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Moradora Nova

Jéssica me agarra pelo braço e quase me arrasta em direção a rua principal. Quando passamos em frente a boca ela sorri para os dois homens armados, enquanto eu apenas forço um sorriso e finjo amizade com eles.

— Qual foi, Jéssica. E essa mina aí? Bora apresentar para os amigos. — Um deles diz assim que passamos em frente a mesa.

— Tu tá maluco, Gere? Vou falar pra tua mulher.

— Tô mais com ela não, Jéssica. Ela é mó loucona, quase botou fogo em mim.

— Devia ter colocado. Deixa a minha amiga quieta que ela é nova aqui. Bora, Lud. Se der sorte tu ainda faz uma unha top hoje mesmo.

Sorrio com o jeito da Jéssica, nem de longe as minhas amigas iriam se comportar assim. Após alguns minutos, chegamos em frente a uma pequena porta de vidro, onde uma mulher fazia a sobrancelha de outra.

— Qual foi, Moniquinha. Trouxe a minha amiga aqui pra fazer a unha, dá pra fazer hoje?

– Oi. — a cumprimentei e ela me encara séria, mas depois sorri.

— Claro, pô, mas vai ter que esperar eu terminar essa henna aqui.

— A gente espera. A Lud tá ansiosa pra ver como tu arrasa na acrygel.

Passamos a tarde inteira no salão da tal Moniquinha e, embora não seja uma coisa que eu normalmente usaria, realmente ela trabalha muito bem com o que faz. Me arrependi profundamente em ter ouvido a Jéssica, e optei por um alongamento razoavelmente grande, pois não consegui sequer abrir o botão do meu short sem sentir dor.

Ao menos consegui um convite dela para curtir o baile da comunidade, talvez assim consiga me aproximar de um dos meus alvos.

Decido conversar com as minhas amigas para tentar distrair os meus pensamentos, e me esquecer do nervosismo.

-Como está a vida na favela, amiga?

-Eu esrou me adatpsndo.

-Desaprendeu a escrever, Liv?

-Aí, amuga, inventei um alongamrnto de unha e ainda não me acistumei

-Por Deus, Liv! Você com alongamento de unha? Hahaha

-Ri mesmo, Debu

-Essa nossa amiga é demais!

-Para, Tau! Ao menos vou conseguir ir ao baule

-Boa sorte!

-Precisarei. Beijos, vou me arrumar, ou tentar, com essas ungas enormes.

Com tudo o que já ouvi o que acontece nesses bailes, confesso que o meu medo triplicou, mas infelizmente não posso abrir mão dessa oportunidade.

Após um bom banho, faço uma maquiagem para a noite, visto um short jeans cós alto e um cropped, e estou pronta para me encontrar com a Jéssica e a Moniquinha.

— Caraca, Lud, tu tá lindona. — Jéssica diz assim que eu saio de casa.

— Tô mesmo. Tô me sentindo, amiga!

— Bora antes que a minha vó acorde, senão ela vai querer que eu leve a minha irmã também. A Moniquinha vai se encontrar com a gente lá.

Mais uma vez a Jéssica agarra o meu braço e me arrasta para o tal baile, sorrio para os homens armados e dessa vez não ouvimos nenhum comentário, embora eles tenham nos comido com os olhos. De longe já é possível ouvir as batidas das músicas, e conforme vamos nos aproximando, o som vai se tornando cada vez mais incômodo. Que Deus me ajude.

— Lud, você tá linda!

— Você também tá, amiga! Amei o cabelo.

— Gostou? — Moniquinha diz enquanto sacode os fios — Essa lace é novo, tava morrendo de medo de ficar ruim

— Tá arrasando, Moniquinha. Vai pegar uns cinco hoje.

— Essa é a Dedéia. — Moniquinha diz enquanto aponta para uma mulher dançando ao lado dela. Ela me encara e força um sorriso, mas não diz nada.

— Oi, Dedéia.

— Dá ideia não, ela tá careta. — Jéssica cochicha quando vê que ela não me respondeu. — Vou pegar um balde pra gente.

Ela dá um tapa no meu braço e se afasta, enquanto eu permaneço parada, me sentindo um peixe fora do aquário. Logo a Jéssica me entrega uma lata de cerveja, e eu agradeço, enquanto tento aprender como se dança as músicas que tocam.

Conforme a madrugada se inicia, após a terceira lata começo a dançar alegremente com as duas, e mais uma vez agradeço pelas aulas de atuação.

— Amiga, e aquele boy ali. — Aponto com os olhos para um dos caras armados bebendo whisky com água de coco. — Nanzin, né?

