5
Nossa noite estava terminando, depois de muita comida chinesa, vinho branco e risadas. John era uma pessoa incrível e eu estava louca para sair com ele de novo.
Talvez aquilo fosse efeito do vinho. Pelo menos era isso que eu diria a Lilian, quando confessasse aquele desejo.
— Obrigado. — diz ao garçom, quando ele leva a conta. — E então? Passei no teste?
— Sinto em dizer que sim. Eu amo tanto comida, mas... Eu quero repetir.
John sorri.
— É, eu também.
Nos levantamos e John se aproxima de mim. Fecho meus olhos e me surpreendo quando seus lábios tocam minha testa e não minha boca. Quando abro os olhos, ele me encara e coça a nuca.
— Quero ir devagar. — diz. — Passei por um término traumático e... Você é legal demais para acelerarmos tudo.
Minha frustração de não ter sido beijada, passa, ao ouvi-lo dizer aquilo. Posso não o conhecer direito, mas só com o que sei sobre essa noite, me questiono como alguém pode magoa-lo.
— Está tudo bem.
— Me dê seu número? — pede. — Quero te mandar umas coisas depois.
— Eu esqueci o celular em casa e acabei de trocar meu número. Então não faço ideia de qual seja.
— Não tem problema. — ia passando um garçom e ele o chama. — Me empresta sua caneta?
Assim que o rapaz a entrega, John pega um guardanapo e anota seu número. Ao lado de seu nome, tinha um pequeno coração torto.
— Nossa, tem até um coraçãozinho.
— Porque sou fofinho.
Não tinha como não rir daquilo. Minha gargalhada estridente ecoou pelo restaurante, fazendo algumas pessoas nos encararem.
— Aí, mereço... — murmuro, jogando o papel dentro da bolsa. — Bem, melhor eu indo. Não queremos que seus fãs desconfiem disso.
— Sim. Foi um prazer. Obrigado.
— Eu que agradeço, John.
Nos despedimos com um abraço tímido e logo estou na rua. Caminho um pouco, aproveitando daquela noite fresca de verão.
Fazia tanto tempo que eu não me sentia bem com um homem, que tudo parece bom demais pra ser verdade.
O fato de eu nunca ter namorado, tem nome e sobrenome. Nicolas Santos. Um brasileiro que tinha vindo morar em Seattle, depois de passar na faculdade. Nos conhecemos por acaso em um bar e foi tudo muito intenso. Nós quase não tínhamos tempo um para o outro, mas sempre que nos encontrávamos, era só beijos e risadas. Estava há mais de sete meses com Nicolas, e ele nunca havia me pedido em namoro. Achei que se daquele jeito estava bom, não tinha pra que mudar nosso status. Éramos namorados não assumidos. Até que um dia, depois de uma briga boba, ele me disse precisar de um tempo para ficar sozinho e pensar. Dizia que eu o pressionava. Esse tempo já faz anos e eu nunca mais o vi.
Eu amava Nicolas. O amava de uma forma única. Sabia que o que eu sentia era diferente de qualquer outro sentimento. Mas quando ele se foi, eu percebi que amava sozinha.
Desde então, eu não quis mais saber de namorados. Ficava com um menino aqui é outro ali, mas não passava de uma semana.
Paro na frente da loja de antiguidades que pertencia ao meu pai, antes dele se afundar nas dívidas e perder tudo. Eu e o novo dono tínhamos uma picuinha, pois nunca gostei de ter perdido aquela loja. Mas ao reparar que ele não estava ali, decido entrar e olhar tudo.
Nunca gostei do que ele fez ali. Mudou tanta coisa, que fez a loja perder a essência que ela tinha.
Estava passando pelo corredor mais caro e sensível de toda a loja, quando uma criança grita e corre em minha direção, fazendo com que eu esbarre em um dos vasos de cristais e ele se espatife no chão. O menino observa minha cara de espanto e se acaba de rir da minha cara. Quando ele escuta a voz de um homem, sai correndo e me deixa ali com todos aqueles pedaços de cristais.
— AÍ MEU DEUS! — o homem grita, me fazendo tomar outro susto. — OLHA O QUE VOCÊ QUEBROU!
— Eu? Foi culpa do menino.
— Que menino se só tem você aqui? — ele ergue uma sobrancelha. — Me desculpe, mas terá que pagar isso.
— O quê? — questiono exasperada. — Eu sei quanto um vaso de cristal custa e não irei pagar. Não foi minha culpa.
Ele me olha de lado e então bate palmas.
— Já sei quem você é! Emma. Filha do antigo dono. Meu patrão não quer você aqui e logo vejo o porquê. Quer destruir todo o seu patrimônio.
— Primeiro que não quero destruir nada. Segundo que se foda seu patrão. E terceiro, eu não vou pagar.
— EU VOU CHAMAR A POLÍCIA!
— CHAMA ENTÃO.
Aquele projeto de pessoa se encaminha até o balcão e pega o telefone. Eu estava apavorada de ser presa, mas mantive a minha pose de durona.
Em menos de dez minutos a polícia chegou. Eu e o ser, que se chama Henri, começamos a falar em uníssono, até que o policial se estressa.
— Calados! — diz. — Primeiro a senhorita.
— Ele quer que eu pague uma coisa que não quebrei.
— Quebrou sim!
— Não quebrei, caralho.
— Da para vocês pararem? — assinto. — Quero ver as câmeras de segurança.
— Estão em manutenção.
— Então não há provas que ela quebrou?
— Não, mas essa garota é louca. Ameaçou quebrar todos os cristais, por pura inveja. Tenho o vídeo desse dia.
— Gravar hoje não foi possível, mas gravar no dia em que estava bêbada, foi? — ironizo.
— A senhorita disse isso?
— Disse, mas não foi inveja.
— E o que me prova que hoje não foi você cumprindo sua palavra?
— As câmeras provariam algo, mas né... E por que está falando assim? Eu já disse que não quebrei aquela porcaria. E EU NÃO VOU PAGAR.
— Acho melhor maneirar seu tom de voz ou te prendo por desacato.
— Prende. — provoco.
Um certo dia meu pai disse, que eu me meteria em belas encrencas, com o meu jeito provocativo.
O policial segura em um dos meus braços e me faz virar, prendendo as algemas em meus punhos.
[...]
— EI? — berro entre as grades, para o policial que passava. — Até quando ficarei aqui?
— Até que alguém pague sua fiança.
— Fiança? O que?
— Por destruição de patrimônio alheio e desacato a uma autoridade.
— Isso é um absurdo! — exclamo. — Eu não destruí nada. Tudo bem, que provoquei o policial, mas não quebrei nada.
Ele vem na minha direção e começa a abrir a cela.
— Estou livre?
— Sim. — sorrio de alívio. — Livre pra ligar para alguém pagar sua fiança.
— Ligar? Mas eu não sei o número de ninguém.
— Ih garota, parece que alguém vai passar a noite na cadeia.
Eu já estava quase entrando em desespero, quando lembrei de um certo papel na minha bolsa.
— Não! Espera... — abro a bolsa e pego o papel. — Eu tenho pra quem ligar.
— Dois minutos. — diz, apontando para o telefone.
Caminho até lá, ensaiando o que dizer. Disco os números e espero ansiosamente, até que ele atende.
— Alô? — seu sotaque é mais forte pelo telefone. Quase me lembra o cara da outra noite.
— John? É a Emma...
— Oi! Chegou bem?
— Então... Eu tive um ligeiro problema de percurso e preciso que venha me buscar.
— Onde? Você está bem?
— Estou... Presa. Me tira desse lugar, John. — choramingo. — Por favor.
— Já estou indo.