Capítulo 4
O ponto de vista de Emily.
Mansão Limão, 20h27
Minha mãe de alguma forma aceitou minha decisão, enquanto meu pai ele não aceitou de jeito nenhum. Perder a filha para conseguir uma aliança de casamento não o deixou feliz, o que eu entendi perfeitamente. Damien havia me deixado no dia seguinte para se despedir da matilha e pegaria minhas malas à noite. Meu pai não tinha me dito uma palavra desde que tomei a decisão de ir embora para que ele pudesse ficar com aquela aliança de casamento, e esse silêncio estava realmente começando a ficar pesado. Ele havia se refugiado em seu escritório e eu acabara de me juntar a ele na tentativa de aliviar a tensão.
“Pai...” eu comecei.
- Não. Não torne isso mais difícil…, ele respondeu, pela primeira vez.
- Tente entender..., eu tentei. Quero proteger a matilha, aquela que você demorou tanto para construir.
- Você não precisava concordar para sair com esse puff! Você sabe perfeitamente que se ele tivesse nos atacado, teríamos repelido o ataque sem nenhum problema! ele enfureceu-se.
- Eu sei pai! Eu gritei. A decisão é minha, então respeite-a!
- Não posso ! ele retrucou, com a voz embargada. Não posso aceitar ver você partir assim!
- Pai..., eu disse, emocionado.
Contornei a grande mesa do meu pai e o abracei. Ele me aprisionou contra ele com seus braços musculosos e deu um beijo em meu crânio.
- Vou sentir muita falta de você..., confessou meu pai.
"Você também..." confessei.
- Pai e filha reunidos..., disse a voz da minha mãe, que nos olhava com lágrimas nos olhos.
Afastei-me do abraço do meu pai e abri o braço. Minha mãe correu até nós e nos abraçamos por um longo momento. Eu teria gostado muito de colocar o tempo em espera. Meu pai terminou o abraço e subiu correndo para vestir o pijama.
Fui para a sala assistir TV. Um documentário sobre a vida selvagem foi transmitido e focado em lobos. Um sorriso se formou em meu rosto e ouvi atentamente o que ele estava dizendo. Um cheiro doce de paella pairava pela casa, fazendo meu estômago roncar. Meu pai desceu do quarto, certamente por causa do cheiro bom que exalava da cozinha. Ele tinha acabado de vestir uma calça de moletom, expondo seus músculos lindos e bem desenvolvidos. Você tinha que admitir, meu pai era uma verdadeira bomba masculina.
- Diga, cobiçar o pai é muito desaprovado! provocou meu pai.
- Não tenho culpa se você chama a atenção de alguém! Eu respondi rindo. E eu não estou olhando para você!
Meu pai riu comigo e foi para a cozinha. Ele e minha mãe saíram cinco minutos depois, minha mãe carregando o prato de paella e meu pai os talheres. Ele pôs a mesa e minha mãe colocou o prato no meio da mesa. Sentamos e provamos a melhor paella que pode existir nesta Terra.
Passamos o resto da noite lá fora, correndo pela vegetação rasteira com a qual estávamos tão familiarizados agora. Paramos numa clareira deserta, aquela para onde meu pai estava me levando. Ele me deu treinamento, querendo ter certeza de que eu poderia me defender de um Alfa, mesmo que já tivesse provado meu valor várias vezes.
- Desculpe impor esse treinamento a você, mas quero ter certeza de que você conseguirá se defender..., justificou meu pai.
- Não se preocupe pai, você vai ficar bem. Você quer levar uma surra? Eu brinquei.
- Será preciso me passar no corpo mocinha! ele ri.
- Sem problemas ! Você é tão ágil quanto um hipopótamo! Eu respondi.
Eu ataquei ele e ele se esquivou no último segundo. Caí na grama molhada e gemi de desgosto.
- Ágil o hipopótamo não é? ele me provocou. Vamos, vamos voltar!
Ele me deu tempo para me levantar e me atacou. Eu habilmente evitei seu ataque e retaliei tentando morder seu flanco esquerdo. Bater. Um grunhido escapou de sua garganta. Ele estava satisfeito. Na euforia do meu sucesso, não o vi pular de cima de mim e morder meu ombro direito.
- Nunca fique satisfeito até que a luta termine, jovem lobo! ele me lembrou.
Rosnei e pulei de volta para ele, determinada a mordê-lo de volta. Falha. Ele havia antecipado meu ataque e aproveitado o momento em que caí no chão para me empurrar e me fazer cair no flanco direito. Então rolei sobre mim mesmo e me endireitei para a grande surpresa do lobo cinzento que era meu pai. Aproveitei para fazê-lo perder o equilíbrio empurrando-o, e ele caiu pesadamente para o lado esquerdo, arrancando-lhe um pequeno gemido de dor. Pulei sobre ele e fechei a boca em sua garganta, vagamente porque era um treinamento.
- Ok, você está pronto para enfrentar um Alfa, notou meu pai.
A tristeza estava presente em sua voz, provavelmente por ser o último treino que faríamos juntos. Limpei sua garganta e me movi para que ele pudesse se levantar. Ele se levantou e seu olhar azul acinzentado perfurou o meu, a dor de me ver partir era onipresente ali. Mas detectei outro sentimento: orgulho.
