Um Herdeiro
Brian
Assinei a última folha da pilha de documentos que a minha secretária havia colocado em cima de minha mesa há mais de uma hora e suspirei aliviado. Estava cansado.
A semana havia sido atribulada, tanto no escritório, como fora dele, e eu não tive tempo para muita coisa, além de trabalhar.
Mas isso era algo a que eu já estava habituado, afinal eu era o CEO de uma empresa de tecnologia multimilionária, a maior empresa do ramo no país e isso acarretava muitas responsabilidades.
Construí meu império com muito esforço e o trabalho nunca me assustou, mas eu precisava admitir andar mais cansado nos últimos tempos. Era chegado o momento de delegar mais algumas das minhas funções e observar a possibilidade de tirar férias de verdade. Não apenas alguns poucos dias de distração.
— Você pode chamar o Carter e o Lewis na minha sala, Margareth? — Pedi para minha secretária, uma senhora na casa dos cinquenta anos, muito eficiente e que jamais havia deixado a desejar em seu trabalho.
— Já assinou todos os documentos, senhor Taylor? — Ela perguntou, aproveitando a oportunidade, visto que eu recusei as suas chamadas anteriores, por não querer ser incomodado.
Confirmei que ela poderia vir buscar os documentos, pois já estavam prontos para anexar a papelada do nosso último contrato firmado e encerrei a chamada.
— Algum problema? – Douglas foi logo perguntando, ao entrar na minha sala, poucos minutos depois.
— A educação manda bater antes de entrar. – Resmunguei, apenas para ser o chato que todos me acusavam de ser.
Douglas Carter estava à frente do setor de tecnologia e eu o considerava o melhor na área, depois de mim, é claro. Porém, eu tinha uma empresa multimilionária para dirigir e deixei aquele setor sob sua responsabilidade, e desde então, nunca houve nenhum motivo para que eu duvidasse da competência dele. O fato de ser um dos meus melhores amigos era apenas um detalhe.
— Você me chamou aqui, cara. – Ele não se incomodou nenhum pouco com a minha reclamação. – Não sei como você consegue suportar a si próprio, Brian. Você é o cara mais chato que eu já tive o desprazer de conhecer.
— Faço das suas palavras as minhas. – Oliver falou.
Oliver também havia acabado de entrar sem bater antes e conseguiu ouvir as últimas palavras do Douglas, pegando o gancho para encher o meu saco.
Oliver Lewis era meu advogado, tanto no que dizia respeito à empresa como nas questões pessoais. Ele era multifuncional, eu costumava brincar, mas ele tinha toda uma equipe para dar o apoio necessário ao seu trabalho, além de grande prestígio por representar uma empresa tão importante como a Reloading Inc.
O fato de eles serem meus melhores amigos não interferiam em meu julgamento em hipótese alguma e eu estava muito satisfeito com o trabalho que eles desempenhavam na minha empresa.
Os dois se sentaram nas cadeiras que ficavam em frente à minha mesa presidencial e se mostraram bem à vontade, a postura relaxada, parecendo não terem preocupação alguma na vida, apenas aguardando o que eu tinha para lhes dizer.
— Eu admiro muito o respeito com que vocês me tratam. – Falei com ironia. – Acredito que vocês estejam desejando trabalhar em outra empresa. Estou certo?
Apoiei meu cotovelo sobre a mesa e descansei o queixo em minha mão.
— Estou pouco me lixando para esse emprego aqui na Reloading. – Douglas falou e estava sendo totalmente sincero. – Você chamou a gente aqui apenas para nos mostrar a sua simpatia ou tem algo mais?
Douglas era o herdeiro de umas das maiores fortunas do país e o dinheiro não estava entre as suas preocupações. Apesar disso, ele gostava de trabalhar e aliado ao fato de não se dar bem com os próprios pais, fazia com que ele estivesse em minha empresa desde que havia se formado na faculdade de Engenharia da Computação, ao invés de estar na empresa do ramo automotivo que pertencia a sua família.
— Chamei vocês aqui para comunicar uma decisão que tomei. – Falei, fazendo com que os dois ficaram imediatamente eretos em seus lugares, abandonando a postura relaxada de antes.
Acredito que meu tom foi uma indicação sobre a seriedade do assunto.
— Algo relacionado a empresa? – Oliver foi o primeiro a se pronunciar.
— Sobre a minha vida pessoal. – Esclareci.
— Você não tem vida pessoal, Brian. – Douglas apontou de maneira bem pontual. – Exceto se esteja se referindo a Tia Melanie.
Melanie era minha tia, irmã do meu pai, que já era falecido, mas os meus melhores amigos sempre a tratavam como se fosse tia deles de fato, e não apenas uma forma carinhosa de tratamento. A minha tia também os acolheu e os tratava como se fossem seus sobrinhos de verdade, assim como eu.
— Vou ter um filho. – Fui direto ao ponto.
— Não sabia nem que você estava namorando e agora você já vai se casar? – Oliver questionou, franzindo a testa, em sua postura sempre compenetrada.
— Não estou namorando ninguém e muito menos tenho alguma pretensão de me casar. – Falei de maneira veemente, pois esta era a verdade.
Já havia me envolvido, há muitos anos, com uma mulher que me mostrou que essa história de amor verdadeiro é apenas ilusória e que as pessoas são movidas por questões financeiras, sempre.
Mesmo aquelas que não tinham recursos, acabavam por se prenderem em relacionamentos que não as satisfazia, apenas para ter com quem dividir as despesas, pois tudo ficava ainda mais difícil quando se tinha que arcar sozinho com todos os custos que a vida demandava.
