Capítulo 4 - Queda à monarquia
Nunca pensei que achar um emprego fosse tão difícil. Eu realmente gastei a sola do meu scarpin mais caro e nem minha boa aparência meu ajudou. O papel que eu havia conseguido na faculdade ajudava a não me dizerem não completamente. Ficavam com meu currículo que era praticamente em branco e prometiam me ligar assim que houvesse uma vaga. Eu não poderia me dar ao luxo de esperar. Eu precisava do emprego urgentemente.
No fim da tarde, voltei para a faculdade e fui encontrar meus amigos no nosso lugar secreto. Todos já me esperavam.
- E então, alguma novidade? – perguntou Kim. – Conseguiu o emprego?
- Claro que não. – falei jogando minha bolsa longe e sentando em uma mesa, completamente esgotada.
Tirei meus sapatos e disse:
- Bolhas... Eu fiz bolhas de tanto caminhar. – falei horrorizada.
- Tentou com o reitor? – perguntou Diana.
- Você conhece alguma pessoa que tenha conseguido emprego com o reitor, Diana? – perguntei curiosa.
- Sim... Algumas meninas das minhas aulas.
- E... Garotos?
Ela pensou um pouco e disse:
- Não.
Eu respirei fundo e contei a eles o que havia acontecido naquela manhã. Para minha surpresa Léo ficou furioso. Levantou e caminhava de um lado para o outro:
- Temos que denunciar.
- Eu concordo. Mas alguém vai ter que realmente gravar. Eu blefei... E por sorte ele acreditou.
- Amiga, você é muito espera. – disse Kim.
- Eu sei disto... Se não fosse já teria ido para cama com ele por um emprego. Consegui o papel e não precisei usar meu corpo. – eu disse sorrindo ironicamente.
- O que fez ele pensar que usaria este corpo? – perguntou Léo me abraçando. – Estou triste por você, minha linda.
- Eu não... – confessei.
Todos me olharam.
- Pensem, eu venci aquele imbecil. - me justifiquei.
- Ela tem razão. – disse Diana.
- Ainda acho que não podemos deixar assim. – falou Léo. – Podemos armar uma cilada para ele. E se usássemos você, Diana?
- Eu?
Eu sabia que não daria certo. Diana era muito tímida para ser isca. E depois do que eu havia feito, Justus já devia estar bem mais esperto.
- Este sistema macabro. – continuou Léo. – Que usam as mulheres como objetos.
- Exato. A culpa é da monarquia.
- Querida, a culpa é do mundo. – contestou Kim. – Que não aceita que garotas bonitas possam ser inteligentes, que acha que tudo que alguém pede pode conseguir algo em benefício próprio, que acha que os gays não são pessoas normais... E por aí em diante.
- Ele tem razão. – disse Diana.
- Vocês sabem que devem existir mais grupos contra a monarquia em vários lugares do reino. – eu disse.
- Sim.
- Somos um grupo pequeno, por isso podemos continuar. Mas não acho que consigamos nenhuma mudança nós quatro, além de dialogarmos. Precisamos fazer parte de um grupo maior. Temos que achar as outras pessoas que pensam como nós.
- Mas encontrar estas pessoas é um risco. – disse Diana.
- Se não tentarmos não saberemos.
- Na verdade a monarquia ficou ruim desde que Rainha Anne assumiu. Enquanto o rei estava bem de saúde, não tínhamos a miséria e a tirania de hoje. – lembrou Léo.
- Isso é verdade. E precisamos ter cuidado. Noriah norte estava tentando tirar a monarquia há muito tempo e o que conseguiram? Quebrar o país e viverem em miséria absoluta. Não basta quebrar a monarquia... É preciso saber o que queremos após a queda dela. – observou Kim.
- Mas há boatos de que o Príncipe Magnus se casará e assumirá o trono no lugar da rainha Anne. – falou Diana.
- Não vejo a rainha Anne abandonando a coroa nunca. – eu disse. – Ela ama ser rainha... Ela quer ser idolatrada, mandar, ter súditos...
- Isso é verdade. – disse Kim. – A rainha ama ser rainha.
Todos rimos.
- Imagina um rei lindo como Magnus Chevalier. Acho que eu até me dobraria para monarquia. – confessou Kim.
- Ora, Kim, você não está falando sério. – disse Léo.
- Que ele é lindo ou que eu me dobraria à monarquia? – ele perguntou rindo.
- Os dois...
- Ele é perfeito. – disse Diana.
- E você também acha este absurdo, Kat? – perguntou Léo, atento ao que eu diria.