- Minha filha, você cresceu tanto…, disse ele emocionado. Sinto que foi ontem que você era um filhote de lobo. Se você soubesse o quanto estou orgulhoso de você...
- Obrigado pai, respondi, emocionado. Ainda podemos conversar telepaticamente mesmo se eu mudar de matilha?
- Felizmente sim..., os pais estão ligados ao filho, e mesmo a mudança de matilha não destrói o vínculo que nos une a você, ele me confidenciou.
Fiquei extremamente aliviado em saber disso. Aproximei-me de meu pai e esfreguei meu focinho em sua cabeça, uma forma de abraço entre lobos. Meu pai se afastou de mim e fomos para casa, onde minha mãe nos esperava pacientemente na sala.
Vila Pack, 10h16
Todos estavam reunidos na praça da aldeia, foi muito emocionante. Várias emoções me dominaram: a dor, a tristeza, a melancolia pela minha partida, mas a alegria de vê-las ao meu redor para me despedir.
Os pequenos foram os mais tristes com a Gabriella, cada um deles me abraçou e me abraçou o mais forte que pôde com seus bracinhos. Exceto Gabriella, que tinha mão de ferro.
Eu queria simplesmente deixar a matilha, me despedindo de todos. Meus pais queriam dar uma festa, mas seria muito difícil me despedir depois.
A manhã passou a uma velocidade vertiginosa, brinquei com os pequenos até meio-dia e depois fui para casa com os meus pais. Verifiquei se não tinha esquecido nada para colocar nas malas, meu coração se partiu aos poucos, as lágrimas brotaram dos meus olhos e apesar dos meus esforços para resistir, comecei a chorar na minha cama, segurando um porta-retratos onde estava uma foto de eu e meus pais estávamos lá dentro. Naquele dia tínhamos caminhado, o tempo estava lindo. Na foto pudemos ver a floresta atrás de nós, assim como o tempo ensolarado. Eu e meus pais estávamos rindo na hora da foto, não lembrava o porquê. Minha mãe entrou no meu quarto e me abraçou, com os olhos lacrimejando.
- Calma... Vai ficar tudo bem meu bebê..., sussurrou minha mãe com uma voz extremamente suave.
- Sentirei tanto a sua falta…, solucei. Eu te amo muito !
- Querido, se você soubesse o quanto eu te amo, ela disse me abraçando ainda mais forte. Vai ficar vazio sem você... Me prometa que vai me contar todos os dias, e a forma como ele te trata.
- Eu prometo a você mãe, eu disse. Eu prometo.
Cumprindo essa promessa, ela me liberou e me ajudou a terminar as malas. Quando terminamos eram três e meia. Um silêncio reinou em meu quarto e foi interrompido pelo lindo ronco do meu estômago. Eu nem tinha comido ao meio-dia. Minha mãe riu e fomos para a cozinha. Um prato de paella estava na geladeira, peguei e reaqueçai no micro-ondas.
O resto do dia passou muito rápido, meus pais e eu aproveitamos nossas últimas horas juntos. Assisti TV em silêncio, para me distrair, quando a campainha tocou na mansão. Meu estômago se apertou quando eu soube quem estava ligando. Damião. Meu pai saiu para abri-la e voltou para a sala com o rosto lívido.
- Emilie, Damien está aqui... meu pai me informou, tentando conter as lágrimas.
Balancei a cabeça e desliguei a televisão. Quando virei a cabeça para olhar para meu pai, Damien estava atrás dele. Olhos brilhando de felicidade. Idiota. Da mesma forma, este provérbio não era totalmente falso: a felicidade de uns é a desgraça de outros. Totalmente verdade neste momento.
- Vou pegar minhas malas, disse com voz neutra.
Passei por Damien, ignorando-o regiamente, e montei. Entrei e percebi que ele havia me seguido.
- Eu vou levá-los. Entre no carro, estarei aí o mais rápido possível, disse ele.
- Eu mesmo os pego, senhor músculo! Eu retruquei.
Ele me olhou com desaprovação e antes que pudesse dizer qualquer coisa eu peguei minhas duas malas, que eram muito pesadas, e o empurrei pelo corredor. Coloquei minhas malas na soleira da porta, ofegante, e corri para os braços de meu pai, que me abraçou, tomando cuidado para não me sufocar.
- Minha filha, se cuide bem aí. E se ele ousar te machucar, diga-me que vou atirar nele! disse meu pai.
"Não se preocupe comigo, pai", eu o tranquilizei.
Eu me afastei, segurando minhas lágrimas. Damien provavelmente presenciou nosso abraço, pois olhava para meu pai com saudade, o que me perturbou um pouco. Ele já estava com minhas malas e, devido ao peso, não quis devolvê-las. Damien passou pela soleira e eu estava prestes a fazer o mesmo quando parei na porta e olhei para meu pai uma última vez.
- Pai ?
- Sim ?
- Gosto de você. Nunca esqueça! Eu disse antes de sair correndo para dentro do elegante carro preto.
- Eu também te amo Emilie, declarou meu pai com a voz trêmula.