrido, compareceram ao enterro e jogaram pétalas secas de rosas para o pedaço de madeira onde jazia o corpo.
Ao lado direito do caixão estava José, a única e verdadeira amizade que dona Nancy tivera. José assistia a cerimônia com os pés descalços, corpo imundo e balbuciava sons inaudíveis. Apesar da séria condição mental que possuía, os bisbilhoteiros não deixaram de notar o seu rosto úmido pelas poucas lágrimas que o percorriam.
Com o mover do tempo, surgiram falácias sobre o corpo da pobre senhora que descansava no além. E, para aquela cidade pequena cheia de lendas e folclores, a história de dona Nancy passou fazer parte daquela cultura.
À noite, quando todos dormiam, o espírito de dona Nancy pedalava pelas ruas de Itororó com o solitário som do farfalhar dos seus sininhos, e aquelas crianças que ousassem sair de casa esse horário, não voltavam nunca mais para ela.