- Sinceramente, não que eu seja alheia a tudo que acontece na família real, mas se fecho meus olhos não lembro do príncipe Magnus. A rainha é dona de toda atenção e merchandising do reino, não dando espaço para ninguém. Ela quer ser única. Esta é minha visão. Mas se eu encontrasse o príncipe Dereck na rua, eu o reconheceria.
- Querida, você nunca vai encontrar o príncipe Dereck na rua. – disse Kim. – E se eu encontrasse ele, agarrava e raptava. Acho-o ainda mais fofo que Magnus.
- Ele também adora um holofote. – observei. – Não tem rede social, mas vive em fotos de pessoas da A e da B. Ele está sempre na noite, nas baladas mais importantes, com os artistas e cantores mais famosos. Ele puxou à mãe.
- Ainda bem que ele só assume o reino se Magnus morrer. – disse Leo.
- Acham que Magnus é melhor que Dereck? – perguntei.
- Claro que sim. – disse Diana. – Ele é sensato, é sério... Nunca o vi numa balada ou numa foto em uma rede social. Só nos jornais e na TV. Ele fala bem...
Eu ri:
- São ambos horríveis. Eles são filhos da rainha Anne, não há como serem boas pessoas.
- O que seu pai acha sobre quando o reino era comandado pelo rei Alfred? – perguntou Léo.
- Eu nunca falei com meu pai sobre isso. – confessei.
- Deveria. – ele disse. – Meu pai disse que eram áureos tempos em Noriah Sul. O rei Alfred era sério e ao mesmo tempo ouvia as pessoas. Ele tentava encontrar soluções que sempre beneficiassem todos. Era um homem que realmente se importava com todo o povo.
- Não é isso que dizem os livros. – Diana falou.
- Eu aposto que a rainha Anne mandou escrever tudo que está nos livros de história.
Caímos na risada novamente. Kim era engraçado sempre e mesmo em assuntos sérios conseguíamos ficar alegres com os comentários dele. Eu amava tê-lo como meu melhor amigo. E eu também era feliz por ter amigos tão inteligentes e cheios de causa para lutarem.
- Bem, o assunto está bom e eu poderia ficar aqui até amanhã conversando sobre o quanto eu odeio a monarquia. Mas eu preciso ir. – falei.
- Boa sorte na sua casa. – disse Kim. – Qualquer coisa me liga.
- Pode deixar, amigo. Amo você.
Despedi-me deles e estava saindo quando Léo fechou a porta e ficou na minha frente, impedindo minha passagem:
- Como vou ficar sem vê-la todos os dias?
Eu ri:
- Você vai sobreviver, seu bobinho.
Ele tentou me beijar, mas eu virei o rosto e o beijo pegou na minha bochecha.
- Quando você vai aceitar ser minha namorada? – ele continuou.
- Léo, por favor, hoje não estou com tempo para isso... Estou cansada, chateada.
- Querida, você sabe que se namorarmos e virmos a casar, você não terá mais problemas financeiros.
- Léo, eu sei disto. Mas eu não quero casar com você por dinheiro. Eu preciso amá-lo.
- Mas você pode me amar com o tempo...
Eu alisei o rosto dele e disse:
- Obrigada por existir na minha vida.
Ele abriu a porta e deixou que eu saísse.
Quando cheguei em casa tomei um banho e vesti uma roupa confortável. Expliquei a minha mãe que não havia conseguido emprego naquele dia. Achei que Laura Lee iria me xingar, mas não. Pelo contrário, ela foi bem gentil:
- Eu sabia que seria assim, minha filha. Você vai conseguir algo. Não desista.
Fiquei com pena de minha mãe. Eu percebi o quanto ela estava cansada de tudo. E eu não queria que ela desistisse. Todos nós estávamos ali graças a ela. Laura Lee era uma mulher forte, decidida, que fazia tudo sozinha na nossa casa. Eu nunca achei que ela e meu pai fossem um casal feliz. Eles se respeitavam, mas nos últimos tempos minha mãe perdera completamente o respeito por ele, depois de ele ter perdido tudo que tínhamos com o vício do jogo. Não sei o que os levou a casar algum dia, mas eu tinha certeza de que não eram apaixonados. Meu pai sempre foi mais sensível e carinhoso. Ela, a rocha que sustentava tudo. Era ela que nos incentivava em tudo e tentava empurrar meu irmão para uma vida com atitudes corretas, a eu fazer faculdade mesmo sem ter certeza do curso que eu queria:
- Faz qualquer coisa... Se precisar, depois muda. O importante é estar lá dentro, estudando. – ela dizia.
E assim eu a ouvi. Ela sempre se preocupava com meu irmão Leon também. Laura Lee era quem nos mantinha juntos, mesmo com todas as dificuldades. Eu queria que ela fosse feliz e tinha medo de ela desistir devido à tantas dificuldades que encontrava.