— Aquele ali de camisa vermelha? — Assinto. — Caraca, amiga. Tu vai logo no mais alto? Aquele ali é o Nanzin sim, é o chefe, pô. O do lado é o DG, é o segundo depois dele. Mas vou logo avisando, nem se envolve sério porque ele não tem fiel nenhuma.

— É só curiosidade, achei ele bonito. — Disfarço. — Quando me mudei pro beco, ele falou comigo.

O tal DG é moreno, baixinho, magro, tem cabelos pretos e olhos esverdeados. O tal Nanzin é pardo, alto, musculoso, cabelos claros e curtos, e olhos castanhos. Eu os reconheceria facilmente, pois o Leandro me mostrou a foto dos dois e eu guardei muito bem a fisionomia deles.

Mesmo sem saber como faria, precisava dar um jeito de me aproximar deles para fingir amizade. Passei boa parte da noite procurando por eles, e os encontrei. Agora não sei como fazer, mas preciso dar um jeito de me aproximar.

— Bora lá. Vou te apresentar pra eles, amiga. — Jéssica diz como se ouvisse os meus pensamentos, e novamente me segura pelo braço, enquanto passamos no meio do pessoal dançando. — Oi, DG, Oi Nanzin, fala aí TH. Apresentar a minha nova amiga Lud. Lud, esse é o TH, o Nanzin, e o DG.

Eles me cumprimentam com dois beijos no rosto, e noto os olhares desconfiados do tal Nanzin em mim. Sorrio calorosamente para eles, fingindo toda a simpatia do mundo, quando a minha vontade era pegar o fuzil do tal TH e matar todos aqui, agora.

— Gatona ela, prima.

— Obrigada, DG.

— Tu é a moradora nova, pô. Da casa onde morava o Mc Uhu, né? — Ele pergunta e eu assinto. — Tu de onde, loirinha?

— Ela se mudou tem pouco tempo, Nanzin. — Jéssica me interrompe antes mesmo de eu responder. — Ela morava em São Paulo, veio fugida de lá.

Jéssica diz espontânea e todos os três me encaram, enquanto eu sinto o medo percorrer pelo meu corpo.

— Não vim fugida, Jéssica. Quer dizer, o doido do meu ex não me deixava em paz e nem largava do meu pé, então tive que sair de lá.

— Tu tá segura aqui com todos aqui, qualquer coisa só avisar que rapidinho a gente resolve essa parada aí.

— Já é, DG.

— Morava em São Paulo e fala como geral aqui? Caô purinho.

— Eu sou carioca, Nanzin. Morei dois anos lá, quem pega sotaque em dois anos? Tá louco?

— Ialá, chamou tu de louco.

— Pára, TH. Foi o modo de falar.

— Isso, Jéssica. A minha família toda mora aqui no Rio. Eu só morei dois anos lá por causa do meu ex, conheci ele pela internet, fui conhecer e fiquei lá com ele. Acabei refazendo a vida lá e agora tive que sair por causa daquele comédia.

— Com uma gata dessas até eu não deixava em paz, loirinha. — Nanzin diz enquanto percorre os olhos pelo meu corpo, e eu sinto o meu rosto corar. — Qualquer coisa é só dar o papo que eu resolvo pra você. Aceita? — Ele diz enquanto levanta a garrafa de whisky.

— Quero nada! Valeu ai, mas estamos bebendo cerveja e eu não gosto de misturar, senão fico bem louca. Jéssica, bora? Quero dançar e a Moniquinha deve estar procurando nós duas. Foi um prazer conhecer vocês.

— Satisfação foi toda minha, loira.

— Já é, Lud. Seja bem-vinda a nossa comunidade.

Novamente eles me cumprimentam com dois beijos no rosto e voltamos para onde estávamos. Enquanto tentava conversar e disfarçar, o meu medo ainda corria perfeitamente pelo meu corpo. Preciso aprender a controlar isso, ou isso irá atrapalhar os meus planos.

Ainda que estivéssemos numa distância razoavelmente longa, sempre que olhava em direção ao Nanzin percebia os olhares dele em mim. Decidi o provocar dançando o mais sensual possível, porém assim que a Dedéia sentou no colo dele, eu decidi parar, afinal, quem quer arrumar problema com uma possível fiel do chefe?

Fomos embora quando já amanhecia e, embora não seja uma coisa que estou acostumada a fazer, gostei bastante de virar a noite dançando com a Jéssica. Por alguns momentos me esqueci o principal motivo de estar aqui, e até consegui curtir como uma pessoa normal.

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