Eu me considerava uma pessoa inteligente e que não precisava de passar pela mesma situação duas vezes, para aprender a lição. Jamais me envolveria em um relacionamento novamente, pois se quando eu não tinha todo o dinheiro que eu possuía atualmente, fui alvo de pessoas interesseiras, quanto mais agora, que eu tinha a maior fortuna dos Estados Unidos.
— Vou te ensinar uma coisa bem simples, meu amigo Brian. – Foi a vez do Douglas falar. – Para ter um filho, você precisa primeiramente, encontrar uma mulher, seja para namorar, casar ou apenas transar mesmo. De outra forma, não é possível.
Quando ele terminou de falar aquilo, soltou uma sonora gargalhada e eu fiquei aguardando enquanto ele se divertia às minhas custas.
— Apenas de olhar para a expressão em seu rosto, já imagino como você pretende ter um filho sem se envolver com mulher alguma. – Oliver apontou e eu tinha certeza de que ele realmente sabia o que se passava em minha mente.
Foi a vez de Douglas parar de fazer graça e trazer uma expressão de seriedade ao seu rosto e franzir a testa em visível desagrado.
— Como assim? – Ele perguntou, provavelmente também já estava começando a deduzir o que se passava.
— É exatamente isso o que vocês estão pensando. — Confirmei seus pensamentos. – Pretendo contratar uma mulher para gerar o meu herdeiro e espero contar com a ajuda do meu advogado, para me auxiliar em todo o processo.
— O que você tem em mente, exatamente? – Oliver perguntou.
A postura do meu amigo agora era de um profissional e o que ela estava querendo saber, dizia respeito às condições para as quais eu desejava aquele acordo, pois ele precisaria elaborar um contrato que me resguardasse de qualquer problema futuro.
Expliquei então as condições que gostaria que ele adicionasse ao contrato que seria celebrado entre as partes, onde eu estivesse totalmente assegurado dos meus direitos como pai e responsável legal pela tutela da criança que ainda seria gerada.
Pedi também que além de elaborar o contrato, meus amigos se responsabilizem pela parte de encontrar uma mulher disposta a gerar meu filho, mas que aceitasse que este seria o seu único papel nessa história. Após o nascimento, ela me entregaria a criança e desaparecia para sempre, abdicando de qualquer direito sobre a criança que gerou dentro de si.
Eu não queria que, em hipótese alguma, a mulher soubesse estar assinando esse contrato comigo, pois ela poderia acabar por espalhar a história, divulgando até mesmo na mídia, em busca de notoriedade. Eu queria que aquele assunto ficasse exclusivamente entre nós.
— Recapitulando: a mulher vai doar seus óvulos e gerar a criança por nove meses, enquanto você só entrará com o sêmen. E mesmo assim ela não terá direito algum sobre a criança. – Douglas perguntou, parecendo incrédulo.
Estava prestes a explicar-lhe que isso era algo totalmente legal pela lei americana, quando Oliver fez exatamente isso, mas usando termos legais.
— Ainda assim, acho muito injusto. – Douglas opinou. – E além de elaborar esse contrato que só beneficia você, Oliver ainda terá que encontrar alguém que aceite fazer esse papel?
— Esse tipo de acordo está cada vez mais presente na sociedade moderna, Douglas. – Oliver reforçou. – Eu não concordo com a forma escolhida por nosso amigo, mas consigo entender a maneira como ele está pensando.
— Eu não posso me expor de forma alguma. – Deixei claro aquele ponto, visto que Douglas estava tão incomodado. – O que você acha, Oliver?
— Deseja que eu responda como advogado ou como amigo?
— Aguardo os dois aspectos da questão. – Falei prontamente.
Independentemente da opinião dos meus amigos, eu não seria demovido daquela ideia sob hipótese alguma. Era algo que vinha amadurecendo em minha mente há vários meses, mas eu precisei primeiro resolver questões da empresa, deixando tudo organizado, pois eu desejava ter tempo para o meu filho, quando ele estivesse comigo.
— Legalmente, você não está fazendo nada errado. É possível fazer conforme deseja. – Oliver expôs sua opinião profissional.
— E o meu amigo Oliver, o que diz?
— Acredito que essa não é a melhor maneira de trazer uma criança para a sua vida. – Ele falou e parecia sincero. – Eu gostaria que meu amigo tivesse uma família e que um filho viesse apenas para somar.
Pensei sobre a situação do próprio Oliver e foi difícil de conter a expressão de pena, uma vez que ele parecia ser o único que não conseguia perceber que a sua própria esposa, Martina, era uma víbora e não parecia amar nenhum pouco a filha que eles tinham, a pequena Eloá.
Eu e o Douglas já havíamos tentado o alertar para aquele fato, mas ele parecia enfeitiçado por sua mulher, não percebendo que ela tinha uma postura na sua presença, que não condizia com a pessoa que ela era de fato.
Quando estava na frente do marido, Martina falava com uma voz fina e doce, fingindo amar a filha. Mas nós já havíamos visto ela sem o Oliver por perto e ela era extremamente maldosa, tratando a filha com verdadeiro desprezo.
Eu não queria passar por algo semelhante e de maneira alguma me colocaria em risco dessa forma. Além da minha própria experiência, ainda podia acompanhar a do meu amigo.
— Eu agradeço bastante por serem sinceros em seus posicionamentos. – Falei.
— Mas você vai fazer o que quer e como quer. – Douglas estava correto.
Eles eram meus amigos há tempo suficiente para saberem que nada conseguia me demover, de uma ideia, quando eu estava decidido.
— Posso contar com a ajuda de vocês?
— Se está decidido, só nos resta ajudá-lo, então. – Oliver falou, enquanto se levantava de sua cadeira, me puxando para um abraço de “homens”.
— É isso aí, meus amigos. – Douglas disse, sendo o próximo a me abraçar. – Seremos tios, Oliver!